Qualidade de vida no trabalho segundo
futuros administradores
Life quality at work according to future managers
Resumo
Rafael da Silva Molina e Valdete Maria Ruiz
Qualidade de Vida no Trabalho é um tema frequente na
literatura de diferentes áreas do conhecimento e vem passando
por transformações sob influência de várias perspectivas que
impactam a atuação de diferentes profissionais, sobretudo a
de gestores de empresas. Sendo assim, o objetivo deste estudo
foi investigar as concepções de universitários concluintes de um
curso de Administração sobre QVT. Participaram da pesquisa
19 acadêmicos do último período de um curso privado
noturno de Administração, nove do gênero masculino e 10 do
gênero feminino, com idades entre 21 e 30 anos, a maioria
solteira, sem dependentes e já atuantes em alguma das áreas
de Administração. O instrumento utilizado foi o Questionário
Interfaces QVT & Administração, do qual foram utilizadas seis
questões para a análise de dados. Os resultados indicaram
que os futuros administradores pesquisados, em sua maioria,
têm um foco mais organizacional do que biopsicossocial sobre
QVT, uma visão positiva sobre a necessidade das empresas
terem programas relacionados a ela e consideram que estes
são investimentos. Contudo, percebem estes programas e
outras ações ligadas à QVT como suporte às atividades da
empresa e assumem não ter uma definição clara sobre o
conceito. Esses resultados indicam a necessidade de formação
mais especializada.
Autores
Palavras-chave
Qualidade de Vida, Trabalho, Saúde Ocupacional, Gestão,
Universitários.
Rafael da Silva Molina
Graduado em Psicologia pelo Centro
Universitário das Faculdades Associadas
de Ensino- UNIFAE.
e-mail:
[email protected]
Valdete Maria Ruiz
Psicóloga pela USP- Ribeirão Preto.
Especialista em Gestão de Recursos
Humanos pelo INPG e em Gestão Escolar
pela FIJ. Mestre e Doutora em Psicologia
como Ciência e Profissão pela PUCCampinas. Professora e supervisora de
estágios do curso de Psicologia da UNIFAE
- Centro Universitário das Faculdades
Associadas de Ensino – FAE e diretora
do Instituto Educacional Imaculada
Conceição.
e-mail:
[email protected]
Recebido em 09/junho/2011
Aprovado em 22/março/2012
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.5, n.2, 2011
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MOLINA, R. da S. RUIZ, V. M.
Introdução
Embora a expressão “Qualidade de Vida no Trabalho”
(QVT) já venha sendo usada desde o final da década de
60, para se referir ao resgate de valores humanísticos e
ambientais negligenciados pelas sociedades industrializadas
em favor do avanço tecnológico e do crescimento
econômico, nos dias de hoje, vem ganhando cada vez
maior destaque na literatura de diferentes áreas (saúde,
ecologia, ergonomia, psicologia, sociologia, economia,
administração e engenharia, por exemplo), em razão das
transformações aceleradas e das novas demandas da
sociedade pós-industrial que impactam a qualidade de
vida das pessoas (RUIZ, 2007; VASCONCELOS, 2001).
A esse respeito, Timossi et al. (2010) destacam que
as empresas estão inseridas em um processo contínuo de
mudança, desenvolvendo estratégias para acompanhar o
aumento da complexidade das relações de mercado, o que
faz com que muitas delas optem por utilizar a Qualidade de
Vida no Trabalho como uma dessas estratégias e dispensem
maior atenção às questões relacionadas à valorização do
capital humano.
Sendo assim, a concepção de Qualidade de Vida
do Trabalho vem se modificando e evoluindo para “uma
compreensão abrangente e comprometida das condições
de vida no trabalho que inclui aspectos de bem-estar,
garantia de saúde e segurança física, mental e social e
capacitação para realizar tarefas com segurança e bom uso
da energia pessoal” (LIMONGI-FRANÇA e RODRIGUES,
2005, p. 166).
Todavia, a própria abrangência do conceito ainda
não permite uma definição consensual, mesmo porque,
conforme explicam Ferreira, Alves e Tostes (2009),
Qualidade de Vida no Trabalho tem sido tratada com
base em diferentes perspectivas analíticas expressas, ao
longo do tempo, por distinções baseadas em: pressupostos
norteadores, visão de ser humano, concepção de trabalho,
diversidade de indicadores e enfoques de gestão. Em
sua revisão, apontam estas distinções em publicações
de estudiosos brasileiros do assunto: conciliação dos
interesses das organizações e dos indivíduos (FERNANDES,
1996); saúde, estilo de vida e ambientes de trabalho
(SILVA e MARCHI, 1997); segurança e higiene no trabalho
(SIGNORINI, 1999); conflitos decorrentes das relações
interpessoais (BOM SUCESSO, 2002); saúde mental,
condições, organização e relações de trabalho (SAMPAIO,
2004); escolas de pensamento, indicadores empresariais
(biológicos, psicológicos, sociais e organizacionais) e
fatores críticos de gestão (LIMONGI-FRANÇA, 2004).
Sob o ponto de vista conceitual, Qualidade de Vida
no Trabalho está ligada, originariamente, às condições
humanas e à ética do trabalho, compreendendo, desde
exposição a riscos ocupacionais observáveis no ambiente
físico, padrões de relação entre o trabalho contratado e a
retribuição desse esforço, até a dinâmica do uso do poder
formal e informal. Assim sendo, inclui componentes de
saúde e segurança ocupacionais e o próprio significado
trabalho, com suas implicações éticas e ideológicas
(LIMONGI-FRANÇA e RODRIGUES, 2005).
As primeiras investigações científicas que deram origem
à denominação “Qualidade de Vida no Trabalho” são
atribuídas a Eric Trist e seus colaboradores do Instituto
Tavistock de Londres, em 1950, e estas se relacionavam
à abordagem sociotécnica das organizações, abrangendo
experiências baseadas na análise e reestruturação de
tarefas, com o objetivo de tornar a vida dos trabalhadores
menos penosa. Mas foi só pouco mais tarde (final da
48
década de 1960), que o termo “Qualidade de Vida no
Trabalho” foi apresentado, nos estados Unidos da América,
como resultado dos questionamentos a respeito de como
as experiências das pessoas, em seus locais de trabalho,
influenciavam sua saúde, seu bem-estar psicológico e a
produtividade das organizações (BOWDITCH e BUONO,
1998; FERNANDES, 1996).
A partir de então, estudos e pesquisas sobre Qualidade
de Vida no Trabalho ganharam mais adeptos no mundo
todo e o trabalho de Walton, de 1975, passou a ser um dos
principais referenciais sobre o tema, por estar baseado em
oito categorias conceituais bastante amplas como critérios
de QVT: compensação justa e adequada; condições de
trabalho justas e salutares; oportunidade imediata de utilizar
e desenvolver a capacidade humana; oportunidade para
continuidade de crescimento e desenvolvimento; integração
social na organização de trabalho; constitucionalismo na
organização de trabalho; espaço do trabalho dentro da
vida como um todo; relevância social do trabalho. Vale
frisar que, ainda hoje, Walton, expoente da chamada
“Escola Organizacional” da QVT, é o autor que oferece o
modelo mais utilizado para se medir a Qualidade de Vida
no Trabalho em uma empresa (CARVALHO-FREITAS, 2009;
LIMONGI-FRANÇA, 2004; MÔNACO e GUIMARÃES,
2000; PAIVA e COUTO, 2008; RECHZIEGEL e VANALLE,
2011; TIMOSSI et al. 2010, TOLFO e PICCINI, 2001).
Outra perspectiva importante para a compreensão
da Qualidade de Vida no Trabalho é baseada no
enfoque biopsicossocial da saúde, derivado da medicina
psicossomática, desde Lipowski, em 1986. Esta perspectiva
propõe uma visão integrada (holística) do ser humano ao
considerar que ele é um complexo sociopsicossomático,
ou seja, tem potencialidades biológicas, psicológicas
e sociais que respondem, juntas, por suas condições de
vida, inclusive no trabalho. O impacto dessa perspectiva
tem unido diferentes áreas do conhecimento, entre as
quais a fisiologia, a ergonomia, a filosofia, a psicologia e
a sociologia, na busca de abordagens mais integradoras
para se conceituar e intervir sobre a Qualidade de Vida no
Trabalho (LIMONGI-FRANÇA, 2004; LIMONGI-FRANÇA
&RODRIGUES; 2005, RUIZ, 2007).
Alinhando-se com os conceitos de “desenvolvimento
sustentável”, preconizado pela Comissão Mundial sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da ONU, e
com o de “responsabilidade social”, usado, pela primeira
vez, em 1998, pelo Conselho Empresarial Mundial para
o Desenvolvimento Sustentável, a Qualidade de Vida
no Trabalho, mais recentemente, vem sendo colocada
num contexto mais amplo, como uma questão de ética,
cidadania e responsabilidades compartilhadas em
prol do desenvolvimento econômico, social científico e
cultural da sociedade. É neste contexto que se define que
a Responsabilidade Social Empresarial (RSE) envolve o
comprometimento permanente dos empresários de adotar
um comportamento ético e contribuir para o desenvolvimento
econômico, melhorando, simultaneamente, a qualidade de
vida de seus empregados e de suas famílias, da comunidade
local e da sociedade, como um todo (LIMONGI-FRANÇA,
2004; RUIZ, 2007).
Verifica-se, assim, que, de fato, são várias as concepções
que influenciam a Qualidade de Vida no Trabalho e,
por isso mesmo, é difícil que se encontre uma definição
completa e consensual sobre ela. Provavelmente como uma
consequência disto, a realidade gerencial no Brasil tem
mostrado que, na prática, ela tem sido compreendida de
forma parcial e multifacetada, com ações administrativas
que a ignoram em suas políticas e processos produtivos
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.5, n.2, 2011
Qualidade de vida no trabalho segundo futuros administradores
ou na reparação de aspectos humanos e ambientais
que possam neutralizar riscos nas condições de trabalho
(FERNANDES, 1996, LIMONGI-FRANÇA e RODRIGUES,
2005).
Além disso, a Qualidade de Vida no Trabalho ainda está
apenas ligada às práticas do setor de recursos humanos,
em boa parte das organizações brasileiras, razão pela qual
autores como Limongi-França (2004); Nunes, Nascimento
e Oliveira (2006), Tolfo e Piccinini (2001), defendem que
Qualidade de Vida no Trabalho deve ser vista como uma
“estratégia organizacional”. Neste sentido, deve ser objeto
de interesse crescente de dirigentes, gestores, trabalhadores,
profissionais da ciência do trabalho, estudantes e
pesquisadores, para que não se satisfaçam somente com
a decisão de melhorar a Qualidade de Vida no Trabalho,
mas, além disso, se empenhem na identificação de fatores
e critérios que sustentem a formulação de modelos de
implantação de projetos que possam ultrapassar iniciativas
aleatórias, meramente assistencialistas, filantrópicas ou
reativas a pressões legais – como ainda acontece em
muitas organizações.
Com esta visão, Limongi-França (1997, apud
VASCONCELOS, 2001, p.25) define Qualidade de Vida
no Trabalho como:
[...] o conjunto das ações de uma empresa
que envolvem a implantação de melhorias
e inovações gerenciais e tecnológicas no
ambiente de trabalho. A construção da
qualidade de vida no trabalho ocorre a partir
do momento em que se olha a empresa e as
pessoas como um todo, o que chamamos de
enfoque biopsicosocial. O posicionamento
biopsicosocial representa o fator diferencial
para a realização de diagnóstico, campanhas,
criação de serviços e implantação de projetos
voltados para a preservação e desenvolvimento
de pessoas, durante o trabalho na empresa.
Nesta definição fica evidente que a Qualidade de
Vida no Trabalho deve partir de ações de cunho gerencial
visando aprimoramentos tecnológicos do ambiente de
trabalho, além de melhoramentos nas áreas de recursos
humanos, planejamento estratégico, produção e bem-estar
do trabalhador, para o que devem concorrer diferentes
paradigmas: ergonomia (adaptação do trabalho ao ser
humano), abordagens clínico-verbais (comunicação e
informação para casos médicos, por exemplo), distúrbios
osteomoleculares relacionados com o trabalho (tendinites,
etc), fatores psicossociais (recuperação, proteção e
promoção da saúde), detecção dos agravos à saúde
relacionados com o trabalho, legislação e programas de
segurança e saúde do trabalho, ciclos de trabalho, entre
outros (LIMONGI-FRANÇA, 2004).
Na mesma direção de Limongi-França, autores como
Fernandes, Rocha, Vendrame, Sarraceni e Vendrame
(2009) definem Qualidade de Vida no Trabalho como
um novo modelo de gestão e de ética, que deve envolver
as dimensões física, intelectual, emocional, profissional,
espiritual e social, buscando-se uma organização
mais humanizada, que proporcione condições de
desenvolvimento pessoal e motivação aos indivíduos. Isto
porque o capital humano cada vez mais é reconhecido
como a peça-chave das organizações vencedoras, que
necessitam de pessoas motivadas, saudáveis e preparadas
para enfrentar constantes desafios. Sendo assim, a
Qualidade de Vida no Trabalho deve se tornar parte da
Pensamento Plural: Revista Científica do
cultura organizacional, concluem.
Além disso, os mesmos autores, além de outros
contemporâneos, destacam que os cursos voltados
para a Qualidade de Vida no Trabalho devem ter como
objetivo aproximar conceitos e práticas de gestão que
atendam à complexidade do mercado e a seus desafios de
competitividade, com ênfase em pessoas.
Mas o que dizer dos cursos de graduação que preparam
futuros administradores para os desafios da gestão da
Qualidade de Vida no Trabalho? Estarão eles sendo bem
preparados nestes cursos? Terão uma visão abrangente e
moderna do conceito? Como se posicionarão diante de
programas e ações de QVT que necessitem investimentos
financeiros e/ou mudanças na cultura organizacional?
Investigar estas questões junto a concluintes de um
curso de Administração privado e noturno, localizado numa
cidade do interior do Estado de São Paulo, foi o objetivo
geral deste estudo o qual, baseado numa ampla pesquisa
de campo com administradores, alunos e professores da
área de Administração, além de ampla análise documental
com alunos do MBA-RH (FIA), em convênio com a USP,
realizada por Limongi-França (2004), teve como objetivos
específicos: verificar quais as áreas da Administração
às quais os estudantes atribuem maior importância;
identificar palavras-chave que significam Qualidade de
Vida no Trabalho, para eles; analisar sua percepção sobre
a necessidade de ações e programas de Qualidade de
Vida no Trabalho nas empresas; verificar se possuem uma
definição clara do conceito e como encaram as ações e
programas de Qualidade de Vida no Trabalho.
Método
Participantes
Participaram do estudo dezenove alunos (nove do
gênero masculino e 10 do gênero feminino) de duas
turmas do último período do curso de Administração de
um centro universitário no interior paulista, ministrado no
horário noturno. As faixas de idade dos participantes estão
compreendidas entre 21 e 30 anos e a maioria (84,2%) é
de solteiros e sem dependentes (63,2%). Por se tratar de
um curso noturno, vários deles já atuam profissionalmente
na área administrativa, na própria cidade ou em outras
da região próxima, incluindo algumas do Estado de Minas
Gerais, sendo 31, 6% em administração geral, 26,3%
em finanças, 15,8% em recursos humanos, 5,3% em
marketing, 5,3% em produção e operação e os demais em
outras áreas.
Instrumento
Visando a coleta de dados para a caracterização dos
participantes e sua percepção de Qualidade de Vida no
Trabalho, foi utilizado o Questionário Interfaces QVT &
Administração (LIMONGI-FRANÇA, 2004). O questionário
contém, no total, 29 perguntas, a maioria delas fechada,
utilizando uma escala do tipo Likert, com variação entre
os pontos: discordo plenamente, discordo, concordo,
concordo plenamente e desconheço.
Embora o instrumento tenha sido aplicado na íntegra,
neste estudo só foram utilizadas, para a análise de dados,
as questões de números 1, 2, 16, 18, 27 e 28, por se
relacionarem, mais diretamente, aos objetivos do mesmo.
O instrumento foi acompanhado por um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido que os estudantes leram
e assinaram, antes de responder.
Procedimento
Em horários de aula previamente autorizados pelo
, São João da Boa Vista, v.5, n.2, 2011
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MOLINA, R. da S. RUIZ, V. M.
Coordenador do curso de Administração, nos dias 21 e
22 de outubro de 2010, o primeiro Autor deste estudo,
que realizava, então, estágio na área de Psicologia
Organizacional sobre o tema Qualidade de Vida no
Trabalho, compareceu às duas salas do curso, explicando
seus objetivos e solicitando a participação dos alunos
presentes. Pediu que lessem e assinassem o Termo de
Consentimento Livre e que respondessem ao questionário
em dias e horários que julgassem mais convenientes,
devolvendo-lhe ambos, pessoalmente, no prazo de
três dias, quando voltaria às salas. Foram entregues 19
questionários, correspondendo à participação de 26,4%
do total de alunos do curso.
Resultados e Discussão
Os dados obtidos em cada uma das seis questões
do instrumento utilizado para a coleta de dados sobre
Qualidade de Vida no Trabalho foram tabulados e
são expressos em percentuais, nas Figuras de 1 a 6,
apresentadas na sequência.
A questão 1 era aberta e pedia que os alunos indicassem
duas áreas que consideravam de maior importância para o
Administrador de Empresas. Verifica-se, na Figura 1, que as
áreas de finanças e recursos humanos foram sobremaneira
privilegiadas, pois respondem, juntas, por mais de 70,0%
das respostas. Num patamar intermediário, situam-se
as respostas nas áreas de planejamento estratégico,
produção e comercial, que somaram 15,9% do total e,
com representatividade bem menor estão as áreas de
administração geral, marketing, logística, contabilidade e
psicologia, que perfizeram apenas 13,0 % das respostas.
Figura 1 - Áreas de atuação de maior importância para o administrador.
Fonte: Pesquisa realizada pelos autores
É interessante observar que, embora a pesquisa tratasse
de Qualidade de Vida no Trabalho, nenhum estudante
mencionou esta área como importante para a atuação
do Administrador. Tampouco foram indicadas outras mais
diretamente ligadas a ela (como saúde e segurança), a
exemplo do que ocorreu na pesquisa de Limongi-França
(2004). Este pode ser um indicativo de que a população
pesquisada não perceba a Qualidade de Vida no Trabalho
como uma área importante ou de que não a perceba como
desvinculada de outras.
Por outro lado, considerando-se que, tradicionalmente,
os programas e ações relativos à Qualidade de Vida
no Trabalho são ligados à área de Recursos Humanos,
a segunda de maior importância para os acadêmicos
pesquisados, com 31,6% das respostas, pode-se que as
tenham englobado nesta área de atuação. Desta maneira,
pode-se supor que tais ações ou programas teriam
lugar em sua atuação profissional, no futuro, dentro de
recursos humanos. Esta suposição ganharia força se fosse
considerada, também, a importância, ainda que pequena
(2,6%), atribuída pelos participantes à área de psicologia,
outra área tradicionalmente ligada a ações e programas de
Qualidade de Vida no Trabalho.
Todavia, o fato dos graduandos pesquisados terem
atribuído à área financeira o primeiro lugar de importância,
com o expressivo percentual de 39,5% do total de respostas,
leva a questionar se estariam em condições de investir em
Qualidade de Vida no Trabalho como administradores
de empresas pois, como mostra a literatura (RUIZ, 2007),
50
muitos desses profissionais ainda concebem programas
e ações em prol da mesma como despesa e não como
investimentos em saúde, segurança e bem-estar dos
trabalhadores – os quais poderão reverter em melhores
resultados organizacionais, incluindo a lucratividade. Sob
este aspecto, seria desejável que as percepções relativas às
áreas de administração geral e planejamento estratégico,
por exemplo, fossem maiores do que as encontradas na
amostra pesquisada (respectivamente 2,6 e 5,3%).
Ainda sobre o grau de importância atribuído às áreas
de atuação do administrador, é interessante destacar
que, em seu estudo com administradores profissionais de
várias áreas com estudantes e docentes de Administração,
Limongi-França (2004) também verificou que, em relação
às demais pesquisadas, as duas principais foram: finanças
(19,7% do total de respostas) e recursos humanos (30,9%).
Entretanto, seus dados apresentam-se em ordem inversa
aos da presente pesquisa, sendo o percentual de recursos
humanos muito próximo entre ambas e o de finanças
bem menor. Sobre seus resultados, a autora comenta que
“o administrador geral migrou para a área de recursos
humanos” e que “as respostas à variável RH podem
significar congruência com as atividades de Qualidade
de Vida no Trabalho, normalmente enquadradas como
atividades de recursos humanos, mais especificamente
questões de saúde, segurança e benefícios” (p. 148). No
presente estudo, todavia, esta afirmação não poderia
ser feita com o mesmo grau de segurança, visto que os
estudantes de Administração atribuíram importância bem
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.5, n.2, 2011
Qualidade de vida no trabalho segundo futuros administradores
maior à atuação na área de finanças. O que precisaria ser
mais bem investigado é se este resultado está ligado ao
tipo de formação que o curso lhes oferece, à sua própria
vivência profissional (visto que boa parte deles já trabalha
em uma ou mais áreas da Administração em cidades do
interior do Estado de São Paulo e Minas Gerais), ou a
outras variáveis.
A Figura 2 apresenta os focos das palavras-chaves
que os participantes relacionaram à Qualidade de Vida
no Trabalho, mediante categorização de respostas à
pergunta de número dois do questionário. A categorização
foi feita pelos Autores, à semelhança da realizada por
Limongi-França (2004). Nesta figura se observa que o foco
organizacional obteve percentual bem maior de respostas
(42,1%), o que pode ser interpretado como uma percepção
ampla e moderna do conceito de Qualidade de Vida no
Trabalho, enquanto ligado não só a condições biológicas,
sociais e psicológicas, mas também a práticas de gestão e
desenho organizacional dos ambientes ocupacionais.
Figura 2: Focos das palavras-chave sobre QVT.
Fonte: Pesquisa realizada pelos autores
Se a interpretação anterior for verdadeira, pode-se
esperar que os acadêmicos que compuseram a amostra
deste estudo procurem, em sua vida profissional, considerar
os diferentes tipos de variáveis que interferem na Qualidade
de Vida no Trabalho, mais do que os participantes do
estudo citado de Limongi-França, que encontrou no foco
organizacional apenas 13,8% de respostas. Por outro lado,
chama a atenção o fato de terem atribuído à dimensão
psicológica um percentual tão mais baixo (5,26%) em
relação aos demais, e tão diverso do encontrado por
Limongi-França, em sua amostra (39,2%). Este dado
pode significar que os graduandos desconhecem ou dão
pouca importância aos processos afetivos, emocionais e
de raciocínio, conscientes ou inconscientes, que formam a
personalidade de cada pessoa e seu modo de perceber e
se posicionar diante das demais pessoas e circunstâncias
que vivencia – o que afeta sua saúde e, por extensão, sua
Qualidade de Vida no Trabalho, conforme preconiza a
visão biopsicossocial (LIMONGI-FRANÇA e RODRIGUES,
2005).
As Figuras 3, 4, 5 e 6 apresentam dados relativos
aos fatores críticos que avaliam o conceito de Qualidade
de Vida no Trabalho, segundo a concepção da autora
do instrumento de pesquisa que foi utilizado no presente
estudo. Fazem parte destes fatores as questões 16, 18, 27
e 28 do instrumento.
As respostas obtidas na questão 16 (Tabela 3) indicam
que a totalidade dos acadêmicos de Administração
pesquisados considera que toda empresa deve ter um
programa de Qualidade de Vida no Trabalho, pois nenhum
respondeu que discordava ou discordava plenamente
dessa necessidade. Pelo contrário, o maior percentual
de respostas foi encontrado na categoria “concordo
plenamente”.
Figura 4: Percepção dos participantes em relação a ter uma definição clara sobre QVT.
Fonte: Pesquisa realizada pelos autores
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.5, n.2, 2011
51
MOLINA, R. da S. RUIZ, V. M.
Como já mencionado, a literatura mostra que não
existe uma definição clara, abrangente e unânime a
respeito da Qualidade de Vida no Trabalho, pois seu
conceito vem sendo influenciado por diferentes visões e
tendências. Assim, poderia ser este o motivo da incerteza
dos participantes nesta questão, o que indica a necessidade
de se aprofundarem no estudo do assunto, seja na
graduação ou em cursos específicos de pós-graduação –
condição importante para que, como futuros profissionais,
possam ter uma atuação mais abrangente e moderna,
como denotaram em algumas questões anteriores. Este
dado também pode indicar a necessidade de que o próprio
curso de Administração focalize melhor o tema. Tais
necessidades parecem ser ainda mais evidentes quando
se comparam os dados aqui obtidos com os de LimongiFrança (2004), cujos participantes, em minoria (35,4%),
declararam discordar ou discordar plenamente de ter uma
definição clara sobre Qualidade de Vida no Trabalho.
Quando perguntados sobre como são vistos ações e
programas de Qualidade de Vida no Trabalho (questão
27 do instrumento de pesquisa), a amostra de estudantes
apresentou maior percentual de respostas na categoria
investimentos (36,0%), conforme se verifica na Figura
5. No entanto, na mesma figura, observa-se que uma
parcela significativa se posicionou pelo contrário, ou
seja, considerou que ações e programas de Qualidade
de Vida no Trabalho são vistos como despesas (16,0%).
Consideradas juntas, estas duas categorias representam
mais de 50,0% de respostas relacionadas à área financeira
da Administração, área à qual os participantes atribuíram
maior importância (Figura 1).
Estes resultados levam, novamente, a questionar se
os futuros profissionais de Administração pesquisados
serão realmente capazes de investir em Qualidade de
Vida no Trabalho de forma estratégica, considerando todo
o conjunto de variáveis que a afetam, como recomenda
a literatura recente, ou se irão tratá-la como despesa ou
ação específica da área de recursos humanos (28,0%
- segundo maior percentual de respostas na questão).
Esse questionamento pode adquirir um caráter pouco
mais contundente ao se considerar que, na pesquisa de
Limongi-França (2004), as categorias “despesa” e “ações
específicas de recursos humanos” obtiveram percentuais de
respostas relativamente menores (respectivamente 10,6%
e 22,1%).
Figura 5: Como são vistos as ações e programas de QVT.
Fonte: Pesquisa realizada pelos autores
A última questão relativa aos fatores críticos para a
concepção de Qualidade de Vida no Trabalho (questão
28) inquiriu os participantes sobre como devem ser as
ações e programas relativos a ela: um produto ou serviço
permanentes da empresa; suporte às atividades da empresa;
ações gerenciais; estratégias e políticas da empresa;
outros. Os resultados obtidos na questão são apresentados
na Tabela 6, que indica um percentual bem mais alto
de respostas (quase 50,0%) na categoria “suporte às
atividades da empresa”. Este dado leva à consideração de
que os acadêmicos de Administração tendem a encarar as
ações e programas de Qualidade de Vida no Trabalho mais
como coadjuvantes ou acessórios do que como estratégias,
produtos ou serviços oferecidos permanentemente pelas
empresas como resultados de suas políticas de gestão,
visto que estas últimas categorias obtiveram percentuais
bem menores (21,0% cada). E esta não é uma tendência
52
que se verifica na literatura recente, como indicam os
próprios dados obtidos por Limongi-França (2004), os
quais se apresentam bem diversos: a categoria “suporte”
foi uma das que obteve menores percentuais de respostas
(8,8%), enquanto as categorias “estratégias” e “produto
ou serviço permanentes” obtiveram os maiores percentuais
(respectivamente 50,2 e 17,0%). Mesmo com resultados
superiores, a autora salienta que, embora as ações e
programas de Qualidade de Vida no Trabalho sejam, em
geral, percebidos como necessários para as organizações
melhorarem seu desempenho, grande parte dos seus
pesquisados indicaram não ter conhecimento das formas
ou modelos gerenciais requeridos para sua implantação
e operacionalização, o que demonstra o grande espaço
existente a ser consolidado na visão gerencial de Qualidade
de Vida no Trabalho e, mais uma vez, a necessidade de se
investir em formação especializada na área.
Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.5, n.2, 2011
Qualidade de vida no trabalho segundo futuros administradores
Figura 6: O que devem ser as ações e programas de QVT.
Fonte: Pesquisa realizada pelos autores
Considerações Finais
Notas
1. O estudo é baseado, em parte, no trabalho de conclusão de estágio “Percepção de futuros administradores
sobre o conceito e a importância da Qualidade de Vida no Trabalho”, realizado, no ano de 2010, pelo
primeiro Autor, sob supervisão da segunda.
Referências
Este estudo, mesmo com as limitações da amostra e
da análise de dados empregada, identificou elementos
importantes relacionados às concepções sobre a Qualidade
de Vida no Trabalho de graduandos de Administração da
região de São João da Boa Vista, interior do Estado de
São Paulo, os quais merecem ser considerados por outros
estudantes, por pesquisadores do assunto, tanto quanto
pelos gestores do curso pesquisado e por empresários ou
atuais administradores de organizações que contratam
profissionais com formação e características semelhantes.
O primeiro ponto a ser destacado é que os acadêmicos
pesquisados concentraram o foco da Qualidade de Vida
no Trabalho no âmbito organizacional, indicando que a
consideram mais diretamente ligada a fatores como os
oito presentes na concepção de Walton (representante
da Escola Organizacional). Se, por um lado, esta visão
é positiva, posto que ampla e relativamente mais objetiva,
por outro, pode levar a minimizarem a importância das
variáveis biopsicossociais que impactam a Qualidade de
Vida no Trabalho (especialmente a variável psicológica, à
qual atribuíram importância muito pequena), nas ações e
programas de QVT que vierem a empreender. Para tanto,
como recomendam estudiosos do tema, seria fundamental
que contassem com uma equipe multidisciplinar composta
por especialistas em medicina, higiene e segurança do
trabalho, bem como com outros profissionais da área de
saúde como fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e
psicólogos. E isto, principalmente, porque a maioria deles
declarou não ter, ainda, clareza na própria definição de
Qualidade de Vida no Trabalho, resultado que indica
ser necessário que se aprofundem no estudo do assunto
na própria universidade ou, talvez, em cursos de pósgraduação.
Outro aspecto positivo a ser ressaltado é que a totalidade
dos graduandos que participou do estudo considerou que
toda empresa deve ter um programa de Qualidade de
Vida no Trabalho. Contudo, uma parcela significativa deles
ainda concebe que programas de QVT são mais despesas
do que investimentos capazes de impulsionar o crescimento
das organizações. Esta concepção poderá levá-los a uma
gestão financeira equivocada, caso não a combinem com
uma visão estratégica de médio e longo prazo. Portanto,
vale recomendar que o curso de Administração considere
esse aspecto na formação de seus alunos, mesmo porque
a amostra deste estudo indicou considerar finanças como
a área mais importante para o administrador de empresas.
Além disso, muitos dos acadêmicos que responderam
à pesquisa consideraram que programas de Qualidade de
Vida no Trabalho dependem de ações específicas da área de
recursos humanos, como suporte às atividades da empresa
e não como ações estratégicas de gestão empresarial
que ofereçam produtos ou serviços permanentes aos
seus colaboradores, de forma a constituírem valores
fundamentais da cultura organizacional. Neste sentido,
também seria recomendável que os participantes
buscassem se atualizar quanto às modernas formas de
gestão da Qualidade de Vida no Trabalho, para que
possam ter uma prática profissional mais afinada com os
tempos atuais. Com isso ganharão tanto os colaboradores
quanto as instituições em que trabalhem, pois a Qualidade
de Vida no trabalho é vista, hoje, como uma competência
essencial para os profissionais e organizações de todos os
ramos operarem em ambientes competitivos e mutáveis.
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Abstract
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Life Quality at Work is a frequent theme on the literature of different areas of knowledge and has been changed
under influences from several perspectives that have an impact on different professionals’ acts, meanly managers of
companies. With this in mind, this study’s objective was to investigate the conceptions about LQW from graduates
of an Administration course. Nineteen academicals of the last period from of a private, nocturne Administration
course participated on the research, nine from the male gender and ten from the female gender, with ages
between 21 and 30, most of them single, without dependents and acting in some Administration area already. The
instrument used was the Interfaces Questionnaire LQW and Administration from whose were used six questions for
data analyses. The results pointed out that the future administrators analyzed have a larger organizational focus
than a biopsicosocial one about LQW, a positive view about the enterprise’s need of having programs related to
it and consider that they are investments. However, they realize the programs and other actions linked to LQW as
a support to the enterprise’s activities and they assume that they don’t have a clear definition about the concept.
These results indicate the necessity of a more specialized formation.
Key words
Life Quality, Work, Occupational Health, Management, University Students
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Pensamento Plural: Revista Científica do
, São João da Boa Vista, v.5, n.2, 2011