CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
CONSULTA N° 51/2013 – CAOP Cível
OBJETO: Curatela – Surdo-mudez – Entendimento Doutrinário e
Jurisprudencial – Admissibilidade – Critério – Avaliação da Capacidade do
Indivíduo de se Comunicar/Exprimir sua Vontade.
INTERESSADA: 1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA COMARCA DE
PRUDENTÓPOLIS.
CONSULTA N° 51/2013:
1. Trata-se de consulta formulada por meio de contato
telefônico pela Dr.ª Aysha Sella Claro de Oliveira – oficiante junto à 1ª
Promotoria de Justiça da Comarca de Prudentópolis, por meio de
contato telefônico, em 1°/11/2013, a respeito da possibilidade de
interdição de pessoa com deficiência auditiva.
Segundo a consulente, o laudo pericial é conclusivo
apenas no que tange à incapacidade auditiva do interditando e não
aponta para nenhum indício de lesão ou deficiência mental que
comprometam a capacidade de discernimento do indivíduo.
Além disso, relatou a d. Promotora de Justiça que a
requerente - mãe do interditando – sustenta o pedido de interdição do
filho no fato de ele, supostamente, ter dificuldade de obedecer as suas
ordens.
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
1
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
É o que cumpria relatar, passo à manifestação.
2.
Após
pesquisa
doutrinária
e
jurisprudencial,
observamos que o entendimento predominante é no sentido de ser
admitida a interdição de indivíduo surdo-mudo.
O critério estabelecido para definir se uma pessoa maior
de dezoito anos e deficiente auditiva tem necessidade de interdição é a
avaliação da sua capacidade de exprimir vontade por meio da
comunicação, ainda que de forma limitada, com outras pessoas
além daquelas pertencentes ao seu convívio pessoal.
Os arestos encontrados na pesquisa dão conta de que a
interdição
de pessoa surda-muda
situações nas quais
costuma ser
decretada em
é identificado que o indivíduo não foi
alfabetizado adequadamente e, por conseguinte, não tem condições
de expressar a sua vontade, ainda que por meio de linguagem
alternativa.
Em outros casos, nos quais não se faz menção a qualquer
redução da capacidade de discernimento, em decorrência de outros
fatores fisiológicos, e constata-se que a pessoa é alfabetizada e recebeu
instrução necessária para se comunicar no meio social, bem como que
demonstra uma inteligência normal, a interdição é rejeitada.
Confira-se o resultado da pesquisa:
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
2
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INTERDIÇÃO - INTERDITANDO
SURDO-MUDO QUE, AOS 47 (QUARENTA E SETE) ANOS, É
ANALFABETO E APENAS CONSEGUE COMUNICAR-SE, POR
MEIO DE SINAIS, COM PESSOAS CONHECIDAS, SEM TER
RECEBIDO A INSTRUÇÃO NECESSÁRIA A SUPERAR SUAS
DIFICULDADES - IMPOSSIBILIDADE DE MANIFESTAÇÃO
LIVRE E INEQUÍVOCA DE SUA VONTADE OBSERVADA,
INCLUSIVE, NA AUDIÊNCIA DESIGNADA PARA INTERROGÁLO, A QUAL RESTOU PREJUDICADA, TENDO A APELANTE,
SUA MÃE, PRESTADO INFORMAÇÕES EM SEU LUGAR INCAPACIDADE RECONHECIDA - RECURSO CONHECIDO E
PROVIDO,
A
FIM
DE
DECRETAR
A
INTERDIÇÃO
DO
INTERESSADO, COM BASE NO ART. 1.767, II, DO CÓDIGO
CIVIL E DE NOMEAR A APELANTE COMO SUA CURADORA.
(TJPR - 18ª C. Cível - AC - 402807-5 - Paranacity - Rel.:
Cláudio de Andrade - Unânime - J. 15.08.2007). (Grifou-se).
APELAÇÃO
CÍVEL.
INTERDIÇÃO.
PRELIMINAR
DE
CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. DESNECESSIDADE
DE
PROVA
PERICIAL.
DOCUMENTOS
NOS
AUTOS
SUFICIENTES AO DESLINDE DA CAUSA. INTERDITANDA
SURDA-MUDA E ANALFABETA. CIRCUNSTÂNCIA QUE, POR
SI SÓ, NÃO A SUJEITA À CURATELA. CONSTATADA A
CAPACIDADE
DE
COMUNICAÇÃO
COM
PESSOAS
ESTRANHAS AO NÚCLEO DE CONVIVÊNCIA ATRAVÉS DE
GESTOS E LEITURA LABIAL, BEM COMO DE MANIFESTAR
SUA VONTADE. INEXISTÊNCIA DE DEFICIÊNCIA MENTAL.
SENTENÇA
DE
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA.
RECURSO
DESPROVIDO. (TJSC - AC: 721174 SC 2010.072117-4, Relator:
Sérgio Izidoro Heil, Data de Julgamento: 08/12/2011, Segunda
Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Apelação Cível n.,
de Urussanga). (Grifou-se).
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
3
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
AÇÃO
DE
INTERDIÇÃO.
SURDO-MUDO. INCAPACIDADE
ABSOLUTA. LAUDO MÉDICO. INDEFERIMENTO. RECURSO. É
de ser mantida sentença que, em procedimento de interdição,
relativamente ao surdo-mudo, indefere o pedido, quando
provado que o interditando tem condições de reger a sua
pessoa e administrar seus bens. Sentença mantida. "Em
terceiro lugar, são absolutamente incapazes os surdos-mudos,
que não pudessem exprimir a sua vontade. A surdo- mudez
resulta de lesão aos centros nervosos, aproximando o paciente
dos alienados mentais. Todavia, para decidir se o surdo-mudo
é ou não incapaz, situa-se o legislador sob o ângulo da
possibilidade de externar a sua vontade. Se, de modo
satisfatório, pode exprimir seu pensamento, é porque
possui discernimento; nesse caso, não é incapaz" (Curso de
Direito Civil - Parte Geral - Ed. Saraiva - 1.977 - 16ª Edição pág. 62). No mesmo sentido, Marco Aurélio S. Viana: "O que
determina a incapacidade absoluta do surdo-mudo é a
impossibilidade de expressar a sua vontade. O direito
civil abordou o tema do ponto de vista da manifestação da
vontade. Se ele é apto a manifestar sua vontade, está
perfeitamente ajustado ao meio social, possui inteligência
normal e exprime-se satisfatoriamente; em caso contrário,
entende-se que sofre de lesão central, que o aparta do
ambiente social, tornando-o alienado". (TJMG - Apelação
Cível 1.0000.00.337931-0/000,
Relator(a):
Des.(a)
Cláudio
Costa, 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 30/10/2003,
publicação da súmula em 25/11/2003). (Grifou-se).
Direito civil. Surdo-mudo. Interdição. Vontade. Expressão.
Decreta-se a interdição do surdo-mudo se ele, segundo a
prova produzida, não exprime a sua vontade de modo
satisfatório,
impondo-se
ao
curador
nomeado, quando
possível, o cumprimento da providência prevista no art.
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
4
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
456 do Código Civil. (...) Clovis Bevilaqua esclarece que a
"surdo-mudez congenita resulta, em regra, de uma lesão dos
centros nervosos, que approxima o paciente do alienado; algumas
vezes, porém, assim não será. O direito civil colloca-se no ponto
de vista da manifestação da vontade. Se o surdo-mudo póde
exprimir a sua vontade, de modo satisfactorio, é porque possui
uma intelligencia normal, capaz de discernimento e de adaptação
ao
meio
social;
se
não
consegue
exprimir-se,
de
modo
satisfactorio, é porque soffre de uma lesão central, que o isola do
mundo e o torna um alienado" (...) O art. 456 do Código Civil
dispõe que havendo meio de educar o surdo-mudo, o curador
promover-lhe-á o ingresso em estabelecimento apropriado. (...)
("Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, edição histórica",
vol. I, p. 185). (TJMG - Apelação Cível 1.0000.00.1939784/000, Relator(a): Des.(a) Almeida Melo , 4ª CÂMARA CÍVEL,
julgamento
em
16/11/2000,
publicação
da
súmula
em
29/12/2000). (Grifou-se).
(...) Seja, pois, porque conseguiu comunicar-se com o oficial
de justiça (fls. 18vº), seja porque é alfabetizado (fls. 15 e 20),
seja, ainda, em razão da conclusão a que chegou o médico
subscritor do laudo de fls. 44/45, conclui-se que o apelado não
se enquadra na incapacidade prevista no inciso III do art.
3º, nem tampouco no disposto no art. 1.767 do CC. A
propósito,
ensina
a
doutrina
que
se
os
surdosmudos
“puderem exprimir sua vontade, ainda que na linguagem
que lhes é própria, adquirida por meio de educação
adequada, serão capazes” (cf. SILVIO VENOSA. Direito civil
parte geral. 2ª ed., São Paulo: Ed. Atlas, 2002, p. 176; RENAN
LOTUFO. Código civilcomentado. 2ª ed., São Paulo: Ed. Saraiva,
2004, vol. 1, p. 20; RAPHAEL DE BARROS MONTEIRO e outros.
Comentários ao novo código civil. Coord. Sálvio de Figueiredo
Teixeira. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2010, vol. 1, p. 61).
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
5
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
Diante do exposto, conclui-se que, a despeito de suas
limitações, Onildo tem absoluta capacidade para gerir sua
vida e administrar seus bens, não se enquadrando nas
hipóteses do art. 1.767 do CC, embora necessite de auxílio
em algumas atividades do cotidiano. A propósito, já se
decidiu que “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO.
REDUÇÃO OU INCAPACIDADE DE DISCERNIMENTO SEQUER
ALEGADA COMO FUNDAMENTO DO PEDIDO. HIPÓTESE DE
IMPROCEDÊNCIA. (...) Preliminar rejeitada. A deficiência
auditiva da interditanda não implica em reconhecer sua
incapacidade para gerir atos da vida civil. Dificuldades ao
exercício da atividade laboral não indicam situação de
interdição, mormente não havendo menção acerca da
eventual redução na capacidade de discernimento, ou
mesmo
impossibilidade
de
exteriorização
da
vontade.
Tratando-se de medida extrema, exige-se prova cabal da
incapacidade, o que sequer veio alegado nos autos (...)” (TJRS,
7ª Câmara Cível, Ap. 70022227243, rel. Des. André Luiz
Planella Villarinho, j. 13/08/2008). (...) (TJSP - Apelação
0124068/86.2004.8.26.0000, Relator(a): Des.(a) Galdino Toledo
Junior,
9ª
Câmara
de
Direito
Privado,
julgamento
em
21/05/2013). (Grifou-se).
“(...) sua decretação requer certeza absoluta da incapacidade
(GONÇALVEZ, Carlos Roberto. Direito de família. São Paulo,
Saraiva, 2002, v. II. In: CARVALHO FILHO, Milton Paulo.
Código Civil Comentado Doutrina e Jurisprudência. 5ª Ed.:
Manole, Barueri, São Paulo, p. 1.767). (Grifou-se).
Examinando o caso concreto apresentado na consulta à
luz
da
orientação
doutrinária
e
jurisprudencial
acima
citada,
aconselhamos que a d. Promotora de Justiça verifique nos autos se
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
6
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
há outros elementos que permitam identificar se o interditando tem
capacidade de comunicação e consegue exprimir a sua vontade.
Uma forma adequada de avaliação da presença desse requisito é a
constatação de ser o indivíduo alfabetizado ou não, conforme indica a
jurisprudência nacional.
O fato de a mãe – pretensa curadora – alegar que o filho
tem dificuldades de obedecer às suas ordens em razão da deficiência não
enseja, em regra, a incapacidade do interditando.
É importante examinar se o obstáculo sustentado não é
proveniente da ignorância da genitora em relação aos meios de
comunicação do filho, como o conhecimento insuficiente de libras.
Por derradeiro, nos parece oportuno ressaltar que, no caso
de eventual decreto de interdição, é imperioso o alerta à curadora
quanto ao seu dever de despender esforços para que o filho seja
instruído com mecanismos que lhe permitam se comunicar de
forma adequada na sociedade (cf. art. 1.776, do Código Civil) e,
futuramente, eximir-se do estado de incapacidade para a prática dos
atos da vida civil.
3. Frente ao questionamento formulado e aos dados
fornecidos a este Centro de Apoio Operacional das Promotorias de
Justiça
Cíveis,
Falimentares,
de
Liquidações
Extrajudiciais,
das
Fundações e do Terceiro Setor, são esses, em tese, os esclarecimentos
que se entende adequados.
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
7
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DE JUSTIÇA CÍVEIS
FALIMENTARES, DE LIQUIDAÇÕES EXTRAJUDICIAIS,
DAS FUNDAÇÕES E DO TERCEIRO SETOR
Curitiba, 06 de novembro de 2013.
Terezinha de Jesus Souza Signorini
Procuradora de Justiça- Coordenadora do CAOP
Samantha Karin Muniz
Assessora Jurídica
Av. Mal. Deodoro. 1028 – Edifício Baracat – 4º andar – FONE: (41)
32504848/4852
8
Download

CONSULTA N° 51/2013 - Centro de Apoio Operacional das