A SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO: CAUSAS E MECANISMOS (LEIS NºS 11.232/2005 E 11.382/2006) Luís Guilherme Aidar Combioli SUMÁRIO: 1. A execução e seu desenvolvimento no contexto da efetividade e da celeridade do processo - 2. Causas de suspensão da execução - 3. Oposição do executado e suspensão da execução: de regra a exceção; do regime ope legis para o ope iudicis - 4. Impugnação à execução - 5. Embargos à execução - 6. Ação autônoma - 7. Ação rescisória - 8. Embargos de terceiro - 9. Encerramento. 1. A EXECUÇÃO E SEU DESENVOLVIMENTO NO CONTEXTO DA EFETIVIDADE E DA CELERIDADE DO PROCESSO Nos dias de hoje, duas são as palavras de ordem no processo civil: efetividade e celeridade. O anseio por um processo que dê plena atuação às regras de direito material e pacifique com justiça, num tempo razoável, é o que tem movido os processualistas. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 e sua ampla promessa de proteção judiciária (art. 5º, XXXV) trouxeram significativos avanços nessa direção. Mais recentemente, ainda no plano constitucional, "a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação" ganharam status de "direitos e garantias fundamentais" (art. 5º, LXXVIII), por ocasião da edição da Emenda Constitucional nº 45, de 8 de dezembro de 2004, o que representou mais um passo rumo à tempestividade da tutela jurisdicional. No plano infraconstitucional, a Reforma do Código de Processo Civil, iniciada em 1994, deflagrou importante movimento rumo à efetividade e à 1 celeridade do processo. Nesse sentido, suas figuras mais emblemáticas são a tutela específica (art. 461), capaz de proporcionar os mesmos efeitos programados para o adimplemento de um dever, e a antecipação de tutela (art. 273), apta a precipitar no tempo os efeitos do provimento jurisdicional final. A tutela específica trouxe como marca característica, ainda, a efetivação do comando inserto na sentença na mesma relação jurídica processual, sem a necessidade de instauração de um novo processo, o que foi um prenúncio do que estava por vir nas subsequentes ondas reformistas. Aliás, pode-se dizer que também a antecipação de tutela trouxe para o contexto do processo de conhecimento medidas satisfativas, tendo em vista sua aptidão para a outorga desde logo do próprio bem da vida pretendido com o ingresso em juízo. Começava a ganhar corpo a idéia de um "processo sincrético". Nos anos de 2001 e 2002, teve lugar a segunda etapa da Reforma do Código de Processo Civil. Ela refinou a tutela específica e a antecipação de tutela, ao estender aquela às situações de entrega de coisa (art. 461-A) e instituir para esta uma nova hipótese de cabimento ("incontrovérsia em torno de pedido" - art. 273, § 6º). Ainda, tornou expressa a fungibilidade entre tutela antecipada e tutela cautelar (art. 273, § 7º). Além disso, trouxe algumas inovações, endereçadas sempre à efetividade e à celeridade, como a autorização para o enfrentamento do meritum causae diretamente pelo tribunal no julgamento dos recursos (art. 515, § 3º) e o dever de observância dos provimentos jurisdicionais, sob pena de multa (art. 14, V e parágrafo único). No ano de 2005, iniciou-se a terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil, mais uma vez com a proposta de intensificar a efetividade e a celeridade do processo. A figura central da mais recente onda reformista é a execução. E não poderia ser diferente, como aponta Humberto Theodoro Júnior: "Nessa óptica de encontrar a efetividade do 2 direito material por meio dos instrumentos processuais, o ponto culminante se localiza, sem dúvida, na execução forçada, visto que é nela que, na maioria dos processos, o litigante concretamente encontrará o remédio capaz de pô-lo de fato no 'exercício eletivo' do direito subjetivo ameaçado ou violado pela conduta ilegítima de outrem 1". Acrescenta o jurista mineiro que, "quanto mais cedo e mais adequadamente o processo chegar à execução forçada, mais efetiva e justa será a prestação jurisdicional 2". A Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, veio para o cenário jurídico com o firme propósito de abreviar a chegada à execução forçada. Isso fica evidente com a transformação dos autônomos processos de liquidação de sentença, execução fundada em título judicial e embargos a essa execução num mero desdobramento da relação jurídica processual já instaurada perante o juízo cível 3. Daqui por diante, uma vez reconhecido judicialmente o dever de pagar quantia, basta simples requerimento do credor para a deflagração de medidas voltadas ao cumprimento da respectiva sentença (art. 475-J, caput). Lembre-se de que para os deveres de fazer, não fazer e entrega de coisa reconhecidos judicialmente já não se dependia da instauração de um novo processo: na mesma relação jurídica processual, o juiz, de ofício ou a requerimento da parte, encarregava-se das medidas necessárias para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente (art. 461, § 5º). É possível ver na Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, uma série de outras medidas voltadas à agilização do caminho da execução forçada. É o caso da concentração das atividades de penhora e avaliação 1 As novas reformas do Código de Processo Civil, n. 4.1.1, p. 93. Op. cit., p. 93. 3 Registre-se que para a liquidação ou para a execução direta de "sentença penal condenatória transitada em julgado" (art. 475-L, II), "sentença arbitral" (art. 475-L, IV) e "sentença estrangeira, homologada pelo Superior Tribunal de Justiça" (art. 475-L, VI) ainda é necessária a instauração de um novo processo, na medida em que inexiste prévio processo civil por desdobrar. Além disso, a execução contra a Fazenda Pública e os respectivos embargos foram mantidos como processos autônomos, ainda quando aquela seja fundada em sentença. Esses embargos são disciplinados pelo Capítulo II do Título III do Livro II do Código de Processo Civil (arts. 741 a 743). 2 3 (art. 475-J, caput e § 1º), da intimação da penhora e da avaliação na pessoa do advogado do executado (art. 475-J, § 1º), da possibilidade de indicação pelo próprio exequente dos bens a serem penhorados (art. 475J, § 3º). Neste trabalho, terá destaque uma das mais importantes medidas nesse sentido implementadas pela Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, qual seja, a cassação do efeito suspensivo da oposição à execução amparada por título judicial (art. 475-M, caput). Com isso, deixa de ser necessária a suspensão das atividades executivas na pendência de tal oposição, fato que traz uma sensível abreviação do tempo necessário à efetiva satisfação dos direitos. Similar diretriz foi fixada para a execução fundada em título extrajudicial (art. 739-A, caput), com o advento da Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, que também se insere no contexto da terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil. O objeto deste estudo não se limita à análise da nova sistemática implementada para a paralisação das atividades executivas por ocasião da oposição do executado. Como já anunciado pelo título, pretende-se fazer uma análise de causas e mecanismos atrelados à suspensão da execução. É certo que o desenvolvimento ininterrupto das atividades executivas casa perfeitamente com as noções de efetividade e celeridade do processo. Todavia, é necessário, também, ter em conta outros valores protegidos pelo ordenamento jurídico, que no caso concreto podem falar até mais alto, inclusive para que o processo não deixe de ser efetivo, agora sob a perspectiva do executado ou de outras pessoas afetadas pelos atos executivos. Assim, nos tópicos subsequentes, serão objeto de considerações situações que desencadeiam a suspensão da execução, tendo como ponto de partida o art. 791. Tratar-se-á, também, de ferramentas atreladas ao fenômeno suspensivo, caso da impugnação (arts. 475-J, § 1º, 475-L e 475M), dos embargos à execução (arts. 736 e s.), abordados à luz da Lei nº 4 11.382, de 6 de dezembro de 2006, de ação autônoma, da ação rescisória (arts. 485 e s.), analisada com ênfase em outra importante inovação trazida pela terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil, mais especificamente pela Lei nº 11.280, de 16 de fevereiro de 2006, qual seja, a possibilidade de concessão de medidas urgentes com aptidão para a suspensão do cumprimento da sentença (art. 489) e dos embargos de terceiro (arts. 1.046 e s.). 2. CAUSAS DE SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior, "consiste a 'suspensão da execução' numa situação jurídica provisória e temporária, durante a qual o processo não deixa de existir e produzir seus efeitos normais, mas sofre uma paralisação em seu curso, não se permitindo que nenhum ato processual novo seja praticado enquanto dure a referida crise 4". O art. 791 arrola três ordens de causas para a suspensão da execução: "no todo ou em parte, quando recebidos com efeito suspensivo os embargos à execução (art. 739-A)" (inc. I); "nas hipóteses previstas no art. 265, I a III" (inc. II) e "quando o devedor não possuir bens penhoráveis" (inc. III). O recebimento dos embargos do devedor, assim como a outorga de efeito suspensivo à impugnação do executado (art. 475-M, caput), será objeto de considerações em tópicos subsequentes (infra, nºs 3, 4 e 5). Por ora, apenas fica o registro de que a Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, trouxe nova redação ao inciso I do art. 791, afinada com o novo critério ope iudicis para a suspensão da execução nessas circunstâncias. As situações descritas nos incisos I a III do art. 265 não são causa de suspensão apenas da execução, mas de todo e qualquer processo. No 4 Curso de direito processual civil, v. II, n. 952, p. 329. 5 inciso I, está prevista a hipótese de "morte ou perda da capacidade processual de qualquer das partes, de seu representante legal ou de seu procurador". Tal morte ou perda desencadeia instantaneamente a suspensão da execução, já a partir do falecimento ou da caracterização da incapacidade. A ulterior decisão que atesta esse estado de coisas tem eficácia meramente declaratória e opera ex tunc 5, sendo ineficazes os atos executivos praticados a partir do evento suspensivo. É natural que o processo cesse imediatamente sua marcha ante a súbita perda da capacidade de ser parte, de estar em juízo ou de postular (arts. 9º e 10 do CC, art. 12 do CPC e art. 1º, I, da Lei nº 8.906/94), em razão da falta de condições para que um dos sujeitos da relação jurídica processual defenda adequadamente seus interesses em juízo. Isso tem ainda mais razão de ser num processo de medidas tão drásticas como o de execução. E os anseios por efetividade e celeridade não podem atropelar essa realidade. No caso de morte de uma das partes, é preciso que se proceda à habilitação dos seus sucessores na execução, nos termos dos arts. 1.055 e seguintes. Ultimadas as medidas necessárias para tanto, a execução retoma sua marcha (art. 1.062). Na hipótese de inatividade dos sucessores do exequente, a execução é extinta por abandono da causa (art. 267, III). Já no caso de inércia dos sucessores do executado após a sua integração à relação jurídica processual, a execução segue à sua revelia, em conformidade com as disposições do art. 322. Nas ocasiões de incapacidade de parte e de morte ou falta de capacidade de seu representante legal, aguarda-se por "prazo razoável" pela chegada de pessoa apta a representar seus interesses em juízo para então a execução voltar a tramitar. Se tal chegada não acontecer, 5 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de direito processual civil, v. I, n. 304, p. 272; DINAMARCO, Instituições de direito processual civil, v. III, n. 855, p. 152. Negrão e Gouvêa anotam que "a suspensão do processo, em razão da morte de uma das partes, é automática e se inicia no momento em que se dá a ocorrência do fato, tendo a decisão que a declara efeito ex tunc (STJ, Corte Especial, ED no REsp 270.191, Rel. Min. Peçanha Martins, j. 04.08.04, rejeitaram os embs., v. u., DJU 20.09.04, p. 175)" (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 17d ao art. 265, p. 362). 6 conforme o caso, a execução será prontamente extinta (caso de omissão do representante do exequente), seguirá à revelia do executado (caso de inércia do seu representante) ou retomará a sua marcha com a nomeação de um curador especial pelo juiz (art. 9º, I) 6. Na situação de morte do patrono de uma das partes, o juiz assinará prazo de 20 dias para a constituição de novo advogado (art. 265, § 2º). A mesma solução deve ser adotada para a hipótese de incapacidade do advogado. A comunicação de tal prazo à parte deve ser feita pessoalmente 7, até porque ela está sem procurador que a represente nos autos. A desobediência desse prazo tem consequências diferentes, conforme se trate de ordem endereçada ao exequente ou ao executado. No caso do exequente, tal desobediência implicará a pronta extinção da execução (art. 265, § 2º). Já no caso do executado, a indiferença para com a determinação de que seja constituído novo patrono implicará a sequência da execução à sua revelia (novamente, art. 265, § 2º), nos termos do art. 322. No inciso II do art. 265 prevê-se a "convenção das partes" como causa de suspensão do processo e, consequentemente, da execução. À primeira vista, isso poderia significar um entrave para a efetividade e celeridade da execução. Porém, sendo o movimento suspensivo uma lícita iniciativa dos maiores interessados no efetivo e célere desfecho do feito, tais ideais acabam não sofrendo arranhões. Até porque a acordada paralisação da execução pode criar o cenário propício para a satisfação da obrigação ou a composição das partes, trazendo-lhes, de forma mais ágil e menos custosa, tudo o que o processo acabaria por lhes oferecer ao final. 6 Cf. DINAMARCO, Instituições de direito processual civil, v. III, n. 863-864, p. 162-165. Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 18a ao art. 265, p. 362. Trata-se do REsp 34.886-2. 7 7 Para que a convenção das partes produza o efeito suspensivo previsto no inciso II do art. 265, é impositivo que ela conte com a participação de todos os sujeitos parciais da relação jurídica processual. Faltando a concordância de uma das partes, a convenção não é apta a suspender o feito. Aqui, mais uma vez, a suspensão do feito se dá tão logo acontecido o evento previsto na lei; no caso, tão logo externada em juízo a manifestação de todas as partes nesse sentido. Novamente, os efeitos da decisão do juiz retroagem até o momento da ocorrência da causa suspensiva 8. Todavia, registre-se que a suspensão do processo por convenção das partes não suspende prazos peremptórios, como é o caso do prazo para embargar a execução 9. Uma vez findo o prazo convencionado pelas partes, no dia seguinte deve o juiz automaticamente determinar a sequência da execução (art. 265, § 3º). Anote-se, ainda, que a suspensão da execução por convenção das partes nunca excederá o prazo de seis meses (art. 265, § 3º). O art. 792 descreve em seu caput especial hipótese de convenção das partes para a suspensão da execução: "convindo as partes, o juiz declarará suspensa a execução durante o prazo concedido pelo credor, para que o devedor cumpra voluntariamente a obrigação". Quando as partes lançarem mão dessa específica forma de convenção, não incide a limitação semestral prevista no § 3º do art. 265, "admitindo-se que a suspensão 'seja prolongada pelo tempo necessário ao cumprimento da obrigação' (RT 714/37, RJTAMG 60/62, maioria, 67/214) 10". Porém, uma vez terminado o prazo concedido, sem que tenha sido cumprida a obrigação, o juiz deve determinar a retomada da execução (art. 792, parágrafo único), a exemplo do que acontece com o término do prazo avençado em qualquer outra convenção (art. 265, § 3º). 8 Cf. DINAMARCO, Instituições de direito processual civil, v. III, n. 855, p. 151-152. Cf. DINAMARCO, Instituições de direito processual civil, v. II, n. 688, p. 658, e v. III, n. 859, p. 157. 10 NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 2a ao art. 792, p. 872. 9 8 A oposição de "exceção de incompetência do juízo, da câmara ou do tribunal, bem como de suspeição ou impedimento do juiz" é a causa suspensiva descrita no inciso III do art. 265, que também conduz, naturalmente, à suspensão da execução. Mais uma vez, existem fatores legítimos a frear a marcha da execução, qual seja, aqui, a necessidade de definição de órgão competente e isento para capitanear as invasivas atividades executivas. Para a determinação do evento que desencadeia a suspensão do feito no caso das exceções rituais é preciso harmonizar as disposições do inciso III do art. 265, que atrela a paralisação do feito à "oposição" da exceção, e do art. 306, no sentido de que, "'recebida' a exceção, o processo ficará suspenso (art. 265, III)". Na medida em que a espera pelo recebimento da exceção pode dar margem a acontecimentos danosos, ainda mais em se tratando de um processo de características invasivas como a execução, a melhor solução parece ser a de atribuir efeito suspensivo à simples apresentação da exceção e atrelar a subsistência desse efeito ao seu recebimento pelo órgão responsável por seu julgamento. Assim, mais uma vez, o pronunciamento judicial acerca do evento suspensivo do processo tem eficácia meramente declaratória, retroagindo até o momento da ocorrência da causa de suspensão. Já, quando a exceção sequer é recebida (p. ex., no caso de ser intempestiva), desaparece do cenário jurídico qualquer efeito suspensivo que ela pudesse vir a ter 11. O art. 306 prevê que o processo fique suspenso até que a exceção "seja definitivamente julgada". Isso não significa, contudo, que a execução 11 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de direito processual civil, v. I, n. 388, p. 350; DINAMARCO, Instituições de direito processual, v. III, n. 855, p. 152. Na jurisprudência: "'A simples oposição de exceção de incompetência, independente de seu recebimento pelo magistrado, é ato processual apto para produzir a suspensão do processo, a não ser que haja indeferimento liminar da exceção de incompetência' (STJ, 3ª Turma, REsp 243.492-MS, Rela. Mina. Nancy Andrighi, j. 13.11.01, deram provimento parcial, v. u., DJU 18.02.02, p. 410)" (NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 6 ao art. 306, p. 425-426). 9 tenha que aguardar o desfecho do último recurso envolvendo a matéria para somente então seguir adiante. Na medida em que não há previsão de recurso com ordinário efeito suspensivo nesses casos, basta o julgamento da exceção pelo órgão dela encarregado e a comunicação da respectiva decisão às partes para que a execução esteja em condições de voltar a se desenvolver 12. Todavia, fica a ressalva da possibilidade de outorga de excepcional eficácia suspensiva a recurso interposto contra o julgamento da exceção (art. 558), fato que pode levar ao prolongamento da paralisação das atividades executivas. A última causa de suspensão da execução descrita no art. 791 diz respeito à falta de bens do executado passíveis de constrição. Trata-se de um obstáculo material à sequência da execução, que simplesmente não tem como seguir adiante para a satisfação do exequente nessas circunstâncias. Resta, então, remeter os autos ao arquivo e aguardar por provocação das partes. A jurisprudência tem afastado, nesses casos, a prescrição intercorrente em execuções reguladas pelo Código de Processo Civil, desde que o exequente tenha adotado no processo comportamento diligente 13. Já, em matéria de execução fiscal, a Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980, fala expressamente em prescrição intercorrente nessas hipóteses, que se materializa com o transcurso do prazo prescricional a partir da remessa dos autos ao arquivo, programada para acontecer depois de um ano sem sucesso nas diligências para a localização do executado ou de bens penhoráveis (LEF, art. 40, §§ 2º e 4º). 12 Cf. DINAMARCO, Instituições de direito processual civil, v. III, n. 867, p. 169-170. Na jurisprudência, Negrão e Gouvêa trazem diferentes posições acerca do tema. No caso de rejeição da exceção de incompetência, há julgados tanto pela pronta eficácia da decisão que a julga (v. RSTJ 180/397, RT 511/190, 522/129, 572/49, 807/310, JTJ 174/184, RF 264/251), quanto pela necessidade do aguardo do desfecho do agravo contra ela interposto (v. REsp 508.068), com predominância da primeira corrente. No caso de acolhimento da exceção, existem acórdãos que dão pela retomada dos prazos suspensos (e conseqüentemente do feito): "'a partir da intimação da respectiva decisão' (RJTJESP 88/294)"; "com a intimação do réu da chegada dos autos ao juízo declarado competente" (v. REsp 513.964, RSTJ 20/388, 46/250, 151/360, STJ-RJTJERGS 156/31, RT 520/199, 591/175, JTJ 162/177); "da intimação do despacho pelo qual o juiz ad quem admitiu formalmente sua competência (RSTJ 50/318; JTA 62/66)"; "da ciência do réu de que o juízo ao qual se encaminharam os autos, explícita ou implicitamente, aceitou a declinação (RSTJ 151/360)" (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 6 ao art. 306, p. 426). 13 Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 6 ao art. 791, p. 872. V. REsp 261.604, REsp 280.873 e REsp 327.329. V. também NERY JR.; NERY, Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante, nota 3 ao art. 791, p. 931. 10 O elenco de causas suspensivas do art. 791 não é exaustivo 14. Ainda no Código de Processo Civil, é possível encontrar outros eventos que ensejam a suspensão dos processos em geral e são de total pertinência para a execução. São exemplos disso "a incapacidade processual ou a irregularidade da representação das partes" (art. 13), "motivo de força maior" (art. 265, V), a suscitação do incidente de falsidade (art. 394) e a oposição dos embargos de terceiro (art. 1.052). Para os dois primeiros, valem as considerações já lançadas quando se discorreu sobre os incisos I a III do art. 265. No tocante ao incidente de falsidade, fica a observação da sua pertinência para as situações em que o executado depare com execução que traga como título um documento falso e o alerta para que ele suscite o incidente no prazo para a oposição à execução, sob pena de preclusão 15. Os embargos de terceiro serão objeto de considerações mais adiante (infra, nº 8). Mais uma causa de suspensão da execução prevista no Código de Processo Civil fora do art. 791 está no art. 489, em que é dito com todas as letras que as medidas de urgência concedidas em sede de ação rescisória podem desencadear a suspensão do cumprimento da decisão rescindenda quando tal medida for "imprescindível", como já anunciado preambularmente. Esse assunto também será tratado de forma mais aprofundada em tópico seguinte (infra, nº 7). Na jurisprudência, a não-localização do executado já foi enquadrada como evento apto a desencadear a suspensão de execução regulada pelo Código de Processo Civil 16. Lembre-se de que em sede de execução fiscal 14 Cf. DINAMARCO, Execução civil, n. 85, p. 144-146. Ainda: "'não é exaustivo o elenco das causas de suspensão constantes do art. 791' (SIMP-concl. LXII, em RT 482/272...)" (NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 1b ao art. 791, p. 870). 15 Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, notas 8a e 9 ao art. 390, p. 471. 16 Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 1b ao art. 791, p. 870. V. REsp 2.329. 11 tal evento é colocado pela lei ao lado da ausência de bens penhoráveis como causa suspensiva do processo (LEF, art. 40, caput). Além disso, a existência de demanda com aptidão para interferir no resultado prático da execução também tem ensejado a suspensão da execução (infra, nº 6). Antes de encerrar este tópico, são pertinentes algumas palavras acerca da exceção de pré-executividade. Esse mecanismo foi criado para viabilizar atividades cognitivas no próprio processo de execução. Sua intenção é a de equilibrar os direitos do exequente e os do executado, ao permitir que este provoque o enfrentamento de determinadas matérias pelo juiz no ambiente da execução, desde que o andamento desta não seja prejudicado. Na sua origem, a exceção de pré-executividade foi concebida para a arguição de matérias cognoscíveis de ofício. Hoje, pode-se dizer que sua admissão é aferida secundum eventus probationis 17: para temas cabalmente documentados, é pertinente a exceção de pré-executividade; para assuntos carentes de atividades instrutórias, fecham-se as portas da execução, ainda que a matéria invocada seja apreciável de ofício 18. A linha de equilíbrio que norteou a concepção da exceção de préexecutividade não permite que ela tenha aptidão para suspender a execução 19. A força do direito inserto no título executivo impõe que assim seja. Abrir brechas, para que cada petição apresentada pelo executado ponha em risco a continuidade da execução, quebraria aquela linha de 17 Cf. ASSIS, Araken de, Execução de pré-executividade, p. 30. "O critério definidor das matérias que podem ser alegadas em objeção de 'pré-executividade' é o fato de ser desnecessária a dilação probatória, afastando-se a distinção fincada, exclusivamente, na possibilidade de conhecimento de ofício pelo Juiz. Passou-se a admitir essa forma excepcional de defesa para acolher 'exceções' materiais, extintivas ou modificativas do direito do exeqüente, desde que comprovadas de plano e desnecessária a produção de outras 'provas' além daquelas constantes dos autos ou trazidas com a própria 'exceção'" (STJ, 2ª Turma, REsp 769.768, Rel. Min. Castro Meira, j. 20.09.05, deram provimento, v. u., DJU 17.10.05). Ainda: "A possibilidade de verificação de plano, sem necessidade de dilação probatória, delimita as matérias passíveis de serem deduzidas na 'exceção de pré-executividade', independentemente da garantia do juízo" (STJ, 1ª Turma, REsp 780.043, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 25.10.05, deram provimento, v. u., DJU 14.11.05). Lê-se se no corpo do v. acórdão: "Tipicamente, a prescrição, o pagamento e a litispendência podem ser conhecidos pela via da exceção, sempre que demonstrados por prova documental pré-constituída" (STJ, 1ª Turma, REsp 780.043, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 25.10.05, deram provimento, v. u., DJU 14.11.05). E para terminar: "Não se admite a argüição de ilegitimidade passiva ad causam por meio de exceção de pré-executividade quando sua verificação demandar extenso revolvimento de provas" (STJ, 1ª Turma, REsp 604.257-AgRg, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 04.05.04, negaram provimento, v. u., DJU 24.05.04). 19 Sobre a inaptidão da exceção de pré-executividade para a suspensão da execução, cf. ASSIS, Araken de, Cumprimento da sentença, n. 107, p. 309-310. 18 12 equilíbrio, a dano da efetividade e da celeridade do processo. Por isso, a lei concentra o poder de suspensão da execução na impugnação (art. 475M, caput) e nos embargos (art. 739-A, § 1º), reservando, para tanto, momento em que esteja seguro o juízo (arts. 475-J, § 1º, e 739-A, § 1º). Ademais, tendo em vista o caráter instantâneo das atividades cognitivas desenvolvidas em sede de exceção de pré-executividade, o tempo de espera por um pronunciamento judicial é pequeno, devendo o executado suportá-lo. Por fim, fica o registro de que, uma vez "suspensa a execução, é defeso praticar quaisquer atos processuais" (art. 793). Fica ressalvada, todavia, a possibilidade de o juiz "ordenar providências cautelares urgentes" (ainda art. 793). Essa fórmula praticamente repete as disposições do art. 266. Assim, tendem à ineficácia os atos executivos praticados na vigência da suspensão da execução e produzem efeitos apenas aqueles realizados com amparo em medida de urgência. Atente-se em que a terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil trouxe inovações nesse cenário, ao permitir que a execução fundada em título judicial avance mesmo no período de suspensão desencadeado pela impugnação, desde que ofertada caução (art. 475-M, § 1º), como se verá adiante (infra, nº 4). Na mesma linha, a Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, autoriza a prática de atos constritivos e avaliadores na vigência do efeito suspensivo dos embargos à execução (art. 739-A, § 6º - infra, nº 5). Além disso, chega a ser até desnecessário lembrar que os atos praticados nos incidentes dirigidos à investigação de incompetência relativa, suspeição ou impedimento do juiz não são afetados pela suspensão provocada pelas respectivas exceções e têm sua eficácia preservada 20. 20 Com apoio nas idéias de Liebman, Dinamarco trata como "imprópria" a suspensão provocada pelas exceções rituais, porque, "nesses casos, o processo como um todo não resta inerte nem golpeados de plena ineficácia todos os atos que nele se realizem. Os incidentes suspensivos fazem parte do processo e os atos que nele se realizam são eficazes; o procedimento principal, ou central, é que se paralisa à espera dos resultados do incidente instaurado" (Instituições de direito processual, v. III, n. 854, p. 150). 13 3. OPOSIÇÃO DO EXECUTADO E SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO: DE REGRA A EXCEÇÃO; DO REGIME OPE LEGIS PARA O OPE IUDICIS Antes de tratar especificamente da impugnação e dos embargos à execução, é interessante fazer um breve retrospecto das últimas mudanças legislativas em torno da matéria. Malgrado os anseios por um processo efetivo e célere, algumas iniciativas pareciam ir em sentido oposto. A inserção do § 1º no art. 739, por ocasião da Reforma do Código de Processo Civil, foi uma delas. Ao dispor que "os embargos serão sempre recebidos com efeito suspensivo", o legislador afirmou uma realidade que desde então já consistia num obstáculo no caminho da execução forçada, deixando o exequente necessariamente, privado do bem da vida ao menos até o desfecho da oposição do executado em 1ª instância e afastando-se das noções de efetividade e celeridade. Nesse cenário, a terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil é uma espécie de mea culpa do legislador. Agora, a suspensão da execução amparada por título judicial por ocasião da oposição do executado deixou de ser "regra" para se tornar "exceção": "a impugnação não terá efeito suspensivo, podendo o juiz atribuir-lhe tal efeito desde que relevantes seus fundamentos e o prosseguimento da execução seja manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação" (art. 475-M, caput). Mesmo quando a exceção tem lugar, o legislador deixa uma porta aberta para a sequência da execução: "ainda que atribuído efeito suspensivo à impugnação, é lícito ao exequente requerer o prosseguimento da execução, oferecendo e prestando caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos" (art. 475-M, § 1º). No âmbito da execução fundada em título extrajudicial, foram estabelecidas regras parecidas com a edição da Lei nº 11.382, de 6 de 14 dezembro de 2006: "os embargos do executado não terão efeito suspensivo" (art. 739-A, caput); "o juiz poderá, a requerimento do embargante, atribuir efeito suspensivo aos embargos quando, sendo relevantes seus fundamentos, o prosseguimento da execução manifestamente possa causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes" (art. 739-A, § 1º). Uma outra perceptível mudança em matéria de oposição do executado e suspensão da execução fundada em título judicial é a substituição do critério ope legis pelo ope iudicis. Agora, cabe ao juiz e não mais à lei determinar os rumos da execução impugnada, o que deve ser feito à luz das circunstâncias do caso concreto, em especial dos fundamentos que dão apoio à impugnação e dos danos a que o executado está exposto (art. 475-M, caput). A colocação da sensibilidade do juiz no lugar da peremptória fórmula legal, impositiva da suspensão da execução, foi a forma encontrada pelo legislador para equilibrar os valores em jogo, quais sejam, de um lado, a efetividade e a celeridade da execução, e do outro, a tutela dos direitos e interesses do executado. Mais uma vez, a Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, trilhou caminho semelhante para a execução amparada por título extrajudicial (cf. art. 739-A, § 1º). Para o bom funcionamento da sistemática implementada pela terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil, o juiz tem um papel fundamental. A opção pelo critério ope iudicis deixa nas mãos do magistrado grande responsabilidade para o sucesso da fórmula pensada pelo legislador para a suspensão da execução. Cabe a ele tornar regra, na prática, a continuidade das execuções na pendência de impugnação, ao mesmo tempo em que deve ter a percepção necessária para filtrar aquelas que devem esperar pelo desfecho destas para, então, seguir adiante. 15 4. IMPUGNAÇÃO À EXECUÇÃO A suspensão da execução em razão da oferta de impugnação está atrelada a requisitos comuns às medidas de urgência, tendo à sua base o clássico binômio fumus boni iuris e periculum in mora 21. Na fórmula utilizada no caput do art. 475-M, a "relevância dos fundamentos" representa o fumus boni iuris. Trata-se de expressão praticamente idêntica à constante do caput do art. 558 ("sendo relevante a fundamentação"). Com isso, exige-se que o impugnante traga argumentos substanciosos para justificar a suspensão da execução; argumentos que demonstrem ser provável seu êxito na impugnação apresentada. Ao lado dos argumentos substanciosos, deve estar presente também o periculum in mora, representado pela "manifesta possibilidade de grave dano de difícil ou incerta reparação". Trata-se de fórmula com conotação semelhante às das conhecidas expressões "lesão grave e de difícil reparação" (arts. 522, 558 e 798) e "dano irreparável ou de difícil reparação" (art. 273, I). A presença do advérbio "manifestamente" é um diferencial, conferindo à iminência do dano para fins de suspensão da execução "caráter evidente, indiscutível, incontestável 22". Apenas a proximidade de danos mais do que prováveis autorizará a suspensão da execução. Se os danos forem de incerta ocorrência, não há suporte para a outorga de efeito suspensivo à impugnação. O estágio em que se encontram as atividades executivas é um fator a ser levado em conta nessas circunstâncias. Além disso, as características dos bens da vida sobre os quais recaem os atos executivos devem ser consideradas para o dimensionamento dos danos que a sequência da execução pode provocar. 21 Sobre os requisitos comuns para a concessão das medidas urgentes, cf. PROTO PISANI, Lezioni di diritto processuale civile, cap. XIII, n. 5.5.1, p. 690; DINAMARCO, O regime jurídico das medidas urgentes, p. 34-35. 22 De acordo com Houaiss e Villar, manifesto é aquilo "que não pode ser contestado em sua natureza, existência; flagrante, indiscutível, inegável; declarado, notório; claro, patente, evidente" (Dicionário Houaiss da língua portuguesa, p. 1.837). 16 Por exemplo, a expropriação de bens infungíveis tende a trazer 23 consequências irreversíveis . A excepcionalidade da medida suspensiva indica que ela fique condicionada a expresso requerimento do executado 24. Se o maior interessado na suspensão da execução nada requerer, não cabe ao juiz de ofício suspendê-la 25. O pedido de suspensão da execução não precisa ser necessariamente formulado por ocasião da apresentação da impugnação. A lei não faz qualquer imposição dessa ordem, de tal sorte que, enquanto pendente a impugnação, pode ser requerida a atribuição de efeito suspensivo. Ou seja, o direito à suspensão da execução em razão da impugnação não fica sujeito à preclusão temporal 26. Parece recomendável que, na medida do possível, o juiz ouça o exequente antes de decidir acerca da suspensão, ou não, da execução 27. Ele somente deve suspender as atividades executivas inaudita altera parte se isso for imprescindível para combater os danos narrados pelo executado. O espaço para a prévia manifestação do exequente pode estar atrelado à resposta à impugnação 28 ou à intimação específica para que o exequente se pronuncie sobre o pedido de efeito suspensivo formulado pelo executado 23 Seguem pertinentes ponderações de Wambier; Wambier e Medina: "A arrematação do bem poderá, conforme o caso, causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação, se se tratar de bem infungível, de difícil recuperação ou reconstituição após a arrematação - p. ex., a arrematação de imóvel comercial no qual o executado exerce sua atividade empresarial, que dificilmente poderá ser exercida em outro local. Não haverá semelhante risco, no entanto, nos casos em que forem penhorados bens fungíveis (p. ex., cabeças de gado, toneladas de soja, etc.). Em tais casos, pensamos que, como regra, se estará diante de risco muito pequeno de dano" (Breves comentários à nova sistemática processual civil, v. 2, p. 162). E concluem: "Pode o juiz, até mesmo, suspender a execução 'após a arrematação', impedindo que o exeqüente levante dinheiro obtido com a alienação do bem. Esta solução - isto é, suspender-se a execução não 'antes', mas 'após' a arrematação -, segundo pensamos, se imporá na maioria dos casos em que tiverem sido penhorados bens fungíveis" (op. cit., p. 162). 24 Cf. RODRIGUES, Marcelo Abelha, A terceira etapa da reforma processual civil, p. 164; BARIONI, Rodrigo, Cumprimento da sentença: primeiras impressões sobre a alteração da execução de títulos judiciais, p. 539; RAMOS, Glauco Gumerato, Reforma do CPC, p. 251-252. Sustentando a possibilidade de suspensão da execução por iniciativa do juiz, independentemente de requerimento do executado: ASSIS, Araken de, Cumprimento da sentença, n. 119.2, p. 348-349. 25 O art. 739-A, § 1º, fala expressamente em "requerimento do embargante" para a concessão de efeito suspensivo aos embargos opostos à execução fundada em título executivo extrajudicial. 26 BUENO, Cassio Scarpinella, A nova etapa da reforma da Código de Processo Civil, v. I, n. 11.1, p. 120. 27 Cf. BUENO, Cassio Scarpinella, A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, v. I, n. 11.1, p. 119-120. 28 A intimação para responder aos termos da impugnação é decorrência de aplicação analógica do caput do art. 740. O suporte para essa e outras analogias está no art. 475-R. 17 Como acontece com toda medida de urgência, a resposta positiva ou negativa do juiz à suspensão da execução pela impugnação não impede ulteriores discussões em torno da matéria, desde que tenham acontecido modificações no cenário fático-jurídico da causa, a mostrar que se fazem presentes os requisitos antes reputados ausentes e vice-versa. Porém, mantido estável esse cenário, não existem muitas brechas para alterações. O modo de ser da impugnação faz com que a segurança do juízo acabe funcionando como um requisito implícito para a suspensão da execução. Tendo em vista que o § 1º do art. 475-J amarra o prazo da impugnação ao aperfeiçoamento da penhora e da avaliação 29, o seu processamento fica condicionado ao término das atividades constritivas e avaliadoras 30. Caso a impugnação seja ofertada antes da segurança do juízo, ela deve ficar retida. Até o aperfeiçoamento da penhora e da avaliação, não há espaço para deliberações em torno do efeito suspensivo da impugnação. A excepcional suspensão da execução impugnada guarda paralelo com o extraordinário efeito suspensivo emprestado à apelação interposta contra a sentença de rejeição dos embargos à execução, para o fim de suspender as atividades executivas. As diretrizes do caput do art. 475-M são bastante parecidas com as do art. 558, caput e parágrafo único. Assim, pode-se dizer que as hipóteses de outorga de efeito suspensivo excepcional ao apelo interposto pelo embargante servem de parâmetro para a atribuição de eficácia suspensiva extraordinária à impugnação 31. 29 "Do auto de penhora e de avaliação será de imediato intimado o executado [...] podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias" (art. 475-J, § 1º). 30 No caso dos embargos à execução fundada em título extrajudicial, sua oposição está descolada da prévia segurança do juízo (art. 736, caput), na suspensão da execução continua vinculada a essa idéia, na medida em que condicionada à garantia por "penhora, depósito ou caução suficientes" (art. 739-A, § 1º). 31 Em parecer, Humberto Theodoro Júnior retrata situação autorizadora da concessão de excepcional efeito suspensivo à apelação interposta contra a sentença de rejeição dos embargos à execução, que fornece suporte para a paralisação da execução em razão da impugnação: "Sem o efeito suspensivo, a execução fiscal prossegue em caráter definitivo, propiciando ao Fisco recolher como receita volumosos tributos garantidos por depósito judicial ou fiança bancária. Uma vez recolhido o tributo indevido, somente a longo prazo e sob complexos e problemáticos procedimentos poderá ser recuperado o pagamento forçado e não devido. Tudo isto em face de uma situação de evidente ilegalidade da exigência fiscal, pois as mais altas Cortes 18 Para a pertinência da analogia, é preciso apenas certificar o caráter manifesto do dano iminente ventilado na impugnação, que não é exigido pelo caput do art. 558. E ter em conta que a oposição do executado ainda não sofreu nenhum revés. A suspensão da execução deve ter a precisa medida dos fundamentos relevantes e dos danos iminentes. Se parte da argumentação trazida pelo impugnante não for substanciosa ou se os prejuízos por ocorrer estiverem atrelados a uma parcela da execução, a eficácia suspensiva da impugnação deve ser parcial. A parcela da execução indiferente ao efeito suspensivo segue seu curso normal. Consequência natural dessa realidade é a de que, se a impugnação for parcial, a parcela não impugnada da execução também tem curso normal, não sendo afetada por eventual efeito suspensivo concedido em favor do executado. Tudo isso é confirmado por aplicação analógica do § 3º do art. 739-A (infra, nº 5). A outorga de efeito suspensivo à impugnação não significa necessariamente a paralisação da execução. O § 1º do art. 475-M permite que o exequente requeira a seqüência da execução suspensa, desde que prestada "caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos". Trata-se de medida sintonizada com as ideias de efetividade e celeridade do processo, que agiliza o caminho da execução forçada. Ao mesmo tempo, tal medida cuida de proteger os direitos e os interesses do executado, pela imposição de caução nessas circunstâncias. O direito à sequência da execução não fica sujeito à preclusão temporal, podendo ser exercido enquanto durar a eficácia suspensiva da Judiciárias já se pronunciaram de forma categórica contra a pretensão ostentada pela Fazenda Pública mineira perante as exportações da empresa consulente". ("Execução. Rejeição dos embargos do devedor. Relevância do recurso de apelação. Perigo de dano de difícil reparação. Atribuição de efeito suspensivo ao recurso", p. 141-142). Negrão e Gouvêa trazem acórdãos que outorgaram efeito suspensivo excepcional à apelação tirada contra a sentença de rejeição dos embargos (Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 5 ao art. 558, p. 712). Entre eles está o proferido no julgamento do REsp 652.346, no qual foi consignado que a alienação do bem penhorado seria prejudicial para o desenvolvimento da atividade empresarial pelo executado. No mesmo sentido: STJ, 1ª Turma, REsp 351.772, Rel. Min. Garcia Vieira, j. 05.02.02, negaram provimento, v. u., DJU 18.03.02. 19 impugnação 32. Seu exercício leva a uma inversão de perspectiva: em vez de simplesmente se preparar o terreno para a satisfação do direito do exequente, com a garantia do juízo, a execução segue desde logo adiante e o que é arrumado é o cenário para a eventual neutralização das atividades executivas. Isso se afina com a força do direito expresso em título executivo judicial. A "caução suficiente e idônea", descrita pelo § 1º do art. 475-M, tem as mesmas características daquela exigida na execução provisória para a efetivação de levantamento de depósito em dinheiro, de alienação de propriedade ou de ato lesivo (art. 475-O, III). Isso permite concluir que a atividade executiva desenvolvida nessas circunstâncias orienta-se, ao menos momentaneamente, pelas mesmas diretrizes postas para a execução provisória, inclusive no que diz respeito à possibilidade de dispensa da caução. Em linhas gerais, a exigência ou a dispensa da caução envolve um jogo de equilíbrio entre valores. Por um lado, a imposição da garantia não pode significar um óbice intransponível para o exercício de um direito, mormente para um direito expresso em título executivo judicial, sob pena de afrontar a garantia constitucional de "acesso à justiça" (CF, art. 5º, XXXV) 33. Por outro lado, sua dispensa não pode deixar o executado desprotegido para a sequência da execução, principalmente quando houver argumentos relevantes para o trancamento ou redução das atividades executivas. Para a tomada de decisão nessas circunstâncias, deve o juiz ponderar qual das partes está exposta ao "mal mais provável", qual delas está sujeita ao "mal maior" e qual delas ostenta "o direito mais 32 Cf. BUENO, Cassio Scarpinella, A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, v. I, n. 11.2, p. 123-124. Cf. LUCON, Paulo Henrique dos Santos, Eficácia das decisões e execução provisória, p. 415; DINAMARCO, Execução provisória de mandado de segurança, p. 470. 33 20 forte 34". Conforme o resultado dessas perquirições, ele exige ou dispensa a caução para a sequência da execução. Não há muitas brechas para a liberação da caução prevista no § 1º do art. 475-M. Afinal, ao determinar a suspensão da execução, o juiz atesta a existência de fundamentos relevantes para o seu trancamento ou redução ("direito forte") e a iminência de dano grave e de certa ocorrência a afetar o executado ("mal provável"). Seria preciso que o exequente demonstrasse, ao menos, sua sujeição a um "mal maior" e "provável" para legitimar a dispensa da garantia. Pensa-se, por exemplo, na hipótese prevista no inciso I do § 2º do art. 475-O, que comporta aplicação analógica às execuções levadas adiante dentro do período de suspensividade excepcional da impugnação. Assim, é possível prescindir da garantia para a continuidade das execuções fundadas em "crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário mínimo", quando "o exequente demonstrar situação de necessidade". Até porque não faria sentido restringir tal dispensa às execuções fundadas em pronunciamento judicial sujeito à revisão, e deixá-la de fora das execuções amparadas por decisão transitada em julgado. Todavia, aqui, o julgador deve sopesar os valores em jogo e decidir o que deve falar mais alto, confrontando os reconhecidos danos a que exposto o executado com a situação de necessidade revelada pelo exequente, à luz do direito ostentado por cada um e das nuanças do caso concreto. A exigência da caução para a sequência da execução não significa que ela deva ser prestada já para a retomada da execução suspensa pela impugnação. Conforme consolidado pela jurisprudência, a prestação da caução para fins de execução provisória se faz necessária apenas no momento imediatamente anterior à efetiva modificação na situação jurídica 34 Sobre esses juízos, cf. DINAMARCO, O regime jurídico das medidas ingentes, p. 35. 21 do executado (p. ex., no momento do leilão do bem penhorado) 35. Assim, a execução, até então paralisada pela impugnação, pode seguir sem garantia até a iminência daquela modificação. Por ocasião da retomada da execução, devem ser definidas apenas as dimensões da caução, à luz do princípio do contraditório (CF, art. 5º, LV). Na hipótese de efeito suspensivo integral, a caução deve ter por base o valor da execução. Já, quando o efeito suspensivo for parcial, a garantia deve pautar-se exclusivamente pelos valores atrelados à parcela suspensa da execução. A afinidade entre a execução desenvolvida na vigência da eficácia suspensiva da impugnação e a execução provisória não se limita à questão da caução. Chama-se atenção, agora, para o papel do exequente na deflagração ou continuidade da execução nessas situações. Sua opção por levar adiante a execução suspensa envolve tanto ou mais "iniciativa, conta e responsabilidade" do que a instauração da execução provisória (art. 475O, I). Para iniciar execução provisória, o exequente deve ponderar em abstrato as chances de provimento do recurso de seu adversário e avaliar os riscos e as dimensões de eventuais prejuízos atrelados ao desenvolvimento de atividades executivas. Em se tratando de recurso pendente de julgamento perante os tribunais de superposição, tais chances de provimento tendem a ser bastante pequenas, em razão dos inúmeros óbices legais, sumulares e práticos, o que não deixa de ser um incentivo para a pronta execução do julgado. Já no caso da sequência da execução impugnada com efeito suspensivo, o exequente vê-se diante de pronunciamento judicial que desaconselha a sequência das atividades executivas, tanto por atestar a probabilidade de seu fracasso como por constatar a iminência de danos de certa ocorrência para a outra parte. Se 35 Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código do Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 3 ao art. 475-O, p. 550, em especial REsps 653.879 e 67.697. Em igual sentido, na doutrina: DINAMARCO, A reforma da reforma, n. 183, p. 256; BUENO, Cássio Scarpinella, Execução provisória e antecipação de tutela: dinâmica do efeito suspensivo da apelação e da execução provisória, conserto para a efetividade do processo, n. 2.3, p. 172 e s. 22 mesmo assim, ele opta por levar a execução adiante, deve assumir as responsabilidades por sua escolha. Nesse contexto, reafirma-se que a opção de dar seguimento à execução na pendência de impugnação dotada de eficácia suspensiva envolve tanto ou mais riscos do que o requerimento para execução provisória. E se, na execução provisória, o exequente é obrigado nos próprios autos a reparar os danos causados ao executado e a restituir as partes ao estado anterior (artigo 475-O, I e II), com muito mais razão ele deve sê-lo na execução desenvolvida no período de suspensão provocado pela impugnação. Consigne-se que essa analogia somente tem pertinência para as execuções levadas adiante durante a vigência do efeito suspensivo da impugnação e vale apenas para os atos praticados nesse ínterim. Nas execuções não suspensas ou desenvolvidas após a cassação da eficácia suspensiva, não se cogita de aplicação analógica dos incisos I e II do art. 475-O. A essa altura, parece pertinente o registro de que os riscos atrelados à sequência da execução na pendência do efeito suspensivo da impugnação fazem do § 1º do art. 475-M uma regra que não pode ser absolutizada. Aliás, nenhuma disposição do ordenamento jurídico é absolutizável. Assim, em situações excepcionais, quando os juízos do "direito mais forte", do "mal maior" e do "mal mais provável" e, de modo geral, as nuanças do caso concreto revelarem que a sequência da execução trará danos gravíssimos, de certa ocorrência e irreversíveis ao executado, que o êxito da impugnação é praticamente certo, e que o exequente tem condições de suportar o tempo necessário para o julgamento da impugnação, é possível que o juiz coloque de lado a regra do § 1º do art. 475-M, brecando a execução mesmo ante a oferta de caução para sua sequência, em nome de valores circunstancialmente mais importantes. Afinal, a execução não pode ser transformada em um 23 descontrolado rolo compressor, por mais que se anseie pela efetividade e celeridade do processo. Isso reforça a responsabilidade do juiz na condução do processo daqui por diante. Como já alertado, medidas de urgência, tal qual a outorga de efeito suspensivo à impugnação, são permeáveis a alterações no cenário fáticojurídico da causa. Por exemplo, desaparecido o fumus boni juris ou o periculum in mora, sua cassação é impositiva 36. Nessa linha, a cessação da suspensão da execução é um efeito automático da rejeição da impugnação em 1ª instância, em razão da dissipação do fumus boni juris. Mesmo que o executado interponha agravo contra a decisão de rejeição, isso não paralisa a execução nem impõe exigência de caução para o seu desenvolvimento, a não ser que ao seu agravo de instrumento seja outorgado um ainda mais excepcional efeito suspensivo (art. 558, caput). A maior excepcionalidade desse efeito suspensivo não está ligada aos requisitos abstratamente exigidos pela lei, que permanecem os mesmos, mas pelo grau de dificuldade da sua demonstração. Afinal, é preciso trazer argumentos mais do que substanciosos para barrar uma execução fundada em título judicial que já teve seus contornos definidos por meio de cognição exauriente em 1ª instância. Ou seja, é preciso muito esforço do executado para abalar a convicção formada em torno do direito do exequente. 5. EMBARGOS À EXECUÇÃO Com a edição da Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, a suspensão da execução fundada em título executivo extrajudicial fica na dependência de "requerimento do embargante", da existência de 36 O art. 739-A, § 2º, prevê expressamente a modificação ou revogação da decisão que disciplina os efeitos dos embargos à execução, uma vez desaparecidas as circunstâncias que a motivaram. 24 "fundamentos relevantes", da "possibilidade manifesta de graves danos de difícil ou incerta reparação em razão do prosseguimento da execução" e da "prévia garantia da execução por penhora, depósito ou caução suficientes" (art. 739-A, § 1º). Tem-se, aqui, uma repetição da fórmula implantada para a outorga de efeito suspensivo à impugnação do executado. No tocante aos elementos centrais, até as palavras utilizadas pelo legislador são as mesmas: "relevantes seus fundamentos" (arts. 475-M, caput, e 739-A, § 1º) e "prosseguimento da execução manifestamente 'possa' causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação" (art. 739-A, § 1º - no caput do art. 475-M, em vez da palavra "possa", constam as palavras "seja suscetível", que têm a mesma conotação daquela). Ou seja, mais uma vez é preciso demonstrar fumus boni juris e periculum in mora para a suspensão da execução. No tocante ao fumus boni juris, lembre-se de que os embargos à execução são de fundamentação livre, sendo permitida a veiculação de qualquer matéria que o executado poderia apresentar como defesa no processo de conhecimento (art. 745, V), o que ajuda na caça de argumentos importantes para a demonstração da probabilidade de êxito dos embargos. No que diz respeito aos outros dois elementos constantes do caput do art. 739-A ("requerimento do executado e garantia da execução"), a coincidência entre embargos e impugnação também é evidente. Malgrado não haja no caput do art. 475-M menção expressa às palavras "requerimento do executado", a exigência desse requerimento em sede de impugnação é uma decorrência da própria excepcionalidade da medida suspensiva. E a necessidade de prévia segurança do juízo para a outorga de efeito suspensivo à impugnação é inferida da expressa vinculação entre o prazo para a sua apresentação e o fim das atividades constritivas e avaliadoras (art. 475-J, § 1º). 25 Num primeiro momento, não é possível fazer incidir por analogia, nas execuções fundadas em título extrajudicial, a disposição do § 1º do art. 475-M, permissiva da sequência da execução suspensa mediante a oferta de caução. É que o título executivo judicial traz um grau de probabilidade maior do direito nele expresso do que o título executivo extrajudicial. Ele é forjado em juízo, mediante atividade cognitiva exauriente, com observância das garantias constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (CF, art. 5º, LIV e LV). Essas condições se refletem no restrito rol de matérias passíveis de arguição na impugnação à execução nele fundada e autorizam a inversão de perspectiva já anunciada (supra, nº 4), a fim de que se arrume o cenário para eventual neutralização das atividades executivas, em vez de simplesmente preparar o terreno para a satisfação do direito. Já o título executivo extrajudicial, malgrado expresse dose de probabilidade suficiente para dispensar uma fase processual prévia para fins de cognição, não é criado em ambiente e condições tão seguras. Basta lembrar que no Brasil qualquer "documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas" (art. 585, II) carrega o rótulo de título executivo extrajudicial. Por isso, vislumbrando o juiz argumentos e danos relevantes para o executado, a execução fundada em título extrajudicial fica paralisada ao menos até o julgamento dos embargos ou até uma mudança nas circunstâncias que ensejaram a suspensão, como se verá logo a seguir. A supressão do automático efeito suspensivo dos embargos do executado traz um novo panorama para a execução contra a Fazenda Pública. Na medida em que não mais há no ordenamento jurídico dispositivo que atribua à oposição do executado inerente eficácia suspensiva, a aptidão dos embargos opostos pela Fazenda Pública para a suspensão da execução também é regulada pelo critério ope iudicis. Isso significa que, tanto nas execuções fundadas em título judicial quanto 26 naquelas amparadas por título extrajudicial, as atividades executivas somente serão paralisadas na medida em que a Fazenda Pública trouxer "fundamentos relevantes" e demonstrar a iminência de "danos" qualificados. As disposições insertas pela Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, nos §§ 2º e 3º do art. 739-A trazem ideias já apresentadas neste escrito, no tópico destinado à impugnação à execução (supra, nº 4). No § 2º, é previsto que "a decisão relativa aos efeitos dos embargos poderá, a requerimento da parte, ser modificada ou revogada a qualquer tempo, em decisão fundamentada, cessando as circunstâncias que a motivaram". Com essa fórmula, que lembra a do § 4º do art. 273, mas vai além, por enfatizar a necessidade de requerimento e de alteração no cenário fático-jurídico para novas deliberações em torno da suspensão da execução, procura-se conferir estabilidade à medida urgente, ao mesmo tempo em que se cuida de mantê-la aderente a modificações no plano dos fatos ou do direito. Já, no § 3º do art. 739-A, tem-se diretriz constante do revogado § 2º do art. 739, com adaptação para a nova realidade: "quando o efeito suspensivo atribuído aos embargos disser respeito apenas à parte do objeto da execução, essa prosseguirá quanto à parte restante". Nada mais natural: a suspensão da execução deve ocorrer na precisa medida dos fundamentos relevantes e dos danos a que está sujeito o executado. Existindo parcela da execução descolada desses fatores, ela deve seguir adiante. No caso de embargos parciais, o silêncio do executado é o mais eloquente sinal de que não existem elementos para a paralisação de parte da execução. A Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, traz, ainda, um § 4º para o art. 739-A: "a concessão de efeito suspensivo aos embargos oferecidos por um dos executados não suspenderá a execução contra os que não embargaram, quando o respectivo fundamento disser respeito exclusivamente ao embargante". Essas disposições praticamente repetem 27 os dizeres do revogado § 3º do art. 739 e podem ser tratadas como um desdobramento da ideia inserta no § 1º do art. 739-A: a inércia de um dos executados e a incomunicabilidade dos argumentos deduzidos pelo executado que se opôs à execução configuram "falta de fundamentos relevantes" para a suspensão da execução em face do inerte. Ainda, é possível ver no § 4º do art. 739-A o mesmo espírito que norteia a extensão dos efeitos do recurso interposto por um dos litisconsortes aos demais (art. 509, caput e parágrafo único). Assim, não há dúvidas de que embargos apoiados em defesas comuns aproveitam os demais devedores solidários colocados no polo passivo da execução, inclusive no que diz respeito à suspensão das atividades executivas. Outra alteração trazida pela Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006, está no § 6º do art. 739-A: "a concessão de efeito suspensivo não impedirá a efetivação dos atos de penhora e avaliação". A efetivação da penhora sequer precisaria ser ressalvada pelo § 6º, tendo em vista que a garantia do juízo é pressuposto para a suspensão da execução. Logo, sem penhora efetivada sequer se delibera sobre a paralisação das atividades executivas. A liberação das atividades avaliadoras na pendência do efeito suspensivo é uma medida salutar e afinada com a efetividade e a celeridade do processo. Tais atividades não expõem o executado a dano e agilizam o caminho da execução forçada, na medida em que proporcionam sua retomada já para a expropriação dos bens do executado. Com isso, aproveita-se melhor o tempo em que a execução fica parada à espera da solução dos embargos, que consiste numa das etapas mortas do processo. A antecipação do momento da avaliação é mais um ponto de contato entre a execução fundada em título extrajudicial e a execução amparada por título judicial (art. 475-J, caput, § 1º). O julgamento dos embargos à execução é um importante marco para a definição dos rumos das atividades executivas. Seu acolhimento impede 28 o seguimento da execução, prolongando a suspensão das atividades executivas, na hipótese de já se ter conferido eficácia suspensiva aos embargos, ou impondo sua imediata paralisação, caso isso ainda não tenha sido determinado. Já a rejeição dos embargos deixa o caminho aberto para a sequência da execução, que continua a se desenvolver, caso não tenha sido anteriormente paralisada, ou retoma sua marcha, na hipótese de os embargos terem desencadeado a suspensão das atividades executivas. Cabe lembrar que a apelação dirigida contra a sentença de rejeição dos embargos à execução permanece com efeito meramente devolutivo (art. 520, V). Faz-se pertinente menção ao novo texto do art. 587, de acordo com a Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006: "é definitiva a execução fundada em título extrajudicial; é provisória enquanto pendente apelação da sentença de improcedência dos embargos do executado, quando recebidos com efeito suspensivo (art. 739)". A redação do dispositivo é extremamente falha. Suas palavras indicam que um juízo provisório, qual seja, o da suspensão da execução pelos embargos, determina as características daquela após a rejeição destes, quando o que interessa para a sorte da execução, após a rejeição da oposição, são as chances de provimento da apelação que houver sido interposta contra a sentença, que é fundada em cognição exauriente. Além disso, para espanto geral, a transformação da execução em provisória vem para o exequente como um "prêmio", após seu sucesso no julgamento dos embargos. Como se isso não bastasse, o novo art. 587 atrita com a Súmula nº 317 do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que "é definitiva a execução de título extrajudicial, ainda que pendente apelação contra sentença que julgue improcedentes os embargos". E uma reforma legislativa que se propõe a agilizar e a fortalecer a execução não pode vir ao mundo para enfraquecêla. 29 Nesse cenário, é preciso fazer uma leitura inteligente do novo art. 587, afirmada com a Súmula 317 do Superior Tribunal de Justiça. O fato de os embargos terem sido recebidos com efeito suspensivo não deve ter relevância para o destino da execução após a rejeição daqueles em 1ª instância. Basta pensar que o desenrolar dos embargos pode revelar uma situação completamente distinta daquela desenhada pelo embargante num primeiro momento para conseguir brecar a execução, que pode levar até a sua condenação por litigância de má-fé, para perceber que a anterior atribuição de eficácia suspensiva aos embargos não interessa aos novos rumos da execução. Evento que tem relevância para a sequência da execução após a rejeição de embargos recebidos com efeito suspensivo é a concessão de excepcional medida de urgência atrelada à apelação que houver sido interposta pelo embargante (art. 558, caput e parágrafo único). É possível que tal medida prolongue ou implique nova suspensão da execução, uma vez demonstradas as chances de êxito do apelo e a iminência de danos qualificados com a sequência das atividades executivas (ainda, art. 558, caput e parágrafo único). É para esses casos que parece ter algum sentido a segunda parte do art. 587, com a seguinte interpretação: "quando a apelação do executado houver estendido ou desencadeado nova suspensão da execução, é possível requerer sua continuidade, nos moldes do art. 475-M, § 1º, que se orienta pelas diretrizes postas para a execução provisória". A essa altura, já é possível enxergar suporte para aplicação analógica desse dispositivo legal, de modo a liberar a sequência da execução suspensa mediante caução 37. Afinal, o exequente conta com título executivo extrajudicial que já foi analisado de forma exauriente em juízo. Nesses casos, caberá ao tribunal conciliar e equilibrar os valores em jogo, à luz das nuanças do caso concreto. Enfim, em matéria de provisoriedade da execução, a vinculação da ideia de suspensão à apelação e não ao recebimento dos embargos é a 37 Lembre-se, mais uma vez, que a regra do § 1º do art. 475-M não é absolutizável (supra, nº 4). 30 única forma de inserir o art. 587 no contexto da terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil. 6. AÇÃO AUTÔNOMA Toda execução gira em torno de um bem da vida que o exequente pretende ver atribuído para si. Ocorre que podem existir outros processos de alguma forma relacionados com esse mesmo bem, inclusive com aptidão para interferir no resultado prático da execução. É o que ocorre, por exemplo, quando o contrato em que se funda a pretensão executiva também é objeto de outra demanda, voltada à sua completa invalidação. Quando tais processos puderem fazer as vezes de oposição à execução, eles naturalmente terão força para desencadear a suspensão das atividades executivas, uma vez atendidas as condições exigidas para tanto. Assim, as ações autônomas também figuram entre as ferramentas capazes de suspender a execução. A respeito do tema, segue a didática ementa de acórdão da lavra do Ministro Teori Zavascki: "Entre ação de execução e outra ação que se oponha ou possa comprometer os atos executivos, há evidente laço de conexão (CPC, art. 103), a determinar, em nome da segurança jurídica e da economia processual, a reunião dos processos, prorrogando-se a competência do juiz que despachou em primeiro lugar (CPC, art. 106). Cumpre a ele, se for o caso, dar à ação declaratória ou anulatória anterior o tratamento que daria à ação de embargos com idêntica causa de pedir e pedido, inclusive, se garantido o juízo, com a suspensão da execução 38". 38 NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 4 ao art. 103, p. 232. Trata-se do REsp 557.080. 31 Ações autônomas podem ser ajuizadas antes, durante ou depois da pendência da execução. Geralmente, a jurisprudência contempla a eficácia suspensiva das demandas já pendentes por ocasião da instauração da execução, tratando-as como se embargos fossem 39. Não há por que negar igual tratamento às demandas ajuizadas após a instauração da execução, mas antes do vencimento do prazo próprio para impugnar ou embargar a execução. Em ambas as situações, basta que o executado requeira, no prazo da impugnação ou dos embargos, o aproveitamento de sua demanda como oposição à execução 40. Para a suspensão da execução nessas circunstâncias, exigem-se, ainda, a prévia segurança do juízo e a demonstração de "fundamentos relevantes", bem como de "danos" atrelados ao seguimento da execução, tal qual acontece por ocasião da apresentação da impugnação ou dos embargos à execução (arts. 475-M, § 1º, e 739-A, § 1º). Ação autônoma apresentada quando já ultrapassado o prazo próprio para a oposição à execução não pode ser recebida como embargos nem como impugnação. Isso faz com que tal ação, nesses casos, não tenha a predisposição à suspensão das atividades executivas vista nesses dois mecanismos, principalmente quando o executado houver quedado inerte na oportunidade própria para se opor à execução, fato que enfraquece futura caracterização de urgência na sua paralisação. Todavia, em situações excepcionais, pode o juiz conceder medidas urgentes em ulterior ação autônoma, com aptidão para a suspensão da correlata execução, uma vez satisfeitos os requisitos para tanto 41. 39 "A regra do art. 791 da Lei Adjetiva Civil comporta maior largueza na sua aplicação, admitindo-se, também, a suspensão do processo de execução, quando haja a anterioridade de ação declaratória em que discute o valor do débito cobrado pelo credor hipotecário de financiamento contratado pelo SFH" (REsp 626.629-AgRg); "Reconhece-se a conexão entre a execução e a ação declaratória de nulidade de cláusulas, por constituir esta resistência antecipada do devedor, em ordem a operar como verdadeiros embargos" (REsp 294.562); "A execução ajuizada após a propositura de ação que tem por objeto a desconstituição do título extrajudicial dispensa a oposição de embargos do devedor e, ultimada a penhora, fica suspensa até a sentença proferida na ação de conhecimento" (REsp 437.167). Para esses julgados, cf. NEGRÃO, GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 2a ao art. 791, p. 871. 40 Cf. ASSIS, Araken de, Cumprimento da sentença, n. 105, p. 302. 41 "Por esse motivo, se não for oferecida impugnação, o executado poderá promover ação cognitiva autônoma, nela apresentando razões que venham a inquinar o crédito exeqüendo. É evidente que essa ação não tem o efeito de suspender a 32 Ação autônoma ajuizada após o encerramento da execução não tem aptidão para a suspensão das atividades executivas. Acaciana revelação... Todavia, isso não retira sua aptidão para interferir no resultado prático da execução, na medida em que a falta de oposição às atividades executivas produz apenas efeitos endoprocessuais 42. 7. AÇÃO RESCISÓRIA Como já anunciado no tópico preambular, a possibilidade de concessão de medidas de urgência em sede de ação rescisória, com aptidão para a suspensão do cumprimento da sentença, foi expressamente incorporada ao Código de Processo Civil pela terceira etapa da Reforma: "o ajuizamento da ação rescisória não impede o cumprimento da sentença ou acórdão rescindendo, ressalvada a concessão, caso imprescindíveis e sob os pressupostos previstos em lei, de medidas de natureza cautelar ou antecipatória de tutela" (art. 489). A nova fórmula traz o critério ope iudicis de suspensão da execução também para o plano da ação rescisória e torna superada a ideia de que "a ação rescisória não suspende a execução da sentença rescindenda" (antiga redação do art. 489), que, aliás, já era objeto de mitigações por parte da jurisprudência 43. execução (efeito ope legis dos embargos e ope iudicis da impugnação), a não ser que o demandante que lá figura como executado requeira antecipação de tutela para suspender a execução" (LUCON, Paulo Henrique dos Santos, Nova execução de títulos judiciais e sua impugnação, p. 450). Na jurisprudência: "'Em curso processo de execução, não há impedimento a que seja ajuizada ação tendente a desconstituir o título em que aquela se fundamenta. Inexistência de preclusão, que se opera dentro do processo, não atingindo outros que possam ser instaurados, o que é próprio da coisa julgada material. Carecendo a ação da eficácia própria dos embargos, a execução prosseguirá, salvo se, em cautelar, for outorgado efeito suspensivo. Julgada procedente a ação, extingue-se a execução. Se a sentença sobrevier ao exaurimento da execução, abrir-se-á ao executado a possibilidade de, mediante ação condenatória, reaver o que houver pago indevidamente' (RSTJ 134/269, um voto vencido)" (NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 1a ao art. 736, p. 837-838). 42 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto, Processo de execução, cap. XXVIII, p. 445 e s.; LUCON, Paulo Henrique dos Santos, Embargos à execução, n. 107, p. 255-260. 43 Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 4 ao art. 489, p. 581. 33 O novo art. 489 não pode ser visto como um retrocesso na marcha rumo à efetividade e à celeridade do processo nem como uma ameaça a mens legis de transformar a suspensão da execução em exceção. Assim como era inoportuna a previsão de automático efeito suspensivo a todos e quaisquer embargos à execução, também era criticável a disposição de que nenhuma ação rescisória tinha aptidão a suspender a execução da sentença rescindenda. A busca por um processo efetivo e célere também deve cuidar de fazer da ação rescisória um mecanismo apto à tempestiva e real tutela de direitos. Além disso, são óbvios os danos que podem advir de execução fundada em sentença que tem tudo para ser rescindida. Nesse ponto, a terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil foi bem equilibrada. Com acerto, ela escolheu como regra geral a sequência da execução na pendência de ação rescisória e deixou como exceção a suspensão da atividade executiva nessas circunstâncias. Para enfatizar o caráter de exceção, lançou mão da expressão "imprescindíveis" (art. 489). O novo art. 489 prevê tanto "medidas de natureza cautelar" como "antecipatória" para preservar os direitos envolvidos no pedido de rescisão do julgado. Aqui se aplica com toda força a ideia de "fungibilidade" entre as medidas urgentes (art. 273, § 7º), de modo que a postulação de qualquer das providências previstas no art. 489 é apta a proteger os interesses do demandante, desde que estejam presentes os requisitos para a tutela de urgência. Nesse contexto, a fungibilidade se opera tanto nas situações em que se pede antecipação de tutela e o julgador entende ser mais adequada a concessão de medida cautelar como nos casos de formulação de pedido cautelar e entendimento pela adequação de pleito antecipatório 44. Nestes, a adequação vislumbrada resolve-se com simples determinação para a emenda da petição inicial 45. 44 45 Cf. YARSHELL, Ação rescisória: juízos rescindente e rescisório, n. 91, p. 288-289. Cf. YARSHELL, Ação rescisória: juízos rescindente e rescisório, n. 91, p. 289. 34 As medidas de urgência no âmbito da ação rescisória também se apoiam no clássico binômio fumus boni iuris e periculum in mora. No que diz respeito ao primeiro componente do binômio, as ideias de "verossimilhança" e "prova inequívoca" (art. 273, caput) e de "fundado receio" (art. 798) no ambiente rescisório podem ser condensadas na existência de substanciosos argumentos a embasar o pedido de rescisão do julgado; na existência de elementos a indicar que a desconstituição da decisão rescindenda é o resultado mais provável no caso concreto. No tocante ao outro componente do binômio, as noções de "lesão grave e de difícil reparação" (art. 798) e "dano irreparável ou de difícil reparação" (art. 273, inc. I) significam, em sede de ação rescisória, que a subsistência da decisão rescindenda no cenário jurídico expõe o autor a substanciosos danos 46. É preciso cuidado no momento de analisar pedido de tutela de urgência em sede de ação rescisória, pois ela sempre significa em alguma medida uma mitigação do valor "coisa julgada". Está-se, pois, diante de medida excepcional 47, da qual se deve lançar mão com parcimônia. Como já dito, o legislador realça esse estado de coisas, ao falar na "imprescindibilidade" da medida urgente para o resguardo dos valores envolvidos na ação rescisória (art. 489). Ou seja, a suspensão do cumprimento de sentença deve se dar apenas quando for algo indispensável e nos limites dessa indispensabilidade. Isso significa que a sustação da atividade executiva deve ter a precisa dimensão dos argumentos substanciosos para a rescisão e dos danos a que exposto o autor da ação rescisória. Se parte da argumentação trazida na ação rescisória for insubsistente ou se os prejuízos temidos estiverem 46 Segue retrato de situações autorizadoras de medida de urgência em sede de ação rescisória antes mesmo da nova redação dada ao art. 489: ser o acórdão rescindendo contrário à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF, Pleno: RSTJ 183/531, dois votos vencidos); "Em caso de evidente teratologia do acórdão rescindendo e da irreversibilidade de sua execução" (RSTJ 163/37); ter o acórdão rescindendo fixado "o valor de R$ 21.500.000,00, para cobrir indenização referente a um terreno de 150 m de frente por 150 m de fundo, situado ao Município de Belém/PA" (REsp 567.527-AgRg). Para esse retrato, cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 4 ao art. 489, p. 581. 47 Cf. YARSHELL, Ação rescisória: juízos rescindente e rescisório, n. 90, p. 286-287. 35 circunscritos a uma parcela da decisão rescindenda, esta tem apenas parte de sua eficácia afetada. Nessas circunstâncias, a parcela do pronunciamento rescindendo indiferente à medida urgente continua a produzir seus efeitos ordinários. Alterações no cenário fático-jurídico da causa interferem em anterior deliberação sobre a medida de urgência postulada pelo autor da ação rescisória. Assim, desaparecido o fumus boni iuris ou o periculum in mora anteriormente vislumbrado para sua concessão, a cassação da decisão provisória é impositiva. Doutra parte, preenchidos os requisitos outrora reputados ausentes, a outorga da tutela de urgência é de rigor. A concessão de medidas urgentes em sede de ação rescisória não impede que se dê início ao cumprimento da sentença, fato que significaria violação da garantia constitucional de acesso à justiça (CF, art. 5º, inc. XXXV). Fala-se de medidas limitadas à sustação da prática de determinados atos ou à exigência de garantia para liberar a sua realização. Trata-se de mais uma questão marcada pelo equilíbrio entre valores e pelos juízos do "mal mais provável", do "mal maior" e do "direito mais forte", sendo enorme sua semelhança com os casos de execução levada adiante na vigência de efeito suspensivo outorgado à impugnação do executado (art. 475-M, § 1º - supra, nº 4) e de execução provisória (art. 475-O). Afinal, está-se diante novamente de cenário marcado pela perspectiva de trancamento ou redução da execução. Nesse contexto, muito do que se disse para a impugnação aplica-se à concessão de medida urgente em sede de ação rescisória (ainda supra, nº 4). Assim, a tutela de urgência na ação rescisória não impede o desenrolar do cumprimento da sentença quando houver caução suficiente e idônea para a neutralização dos danos a que exposto o executado (arts. 36 475-M, § 1º, e 475-O, III) 48; não há muitas brechas para a dispensa dessa caução, tendo em vista a existência de decisão na ação rescisória, tomada à luz do caso concreto, desaconselhando a sequência dos atos satisfativos; aplica-se, excepcionalmente, a hipótese de dispensa de caução prevista no art. 475-O, § 2º, I; a caução somente é exigível no momento imediatamente anterior à efetiva modificação na situação jurídica do executado; a opção pela continuidade da execução na vigência da medida urgente concedida na ação rescisória confere suporte material para a incidência dos incisos I e II do art. 475-O, por envolver tanto ou mais "iniciativa, conta e responsabilidade" do que a instauração de uma execução provisória. A ação rescisória não parece ser campo propício para as modalidades de antecipação de tutela previstas no inciso II e no § 6º do art. 273, em razão da prevalência do valor "coisa julgada" sobre a simples e natural demora do julgamento combatida por esses dispositivos legais ("dano marginal do processo"). Ademais, a defesa da coisa julgada pelo réu dificilmente será rotulável como abusiva ou protelatória (inc. II) e a falta de controvérsia em torno do pedido rescisório é insuficiente para autorizar a rescisão e, consequentemente, a antecipação de seus efeitos (§ 6º). A competência para a apreciação de pedido de tutela de urgência atrelado à ação rescisória, inclusive no que diz respeito à suspensão do cumprimento da sentença rescindenda, é do tribunal encarregado do julgamento do pleito rescisório 49. Assim, fica a seu cargo decidir sobre todas as questões atreladas a essa suspensão (extensão, continuidade da 48 Aqui exime suporte para a aplicação analógica do § 1º do art. 475-M, por se tratar de execução fundada em título judicial, forjado em ambiente seguro e em condições que contribuem para a probabilidade do direito do exeqüente. Todavia, é pertinente novamente a lembrança de que a regra do § 1º do art. 475-M não é absolutizável. 49 Cf. YARSHELL, Ação rescisória: juízos rescindente e rescisório, n. 93, p. 291. Na jurisprudência: "A competência para determinar a suspensão da execução do julgado, com fundamento no ajuizamento de ação rescisória, é exclusiva do Tribunal competente para apreciar a referida ação" (STJ, 2ª Turma, REsp 742.644, Rel. Min. Franciulli Netto, j. 01.09.05, deram provimento, v. u., DJU 06.03.06). 37 execução, atos por suspender, exigência de caução, etc.). Ao relator designado para a ação rescisória cabe analisar, de plano, a medida de urgência postulada, sendo recomendável a sujeição de sua decisão unipessoal a referendo dos demais integrantes da turma julgadora, independentemente de pedido do autor ou do réu nesse sentido 50. Para a suspensão do cumprimento da sentença rescindenda, não é necessário que a execução tenha sido impugnada nem que seu juízo esteja seguro. A ação rescisória está num plano distinto da execução e da impugnação e tem objeto diferenciado. Ela se presta a debates em torno de eventos antecedentes à formação do título executivo judicial. Já na execução e na impugnação, exceção feita à falta de citação, as atenções estão voltadas a acontecimentos ulteriores à consolidação do título. A ação rescisória é regida por disposições próprias e nenhuma delas traz exigências daquela ordem. O mesmo acontece com as medidas urgentes. Todavia, registre-se que a concessão de tutela de urgência em sede de ação rescisória pode vir acompanhada de exigência para a prestação de caução (art. 273, § 3º, c/c art. 475-O, III, e arts. 804 e 805), o que tende a produzir efeito semelhante ao da segurança do juízo. 8. EMBARGOS DE TERCEIRO As atividades constritivas e expropriatórias que caracterizam a execução são predispostas a interferir na posse e na propriedade dos bens sobre os quais elas recaem. Toda vez que tais atividades provocarem turbação ou esbulho em posse, ou ameaçarem a propriedade de quem não é parte na relação jurídica processual nem é responsável pela satisfação do direito objeto da execução, fica o lesado autorizado a lançar mão dos embargos de terceiro (art. 1.046). Quando opostos a ato praticado em sede 50 Cf. YARSHELL, Op. cit, n. 93, p. 291. 38 de execução, esses embargos podem ser apresentados "até cinco dias depois da arrematação, adjudicação ou remição, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta" (art. 1.048). Trata-se de marco temporal objetivo, desvinculado de qualquer comunicação formal do terceiro 51. Os embargos de terceiro consistem em mais um mecanismo apto à suspensão da execução, nos termos do art. 1.052: "quando os embargos versarem sobre todos os bens, determinará o juiz a suspensão do curso do processo principal; versando sobre alguns deles, prosseguirá o processo principal somente quanto aos bens não embargados". A particularidade dos embargos de terceiro em comparação com os outros mecanismos de suspensão da execução analisados neste trabalho está no fato de a paralisação das atividades executivas não ser provocada pelo executado. É alguém que não participa do processo que provoca a medida suspensiva da execução. Tal suspensão é um fenômeno distinto do deferimento liminar dos embargos, previsto no art. 1.051. Aquela consiste na paralisação do feito no qual foi proferido o ato lesivo ao terceiro; este se consubstancia na imediata proteção da posse ou propriedade do bem colocada em risco, mais especificamente em ordem para a instantânea manutenção ou restituição do bem em favor do embargante 52. Ambas as medidas visam à proteção do terceiro embargante e devem ser tomadas com essa preocupação e em conformidade com as nuanças do caso concreto. A suspensão do processo de execução pela apresentação de embargos de terceiro é algo que merece algumas reflexões. A primeira delas tem a ver com a própria ideia de suspensão da execução, que não é 51 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de direito processual civil, v. III, n. 1.438, p. 289. De acordo com Humberto Theodoro Júnior, "[...] a medida liminar é uma faculdade e não uma condição de procedibilidade na ação de embargos. O terceiro pode dispensá-la ou pode prosseguir no feito, para tentar melhor prova de sua posse ou direito, mesmo quando improcedente a justificação inicial" (Curso de direito processual civil, v. III, n. 1.440, p. 291). 52 39 bem o que acontece quando o terceiro se opõe à execução. Na verdade, o que se tem é a paralisação das atividades dirigidas à constrição e à expropriação do bem do terceiro, e não a suspensão da execução propriamente dita. Tanto assim é que a execução pode ter sequência para o desenvolvimento de qualquer atividade que seja indiferente àquele bem, tal como a procura de outros bens aptos à satisfação do direito do exequente. Aliás, cabe o registro de que a eficácia suspensiva dos embargos de terceiro não vai além das dimensões destes (art. 1.052). Por isso, para os bens estranhos aos embargos de terceiro, as atividades executivas continuam a se desenvolver normalmente. Uma outra reflexão remete ao tratamento de "preceito cogente" que a jurisprudência dispensa à suspensão do processo correlato aos embargos de terceiro 53, o que tornaria tal suspensão decorrência do simples recebimento dos embargos pelo juiz (art. 1.052) 54. Em um momento em que se preocupa com a efetividade e a celeridade do processo, a automática eficácia suspensiva dos embargos de terceiro recebidos deve ser mais bem pensada. Atualmente, a execução fundada em título judicial somente é paralisada pela impugnação quando esta traz "fundamentos relevantes" e demonstra a iminência de "danos" qualificados (art. 475-M, caput - supra, nºs 3 e 4). A suspensão da execução amparada por título extrajudicial em razão da apresentação de embargos pelo executado segue a mesma trilha (art. 739-A, § 1º - supra, nºs 3 e 5). Nesse cenário, a segunda reflexão que se propõe sugere enfoque do efeito suspensivo dos embargos de terceiro de forma mais permeável a noções que integram a sistemática própria das medidas urgentes ("juízo do direito mais forte, juízo do mal maior, juízo do mal mais provável" - supra, nº 4). É certo que há substanciais diferenças entre a condição do terceiro, que se vê surpreendido por medida 53 Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 2 ao art. 1.052, p. 1.011 (v. em especial RSTJ 59/305, na qual está estampado o REsp 35.299-1). 54 Cf. NERY JR.; NERY, Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante, nota 1 ao art. 1.052, p. 1.037. 40 constritiva ou expropriatória baseada em título que lhe é estranho e tomada em processo do qual ele não é parte, e a condição do executado, que participou da formação do título que lastreia a atividade executiva e integra um dos polos do respectivo processo. E uma das coisas que requerem mais cuidados para a legitimidade da atividade jurisdicional é o respeito aos limites objetivos e subjetivos da execução. Tanto assim é que a tutela liminar do embargante depende apenas de prova suficiente da posse (fumus boni iuris). Ocorre que pode haver situações em que a suspensão da execução implique danos maiores do que o seu desenvolvimento. E o exequente embargado pode ter maiores chances de êxito nos embargos do que o terceiro embargante. É preciso ter em conta, ainda, o estágio em que se encontram as atividades executivas e as características do bem objeto da execução para dimensionar os valores em jogo (supra, nº 4). Por isso, a suspensão de atividades executivas pelo simples recebimento dos embargos de terceiro não pode ser tratada como um valor absoluto 55, ou seja, ela pode ser afastada ou flexibilizada quando for o caso de tutelar um valor circunstancialmente mais importante. De algum modo, é possível ver essa ideia nos pronunciamentos jurisprudenciais que mitigam a regra do art. 1.052 e afastam a suspensão da execução em caso no qual já foi reconhecida judicialmente a existência de "fraude de execução 56". Nesses casos, a perspectiva de insucesso do terceiro em 55 De outra óptica, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro faz considerações nesse sentido: "A regra é de que, promovida a ação de embargos de terceiro, o processo principal será suspenso, salvo se não houver prejuízo para o embargante, ou se a liminar for suficiente para o alcance da finalidade pretendida" (Comentários ao Código de Processo Civil, v. IX, t. II, n. 75, p. 186). E conclui: "Assim, não há como se sustentar a obrigatoriedade irrestrita da suspensão, até porque o artigo em estudo permite a avaliação do juiz no caso concreto, já que exige decisão judicial determinando a suspensão, verbis: 'determinará o juiz a suspensão do processo'. Situação diversa ocorre na ação de embargos de terceiro, hipótese em que o legislador não deu opção ao juiz, determinando que 'os embargos serão sempre recebidos com efeito suspensivo' (art. 739, § 1º, do Código de Processo Civil), isto é, em qualquer hipótese" (op. cit., p. 186). Todavia, ressalva: "É evidente que o juiz somente poderá fugir à regra preconizada pelo legislador em hipóteses excepcionais, desde que o prosseguimento do processo principal não cause prejuízo para o embargante, e, em qualquer hipótese, não poderá haver disposição do direito pleiteado pelo terceiro, enquanto não decidida a ação de embargos de terceiro" (op. cit., p. 187). 56 Cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 2 ao art. 1.052, p. 1.011 (v. em especial REsp 30.663-6, com ponderação do Relator no sentido de que "não se concebe que a lei venha dispor contra seus próprios princípios, pois um dispositivo legal não pode ser interpretado isoladamente e sim no contexto e intercâmbio de normas outras que delimitem o proceder judicial"). Ainda na jurisprudência, no mesmo sentido: STJ, 3ª Turma, REsp 623.407, Rel. Min. Menezes Direito, j. 04.08.05, não conheceram, v. u., DJU 24.10.05. 41 seus embargos possibilita a tutela da efetividade e da celeridade da execução. Além disso, a liberação de atividades executivas que não importem levantamento de dinheiro nem alienação de propriedade é uma forma de tentar conciliar os interesses das partes na pendência dos embargos de terceiro. O julgamento dos embargos de terceiro em 1ª instância define a sorte da suspensão da execução. Sua rejeição, ainda quando não se dê liminarmente, implica o destrancamento da execução, que volta a se desenvolver normalmente. Afinal, a subsequente apelação carece de efeito suspensivo, tal qual acontece em todo caso de insucesso da oposição à execução (embargos do executado e embargos à arrematação - art. 520, V, e Súmula 331 do STJ) 57. Isso, aliás, é um imperativo da efetividade e da celeridade da execução, que não pode ficar parada à espera do reexame de uma decisão favorável ao exequente. No entanto, é possível que o embargante apelante peça ao tribunal medida de urgência endereçada à suspensão da execução (art. 558, caput e parágrafo único). Já o acolhimento dos embargos de terceiro prolonga o estado de suspensividade ou impõe a imediata paralisação da execução, caso tal já não tenha ocorrido. 9. ENCERRAMENTO Neste curto tópico, coloca-se em evidência, mais uma vez, a necessidade de se equilibrarem os valores em jogo no contexto do processo. No âmbito da execução, isso significa garantir acesso rápido e 57 "O recurso cabível é a apelação, que não tem efeito suspensivo quando os embargos opostos pelo terceiro à execução são julgados improcedentes (art. 520, nº V)" (THEODORO JÚNIOR, Humberto, Curso de direito processual civil, v. III, n. 1.441, p. 292). A jurisprudência trilha outro caminho, ao dizer que a apelação interposta contra a decisão que rejeita os embargos de terceiro tem efeito suspensivo, mas chega ao mesmo destino, quando diz que tal efeito suspensivo fica restrito ao processo de embargos de terceiro, não se alastrando para o feito que lhe é correlato, que, assim, torna a se desenvolver (cf. NEGRÃO; GOUVÊA, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, nota 3 ao art. 520, p. 634 - v. em especial no STJ RMS 3.776-2). No mesmo sentido: STJ, 3ª Turma, MC 8.930-EDcl-AgRg, Rel. Min. Menezes Direito, j. 16.11.04, negaram provimento, v. u., DJU 17.12.04. 42 efetivo ao bem da vida que integra seu objeto, sem ultrajar direitos e garantias dos responsáveis pela satisfação do direito do exequente ou de qualquer outra pessoa. Praticamente todas as causas de suspensão da execução são manifestações de equilíbrio, na medida em que procuram brecar ou suavizar sua marcha quando tais direitos e garantias estiverem em risco. A terceira etapa da Reforma do Código de Processo Civil trouxe um componente novo e importante para esse cenário, qual seja, a substituição do critério ope legis pelo ope iudicis em matéria de suspensão da execução pela oposição do executado e pelo ajuizamento de ação rescisória. A sensibilidade do juiz é ferramenta mais eficiente do que fria fórmula legal na busca por equilíbrio entre os valores atrelados à execução. Espera-se que ela seja bem utilizada e contribua para a boa prestação da atividade jurisdicional 43