DÚVIDA LEGAL Reclamação relâmpago Pesquisa do Idec revela que as principais redes de varejo não respeitam o prazo legal para reclamar de produtos com defeito O IDEC Cartaz encontrado nas Casas Bahia do bairro da Liberdade, em São Paulo: o prazo informado contraria o CDC comprovou que as 13 empresas pesquisadas cometiam essa mesma irregularidade. De acordo com dados do Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (Sindec), do Ministério da Justiça, as categorias “telefone”; “microcomputador e produtos de informática”; “televisor, aparelho de DVD, filmadora e videocassete”; e “geladeira e freezer” somaram quase 143 mil queixas em 2009. O principal motivo das reclamações foram problemas com a abrangência da garantia, seguido por produto entregue com danos/defeito. Código de Defesa do Consumidor (CDC) completa 20 anos em 11 de setembro. Para comemorar a data, a seção Dúvida Legal terá, em 2010, uma página a mais para esclarecer as principais dúvidas dos consumidores. Para começar, falaremos do “direito de troca”. Segundo levantamento do Idec, as empresas de varejo costumam impor condições que contrariam a lei. O Instituto analisou 15 delas (veja quais são na página ao lado), por meio do Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) e das notas fiscais fornecidas, e constatou que estas impõem um prazo para reclamação (por produto defeituoso) menor que o previsto pelo CDC. Em outubro de 2008, a REVISTA DO IDEC (edição no 126) publicou uma pesquisa semelhante e 30 Revista do Idec | Março 2010 DIREITOS DO CONSUMIDOR De acordo com o artigo 18 do CDC, os fornecedores de produtos duráveis e não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade. Traduzindo: se o produto tiver defeito, o consumidor pode reclamar ao fabricante ou à loja onde comprou a mercadoria. Antes de falar sobre os prazos para reclamações é preciso saber que existem dois tipos de vício (o aparente e o oculto) e dois tipos de produto (os duráveis e os não duráveis). Vício aparente é o defeito que pode ser constatado facilmente, por exemplo, um risco no freezer. O oculto é o defeito que surge repentinamente, com a utilização do produto, por exemplo, um problema no motor. Quanto aos produtos, os duráveis são aqueles que deveriam ter vida útil razoavelmente longa, como os aparelhos eletrônicos, e os não duráveis, grosso modo, são os consumidos em prazos curtos, como alimentos. Pois bem. De acordo com o artigo 26 do CDC, quando o vício é aparente, o prazo para reclamação é de 30 dias (para produtos não duráveis) e 90 dias (para produtos duráveis), contados a partir da data da compra. Se o vício é oculto, os prazos são os mesmos, mas começam a valer no momento em que o defeito é detectado pelo consumidor. DEVER DO FORNECEDOR Segundo o artigo 18 do CDC, o fornecedor e o fabricante têm 30 dias, a partir da reclamação, para sanar o vício do produto. Extrapolado esse período, o consumidor pode exigir um produto similar, a restituição imediata da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço. Essas exigências podem ser feitas antes dos 30 dias se a substituição das partes com defeito puder comprometer as características do produto, diminuir-lhe o valor, ou quando se tratar de um “produto essencial” (geladeira, por exemplo). RESULTADOS Todas as redes pesquisadas pelo Idec impõem ao consumidor prazos de reclamação que variam de dois a sete dias, contrariando o CDC. Quando esse prazo expira, os fornecedores consultados orientam o consumidor a procurar a assistência técnica do fabricante do produto. O fato de o fornecedor ser solidariamente responsável pode parecer apenas um detalhe. Mas vale lembrar que, enquanto as grandes redes de varejo estão espalhadas pelas principais cidades do país, as assistências técnicas dos fabricantes costumam ser menos numerosas. Por exemplo, em toda a cidade de São Paulo existem apenas duas autorizadas da fabricante de celular Nokia. Outra constatação preocupante: algumas redes, como o Magazine Luiza, não se responsabilizam por vícios aparentes. O Extra e a Fast Shop vão além: suas notas fiscais exibem um carimbo com uma série de perguntas que precisam ser respondidas pelo comprador no ato da compra ou da entrega. Dependendo das respostas do consumidor, que é impelido a validálas com uma assinatura, provavelmente uma eventual reclamação posterior não será atendida. “O consumidor pode se negar a responder a essas perguntas”, orienta Renata Farias, advogada do Idec. De toda forma, em hipótese alguma esse carimbo pode valer mais do que o CDC. Serviço O Idec contatou a assessoria de imprensa das empresas a fim de conhecer o posicionamento oficial acerca das práticas citadas nesta matéria. Oito responderam. As Casas Bahia disseram que “o prazo de 72 horas se dá em benefício do próprio consumidor, uma vez que (...) ele não precisará aguardar 30 dias para obter tal reparação”. De fato, o CDC concede o período de 30 dias para que o caso de um produto com defeito seja solucionado, mas o problema é outro: passadas essas 72 horas, o consumidor é orientado pela empresa a se dirigir à assistência técnica, quando o CDC determina que ele tem de 30 a 90 dias para reclamar ao fabricante ou ao fornecedor. O Magazine Luiza alega que sete dias é o prazo que o consumidor tem para se arrepender de compras realizadas pelo site. Ou seja, seria o prazo de arrependimento ● Lojas físicas 3 dias Americanas1 No caso de alguns produtos, como laptops e impressoras, o consumidor é orientado a procurar diretamente a assistência técnica Não há prazo; o consumidor é orientado a procurar a assistência técnica Carrefour Se a assistência técnica não solucionar o caso em 30 dias, a empresa se compromete a trocar o produto Casas Bahia 3 dias Extra 3 dias Uma série de perguntas é carimbada na nota fiscal. O cliente deve responder e assinar 7 dias Fast Shop Uma série de perguntas é carimbada na nota fiscal. O cliente deve responder e assinar 7 dias Kalunga2 A nota fiscal é carimbada com a frase “Troca: em até 7 dias, somente em caso de defeito” 7 dias Magazine Luiza Se o fornecedor alegar que o prazo para reclamação já expirou, cite o CDC. Se necessário, use um dos modelos de carta disponíveis no final da página <www.idec.org.br/auto_descricao. asp?idbase=418> As empresas respondem Prazos para reclamação* A loja não se responsabiliza por vício aparente Ponto Frio 3 dias Sam’s Club 7 dias Walmart 7 dias Para celulares, o prazo é de 2 dias previsto pelo CDC quando o produto é adquirido fora do estabelecimento comercial. No entanto, o SAC informou que passados sete dias da data da compra, as reclamações devem ser feitas ao fabricante. Extra e Ponto Frio (ambos do Grupo Pão de Açúcar) e Kalunga têm posicionamento semelhante ao das Casas Bahia: comprometem-se a trocar os produtos de três a sete dias a partir da data da compra. Transcorrido esse prazo os consumidores perdem o direito de reclamar junto ao fornecedor, o que contraria o CDC. O Carrefour diz que “o consumidor é orientado a encaminhar [o produto defeituoso] à assistência técnica autorizada”. Mas, de acordo com o CDC, o fornecedor tem responsabilidade solidária. Walmart e Sam’s Club também afirmam cumprir o CDC, mas se esquecem da responsabilidade solidária. ● Lojas virtuais Americanas Extra Magazine Luiza Fast Shop Ponto Frio 7 dias *Informações passadas pelos SACs das empresas 1 Informação passada pela unidade Frei Caneca, em São Paulo (SP) 2 Como o Idec não conseguiu entrar em contato com o SAC, a informação foi retirada da nota fiscal Revista do Idec | Março 2010 31