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Responsabilidade civil por danos morais entre c?ges
1. Introdução
Antes de adentrar-se propriamente no tema da responsabilidade civil por danos morais entre cônjuges, é consentâneo analisar-se a origem da
família. Contudo, como este trabalho não visa aprimorar-se nesse tema, serão necessárias apenas breves alusões sobre o mesmo para que se
compreenda a importância da família e do casamento para a sociedade.
Segundo Engel, instruído pelo pensamento do sociólogo Morgan, a origem da família passa por uma fase inicial denominada promíscua. Nesta fase,
nota-se que entre os homens e as mulheres não havia a exclusividade nas relações sexuais. O que quer dizer que para um único homem havia
várias mulheres e que para uma única mulher havia vários homens.
Continuando o seu estudo, Engel entende que essa fase foi excluída da evolução do instituto família, tendo em vista que, ela mostra-se um tanto
quanto constrangedora para a humanidade.
Entretanto, o professor Caio Pereira entende que essa fase não foi retirada dos manuais de estudo que tratam da origem da família por trazer
desconforto para a humanidade, mas sim pelo fato dela nunca ter existido.
Caio Pereira (2002, p.17) traz precisa lição acerca do assunto:
“A fase denominada de promíscua é incompatível com a idéia de exclusividade inata do ser humano e até mesmo de muitos irracionais, por serem
contraditórios com o próprio desenvolvimento da espécie.”
Apesar da análise da origem da familiar ser divergente, os estudiosos do assunto comungam da ideia de que a família, em qualquer de suas fases
históricas por quais tenha passado, sempre teve um destaque e uma valorização especial, pelo fato de representar a base da sociedade.
Avançando no estágio evolutivo da família, nos importar trazer a discussão o entendimento que Pontes de Miranda nos dá acerca da origem familiar.
Segundo o ilustre autor, a família passou por vários estágios evolutivos e, que dessas fases a monogamia foi uma das características mais atuais e
importantes que ela possui. (MIRANDA, 2001, p.62)
Segundo ensinamento de Pontes de Miranda (2001, p.66):
“A monogamia é o estado mais adequado e, quiçá, o único compatível com o plano jurídico, com a solidariedade social e as demais condições
necessárias do aperfeiçoamento e do progresso humano. Consulta os mais elementares imperativos de fisiologia e de psicologia o princípio de que o
ser humano feliz procura a permanência da felicidade. O homem ou a mulher que se sente bem na convivência sexual, e não só sexual, com sua
companheira ou o seu companheiro, busca conservar as circunstâncias que lhe permitam essa convivência. Só a monogamia atende a esse dado.”
Desta forma, percebe-se o quanto a relação conjugal entre o homem e a mulher é importante tanto para a sociedade como para a própria felicidade
do ser humano. É a partir da união entre o homem e a mulher que a estrutura social passa a se consubstanciar, a se harmonizar. Daí a importância
de se preservar a harmonia e a paz entre os cônjuges.
Por conseguinte, o casamento, também, ganha grande destaque na sociedade. Já que ele, em regra, representa uma fonte primária das relações
familiares. Nesse diapasão Maria Helena Diniz (2009, p.27) preconiza sobre a família:
“[...] se origina do casamento celebrado com observância de certas formalidades e exigências. Portanto, vê-se que família e casamento estão ligados.
Mas deve-se anotar que, com a Constituição da República de 1988, e com as Leis n.° 897/94 (Lei do Concubinato) e Lei n.° 9278/96 (União Estável),
a família não se resume mais ao casamento entre homem e mulher e seus filhos. [...]”
Em breves palavras se pode conceituar o casamento como o vínculo jurídico do qual surge uma família. Silvio Rodrigues (2002, p.152) conceitua o
casamento, vejamos:
“[...] trata-se de uma instituição em que os cônjuges ingressam pela manifestação de sua vontade, feita de acordo com a lei. Daí a razão pela qual,
usando de uma expressão já difundida, chamei ao casamento contrato de direito de família, almejando, com esta expressão, diferençar o contrato de
casamento dos outros contratos de direito privado.”
Devido à importância do casamento para a sociedade, desde os tempos remotos, passa a existe punição para aqueles que provocaram a dissolução
culposa do matrimônio. Segundo Regina da Silva (1999 p.11-12):
“[...] verifica-se, assim, que no Direito Romano são encontrados antecedentes históricos da reparação de danos acarretados pela dissolução do
casamento, tanto injustificada como causada por culpa do cônjuge.”
É importante, ressaltar que apesar do reconhecimento da responsabilidade civil nas relações familiares já datar de muito tempo, no caso específico
de rompimento do vínculo matrimonial, isso até hoje é bastante discutido.
2. Reparação do dano moral entre cônjuges
Em que pese à ideias contrárias a reparação do dano moral no rompimento do casamento o que não se pode negar é a necessidade da presença do
princípio da dignidade humana em toda relação desenvolvida pelo homem.
Como é sabido por todos nós, o referido princípio, é um dos fundamentos primordiais do sistema jurídico brasileiro, consoante os dizeres do art. 1º,
inciso III, da Constituição Federal.
“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado
Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...]
III- a dignidade da pessoa humana.”
E, por ser a família a célula básica da sociedade é de suma importância que a mesma seja acobertada pela tutela que o princípio da dignidade
humana tem a oferecer a toda e qualquer relação em que a pessoa venha a integrar.
O douto Carlos Bittar (1999, p.13) afirma:
“O cônjuge lesado, em obediência ao princípio da proteção da dignidade à pessoa humana, merece a devida reparação pelos danos sofridos.
Repugna não só o Direito, mas a consciência humana, o dano injusto, de modo que “a teoria da reparação de danos ou da responsabilidade encontra
na natureza do homem a sua própria explicação”.
Prosseguindo, ressalta-se que, para a configuração da reparação do dano moral entre os cônjuges é indispensável que os pressupostos da
responsabilidade civil estejam presentes. Ou seja, é preciso que haja a ação ilícita, que neste caso seria a violação o dever conjugal, mais o dano
moral e que entre eles haja o nexo de causalidade e, por fim a culpa.
Cumpre mencionar que, o tema em análise está resguardado não só no art.1º, inciso III da CF, mas também no seu art. 5º, caput, inciso V e X do
mesmo dispositivo da Carta Magna.
Ademais, existem os deveres dos cônjuges que estão previstos no art. 1566 do CC e se da violação deles não resultar em punição alguma,
inevitavelmente, eles passariam a ser meros avisos que, constantemente seriam transgredidos. Mais uma vez fica configurada a importância da
reparação civil entre os cônjuges.
Vale acrescentar, ainda, que a possibilidade da reparação civil nas relações conjugais parte do pressuposto de um cônjuge ter causado ilicitamente
um dano ao outro, e não do fato de entre eles não existir mais o amor.
Fica claro, então, que o rompimento do casamento por falta de amor entre os cônjuges não é causa de reparação civil, mas tão somente se dessa
falta de amor um cônjuge resolver gerar um dano ao seu consorte.
Vejamos a decisão do TJMG, acerca do assunto:
“INDENIZAÇÃO - DANOSMORAIS E MATERIAIS - ROMPIMENTO PREMATURO DO VÍNCULO CONJUGAL - SITUAÇÃO VEXATÓRIA NÃO
CARACTERIZADA - SEPARAÇÃO - EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO - RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. Ainda que do rompimento de
uma relação afetiva resultem transtornos de ordem psíquica, para quem viu desfeitos os seus sonhos de felicidade, provocando dor e angústia, não
se pode considerar a decepção amorosa, advinda de uma separação judicial, como fundamento do dano moral indenizável. Ao Julgador cabe
distinguir as diferentes situações que a vida apresenta, a fim de não reduzir a dinheiro todas as dores advindas do término de uma relação conjugal,
devendo discernir os casos extremos, como por exemplo, a pública difamação, a injúria grave, as sevícias, as lesões corporais e outras, que possam
decorrer do descumprimento do dever conjugal, a gerar dano moral indenizável. Assim, não demonstrado que o cônjuge que se afastou, a despeito
do pouco tempo de duração da união, tenha submetido sua parceira a situações que tais, não há se cogitar de indenização, até porque, ao manifestar
sua intenção de colocar um fim à relação matrimonial, ele agiu no exercício regular de um direito seu o que afasta a ilicitude do ato praticado” (CC,
art. 188, I). (TJMG, Ap. cível nº1.0024.03.057520-3/001, Rel. Des. Tarcisio Martins Costa.)
Coadunando a esse pensamento, Yussef Cahali (1998, p.673) nos ensina:
“A infração dos deveres conjugais, quando apta a produzir danos de natureza moral, já se mostra suficiente para fundamentar o pedido da reparação
por parte do cônjuge ofendido, considerando, portanto, que o ato ilícito preserva sua autonomia, projetando-se duplamente, seja como fundamento
para a dissolução do casamento, autorizando os efeitos que lhe são próprios, como também fazendo incidir a regra geral da responsabilidade civil.”
Por fim, está claro que, a utilização da responsabilidade civil no seio familiar almejando prevenir e reprimir as condutas danosas nas relações
familiares por meio da garantia da reparação patrimonial e moral, atualmente, é um fato público e notório. Tendo em vista, a importância que o tema
tem apresentado nos últimos tempos.
2.1 Dos Deveres do Casamento
Por muito tempo o matrimônio foi entendido como uma instituição, que para alguns era tida como sagrada, e por isso era indissolúvel.
Essa intangibilidade ganhava mais força ainda pelo fato de não haver leis que delimitassem situações aptas a permitir a dissolução do matrimônio.
Somente a partir da Lei do Divórcio (Lei nº6515/77) é que o ordenamento jurídico brasileiro e, por conseguinte a sociedade passou a admitir o
rompimento do casamento.
A partir desse momento, o casamento ganhou novos contornos. Passa a ser compreendido como um contrato, que como todos os demais exige
direitos e garantem deveres.
O rompimento marital pode surgir de uma forma consensual. Aquela em que os consortes entram em acordo quanto à falência da sociedade
conjugal, mas há, também, a ruptura conjugal delineada por muito sofrimento, inclusive, com danos. Em regra, esse último tipo de ruptura decorre da
quebra dos deveres que são impostas aos consortes.
Neste sentido, a responsabilidade civil, nas relações de família, advém da concretização de um dano real em face do descumprimento de um dever
legal.
Noutras palavras, a realização de um ato ilícito por um dos cônjuges, quando da quebra do dever conjugal com a efetivação do dano ao outro
cônjuge, resulta na dissolução do matrimônio mais a responsabilidade civil e, é claro, o dever de restabelecer a situação anterior ao dano que foi
desequilibrada pelo cônjuge culposo.
É preciso esclarecer que a infração de qualquer dos deveres do casamento não é apta, reflexivamente, a configurar a indenização por dano moral. É
necessário que essa conduta tenha gerado dor, sofrimento psíquico ao consorte vítima.
Nesse mesmo sentido, leciona Branco (2006, p.66):
“Convém destacar, entretanto, que a infração aos deveres do casamento, vista como fenômeno isolado, não se mostra por si só capaz de evidenciar
a presença de dano moral indenizável uma vez que este somente se perfaz quando o comportamento adotado, além de autorizar a dissolução do
casamento, trouxer ao cônjuge inocente inegável sensação de dor, aflição, humilhação, sentimentos de desamor que de uma forma nítida
influenciaram negativamente na relação de vida.”
Cumpre, oportunamente, mencionar a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro/RJ, que adota o posicionamento acima descrito:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MORAL. VIOLAÇÃO DOS DEVERES DO CASAMENTO. INFIDELIDADE CONJUGAL.
ADULTÉRIO. PROVA INEQUÍVOCA. TRAIÇÃO GERA DOR, ANGÚSTIA, SOFRIMENTO, DESGOSTO, REVOLTA, CONSTRANGIMENTO E SE
TRATA DE OFENSA GRAVE. DANO MORAL CONFIGURADO. ART. 5º, V e X, CARTA POLÍTICA. ART. 186 c/c 1566, INCISOS I e V, DO CÓDIGO
CIVIL. VERBA QUE COMPORTA MAJORAÇÃO DIANTE DA EXTENSÃO DA OFENSA E CAPACIDADE ECONÔMICA DAS PARTES ALÉM DO
CARÁTER DIDÁTICO. A traição, que configura uma violação dos deveres do casamento dever de fidelidade recíproca, respeito e consideração
mútuos (art. 1566, inciso I, do Código Civil de 2002) gera, induvidosamente, angústia, dor e sofrimento, sentimentos que abalam a pessoa traída,
sendo perfeitamente cabível o recurso ao Poder Judiciário, assegurando-se ao cônjuge ofendido o direito à reparação do dano sofrido, nos termos do
art. 186 do Código Civil. O direito à indenização decorre inicialmente de mandamento constitucional expresso, que declara a inviolabilidade da honra
da pessoa, assegurando o direito à respectiva compensação pecuniária quando maculada (art. 5º, X, da Constituição da República). Verba
compensatória deve ser fixada de conformidade com a extensão da ofensa, capacidade econômico-financeira das partes e caráter didático.
PROVIMENTO PARCIAL DO PRIMEIRO APELO E IMPROVIMENTO DO SEGUNDO”. (Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e
Criminais do DF. Acordão nº 302776. Relator Des. Sandoval Oliveira. J. 11/12/2007)
O Código Civil de 2002 no seu art. 1566 elenca os deveres dos consortes na constância do casamento. Vale dizer que, esses mesmos deveres são
impostos também àqueles que vivem em união estável.
Em obediência a Constituição Federal, no seu art.226,§3º, a união estável é reconhecida como uma entidade familiar. Cabendo a ela, portanto, os
deveres e direitos concedidos ao casamento.
Prosseguindo, são estes os deveres conjugais:
“Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I - fidelidade recíproca;
II - vida em comum, no domicílio conjugal;
III - mútua assistência;
IV – sustento, guarda e educação dos filhos;
V - respeito e consideração mútuos.”
Destarte, o conteúdo deste artigo é de grande relevância para a fundamentação do pedido de reparação, pois como se pode notar ele compreende a
tutela dos direitos e deveres da família, bem como a dos direitos da personalidade.
O inciso I do aludido artigo, trata do dever de fidelidade que deve coexistir para ambos os cônjuges.
Por fidelidade deve-se entender confiança, lealdade que um cônjuge deve ter em relação ao outro. A fidelidade compreende, também, o fato de
existir a proibição aos cônjuges de manterem relações sexuais ou outra atividade que venha promover a satisfação sexual com uma terceira pessoa.
Em regra, a infidelidade decorre da falta de amor entre os consortes, contudo não é isso que dá ensejo a responsabilidade civil entre elas, mas sim, a
quebra do dever conjugal que resulta num dano. Frisa-se.
Yussef Cahali (2000, p.360) conclui:
“O dever de fidelidade tem um duplo aspecto: - material ou físico e imaterial ou moral, de forma que seu descumprimento dá-se pela prática de ato
sexual do cônjuge com terceira pessoa – que é o adultério – e, também de outros que, embora não cheguem a cópula carnal, demonstram o
propósito de satisfação do instinto sexual fora da sociedade conjugal – ou quase adultério. A infidelidade pode ser material ou moral. Se consistir na
prática de congresso sexual com terceiro, constitui adultério. Se não chega a esse extremo, concretizando-se em fatos que denunciam esse propósito
ou constituem, sob esse aspecto agravo à honra do outro cônjuge, qualifica-se como infidelidade moral, justificando a dissolução da sociedade
conjugal, sob o fundamento da injúria grave. O quase adultério é a situação em que o homem e a mulher, sendo um deles casado, usam das
intimidades excessivas, que vão alem da pura amizade, o que não é, por isso mesmo, aceitável na sociedade brasileira.”
Quanto à vida em comum sob o domicílio conjugal, prevista no inciso II, refere-se à necessidade do casal de ter um lugar definitivo para definir como
domicílio conjugal. Não é preciso viverem debaixo do mesmo teto, porém devem viver juntos.
Silvio Venosa (2006, p.37), acrescenta:
“[...] na convivência sob o mesmo teto está à compreensão do débito conjugal, a satisfação recíproca das necessidades sexuais. Embora não
constitua elemento fundamental do casamento, sua ausência, não tolerada ou não aceita pelo cônjuge, é motivo de separação.”
Por certo, o dano moral seria fruto, neste caso, do fato do consorte faltoso se recusar, injustificadamente, a satisfazer o débito conjugal, o que
resultaria em injúria grave. Mais, também, do caso do consorte abandonar o lar, não deixando um possível lugar onde possa ser encontrado.
Resultando no desamparo moral e material.
Já a mútua assistência implica no preenchimento das necessidades do consorte, no sentido material e imaterial também. O que traduz que não basta
ocorrer entre o casal o bem estar econômico, saúde, alimentação regular, lazer etc. É necessário que exista entre os cônjuges o amor, o respeito à
privacidade, o carinho, enfim é crucial que entre os cônjuges haja a proteção dos direito da personalidade e que essa tutela seja desempenhada por
ambos os consortes.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves (2007, p.178), a mútua assistência:
“Trata-se de dever que se cumpre, na maior parte das vezes, de modo imperceptível, uma vez que se trata de um conjunto de gestos, atenções,
cuidados na saúde e na doença, serviços, suscitados pelos acontecimentos cotidianos. Envolve, por conseguinte, deveres de respeito, sinceridade,
recíproca, ajuda e mútuos cuidados. Trata-se do dever que dirige e verifica o vínculo, assegurando-lhe altíssimo valor ético.”
Maria Berenice Dias (2009, p.247) define a mútua assistência da seguinte forma:
“A promessa de amar e respeitar, na alegria e na tristeza, na pobreza e na riqueza, na saúde e na doença, feita na cerimônia do casamento religioso
nada mais significa do que o compromisso de atender ao dever de mútua assistência, assim como aos deveres de mútuo respeito e consideração.”
Desse modo, está caracterizada a falta da mútua assistência entre os consortes quando não se cumprir entre eles o fornecimento de meios matérias
e imateriais que são exigidos pela lei.
O inciso IV diz respeito aos deveres decorrentes da filiação. A proteção dos filhos é dever de ambos os pais. Destaca-se que o não cumprimento
desse dever, em regra, não causa de indenização entre os cônjuges, por isso não tratarei do mesmo.
Por fim, há o dever de respeito e consideração mútuos, concernente ao inciso V. Este inciso trata de uma norma em branco. O que significa que os
aplicadores do Direito precisam preencher essas normas e sempre ir adequando-as aos casos concretos.
Por ser muito amplo, esse inciso acaba por tutelar toda e qualquer violação aos direitos a personalidade. Por exemplo, o desrespeito a honra, a
integridade física e psíquica, a liberdade, todos esses direito se encaixam nesse inciso.
Cabe lembrar que para a configuração do dano moral entre cônjuges não basta à violação desses deveres supramencionados.É preciso que estejam
presentes os elementos da responsabilidade civil, ou seja, a conduta, dano, nexo de causalidade e culpa.
Nesse sentido Michel Silva (2009, p.121), discorre:
“De fato, não bastará apenas a ocorrência da violação de um dever de vida em comum e/ou a existência de fato que a torne insuportável para que se
possa pedir uma reparação civil. É preciso que o fato estudado seja culposo (ilícito), tendo feito surgir um dano efetivo, real e certo, e que haja nexo
de causalidade entre a conduta e o dano.”
Além disso, como bem assevera a doutrina brasileira, esses deveres conjugais representam um rol exemplificativo de motivos dos quais resultariam
no dano moral entre consortes. Desta forma, a análise do caso concreto se faz percuciente para que se possa concluir na ocorrência ou não do dano
moral no rompimento do casamento.
Cumpre mencionar ainda, que é imprescindível o cônjuge vítima provar o fato que violou o direito de personalidade e não precisamente o dano moral.
Isso ocorre porque como já foi dito acima, pode ter havido uma conduta reprovável por parte do cônjuge culpado, sem que dessa conduta tenha
resultado em prejuízo ao direito da personalidade do cônjuge vítima.
O ilustre professor Carlos Roberto Gonçalves (2003, p.552), nos ensina que:
“O dano moral, salvo casos especiais, como o de inadimplemento do contratual, por exemplo, em que se faz mister a prova da perturbação da esfera
anímica do lesado, dispensa prova em concreto, pois se passa no interior da personalidade e existe in re ipsa. Trata-se de presunção absoluta [...].”
Vejamos, na jurisprudência, o quanto é importante que o cônjuge vítima prove o fato do qual resultou o dano.
“SEPARAÇÃO JUDICIAL CONTENCIOSA – ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO A UM DOS DEVERES DO CASAMENTO – INOCORRÊNCIA –
TESTEMUNHAS QUE COMFIRMAM A BOA CONDUTA DO CÔNJUGE VARÃO – IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO QUE SE IMPÕE – RECURSO
CONHECIDO E PROVIDO – Quando um dos cônjuges requerer a separação judicial com base na conduta desonrosa do outro, ou por este ter
violado os deveres do casamento, cabe-lhe o ônus da prova dessa transgressão, sob pena de ver seu pedido julgado improcedente”. (Ap. Cível nº
98.003436-1, da Capital, Relator Des. Eder Graf). (TJSC – AC 00.023057-0 – 2ª C.Cív. – Rel. Des. Vanderlei Romer – J. 08.02.2001)
Por certo, ocorrendo à violação a um direito da personalidade do consorte, o magistrado não terá que avaliar a dor, o sofrimento do cônjuge vítima, já
que não existe mecanismo capaz disso. O magistrado precisa apenas está convicto de que houve uma violação a um direito da personalidade
promovida culposamente pelo consorte faltoso.
3.Conclusão
Sendo assim, apregoar a inaplicabilidade da reparação civil de danos por se tratar de um vínculo conjugal é o mesmo que negar a tutela a dignidade
humana aos componentes da família quando estes sofrerem dano na constância da relação familiar.
No seio familiar as situações de maior conflito que podem resultar numa provável reparação por danos morais, são aquelas cuja relação conjugal ou
de convivência demonstram as diferenças e os atritos. Diante da quebra dos deveres do casamento resta, portanto configurado o dever de reparar o
possível dano que dessa conduta possa ter resultado
O Direito nada mais é, em seu cerne, que a conseqüência que daquilo que a sociedade lhe exibe e dele requer. Se o Direito emitiu determinados
princípios ou normas, foi em virtude do fato da sociedade ter lhe oferecido elementos, que foram adotados como seu costume. Exemplo disso é a
união estável que há muito tempo era entendida como um comportamento imoral e hoje é totalmente aceita pela sociedade e regulamentada pelo
ordenamento jurídico. Desta forma, o mesmo se espera a admissibilidade da reparação do dano moral entre cônjuges no rompimento do casamento,
pois com a proteção dos direitos da personalidade de cada um dos consortes se está tutelando também à família e à própria sociedade.
Referências: ANDRADE, Fábio Siebeneichler de. A reparação de danos morais por dissolução do vínculo conjugal e por violação dos deveres
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MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de direito processual civil: teoria geral do processo e processo do conhecimento. São Paulo: Atlas, 2005. V.
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