OS DESAFIOS DA QUALIDADE DE VIDA EM AMBIENTES DE “COOPETIÇÃO” Sigmar Malvezzi PhD Belo Horizonte, 8 de maio de 2014 A QUESTÃO DA QUALIDADE DE VIDA • O poder que a sociedade aprendeu a ter sobre as condições de existência (instrumentalidade e conhecimento) e os riscos que surgiram com a aplicação desse aprendizado, colocaram a qualidade de vida no palco dos questionamento e responsabilidades humanas. A QUESTÃO DA QUALIDADE DE VIDA • Hoje, a lista de ameaças à sociedade (agua potável, matérias primas, alimentação, oportunidades de trabalho, conflitos políticos, competição econômica, saúde, comunicação – padrões de vida...) é tão ampla quanto o rol de recursos disponíveis para cuidar dela. A QUESTÃO DA QUALIDADE DE VIDA • Essas constatações definem o roteiro desta reflexão. • O que é a qualidade de vida? • Que desafios as condições atuais do negócios nos distanciam de padrões aceitáveis de qualidade de vida? A QUESTÃO DA QUALIDADE DE VIDA • Qualidade de vida (tal como felicidade, liderança, bem estar, identidade) é um conceito falsamente simples, sobre o qual temos conhecimento intuitivo (seguro) e ignorante (compreensão imprecisa do conceito). A QUESTÃO DA QUALIDADE DE VIDA • A qualidade de vida é uma condição de existência mencionada, pela primeira vez, na narrativa do Gênesis e, desde então, desafiada continuamente, nos diversos saltos qualitativos (sociedade comunitária tribal, sociedade governamental, renascença, industrialização e “sociedade líquida”) da evolução da sociedade. • Hoje, a qualidade de vida é desafiada por fatores como a escala demográfica da sociedade, as desigualdades e injustiças (enfermidade crônica), as identidades ambíguas (periurbanidade), os paradoxos (competição e cooperação), a virtualização dos meios de ação (flash trading) , a precarização do trabalho e principalmente, a impotência da própria compreensão desses desafios. • Esse quadro revela que a qualidade de vida não é um produto, ou serviço (comprado no mercado) para ser aplicado aos desafios, mas uma particular condição humana de existência produto da relação Homem/Homem e Homem/Ambiente, continuamente reconstruída. • Por que hoje essas relações são complicadas? • A raiz dessas complicações é encontrada na ação conjunta e simultânea de três forças. • A virtualização e labilidade do “fazer” (estruturas e produção invisíveis e inacessíveis criando a necessidade de narrativas). • A tecnologia digital (eventos que se movimentam em alta velocidade, desafiando as competências) • A fragmentação econômica e social (o poder individual sobre os eventos aumentando as incertezas e a cultura do individualismo). • Balizadas por essas forças, comunidades, instituições, pessoas, ciências e macro e micro estruturas políticas, sociais e econômicas enfrentam uma cultura e um modo de vida fetichizados por fatores como a busca de resultados, produtividade, inovação, flexibilidade e urgência, desafiando o trabalho, os negócios, as potencialidades, as trajetórias, a emancipação e a sustentabilidade da própria sociedade. • O comprometimento da qualidade de vida começa na impotência (da própria gestão de pessoas) para o lidar com essa cultura e esses fetiches. • Tais condições induzem condições paradoxais de vida e de trabalho como é o caso de se ter que competir e que cooperar, ao mesmo tempo. • Competir porque a sobrevivência impõe a superação de si mesmo e dos outros. • Cooperar porque a eficácia depende de competências portáteis. • Paradoxos como competir e cooperar porque o atual contexto dos negócios funciona sob a mesma lógica do jogo LEGO (qualquer peça pode ser alterada, sem aviso prévio e sem consentimento dos outros). • Nessa lógica (criada pela competitividade, pela instabilidade das relevâncias e das competências), as tarefas e desempenhos tornam-se ações artesanais dentro de contínuas incertezas. • Essa lógica (orderly desorder, como Urry a denomina) obriga a todos a cuidar de si mesmos e de suas obras, crescendo, somando, se diferenciando e compartilhando forças (uma lógica aberta aos paradoxos e conflitos). • Pressionadas a entregar resultados dentro dessa lógica, as pessoas dependem de adaptação imediata para garantir eficácia (nas commodities e serviços) em suas transações. • Essa adaptação requer permanente renegociação de suas identidades, papeis, tarefas, alianças, e vínculos para ajustar suas competências, trajetórias e resultados (tal como os náufragos em alto mar). • Nessas negociações (que hoje ocorrem dentro da estrutura de redes), coloca-se a necessidade de competir e cooperar, ao mesmo tempo (condição que reforça o individualismo e as alianças). • Sloterdijk denomina forma de interação “associação em co-isolamento” (tal como ocorre na estrutura da espuma). • Viver e trabalhar na lógica do jogo LEGO implica muitas novos padrões nas relações do indivíduo consigo mesmo, com os outros e com o mundo devido às demandas do agir (ser reativo, olhar resultados, valorizar o simbólico ) e do pensar (empobrecimento de narrativas, busca do conhecimento instrumental e descontextualização) que comprometem suas competências. • Hoje, é comum as pessoas fazerem sem compreender o que fazem e por que fazem aquilo que fazem. • Essas pessoas funcionam no piloto automático, dependentes dos conhecimentos tácitos e de competências intuitivas. • Nos tornamos incompetentes porque temos que atuar dentro de fluxos rápidos que não nos permite parar para pensar e nem para aprender. • Nosso trabalho ocorre dentro de um contexto sempre emergente no qual temos que revisar nossas competências e nossos vínculos ajustando-nos continuamente. • Hoje, vale aquilo que McLuhan escreveu em 1964, “ a tecnologia da media amplia nossas potencialidades, mas nos amputa algumas daquelas que tínhamos • A rapidez dos fluxos aumentou nosso poder de ação, mas comprometeu nossa capacidade de compreender nossa própria ação. • Viver dentro de um contexto que acelera a maioria dos aspectos da vida nos habitua a fazer sem necessitar da compreensão daquilo que fazemos. • Uma pessoa que rotineiramente “faz” sem necessitar saber do porque de sua ação muda inteiramente sua condição de vida (mais competências e menos emancipação). • Esse indivíduo perde a oportunidade (e a necessidade de) refletir. • Ele tem seu crescimento crítico amputado, embora seja uma fera no fazer. • Essa mudança em sua vida tem sido observada nas pessoas que tem diante de si diariamente, uma pilha interminável de tarefas. • Estudando essas pessoas, Green concluiu que elas passam a viver apenas o tempo presente. Ignoram o futuro e não necessitam do passado. • Pieper descobriu que elas não tem mais prazer porque não proveem espaço para a contemplação, a reflexão e as escolhas (que não sejam impulsivas). • Nos criamos eventos complexos e condições paradoxais de vida e de trabalho e não temos tempo nem competências para compreender o que ocorre neles e com eles. • A amputação de nossa qualidade de vida não está no eventos complexos e paradoxais, mas em nossa negação de tempo e capacitação para os legitimar e compreender. • É amputação é adversa e grave, mas não é desesperadora. • Vemos luz no fim do túnel. • Diante da impotência de mudar a gramática do ambiente, nos constatamos nossa potencialidade de resgatar nossa condição de sujeito crítico. O QUE É QUALIDADE DE VIDA? • A qualidade de vida depende das condições do ambiente porem somos ricos em recursos para lidar com elas e nos manter emancipados e competentes para a busca da nossa autorealização e nossa felicidade. • A busca pela qualidade de vida implica em ações interiores e exteriores. O QUE É QUALIDADE DE VIDA? • Nas ações exteriores, a qualidade de vida implica condições ambientais propícias para a saúde, a alimentação, a segurança, a habitação, a instrução, a formação, o tempo, o lazer, a consciência, a cultura, o trabalho, a família, a liberdade, a mobilidade e a participação. O QUE É QUALIDADE DE VIDA? • Nas ações interiores a qualidade de vida implica na busca dos ideais sublimes, na elaboração das trajetórias de crescimento (como sujeito individual e comunitário) e de realização (ideais para o reconhecimento). • Temos essa busca comunicada em dois filmes, Noites de Cabíria e As Aventuras de Pi. • Cabiria (espezinhada, desprezada, roubada, despojada de tudo) buscou em seus ideais e fé na vida a força e a competência para recomeçar do ponto zero. • A vida continua e eu posso re-econstrui-la. • Pi, movido por seus ideais e pelo desafio das ameaças cria as competências necessárias para garantir a sua sobrevivência e a sobrevivência de Richard Parker. • O que o ambiente nos amputou? Dos vínculos da capacidade de pensar e da contemplação. • Vou atrás desse prejuízo, reorganizando meu tempo e retomando meu projeto de crescer e ser feliz. • A saída para a qualidade de vida não depende apenas da superação de condições exteriores adversas (coopetição), todas situações que tornam a qualidade de vida precária exigem soluções de longo prazo. • vida mas está em nossas mãos (investimento nos projetos de carreira e de vida). • No curto prazo está a parte que depende de nossas próprias mãos (nos investimentos nos projetos de carreira e de vida). • Não serão as instituições (governo, sindicatos, conselhos profissionais, associações patronais,...) que promoverão a qualidade de vida das pessoas pelas quais somos responsáveis, mas nossas ações (Cabíria e Pi). COMO PROMOVER QUALIDADE DE VIDA? • Agir movidos pela moral da esperança (ação idealista e criativa) em substituição à moral do medo (ação pela fuga) e a moral da dependência de condições favoráveis (ação pela acomodação). • A esperança é condição básica da qualidade de vida porque estimula o crescimento e a busca da liberdade (visão da terra prometida de Abraão).