Crescimento de crianças infectadas
Leandro-Merhi VA, et al.
Pediatria (São Paulo) 2001;(1):17-26
Artigo Original Original Article Artículo Original
Características do crescimento de crianças infectadas com
o vírus da imunodeficiência humana
Growth characteristics for children infected with human immunodeficiency virus
Características del crecimiento de niños infectados con el virus de la
imunodeficiencia humana
Vânia Aparecida Leandro-Merhi1 , Maria Marluce Santos Vilela2 , Marcos Nolasco da Silva2, Antônio
de Azevedo Barros Filho2
Serviço de Imunodeficiência Pediátrica do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de
Campinas – UNICAMP. Campinas, SP, Brasil
Resumo
Introdução: A diminuição da taxa de crescimento de crianças infectadas com o vírus (HIV) varia de 20% a 100% e é
proporcional à expectativa de sobrevida. Há poucos estudos mostrando a influência do HIV sobre o crescimento de crianças
infectadas com o vírus; o presente estudo tenta aprofundar esta questão na perspectiva de estimar a velocidade de crescimento.
Objetivo: Estudar as curvas e a velocidade de crescimento em peso e comprimento de crianças infectadas com o vírus da
imunodeficiência humana. Casuística e Métodos: Foram analisadas as curvas e a velocidade de crescimento em peso e
comprimento de 124 crianças nascidas de mães infectadas pelo HIV; 71 destas crianças foram infectadas pelo vírus. Todas as
crianças foram acompanhadas clinicamente desde o nascimento até dois anos de idade. As curvas de crescimento em peso e
comprimento foram determinadas pela análise de regressão e a velocidade de crescimento em peso e comprimento nos dois
grupos de crianças (infectadas e não infectadas) foi obtida pela derivada das funções estimadas de regressão. Resultados: A
análise de regressão mostrou que as crianças não infectadas apresentaram uma taxa de crescimento semelhante às crianças
normais, enquanto que o crescimento das crianças infectadas foi gravemente comprometido, resultando em curvas muito diferentes
das crianças normais na mesma idade. Conclusões: Embora as manifestações clínicas da infecção pelo HIV possam demorar
para aparecer, as alterações na taxa de crescimento das crianças infectadas já surgem nos primeiros meses de vida.
Descritores: Síndrome de imunodeficência adquirida. Infecções por HIV. Transmissão vertical de doença. Crescimento. Pesoestatura. Criança.
1
2
Nutricionista, Doutoranda em Ciências Médicas. Docente do Curso de Nutrição da PUC-Campinas, SP e UNIMEP-Piracicaba,SP,Brasil
Professor Doutor. Departamento de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas – UNICAMP. Campinas, SP, Brasil
17
Crescimento de crianças infectadas
Leandro-Merhi VA, et al.
Pediatria (São Paulo) 2001;(1):17-26
Abstract
Weight and lenght growth curves and weight and lenght growth rate for children infected with human immunodeficiency virus
Introduction: The decrease in the growth rate of children infected with human immunodeficiency virus ( HIV )
varies from 20% - 100% and is proportional to the length of survival. Objective: To study the weight and lenght growth
curves for children infected with HIV. Casuistic and Methods: The weight and length growth curves and rates of 124
children born to HIV-infected mothers were analysed; 71 of these children were infected with HIV. All children were
followed medically from birth up to the age of two years. The weight and length growth curves were determined
by regression analizis and the rate of growth for the two groups of children (infected and non-infected) was obtained
from the derivated using functions estimated from the regression . Results: Regression analysis showed that noninfected children had growth rates similar to those of normal children whereas in HIV-infected children, growth was
severely compromised, and the resulting curves were markedly different from those for normal children at the same
ages . Conclusions: Although the clinical symptoms of HIV infection may take time to appear, lower growth rate of
HIV-infected children are already present in the beginning of the first year of life.
Keywords: Acquired immunodeficiency syndrome. HIV infections. Disease transmission, vertical. Growth. Height weight. Child
Resumen
Características del crecimiento de niños infectados con el virus de la imunodeficiencia humana
Introducción: La disminución de la tasa de crecimiento de niños infectados con el virus (VIH) varia del 20% al 100% y es
proporcional a la espectativa de sobrevida. Hay pocos estudios mostrando la influéncia del VIH sobre el crecimiento de niños
infectados com el virus; así intentou-se profundizar esta cuestión, principalmente, en la perspectiva de estimar la velocidad de
crecimiento. Objetivo: Estudiar las curvas y la velocidad de crecimiento en peso y talla de niños infectados com el virus de la
inmunodeficiencia humana.Casuística y Métodos: Analisaram-se las curvas y la velocidad de crecimiento en peso y talla de
124 niños nacidos de madres infectadas por el HIV; 71 de estos niños fueron infectados por el virus. Todos los niños fueron
acompñados clinicamente desde el nacimiento hasta los dos años de edad. Las curvas de crecimiento en peso y talla fueron
determinadas por el análisis de regresión y la velocidad de crecimiento en peso y talla en los dos grupos de niños (infectados
y no infectados) fue obtenida por la derivada de las funciones estimadas de regresión. Resultados: El análisis de regresión
mostró que los niños no infectados presentaron una tasa de crecimiento semejante a los niños normales, mientras el crecimiento
de los niños infectados fue gravemente comprometido, resultando en curvas muy diferentes de los niños normales de la misma
edad. Conclusiones: Aunque las manifestaciones clínicas de la infeción por el VIH puedan tardar a aparecer, las alteraciones
en la tasa de crecimiento de los niños infectados ya surgen en los primeros meses de vida.
Palabras clave: Síndrome de imunodeficiencia adquirida. Infecciones por VIH. Transmisión vertical de enfermedad.
Crecimiento. Peso por estatura. Niño.
Introdução
A síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS)
tem se tornado um dos maiores problemas de saúde
no mundo. Há estimativas de que aproximadamente 2
milhões de crianças estão infectadas pelo HIV, quase
todas pela transmissão vertical1. A projeção para o ano
2000 é que por volta de 40 milhões entre homens,
mulheres e crianças tornar-se-ão infectados pelo HIV,
a menos que seja desenvolvido um programa efetivo
de prevenção2. Estima-se que no ano 2005 possa haver 150 milhões de pessoas infectadas no mundo, com
18
5 milhões de casos nos Estados Unidos. Muitos dos
indivíduos infectados serão mulheres e crianças3.
Segundo estimativa da Organização Mundial da
Saúde (OMS), há aproximadamente 180.000 crianças
com AIDS na idade de 0 a 4 anos na África4. No Brasil,
no período de 1980 a 1996, há registro de 2.360 casos
de AIDS em crianças de 0 a 4 anos de idade5.
A desnutrição protéico-energética (DPE) é comum
Crescimento de crianças infectadas
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em pacientes com AIDS e pode preceder outras manifestações da doença. Seu desenvolvimento é
multifatorial, incluindo condições que levam à diminuição do consumo de alimentos, alterações no metabolismo intermediário e má-absorção de nutrientes6.
A disfunção do trato gastrintestinal, a má nutrição e
as infecções crônicas ou recorrentes interagem e contribuem para as deficiências nutricionais e os problemas de crescimento observados nas crianças infectadas
pelo HIV7.
A incidência da falência de crescimento varia de 20
a 80% em crianças infectadas com o vírus da
imunodeficiência humana sintomáticas8, 9. A perda de
peso ou a falência de crescimento estão incluídas, pelo
Centro de Controle de Doenças (CDC) e Organização
Mundial da Saúde, na definição clínica de AIDS, referindo-se a indivíduos soropositivos com perda de peso
maior do que 10% do valor mínimo para a idade, por
um período igual ou maior do que 2 meses10.
A diminuição da ingestão oral poderia ser mecanismo para o retardo de crescimento em crianças com
infeção pelo HIV. Entretanto, há evidências mostrando
que a ingestão de nutrientes é tanto similar quanto adequada para o crescimento em crianças infectadas e
não infectadas11. A falência de crescimento é comum
em crianças infectadas pelo HIV e é um dos indicadores mais sensíveis da progressão da doença12.
Fennoy e Leung13 (1990) demonstraram que em
crianças infectadas com o HIV e gravemente doentes
com pneumonia intersticial linfocítica e falência de crescimento, a monitorização cuidadosa da ingestão alimentar resultou no consumo calórico recomendado e taxas
adequadas de ganho de peso. Este estudo sugere que
o cuidado nutricional e o consumo adequado de proteínas, calorias e micronutrientes são benéficos em crianças com AIDS.
Miller et al.14 (1993) observaram que crianças
infectadas com o HIV e crianças normais apresentavam idade gestacional, peso ao nascer e percentil de
peso ao nascimento similares mas, com 19 a 21 meses de idade, seus percentis de peso divergiam significativamente, com preservação da altura. Comparando-se os grupos, a massa corporal magra, apesar de
estar dentro do limite de normalidade, era significativamente diferente das crianças HIV negativas.
McKinney et al.15 (1993) analisaram o crescimento
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de crianças durante os dois primeiros anos de vida e
observaram que as crianças infectadas com HIV nos
quatro primeiros meses de vida eram significativamente menores do que as crianças não infectadas, tanto no
peso em relação à idade, quanto no comprimento em
relação à idade e que o crescimento linear e o ganho
ponderal estavam proporcionalmente diminuídos.
Moye et al.16 (1996) estudaram o impacto da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana adquirida
perinatalmente sobre o crescimento somático, desde o
nascimento até os 18 meses de idade e concluíram
que as crianças infectadas apresentavam um declínio
progressivo no índice de massa corporal, desde o nascimento até 6 meses de idade.
Carey et al.17 (1998 ) mostraram que a construção
do padrão da velocidade de crescimento em crianças
infectadas pode avaliar o seu prognóstico, sendo observados deficits consistentes na velocidade do crescimento entre as crianças infectadas quando comparadas com o padrão normal de crescimento. Testes
de regressão proporcionais indicaram que a velocidade de crescimento em peso e altura contribuem significativamente para o risco de morte entre as crianças
infectadas após o ajuste da terapia anti-retroviral administrada. Apesar da intervenção nutricional ser um
adjuvante importante do tratamento, a melhora dramática na saúde e no estado nutricional é resultante
da terapia anti-retroviral .
A disponibilidade de informações sobre peso e comprimento em crianças infectadas, no ambulatório do
Serviço de Imunodeficiência Pediátrica do Hospital das
Clínicas da Universidade Estadual de Campinas (HCUNICAMP), permitiu o aprofundamento dessa questão, principalmente na perspectiva de estimar a velocidade de crescimento.
O objetivo do presente trabalho foi estudar o
crescimento em peso e comprimento de crianças
infectadas com o vírus da imunodeficiência humana de zero a 24 meses de idade comparadas com
crianças não-infectadas, estimando as velocidades
de crescimento em peso e comprimento.
Casuística e método
Foi realizado um estudo longitudinal de pacientes
que estavam em seguimento no ambulatório do Serviço de Imunodeficiência Pediátrica do Hospital das Clí-
19
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nicas da Universidade Estadual de Campinas, que faz
o acompanhamento de crianças nascidas de mães
infectadas com o vírus da imunodeficiência humana e
cujos pais optaram pelo seguimento do filho neste serviço. Além das atividades assistenciais, é um núcleo de
ensino e de pesquisa.
Foi efetuado um levantamento dos paciêntes acompanhados no serviço perfazendo um total de 164 crianças do ambulatório de imunodeficiência pediátrica,
menores de 48 meses de idade, sendo estudadas as
seguintes variáveis: idade, sexo, idade gestacional ao
nascer, sintomatologia, manifestações clínicas associadas à AIDS, peso de nascimento e medidas de peso e
comprimento no decorrer do período de acompanhamento no ambulatório.
Foram selecionadas crianças de zero a 24 meses
de idade, infectadas com o vírus da imunodeficiência
humana, e crianças de zero a 24 meses de idade,
soropositivas no início, e que se negativaram com o
tempo. As crianças deveriam preencher os seguintes
critérios de inclusão:
1. Nascida de gestação a termo18 com peso adequado
para a idade gestacional19,
2. Ausência de doenças congênitas que pudessem
interferir no desenvolvimento e estado nutricional,
3. Consulta inicial do ambulatório antes da idade
de 24 meses,
4. Crianças infectadas exclusivamente pelo mecanismo de transmissão vertical (mãe-filho),
5. Número mínimo de 3 consultas.
Do número de prontuários, inicialmente levantados,
permaneceram 124 pacientes que preenchiam os critérios estabelecidos para o estudo. Para as análises,
também foram excluídas crianças com peso de nascimento inferior a 2.500g. Nos prontuários que estavam
com registros incompletos, foram utilizadas as informações disponíveis.
As crianças foram classificadas em 2 grupos, da
seguinte maneira:
a) Criança infectada: as crianças foram consideradas infectadas, quando apresentaram sorologia
positiva para o vírus da imunodeficiência humana
após teste de ensaio imunoenzimático (ELISA) e
confirmação pelo exame de Western Blot ou imunofluorescência, após 18 meses de idade ou anterior
a esta idade, quando a criança apresentava
20
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sintomatologia da doença. Estas, foram então classificadas segundo os critérios do Centro de Controle de Doenças10.
b) Criança não-infectada (sororeversora): as crianças foram consideradas como não-infectadas quando
apresentaram completa reversão dos resultados de
sorologia (exame de ELISA), até os 18 meses de idade, com função imunológica normal e sem sintomatologia da infecção com o vírus da imunodeficiência
humana.
Para a definição e classificação clínica das crianças
infectadas, foram usados os critérios adotados pelo
Ministério da Saúde em 1988 e os critérios adotados
pelo CDC norte-americano em 199410, 20.
As crianças infectadas pelo HIV receberam abordagem psicossocial, orientação nutricional pela equipe
pediátrica, suporte imunológico, quimioterapia antiretroviral, antibioticoterapia profilática e terapêutica de
acordo com protocolo clínico. Os agentes antivirais utilizados na população do estudo foram a zidovudina
(AZT) e a didanosina (DDI).
O estudo do crescimento das crianças infectadas e
não-infectadas foi realizado pela análise de regressão.
A análise de regressão é geralmente utilizada para
descrever a relação entre uma variável dependente (ou
resposta) e uma coleção de variáveis independentes
(ou explanatórias).
O objetivo desta análise foi verificar como se comporta a variável Idade (M) com os resultados encontrados de peso e comprimento para o grupo de crianças
infectadas e não-infectadas e também para conhecer
o comportamento das velocidades de crescimento em
peso e comprimento em cada grupo.
Desta forma, as variáveis consideradas foram
as seguintes:
• Idade (M): idade da criança em meses (variável
explanatória),
• Idade 2M: idade M2,
• Idade 3M: idade M3,
• Peso: peso da criança em quilos (variável resposta),
• Comprimento: comprimento da criança em centímetros (variável resposta),
• Grupo: grupo ao qual a criança pertence; infectadas
e não-infectadas.
Crescimento de crianças infectadas
Leandro-Merhi VA, et al.
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Esta análise foi realizada aos 3 (n=21), 9 (n=25),
15 (n=28), e 21 (n=37) meses, considerando as medidas das crianças como sendo independentes
umas das outras, no decorrer do tempo.
A velocidade de crescimento para peso e comprimento para os 2 grupos de crianças foram obtidas pelas derivadas a partir das funções estimadas de regressão.
Resultados
As crianças foram divididas em infectadas e
não infectadas quanto ao sexo, cor, situação no
ambulatório, escolaridade da mãe, tipo de parto
e se receberam aleitamento materno a partir do
nascimento. Estas características são mostradas na Tabela 1.
Com relação ao sexo, verifica-se que entre as
crianças infectadas, 34 (47,9%) pertencem ao sexo
masculino e 37 (52,1%) ao feminino. A relação masculino/feminino é de 0,9:1. Entre as crianças nãoinfectadas, 31 (58,5%) pertencem ao sexo masculino e 22 (41,5%) ao feminino.
Quanto à situação no Serviço de Imunodeficiência Pediátrica, durante o período de levantamento dos dados, no grupo de crianças
infectadas, 32 (45,1%) estavam em acompanhamento regular no ambulatório. Treze (18,4%) haviam
abandonado o seguimento ou apresentavam situação ignorada; 3 (4,2%) haviam sido transferidas
para outro serviço e 23 (32,4%) foram a óbito. Destas, 13 (56,5%) faleceram antes dos 2 anos de idade e 10 (43,4%) com idade superior a 2 anos. A
freqüência do acompanhamento ambulatorial no
grupo das crianças infectadas ocorre de acordo
com a evolução clínica que a criança apresenta.
Tabela 1 – Características da população estudada no Serviço de Imunodeficiência Pediátrica do
Hospital das Clínicas da Universidade Estadual de Campinas. Campinas, SP, Brasil.
Crianças
Características
Infectadas
(N=71)
Nº
%
Não infectadas
(N=53)
Nº
%
34
37
47,9
52,1
31
22
58,5
41,5
65
59
52,4
47,6
32
23
13
3
45,1
32,4
18,4
4,2
30
12
10
1
56,6
22,6
18,8
1,9
62
12
23
23
4
50,0
9,7
18,5
18,6
3,2
5
35
6
3
4
9,4
66,0
11,3
5,7
7,5
27
4
2
1
79,4
11,8
5,9
2,9
5
62
10
5
5
5,7
71,3
11,5
5,7
5,7
23
41
35,9
64,1
19
30
38,8
61,2
42
71
37,2
62,8
Total (N=124)
Nº
%
Sexo
Masculino
Feminino
Situação
Em acompanhamento
Alta
(*)
Óbito
Abandono/Ignorada
Transferido
(**)
Escolaridade da mãe
1º grau completo
1º grau incompleto
2º grau completo
2º grau incompleto
Superior
(***)
Tipo de parto
Cesariana
Vaginal
*
13 crianças foram a óbito antes dos 2 anos de idade e 10 com idade superior a 2 anos
Em 37 prontuários não constava esta informação
***
Em 11 prontuários não constava esta informação
**
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Freqüentemente, estas crianças são acompanhadas semanalmente.
No grupo de crianças não-infectadas, 30 (56,6%)
estavam em acompanhamento regular; 10 (18,8%)
haviam abandonado o tratamento ou escontravamse em situação ignorada; 1 (1,9%) havia sido
transferida para outro serviço; 12 (22,6%) tinham
recebido alta ambulatorial. Neste grupo, nenhuma
criança foi a óbito.
Apesar da dificuldade na obtenção dos dados, podese observar que a maioria das mães, nos grupos de
crianças infectadas e não infectadas, apresentava o 1º
grau incompleto; 35 (66,0%) e 27 (79,4%) respectivamente. A maioria das crianças era proveniente da população de baixa renda.
Quanto ao tipo de parto, observa-se que 23
(35,9%) nasceram de cesariana e 41 (64,1%) de
parto vaginal no grupo de crianças infectadas.
Dezenove (38,8%) nasceram de cesariana e 30
(61,2%) de parto vaginal no grupo de crianças
não-infectadas.
A análise de regressão foi realizada distribuindo-se os valores das variáveis peso e comprimento, de acordo com a idade. Após esta etapa procurou-se encontrar a equação que melhor
se ajustasse aos dados. As escolhas dos ajustes foram baseadas, principalmente, na análise
dos gráficos PREDITO x RESÍDUOS onde se
avalia a distribuição dos resíduos que deve ser
aleatória e não apresentar alta variabilidade, e
PREDITO x OBSERVADO onde os pontos devem se aproximar da reta identidade. Foram escolhidos os modelos e as equações que após
análise dos resíduos apresentavam o melhor
ajuste. Os resultados verificados estão expostos nas Figuras de 1 a 6.
Na Figura 1 estão contidos os resultados do comprimento do grupo infectado e não infectado. A curva estimada para o comprimento é dada por 51,50
+ 2,28*id - 0,10*id2 + 0,002*id3.(N=479; R2= 80,41%).
Para os não infectados a curva estimada para o comprimento é dada por 50,72 + 2,40*id - 0,04*id2.(N=
334; R2= 88,05%).
Na Figura 2 estão contidos os resultados de velocidade de crescimento dos grupos infectado e não
infectado. A curva estimada para a velocidade de
22
Crescimento de crianças infectadas
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crescimento dos infectados é dada por 2,28 –
0.20*id 0,007*id2 para o grupo de crianças não
infectadas. A curva estimada para a velocidade é
dada por 2,40 - 0.09*id.
Na Figura 3 estão contidos os resultados de ganho
ponderal dos grupos infectado e não Infectado. A curva
estimada para o peso dos infectados é dada por 3,82 +
0,27*id.(N=581; R2=62,16%). Para o grupo de crianças não infectadas a curva estimada para o peso é
2
dada por 3,50 + 0,62*id - 0,01*id2 . (N=353; R =79,75%).
A Figura 4 contém os resultados da velocidade
de ganho ponderal dos grupos infectado e não
infectado. A curva estimada para a velocidade é constante e dada por 0,27 Kg/mes. Para o grupo de crianças não infectadas a curva estimada para a velocidade é dada por 0,62 - 0,03*id.
A Figura 5 contém a distribuição de comprimentos do grupo infectado em relação a um
modelo que especifica uma relação quadrática
com a idade e os pontos observados (excluindo
óbitos). A curva estimada para o comprimento é
dada por 53,18 + 1,44*id - 0,012*id 2. (N= 356;
R2=80,60%).
A Figura 6 contém a velocidade estimada de
crescimento do comprimento das crianças
infectadas. A curva estimada para a velocidade é
dada por 1,44 - 0,025*id.
Pelos resultados obtidos, observou-se que os dois
grupos se comportam de maneira distinta.
O peso, quando relacionado à idade no grupo
de crianças infectadas, tem um ajuste linear simples e em conseqüência disto sua velocidade de
crescimento é constante. Para o grupo de crianças não-infectadas, foi necessário acrescentar um
termo quadrático para explicar melhor esta relação. A velocidade de crescimento neste grupo tem
função linear.
O comprimento no grupo de crianças infectadas,
quando consideradas todas as medidas, não apresentou um bom ajuste considerando a função até o
nível quadrático, necessitando acrescentar um termo cúbico. Com base neste ajuste, a função de velocidade de crescimento é uma equação de segunda ordem.
Crescimento de crianças infectadas
Leandro-Merhi VA, et al.
Acrescentamos, dentro do grupo de crianças
infectadas, um outro grupo, excluindo-se aquelas que
foram a óbito. Isto provocou uma mudança no comportamento da curva de crescimento reduzindo de
um grau a ordem do polinômio. Assim, a velocidade
de crescimento passa a ser representada por uma
função linear.
No grupo de crianças não infectadas, o comprimento apresenta uma curva de crescimento de
segunda ordem e sua velocidade de crescimento
é linear.
Discussão e conclusão
A análise do crescimento de crianças filhas
de mães HIV+ revela os fatores sociais e afetivos
envolvidos nas famílias destas crianças. Crianças filhas de mães HIV+ são criadas em um ambiente altamente afetado pela doença e pelas circunstâncias que a acompanham. As crianças que
desenvolvem infecção tem um caminho de altos
e baixos dependendo da disponibilidade de tratamento e da resposta que cada paciente apresenta a esse tratamento. Atualmente dispomos
de novas drogas que podem interferir no curso
normal da evolução da doença.
Como o crescimento nessa faixa etária é extremamente susceptível a influências externas
e à doença, é de se esperar que uma doença
debilitante como a AIDS possa interferir de maneira bastante característica neste processo.
A falência de crescimento tem sido relatada
em 25 a 100% de crianças com infecção pelo
vírus da imunodeficiência humana 21,22 e está associada com redução significativa da sobrevida23.
Há evidências que uma variedade de padrões
de crescimento existem em crianças com AIDS,
as quais podem refletir o amplo espectro da doença. Em algumas crianças infectadas, anormalidades na velocidade de desenvolvimento da altura precedem alterações do peso, e podem repercutir na alteração da função endócrina24.
Em geral, crianças infectadas têm o mesmo
peso e comprimento de nascimento e não apresentam maior risco de prematuridade do que as
crianças não infectadas, mas que nasceram de
Pediatria (São Paulo) 2001;(1):17-26
mães infectadas14,16,25, embora outro estudo tenha constatado diferença entre os grupos 26.
Provavelmente, as anormalidades no desenvolvimento devem começar após o nascimento
e podem ocorrer rapidamente, mesmo nas crianças assintomáticas. Modelos de crescimento não
são sempre previsíveis, visto que o curso clínico
da doença é variável.
Neste estudo, as anormalidades do desenvolvimento nas crianças infectadas tornaram-se evidentes, antes dos 2 anos de idade, conforme
pode ser visto nas Figuras 1, 2, 3 e 4. Houve
deficit maior no peso do que na altura (Figura 3)
com baixa relação do peso para a altura. Estas
constatações são indicações de problemas
nutricionais mais agudos logo no início da doença. Excluindo-se os óbitos, entre as crianças
infectadas, observa-se que o comprimento apresenta um comportamento diferente (Figuras 5 e 6).
O mecanismo da falência do crescimento em
peso e comprimento em crianças infectadas com o
vírus da imunodeficiência humana não está muito
claro até o momento. Estudos mostram que não
foram encontrados dados consistentes sobre o crescimento e função endócrina em crianças infectadas
com o vírus da imunodeficiência humana27,28.
Não foi objeto deste estudo avaliar a influência do efeito do tratamento anti-retroviral administrado a 76% das crianças infectadas. Sabese que o tratamento com zidovudina tem efeito
positivo nas taxas de crescimento de peso29. A
observação de que as crianças infectadas estavam menores do que as não infectadas mostra
que não houve redução das diferenças de crescimento apesar do tratamento.
Nesta casuística, verificou-se que entre as crianças infectadas, 62% apresentaram início da
sintomatologia antes dos dois anos de idade. Tratase portanto de uma população com manifestações
precoces e evolução rápida, e de pior prognóstico.
As 71 crianças infectadas com o vírus da
imunodeficiência humana, seguidas no Serviço
de Imunodeficiência Pediátrica do HC-UNICAMP,
demonstraram comportamento do crescimento
em peso e comprimento comprometidos logo
desde o início.
23
Crescimento de crianças infectadas
Leandro-Merhi VA, et al.
Pediatria (São Paulo) 2001;(1):17-26
Constatou-se que há diferenças no crescimento
em peso e comprimento entre as crianças infectadas
e não infectadas. A avaliação do crescimento, por
meio da construção de curvas, permitiu a comparação entre esses 2 grupos, e ilustra essas diferenças de maneira bastante clara.
Em relação à curva do National Center for Health
Statitistics (NCHS)30, mesmo as crianças sororeversoras situaram-se entre os percentis 10 e 20.
No início da avaliação estavam mais próximos do
P10 e no final mais próximas do P20 (Figuras 1 e 3).
Os resultados do presente estudo mostram
que o comportamento das crianças sororeversoras segue o padrão das crianças normais
e que foi verificado um comportamento peculiar
para as crianças infectadas.
Pesquisas adicionais são necessárias para confirmar e avaliar o significado clínico do retardo de
crescimento em crianças infectadas com o HIV. É
importante salientar a necessidade da monitorização do crescimento, mesmo com as novas
terapias, para identificar, caracterizar e quantificar
o efeito da infecção pelo HIV no crescimento de
bebês e crianças.
Peso (kg)
Complemento (cm)
A falência de crescimento é relatada em aproximadamente 1/3 das crianças infectadas pelo
vírus da imunodeficiência humana, e está associada com a redução da sobrevivência. Em
crianças nascidas de mães infectadas pelo vírus, ocorre uma queda do ganho de peso nos
primeiros meses de vida, anterior ao declínio
do crescimento em comprimento. Nos sobreviventes de longo prazo, mantêm-se um baixo
ganho de crescimento.
Figura 1 – Gráfico do comprimento estimado no grupo de crianças infectadas e não infectadas.
Figura 3 – Gráfico do peso estimado no grupo de crianças
infectadas e não infectadas.
Velocidade (kg/mês)
Idade (meses)
Velocidade (cm/mês)
Idade (meses)
Idade (meses)
Figura 2 – Gráfico da velocidade de crescimento para o comprimento no grupo de crianças infectadas e não infectadas.
24
Idade (meses)
Figura 4 – Gráfico da velocidade de crescimento para o peso
no grupo de crianças infectadas e não-infectadas.
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Comprimento (cm)
Comprimento (cm)
Crescimento de crianças infectadas
Leandro-Merhi VA, et al.
Idade (meses)
Figura 5 – Gráfico do comprimento estimado no grupo de
crianças infectadas.
Idade (meses)
Figura 6 – Gráfico da velocidade de crescimento para o comprimento no grupo de crianças infectadas (excluindo óbitos).
Referências
1. World Health Organization. The current global situation
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Endereço para correspondência:
Dra. Vânia Aparecida Leandro-Merhi
Av. José Bonifácio, 1425 ap.72
CEP 13093-420 Campinas, SP- Brasil
Tel/Fax: (19)-3253-2610
E-mail: [email protected]
Recebido para Publicação: 21/08/2000
Aceito para Publicação: 10/12/2000
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