Caso Clínico Doença Reumática Hospital Regional da Asa Sul Escola Superior de Ciências da Saúde Internato em Pediatria Marcelo Alves Leonardo Rodrigues da Cruz Coordenação: Luciana Sugai www.paulomargotto.com.br Caso Clínico JSM, feminino, 14 anos, negra, natural de Santa Maria da Vitória (BA), residente e procedente de Águas Lindas(GO), estudante. QP: “Dor no joelho há 3 meses”. HDA: Criança apresentou início súbito de dor e edema em joelho direito há cerca de 3 meses.Quadro álgico era restrito à articulação, intenso, contínuo, piorando à movimentação, o que impedia a deambulação, e melhorando discretamente com uso de dipirona.Nega eritema local. Associou no mesmo período febre não aferida, intermitente, sem período de predominância, cedendo também com dipirona. Caso Clínico Nega odinofagia, lesões cutâneas, dispnéia, dor torácica.Procurou em diversas ocasiões o serviço local, sendo prescritos sintomáticos ou mesmo nada sendo feito em virtude da indisponibilidade de médicos. Persistiu com o quadro por 2 meses, quando há cerca de um mês, em consulta ambulatorial no HBDF, verificou-se INR de 6,34 e manutenção da artrite. Optou-se por internação, sendo tratada com oxacilina e ceftrixone, além de AINEs.Ocorreu melhora expressiva do quadro.Durante a internação, constatou-se também taquicardia persistente, sopro cardíaco e alteração de provas de atividade inflamatória. Paciente foi então encaminhada ao HRAS para continuar o tratamento. Caso Clínico Revisão de Sistemas: nada digno de nota Antecedentes Fisiológicos • Pré-natal: ?? • Nascida de parto normal (em domicílio), a termo, gestação sem intercorrências. • Apgar: ? Peso ao nascer: ? Comp:? PC:? • Aleitamento materno exclusivo até 2 meses de idade (total de 1 ano). • Nega alergia medicamentosa. • Desenvolvimento neuropsicomotor normal na infância. • Vacinação completa Caso Clínico Antecedentes Patológicos • Varicela aos 8 anos • Artrite aos 9 anos • Pneumonia aos 11 anos Antecedentes Familiares • Pais saudáveis • Três irmãos, todos mais novos, saudáveis • Nega consangüinidade Caso Clínico Hábitos de vida • Mora em casa de alvenaria com mais 4 pessoas, em local asfaltado, com rede elétrica e de esgotos. A família possui um cachorro. • Renda familiar: R$ 300,00 • Alimentação variada. Não há tabagista na casa. Caso Clínico • Exame Físico • PA: 110X50 mmHg FR: 24irpm FC: 80bpm • BEG, hipocorada (+\4+), hidratada, orientada, afebril ao toque • AR: MVF, sem ruídos adventícios • ACV: RCR 2T, 1ª bulha metálica em todos os focos, sopro diastólico em focos aórtico e aórtico acessório (3+\6+) irrradiando pra região axilar • Abdome: plano, normotenso, RHA presentes, palpação indolor,ausência de VMG • Extremidades: perfusão adequada, sem edema Caso Clínico Hemograma • Hb: 9,4 Ht: 29,1% Leuc: 6600 Segm: 61% Bast:--- Plaq: 511000 • PCR: 15,4 VHS: 90 Hemocultura: negativa Hipóteses diagnósticas Artrite Monoartrite Poliartrite Monoartrite Artrite séptica ( flogose intensa, toxemia) Artrite tuberculosa ( curso indolente) Artrite fúngica ( semelhante à tuberculosa) Artrite reativa ( Reiter) : tríade de conjuntivite, uretrite, artrite Hematológicas: hemoglobinopatias, hemofilia Artrite neoplásica ( artralgia migratória, queda do estado geral, próxima ao início da doença, fugaz AIJ pauciarticular (pico entre 2-3 anos, FR negativo, FAN pode ser positivo, uveíte anterior Poliartrite Febre reumática ( artrite, cardite,nódulos, eritema marginatum, coréia, infecção estreptocócica) Artrites virais ( simétrica, efêmera; fase prodrômica ou principal da doença; rubéola, parvovírus B19, hepatite B) Outras infecções ( bascterianas e parasitoses) LES juvenil ( distal, migratória , simétrica) Caso Clínico Cintilografia “Limítrofe para presença de cardite em atividade.” Ecodoppler “Derrame pericárdico mínimo.” DOENÇA REUMÁTICA Definição Seqüela não supurativa da infecção das vias aéreas superiores por estreptococo betahemolítico do grupo A Epidemiologia Mais freqüente na faixa de 5 a 15 anos de idade Em adultos, surge pela final da 2ª e início da terceira décadas de vida Acomete 3% dos indivíduos com faringite estreptócica sem tratamento Associada baixas condições sócio-econômicas Fisiopatologia Obrigatoriedade de faringoamigdalite estreptocócica Reação auto-imune Mimetismo molecular Resposta mediada por linfócitos T e B com resposta Th1 e Th2 Suscetibilidade em indivíduos com HLA DR4 e DR2 Manifestações Clínicas Sintomas gerais Sintomas geralmente se iniciam após 2 a 4 semanas da infecção estreptocócica Febre Artralgia Astenia Prostração Poliartrite migratória Acomete 70% dos pacientes com FR Assimétrica, ocorrendo em grandes articulações Surge de 2-4 semanas após infecção Duração de 2 a 4 semanas Resposta dramática a salicilatos Cardite Presente em 50% dos acometidos Determina o prognóstico da doença Mais comum em pré-escolares Trata-se de uma pancardite (endocardite, miocardite, pericardite). Cardite Cardite leve – taquicardia sinusal desproporcional à febre, hipofonese de B1, sopro discreto em FM, aumento do Δ PR Cardite moderada – acrescentam-se sinais de pericardite, sopros intensos, aumento de área cardíaca, sobrecargas ventriculares(ECG) Cardite grave – sinais de ICC Eritema Marginatum Presente em menos de 5% dos pacientes Rash máculo-papular, de extensão centrípeta, bordas eritematosas e centro claro, não pruriginoso Acomete tronco e partes proximais de membros Caráter migratório Nódulos subcutâneos Incomuns, tendo associação com cardite grave Surgem cerca de 3 semanas após a cardite Nódulos firmes, de diâmetro entre 0,5 a 2cm, localizados em faces extensoras, sobre tensão e couro cabeludo Duração de 1 a 2 semanas Coréia de Sydenham Manifestação tardia da FR (1 a 6 meses) Mais comum na faixa de 5-15 anos e sexo feminino Tríade clássica: movimentos involuntários, labilidade emocional e hipotonia Associação com distúrbios psiquiátricos Duração de 3 a 4 meses Coréia de Sydenham Coréia: movimentos involuntários, bruscos e sem propósito, presentes em extremidades e face Iniciam-se em mão e progridem para pés e face Hemicoréia Exame neurológico: hipotonia, mão em ordenha, disgrafia, miofasciculações e reflexos pendulares Diagnóstico Clínico-laboratorial Não há exame específico Diagnóstico Achados laboratoriais: VHS PCR Mucoproteínas Provas imunológicas: • ASLO, Anti-DNase B • FAN, fator reumatóide Diagnóstico Ecocardiograma ECG Radiografia de tórax Tratamento Erradicação do estreptococo β hemolítico do grupo A Tratamento das manifestações clínicas Tratamento Penicilina G benzatina, via IM, dose única Adultos: 1200000U Crianças < 25kg: 600000U Alternativas: Penicilina V oral 250/500mg, VO, 8/8 horas por 10 dias Eritromicina 40mg/kg/dia (2 a 3 tomadas) por 10 dias Tratamento Poliartrite, febre e sintomas gerais: Agentes antinflamatórios (Salicilatos) AAS 80 a 100mg/kg/dia Mantido em dose plena até cessação dos sintomas Redução em 2/3 da dose até normalização do VHS e PCR Tratamento Cardite Prednisona 1 a 2mg/kg/dia, VO, dose fracionada ( dose máxima: 60mg/dia) Dose plena por 15 dias Redução de 20 a 25% por semana Cardite grave: pulsoterapia com metilprednisolona + drogas inotrópicas Tratamento Coréia de Sydenham Haloperidol 1mg/dia Aumentar 0,5mg a cada 3 dias até boa resposta Dose máxima: 5mg/dia Tratamento por 3 meses Alternativa: ácido valpróico( 30mg/kg/dia) Profilaxia Primária Mesmas drogas usadas na erradicação do estreptococo Swab de orofaringe de contatos próximos Profilaxia Secundária Penicilina G benzatina 1200000U(ou 600000U) IM de 21/21 dias Exposição de alto risco - intervalo de 15/15 dias Alternativas ( diariamente) • Eritromicina • Sulfadiazina Profilaxia Referências Bibliográficas • Braunwald et al, Harrinson Medicina Interna, 2002 • Serrano Jr et al, Cardiologia prática, São Paulo, 2007 • Manual de Condutas clínicas cardiológicas, Benedito Maciel e José Marin Neto, São Paulo, 2005 • Diretriz de Febre reumática da sociedade brasileira de pediatria, 2002