A Completude do Ordenamento Jurídico Acadêmico: Eduardo Machado de Medeiros Orientador: Reinaldo Pereira e Silva ©Copyright 1997, by Linjur Todos os direitos reservados. All rights reserved COMPLETUDE • Por completude entende-se a propriedade pela qual um ordenamento jurídico tem uma norma para regular qualquer caso • Exclusão de toda a situação na qual não pertençam ao sistema nenhuma das duas normas que se contradizem A Completude do Ordenamento Jurídico 2/45 Tipos de incompletude • Por exuberância: caso das antinomias. Resolvidas pela purificação: eliminação das normas exuberantes ou antinomias • Por deficiência: caso das lacunas • Resolvidas pela integração: eliminação da deficiência de normas ou de lacunas A Completude do Ordenamento Jurídico 3/45 Coerência: Exigência ou necessidade? • É uma exigência, no sentido que num ordenamento podem existir antinomias • É uma necessidade quando o juiz deve julgar todo caso de acordo com uma norma do sistema A Completude do Ordenamento Jurídico 4/45 A Completude como Necessidade • Quando o juiz é obrigado a julgar todas as controvérsias que se apresentarem a seu exame • Quando deve julgá-las com base em uma norma pertencente ao sistema • Quando pode-se julgar pela equidade, não é uma necessidade, pois o ordenamento é completável a cada momento A Completude do Ordenamento Jurídico 5/45 Dogma da Completude • Enunciado no Corpus iuris, ao qual não há nada a acrescentar ou retirar • Onipotência do Estado reverte-se sobre o Direito de origem estatal, não sendo reconhecido outro Direito • Admitir que este não era completo significava introduzir um Direito concorrente A Completude do Ordenamento Jurídico 6/45 Fetichismo da Lei • Ater-se escrupulosamente aos Códigos • Desenvolvido a cada grande codificação • Característico da escola da exegese A Completude do Ordenamento Jurídico 7/45 Escola da Exegese • Opõe-se à escola científica • Admiração incondicional pela obra realizada pelo legislador através da codificação • Crença de que o Código não possui lacunas • Encarnação do dogma da completude jurídica A Completude do Ordenamento Jurídico 8/45 Pressupostos do dogma da completude • Proposição maior de cada raciocínio jurídico deve ser uma norma jurídica • Essa norma deve ser sempre uma lei do Estado • Essas normas devem formar uma unidade A Completude do Ordenamento Jurídico 9/45 Escola do Direito Livre • Direito está cheio de lacunas • Confiança no poder criativo do juiz para preenchê-las • Surge e se desenvolve rapidamente , em oposição à escola da exegese • Sustentada, entre outros, por Ehrlich A Completude do Ordenamento Jurídico 10/45 Desenvolvimento da Escola do Direito Livre • À medida que a codificação envelhecia, descobriam-se as insuficiências • Revolução Industrial: promove rápidas transformações sociais, fazendo as codificações parecerem anacrônicas, acentuando seu envelhecimento A Completude do Ordenamento Jurídico 11/45 Ciências Sociais • Acompanham a divergência Direito constituído/realidade social • Sociologia: representou a destruição do mito do Estado A Completude do Ordenamento Jurídico 12/45 Crítica do Estadismo Jurídico • Gény contrapunha à exegese dos textos legislativos a livre pesquisa científica • “O Direito é uma coisa muito complexa e móvel para que um indivíduo ou uma assembléia ,(...), possam pretender fixar de uma só vez os preceitos de modo a satisfazer todas as exigências da vida jurídica.” (Gény) A Completude do Ordenamento Jurídico 13/45 Reações Positivistas • Direito livre: representava uma nova encarnação do Direito Natural • Admitir a livre pesquisa do Direito significava quebrar a barreira do princípio da legalidade • Fez-se necessário demonstrar que a completude era uma característica constitutiva de todo ordenamento A Completude do Ordenamento Jurídico 14/45 Espaço Jurídico Vazio • Primeira reação à escola do direito livre • Toda norma jurídica representa uma limitação à livre atividade humana • Fora dela podemos fazer o que quisermos A Completude do Ordenamento Jurídico 15/45 Espaço Jurídico Pleno/Vazio • Atividade humana regulada por normas jurídicas: espaço jurídico pleno • Atividade humana livre: espaço jurídico vazio • Até onde o Direito alcança com as suas normas, evidentemente não há lacunas; onde não alcança, há atividade indiferente ao Direito, não lacunas A Completude do Ordenamento Jurídico 16/45 Crítica ao Espaço Jurídico Vazio • Nasce da falsa identificação do jurídico com o obrigatório • O que não é obrigatório (permitido ou lícito) não é juridicamente irrelevante • Romano chama esta liberdade de esfera daquilo que não é lícito nem ilícito A Completude do Ordenamento Jurídico 17/45 Liberdade Protegida • É garantida contra eventuais impedimentos por parte de terceiros • Não-protegida: licitude do uso da força privada • O fato da liberdade não ser protegida não torna essa situação juridicamente irrelevante • Aí está a contraposição ao espaço jurídico vazio A Completude do Ordenamento Jurídico 18/45 Norma Geral Exclusiva • Segunda reação positivista à escola do Direito livre • Ordenamentos: não apresentam lacunas porque não há espaço jurídico vazio • Direito: nunca falta A Completude do Ordenamento Jurídico 19/45 Norma Geral Exclusiva • Todos os comportamentos nãocompreendidos na norma particular são regulados por uma norma geral exclusiva • Norma geral exclusiva: exclui todos os comportamentos que não sejam aqueles previstos pela norma particular A Completude do Ordenamento Jurídico 20/45 Dois Tipos de Normas • Uma série de normas particulares dirigidas a estabelecer, para os casos por elas particularmente considerados, dadas limitações • Uma norma geral dirigida a excluir qualquer limitação para todos os outros casos não particularmente considerados A Completude do Ordenamento Jurídico 21/45 Crítica à Norma Geral Exclusiva • Num ordenamento jurídico não existem somente as duas normas mencionadas, mas também uma outra norma, inclusiva e geral • É a norma geral inclusiva A Completude do Ordenamento Jurídico 22/45 Norma Geral Inclusiva • Uma norma segundo a qual, no caso de lacuna, o juiz deve recorrer às normas que regulam casos parecidos ou matérias análogas • Sua característica é a de regular os casos não-compreendidos na norma particular, mas semelhantes a eles, de maneira idêntica A Completude do Ordenamento Jurídico 23/45 Duas Saídas ao Intérprete • Aplicar a norma geral exclusiva e excluir o caso não-previsto da disciplina do caso previsto (argumentum a contrario) • Aplicar a norma geral inclusiva e incluir o caso não-previsto na disciplina do caso previsto (argumentum a simili) • No caso de lacuna, portanto, há duas soluções possíveis A Completude do Ordenamento Jurídico 24/45 Verificação da Lacuna • A lacuna existe • O ordenamento deixou impreciso qual das duas soluções é a pretendida • Falta um critério para a escolha de qual das duas regras gerais deve ser aplicada A Completude do Ordenamento Jurídico 25/45 Sintetizando... • O sistema pode ser incompleto • Entre a norma particular inclusiva e a norma geral exclusiva introduz-se a norma geral inclusiva, que estabelece uma zona intermediária entre o regulamentado e o não-regulamentado • Nesta direção tende a penetrar o ordenamento, de forma indeterminável A Completude do Ordenamento Jurídico 26/45 Lacunas Ideológicas • São a falta de uma solução satisfatória , de uma norma justa, que se desejaria que existisse, mas não existe • Só o ordenamento jurídico natural não deveria tê-las A Completude do Ordenamento Jurídico 27/45 Ordenamento Considerado Em Si Próprio • O problema do ordenamento jurídico, considerado em si próprio, ser completo ou incompleto, não tem sentido • O ordenamento jurídico em sua totalidade não pertence à categoria das coisas das quais se possa predicar a completude ou a incompletude A Completude do Ordenamento Jurídico 28/45 Ordenamento Comparado ao Ideal • O problema de ser completo ou incompleto o ordenamento jurídico comparado ao ideal refere-se às lacunas ideológicas • Elas não interessam aos juristas A Completude do Ordenamento Jurídico 29/45 Ordenamento Como Parte de um Todo • É o único caso em que se pode falar de lacunas no sentido próprio da palavra • Podem ser ideológicas: oposição entre aquilo que a Lei diz e aquilo que deveria dizer para se adequar ao espírito do sistema • Para Brunetti, essas três maneiras de encarar as lacunas demonstram que este é um problema sem sentido A Completude do Ordenamento Jurídico 30/45 Lacunas Próprias e Impróprias • Lacuna própria: lacuna do sistema ou dentro do sistema • Lacuna imprópria: deriva da comparação do sistema real com um sistema ideal • O que as distingue é a forma pela qual podem ser eliminadas: a imprópria através da formulação de novas normas; a própria, mediante as leis vigentes A Completude do Ordenamento Jurídico 31/45 Lacunas Objetivas e Subjetivas • Subjetivas: dependem de motivo imputável ao legislador • Objetivas : dependem de causas que provocam um envelhecimento dos textos legislativos A Completude do Ordenamento Jurídico 32/45 Lacunas Voluntárias e Involuntárias • São subdivisões das subjetivas • Involuntárias são aquelas que dependem de um descuido do legislador, que faz parecer regulamentado um caso que não é, etc. • Voluntárias são aquelas deixadas de propósito, devido a sua complexidade, confiadas à interpretação do juiz A Completude do Ordenamento Jurídico 33/45 Lacunas Voluntárias são Verdadeiras? • As lacunas voluntárias não são verdadeiras • A lacuna em sentido próprio existe quando se presume que o intérprete decidiu com uma dada norma do sistema e o sistema não oferece solução A Completude do Ordenamento Jurídico 34/45 Lacunas Praeter Legem e Intra Legem • As primeiras existem quando as regras, expressas para serem muito particulares, não compreendem todos os casos que podem apresentar-se a nível dessa particularidade • As segundas têm lugar quando as normas são muito gerais e revelam vazios ou buracos que caberá ao intérprete preencher A Completude do Ordenamento Jurídico 35/45 Como Completar o Ordenamento? • Constatadas as lacunas, como completar o ordenamento? • Podemos recorrer a dois métodos diferentes: a heterointegração e a autointegação A Completude do Ordenamento Jurídico 36/45 Heterointegração • Recurso a ordenamentos diversos • Recurso a fontes diversas daquela que é a dominante (identificada,nos ordenamentos que temos sob os olhos, com a Lei) • O tradicional método de heterointegração mediante recurso a outros ordenamentos consistia, no que se refere ao juiz, a recorrência ao Direito Natural A Completude do Ordenamento Jurídico 37/45 Autointegração • Consiste na integração cumprida através do mesmo ordenamento, no âmbito da mesma fonte dominante • Não recorre a outros ordenamentos, com o mínimo recurso a outras fontes A Completude do Ordenamento Jurídico 38/45 Reenvio a Outros Ordenamentos • Ordenamentos anteriores : recurso ao Direito romano • Ordenamentos contemporâneos: citação de normas de outro ordenamento estatal ou Direito Canônico A Completude do Ordenamento Jurídico 39/45 Tipos de Heterointegração • Recurso ao costume, como fonte subsidiária da lei • Recurso ao poder criativo do juiz (Direito Judiciário) • Recurso às opiniões dos juristas A Completude do Ordenamento Jurídico 40/45 Tipos de Autointegração • Utilização da analogia • Utilização dos princípios gerais do Direito A Completude do Ordenamento Jurídico 41/45 Analogia • Procedimento pelo qual se atribui a um caso não-regulamentado a mesma disciplina que a um caso regulamentado semelhante • No Direito intermédio, era considerada o procedimento mais eficaz para executar a assim chamada extensio legis A Completude do Ordenamento Jurídico 42/45 Analogia/ Interpretação Extensiva • Onde a extensão analógica é proibida, a interpretação extensiva é lícita • O efeito da analogia é a criação de uma nova norma; o da interpretação extensiva é a extensão de uma norma para casos nãoprevistos por ela • Com a interpretação, redefinimos um termo • Na analogia, vamos de uma norma a outra A Completude do Ordenamento Jurídico 43/45 Princípios Gerais do Direito • Normas fundamentais ou generalíssimas do sistema • Normas como todas as outras • Princípio geral, como norma, pode suprir uma lacuna A Completude do Ordenamento Jurídico 44/45 • • • • • • Universidade Federal de Santa Catarina Centro de Ciências Jurídicas Departamento de Direito Luiz Adolfo Olsen da Veiga Aires José Rover Florianópolis, novembro de 1997 A Completude do Ordenamento Jurídico 45/45