Superior Tribunal de Justiça
RECLAMAÇÃO Nº 4.491 - MG (2010/0130345-7)
RELATORA
RECLAMANTE
ADVOGADO
RECLAMADO
INTERES.
ADVOGADO
:
:
:
:
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
BFB LEASING S/A - ARRENDAMENTO MERCANTIL
GLAUBER MARTINS MIRANDA XAVIER E OUTRO(S)
PRIMEIRA TURMA RECURSAL CÍVEL DO JUIZADO
ESPECIAL DE BETIM - MG
: ODAIR JOSÉ DA SILVA
: SHEILLA SOUZA TRINDADE E OUTRO(S)
EMENTA
RECLAMAÇÃO.
JUIZADOS
ESPECIAIS.
PEDIDO
LIMINAR.
DIVERGÊNCIA ENTRE ACÓRDÃO PROLATADO POR TURMA
RECURSAL ESTADUAL E A SÚMULA 381/STJ. PERIGO DE DANO.
SOBRESTAMENTO
DOS
PROCESSOS
VERSANDO
SOBRE
CONTROVÉRSIA SEMELHANTE À DOS AUTOS, LIMITADO ÀS AÇÕES
EM TRÂMITE PERANTE A TURMA RECURSAL RECLAMADA.
1. É vedado aos julgadores reconhecer, com fundamento no art. 51 do CDC e sem
pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. Súmula
381/STJ.
2. A paralisação de milhares de processos que tratem da revisão de cláusulas
contidas em contratos bancários, em razão de liminar concedida por esta Corte,
pode trazer ainda mais prejuízos à integridade do sistema judicial, pois
compromete a fluidez dos feitos e retarda sua solução. Embora haja um número
imponderável de outras ações que cuidam de questão idêntica à dos autos, a
suspensão destes processos a âmbito nacional é inviável, especialmente em
virtude dos imperativos de política judiciária e do relevante interesse social em
causa.
Liminar deferida para determinar a suspensão de todos os processos que cuidem
da revisão de contratos bancários em trâmite perante a 1ª Turma Recursal do
Juizado Especial de Betim – MG, até o julgamento final da presente Reclamação.
DECISÃO
Trata-se de reclamação com pedido de liminar ajuizada por BFB
LEASING S/A ARRENDAMENTO MERCANTIL objetivando a reforma de acórdão
proferido pela PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE
BETIM – MG.
Ação: de revisão contratual ajuizada por ODAIR JOSÉ DA SILVA.
Alega o autor que celebrou contrato de crédito com a ora reclamante, a fim de possibilitar
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a aquisição de um veículo Palio ELX 1.0. A reclamante, contudo, passou a efetuar a
cobrança de valores que não foram objeto do contrato inicialmente celebrado entre as
partes, razão pela qual o consumidor pleiteou a revisão judicial do financiamento
pactuado (fl. 26 e-STJ).
Sentença: julgou parcialmente procedente o pedido, a fim de
reconhecer a abusividade de algumas cláusulas do contrato de adesão firmado pelo autor,
condenando ainda a reclamante ao pagamento da quantia de R$ 2.149,35 (fls. 59/60
e-STJ).
Recurso inominado: a reclamante alega que o autor, em seu pedido
inicial, não especificou as cláusulas do contrato que mereceriam revisão, razão pela qual
a sentença recorrida, ao declarar a abusividade de itens do contrato, contrariou a Súmula
381/STJ (fls. 60/71 e-STJ).
Acórdão: a PRIMEIRA TURMA RECURSAL DO JUIZADO
ESPECIAL CÍVEL DE BETIM – MG negou provimento ao recurso, nos termos da
seguinte ementa (fls. 92/94 e-STJ):
“REVISÃO DE CONTRATO – APLICAÇÃO DO CDC
POSSIBILIDADE – CLÁUSULAS ABUSIVAS – ANULAÇÃO
POSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA NA ÍNTEGRA”
–
–
Reclamação: pugna pela concessão de liminar, a fim de suspender “a
tramitação de todos os processos nos quais tenha sido estabelecida a controvérsia, ou, no
mínimo, determinar a suspensão dos efeitos da decisão combatida proferida pela 1ª
Turma Recursal de Betim do Juizado Especial de Brumadinho – MG, nos autos do
Recurso Inominado n.º 0088742.34.2010.8.13.0027.” Requer ainda o provimento da
presente reclamação, a fim de que seja reformado o acórdão proferido pela 1ª Turma
Recursal do Juizado Especial Cível de Betim - MG (fls. 1/19 e-STJ).
É o relatório. Decido.
I. Do processamento desta reclamação
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A presente reclamação deriva da decisão proferida no julgamento dos
EDcl no RE 571.572-8/BA pelo Pleno do STF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de
14.09.2009, no sentido de que “enquanto não for criada a turma de uniformização para os
juizados especiais estaduais, poderemos ter a manutenção de decisões divergentes a
respeito da interpretação da legislação infraconstitucional federal”, tendo, por
conseguinte, determinado que, até a criação de órgão que possa estender e fazer
prevalecer a aplicação da jurisprudência do STJ aos Juizados Especiais Estaduais, “a
lógica do sistema judiciário nacional recomenda se dê à reclamação prevista no art. 105,
I, f, da CF, amplitude suficiente à solução deste impasse”.
A reclamação, da forma como prevista nos arts. 187 e seguintes do
RISTJ, contudo, não foi concebida para servir de instrumento de uniformização de
jurisprudência. Diante disso, a Corte Especial, em questão de ordem por mim suscitada,
determinou a elaboração de uma resolução delineando uma sistemática de processamento
específica para as reclamações desta natureza. Editou-se, então, a Resolução nº 12,
publicada em 14.12.2009, que se aplica ao presente julgamento.
II. O pedido liminar
Pretende a reclamante a concessão de liminar para que “seja suspensa a
tramitação de todos os processos nos quais tenha sido estabelecida a mesma controvérsia,
ou, no mínimo, determinar a suspensão dos efeitos da decisão combatida proferida pela
1ª Turma Recursal de Betim do Juizado Especial de Brumadinho - MG” (fl. 17 e-STJ).
A concessão da liminar exige a demonstração do periculum in mora,
que se traduz na urgência da prestação jurisdicional, bem como a caracterização do fumus
boni juris, consistente na plausibilidade do direito alegado.
Para tanto, está o Relator autorizado a proceder a um juízo prévio e
perfunctório de viabilidade do pedido principal. Apresentando-se este manifestamente
inadmissível ou contrário à jurisprudência dominante de Tribunal Superior, o seu
aparente insucesso prejudica a concessão da liminar.
Na hipótese em exame, a pretensão da reclamante está resguardada pela
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jurisprudência desta Corte (Súmula 381/STJ), segundo a qual é vedado ao julgador
declarar abusivas as cláusulas de contrato bancário, sem que haja requerimento específico
formulado pelo consumidor nesse sentido.
Esta posição foi melhor desenvolvida no julgamento do REsp
1.061.530/RS, de minha relatoria, realizado nos moldes implementados pelo art. 543-C
do CPC. Fiquei vencida com relação ao reconhecimento ex officio da abusividade das
cláusulas de contratos bancários e fiz questão de registrar em meu voto a minha
divergência, no sentido de “admitir a revisão de ofício, pelos julgadores das instâncias
ordinárias, pois estes julgamentos, muitas vezes, limitam-se a reconhecer proteções ao
consumidor que já estão pacificadas pela jurisprudência do STJ.”
A maioria dos i. Ministros integrantes da 2ª Seção, contudo, assentou
que aos juízes não é permitido “julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido
expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários.” Assim, ressalvada a minha
reserva com relação a este entendimento, foi editada a Súmula 381/STJ.
Patente, portanto, a divergência entre o acórdão prolatado pela 1ª Turma
Recursal do Juizado Especial de Betim – MG e o entendimento jurisprudencial já
consolidado pelo STJ.
No que tange ao periculum in mora, não se nega a razoabilidade do
argumento utilizado pela reclamante para solicitar a suspensão liminar dos processos nos
quais esteja sendo discutida a mesma questão, pois “a manutenção do acórdão proferido
pela 1ª Turma Recursal do Estado de Minas Gerais é passível de gerar prejuízos de ordem
pública face ao grande número de pedidos de revisão de contratos bancários levados ao
crivo do Poder Judiciário e a possibilidade de julgamentos diversos dos passificados (sic)
pela instância superior” (fl. 15 e-STJ). A paralisação de milhares de processos por conta
de liminar eventualmente concedida por esta Corte, entretanto, poderia trazer ainda mais
prejuízos à integridade do sistema judicial, pois comprometeria a fluidez dos feitos e
retardaria sua solução.
Assim, embora haja um número imponderável de outras ações nas quais
está sendo postulada a revisão judicial de cláusulas contidas em contratos bancários, é
igualmente verdade que a suspensão destas ações em âmbito nacional é inviável. É
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preciso considerar, aqui, os imperativos de política judiciária, especialmente face ao
relevante interesse social em causa.
Verifica-se, além do mais, que a grande maioria das Turmas Recursais
tem prestigiado o posicionamento adotado por esta Corte, conscientes do fundamental
papel desempenhado pelo STJ na uniformização da jurisprudência infraconstitucional.
Por essa razão, não vislumbro a necessidade de determinar o sobrestamento de todos os
outros processos que versem sobre controvérsia semelhante à dos autos em âmbito
nacional, sendo todavia aconselhável prescrever a suspensão das ações que objetivem a
revisão de cláusulas em contratos bancários ora em trâmite perante a 1ª Turma
Recursal.do Juizado Especial de Betim – MG.
Forte em tais razões, defiro a medida liminar pleiteada, para, com
supedâneo no art. 2º, I, da Resolução 12/09 do STJ, determinar a suspensão de todos os
processos que cuidem da revisão de contratos bancários em trâmite perante a 1ª Turma
Recursal do Juizado Especial de Betim – MG, até o julgamento final da presente
Reclamação.
Oficie-se (i) o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Minas
Gerais, (ii) o Corregedor Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais e (iii) o presidente
da Turma Recursal prolatora do acórdão reclamado, comunicando o processamento desta
reclamação e solicitando informações.
Dê-se ciência ao autor da ação principal, Odair José da Silva, a fim de
que se manifeste, querendo, no prazo de 05 (cinco) dias.
Publique-se edital no Diário da Justiça, com destaque no noticiário do
STJ na internet, a fim de cientificar os interessados sobre a instauração da presente
reclamação e possibilitar-lhes a manifestação nos autos, no prazo de 30 (trinta) dias (art.
2º, III, da Resolução 12/2009 do STJ).
Decorrido o prazo para informações, remetam-se os autos ao Ministério
Público Federal, para parecer, no prazo de 5 (cinco) dias.
Publique-se. Intimem-se.
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Brasília (DF), 23 de agosto de 2010.
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora
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