BIBLIOTECA DA
Raphael Gomes, advogado: A renovação das concessões de distribuição de energia
elétrica
As condições estabelecidas no Decreto nº 8.461/2015 e a decisão cautelar do TCU
Raphael Gomes, advogado, para a Agência CanalEnergia, Artigos e Entrevistas
06/07/2015
Em 03.06.2015, em atendimento ao disposto na Lei nº 12.783/2013 (Lei de conversão
da Medida Provisória nº 579/2012), foi publicado o Decreto nº 8.461/15 (“Decreto
8.461/15”), que regulamenta a forma e as condições para renovação dos Contratos
de Concessão das Distribuidoras de energia elétrica.
Em razão da importância do tema, será exposto breve histórico para, em seguida,
serem analisados os principais aspectos do Decreto 8.461/15 e da minuta de Termo
Aditivo elaborada pela ANEEL.
Ao final, serão analisados os termos e efeitos da decisão do Tribunal de Contas da
União - TCU que determinou, cautelarmente, a não celebração dos Termos Aditivos
aos Contratos de Concessão.
BREVE HISTÓRICO
Em 17.09.2012, foi publicado o Decreto nº 7.805/2012, que regulamentou a Medida
Provisória nº 579/2012 (convertida na Lei nº 12.783/15), a qual foi tema de intensos
debates do setor elétrico em razão das mudanças estruturais que trouxe ao tratar da
renovação das concessões de geração, transmissão e distribuição.
Em relação às concessões de geração e transmissão (cujas primeiras renovações
aconteceram ainda em 2012/2013), a citada Medida Provisória e o Decreto º 7.805/12
trouxeram regras detalhadas sobre as condições para a continuidade e o novo regime
a ser implantado.
Quanto às concessões de distribuição, foi estabelecido, apenas, que “A partir de 12
de setembro de 2012, as concessões de distribuição de energia elétrica alcançadas
pelo art. 22 da Lei nº 9.074, de 1995, poderão ser prorrogadas, a critério do
poder concedente, uma única vez, pelo prazo de até 30 (trinta) anos, de forma a
assegurar a continuidade, a eficiência da prestação do serviço, a modicidade
tarifária e o atendimento a critérios de racionalidade operacional e econômica”.
Ficou estabelecido, ainda, que a prorrogação da concessão somente poderia ocorrer
para aquelas concessionárias que expressamente realizassem o requerimento junto à
ANEEL, o que deveria ocorrer até o dia 15.10.2012.
Verificou-se, então, que 42 (quarenta e duas) concessionárias de distribuição
realizaram o requerimento perante a ANEEL. Destas concessões, 36 (trinta e seis)
BIBLIOTECA DA
vencem no próximo dia 07.07.2015, 5 (cinco) vencem em 2016 e 1 (uma) vence em
2017.
Em 03.06.2015, foi publicado o Decreto 8.461/15 regulamentando as condições para
renovação das concessões de distribuição, tendo a ANEEL, em 10.06.2015, aberto
Audiência Pública nº 038/2015 para discutir a minuta do termo aditivo aos contratos
de concessão das Distribuidoras, cujo prazo para contribuições terminará em
13.07.2015.
PRINCIPAIS ASPECTOS DO DECRETO 8.461/15 E DA MINUTA DE TERMO ADITIVO
PROPOSTA PELA ANEEL
Conforme citado anteriormente, a Lei nº 12.783/13 estabeleceu que o Poder
Concedente possui a atribuição de decidir pela renovação das concessões de
distribuição de energia elétrica ou pela realização de licitação para celebração de
novos contratos de concessão a serem firmados com os vencedores do certame.
Nos termos do Decreto 8.461/15, a opção adotada pelo Poder Concedente foi
renovar as concessões vincendas mediante o estabelecimento de critérios/metas
a serem seguidos/atingidos pelas concessionárias, sob pena de extinção da
concessão.
Em outras palavras, o mencionado decreto atribui ao Ministério de Minas e Energia –
MME a prerrogativa de prorrogar as concessões de distribuição vincendas, desde que
haja aceitação expressa dos termos do aditivo contratual pela atual concessionária.
Entretanto, a mera aceitação dos termos do aditivo não garante à concessionária a
permanência na concessão durante os 30 anos previstos na Lei.
Para manter a concessão, deverá ser atendida uma série de condições – elencadas no
art. 1º do Decreto -, as quais passamos a analisar à luz de suas premissas e da minuta
de Termos Aditivo em discussão na Audiência Pública nº 038/2015.
(i) “Eficiência com relação à qualidade do serviço prestado”
O primeiro critério previsto no Decreto relaciona-se com a qualidade do serviço ao
consumidor de energia elétrica.
Para mensurar essa condição, a ANEEL deverá fiscalizar a continuidade do serviço,
utilizando indicadores relacionados com a frequência e duração das interrupções.
Objetivando dar maior efetividade e ferramentas de controle para a ANEEL, a minuta
do Termo Aditivo prevê que, na hipótese do descumprimento dos padrões de
qualidade estabelecidos pela Agência Reguladora, poderá haver a proibição da
distribuição de dividendos e/ou juros sobre capital próprio pela concessionária,
conforme regulação a ser emitida posteriormente.
Ainda em relação à qualidade do serviço, a ANEEL propõe que as Distribuidoras: (a)
elaborem e mantenham plano de manutenção das instalações de distribuição; (b)
cumpram metas de universalização do serviço de distribuição – obrigação que já
existia nas normas setoriais; (c) subsidiem e participem do planejamento do Setor
Elétrico e da elaboração dos planos e estudos de expansão do SIN; e (d)
BIBLIOTECA DA
disponibilizem à ANEEL acesso remoto a todos os sistemas utilizados na prestação dos
serviços.
Finalmente, foi prevista a criação de regulamento específico para os últimos 5
(cinco) anos da concessão, para que não haja declínio nos investimentos e
manutenções pela Distribuidora, preservando-se, assim, a qualidade e continuidade
dos serviços para o consumidor.
O §4 do art. 1º c/c o art.4º do Decreto 8.461/15 determina, ainda, que, caso a
Distribuidora venha a descumprir suas metas anuais por dois anos consecutivos ou
apenas uma das metas anuais a partir do 5º ano da renovação, a concessão poderá
ser extinta.
(ii) “eficiência em relação à gestão econômico-financeira”
Nesse aspecto, o Decreto determina que a ANEEL realize a mensuração por meio de
indicadores que “apurem a capacidade de a concessionária honrar seus compromissos
econômico-financeiros de maneira sustentável”.
As metas relacionadas a esse critério, também deverão ser alcançadas pelas
Distribuidoras no prazo máximo de 5 anos, contado a partir do primeiro ano
subsequente à renovação da concessão.
Com base em interlocuções com outros setores regulados – nacionais e estrangeiros -,
bem como utilizando o aprendizado do caso do “Grupo Rede” , a ANEEL propõe a
implementação de uma série de mecanismos e ferramentas visando à instituição de
parâmetros mínimos de governança que resultem em maior transparência e
responsabilidade dos administradores e controladores.
Como exemplos das mudanças propostas pela ANEEL, temos: (a) inclusão de cláusula
específica nos contratos de concessão para tratar de deveres regulatórios e padrões
mínimos a serem adotados pelos órgãos administrativos e de controle internos das
concessionárias; e (b) instituição de deveres e obrigações para o sócio controlador,
relacionados à transparência e, até mesmo, realizar aportes financeiros em
determinadas situações, objetivando o atendimento à sustentabilidade econômica e
financeira da concessão.
Na hipótese de descumprimento de suas obrigações, o sócio controlador poderá, até
mesmo, ter limitada sua participação (bem como de seu grupo empresarial) em novos
empreendimentos do Setor Elétrico.
(iii) “modicidade tarifária”
Sendo um dos pilares da nova estrutura do modelo do Setor Elétrico, normatizada em
2004 por meio da Lei nº 10.848, a modicidade tarifária consta, por óbvio, como um
dos critérios a serem atendidos pelas concessionárias interessadas na renovação de
seus contratos de concessão.
Nesse aspecto, importante lembrar que, atualmente, o modelo do setor de
distribuição adota a regulação por incentivos e não mais a regulação pelo custo,
como ocorria até a década de 1980.
BIBLIOTECA DA
Assim, a ANEEL propõe uma série de inovações no âmbito da AP 038/2015,
objetivando detalhar o regime tarifário, conforme se verifica da Cláusula 7ª da
minuta de termo aditivo ao contrato de concessão.
Ainda sobre a modicidade tarifária, importante registrar a aparente divergência de
opiniões veiculadas pela mídia nas últimas semanas. De um lado, o Ministério de
Minas e Energia - MME tem exposto seu posicionamento no sentido de que os custos
para adequação aos critérios do Decreto 8.461/15 não devem ser repassados para
a tarifa, constituindo-se como ônus do concessionário para manutenção da
concessão.
De outro lado, a ANEEL já manifestou seu entendimento de que tais critérios
caracterizam-se como obrigações novas, de modo que seus custos devem ser
repassados para a tarifa, desde que devidamente fiscalizados e controlados.
(iv) “racionalidade operacional e econômica”
As Distribuidoras terão, segundo o Decreto 8.461/15, também 5 anos para adaptar-se
às condições previstas no Termo Aditivo aos Contratos de Concessão.
Para as Distribuidoras com mercado consumidor inferior a 500GWh/ano, o §6º do art.
1º do Decreto 8.461/15 estabelece importantes mudanças, dentre as quais, pode ser
destacada a redução gradual (20% ao ano) do desconto na Tarifa do Uso do Sistema
de Distribuição destas concessionárias.
Esse desconto para as concessionárias com mercado consumidor inferior a
500GWh/ano é custeado, desde 2013, pela Conta de Desenvolvimento Energético –
CDE e possui como objeto mitigar, para esses consumidores, os impactos da perda da
economia de escala possível nas grandes Distribuidoras.
DECISÃO DO TCU QUE IMPEDE A ASSINATURA DOS ADITIVOS AOS CONTRATOS DE
CONCESSÃO
Conforme já mencionado, no dia 07.07.2015 termina o prazo da concessão de 36
concessionárias de distribuição.
Entretanto, no dia 12.06.2015, o Tribunal de Contas da União - TCU determinou que
o MME abstenha-se de assinar os aditivos aos Contratos de Concessão, conforme
previsto no Decreto 8.461/15.
Como fundamento da decisão, o Ministro José Múcio cita que, anteriormente à
publicação do Decreto 8.461/15, o TCU havia requerido ao MME informações sobre as
alternativas a serem adotadas em razão do término do prazo das concessões de
distribuição.
Após manifestação do MME, o TCU entendeu que deveriam ser apresentados
esclarecimentos adicionais, tendo em vista que não haveria elementos suficientes
para fundamentar que a opção adotada (renovar as concessões mediante imposição
de metas) seria mais vantajosa do que as outras duas possíveis: (a) licitar novamente
todas as concessões; ou (b) prorrogar somente as concessões que já atendessem às
metas desejadas.
BIBLIOTECA DA
Com a publicação do Decreto 8.461/15, objetivando que não fosse concretizada a
renovação das concessões antes do parecer final do TCU, o Ministro Relator decidiu
cautelarmente por determinar que o MME não realize a assinatura dos aditivos aos
Contratos de Concessão, porém permitiu que todos os demais atos preparatórios
sejam realizados.
Dessa forma, a Audiência Pública nº 038/2015 permanece tendo seu normal
andamento, aguardando o deslinde da questão junto ao Tribunal de Contas.
Preocupação justificada dos atuais concessionários de distribuição é a conclusão do
processo perante o TCU.
Considerando que o prazo de grande parte das concessões termina no próximo dia 07
de julho, resta instalada insegurança jurídica em relação ao prazo de vigência dessa
decisão, bem como sobre as consequências de o TCU vir a decidir que o regramento
instaurado pelo Decreto 8.461/15 não é aquele que atende “os princípios
constitucionais e legais aplicáveis à Administração Pública”.
Raphael Gomes é sócio do escritório Demarest Advogados
Download

BIBLIOTECA DA Raphael Gomes, advogado: A renovação das