DATAJURIS™ ID Nº Processo Decisão-Tipo Origem Data Publicação Sexta-feira, 08 de Maio de 2015 355490 12102/2015 Acórdão Tribunal Central Administrativo Sul 2015-04-30 Acórdão publicado em www.datajuris.pt A Caixa Geral de Aposentações, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue: 1.Com todo o respeito que nos merece o Tribunal, que é muito, não se compreende como pode ser ordenado à CGA que pague uma pensão a quem, por um lado, é aposentado e, por outro, veio informar que continuará a exercer funções de notário. 2.O notário é, pois, um profissional liberal. No entanto, só tem razão de existir porque é um oficial público que representa o Estado e, em nome deste, assegura o controlo da legalidade, conforma a vontade das partes à lei e dá garantia de autenticidade aos atos em que intervém, como delegatário da fé pública - a qual é uma prerrogativa exclusiva do Estado. 3.A vertente pública da sua função está sempre presente e por isso este profissional atua na dependência do Ministério da Justiça em tudo o que diga respeito à fiscalização e à disciplina assumindo tal importância para o sistema de administração da justiça que o legislador entendeu que o melhor seria regular o seu exercício. 4.O exercício de funções notariais, de interesse público e relevância pública, está sujeito ao regime de incompatibilidades previsto no artigo 78.° e 79.° do Estatuto da Aposentação. 5.A apreciação sobre se ao Autor é aplicável o regime de incompatibilidades previsto nos artigos 78.° e 79.° do Estatuto da Aposentação, ou não, deverá ser feita na acção principal, e não na cautelar, salientando-se, de resto, que o Tribunal a quo apenas esboçou uma exígua fundamentação sobre a aplicabilidade do regime de incompatibilidades aos notários. Texto 6.Como melhor explanado supra em Alegações, foram descuradas as características basilares de instrumentalidade e de provisoriedade das providências cautelares, não estando cumpridos, no caso vertente, nenhum dos requisitos de que depende a adopção da medida cautelar peticionada, designadamente o fumus boni iuris, cuja verificação, nas providências cautelares antecipatórias, deverá ser bastante mais exigente (cfr. Acórdão do STA, de 2006-10-18, proferido no âmbito do recurso de revista n° 857/06). 7.Acresce que ao antecipar o juízo da causa principal o decisor deve fundamentar, esse juízo, o que, infelizmente, não sucedeu na presente sentença, uma vez que, nem se mostram preenchidos os requisitos de que depende a antecipação desse juízo. * O Recorrido contra-alegou como segue: 1.Alega a Exma Sra representante da Caixa Geral de Aposentações que a Exma. Sra. Juiz a quo proferiu Sentença apesar de " .. não estar cumprido nenhum dos requisitos de que depende a adopção da peticionada providência cautelar,.." 2.Também referiu que "..ordenou à CGA o pagamento de uma pensão de aposentação ao Autor, sem ter em consideração que o exercício de funções notariais, de interesse e relevância pública, se encontra sujeito ao regime de incompatibilidades 3.Efectivamente, o Autor requereu que, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 369°, n°.l do CPC, fosse dispensado de intentar a acção principal. 4.As partes foram notificadas para, querendo, se pronunciarem sobre a antecipação do juízo sobre a causa principal, nos termos do art. 121° do CPTA, mas apenas o A. se pronunciou, tendo manifestado a sua concordância. 5.Ou seja, a CGA não se opôs à antecipação do juízo sobre a causa principal, porque certamente esperava o ganho da causa, mas como a Sentença não lhe foi favorável, vem agota "Ventre contra fadam próprio" litigar com manifesta má-fé. Acresce que; © DATAJURIS fadam próprio" litigar com manifesta má-fé. Acresce que; 6.Motivo pelo qual, nessa parte, bem fundamentou a Exma. Sra. Juiz a quo quando referiu " Está em causa a suspensão do pagamento da pensão de aposentação do Requerente. A decisão que viesse a ser tomada no âmbito do processo cautelar, fosse ela no sentido de adopção ou não de uma providência cautelar em que determinasse o pagamento provisório da pensão, produziria, pela sua natureza, sempre efeitos nefastos e tendencialmente definitivos na esfera jurídica da parte vencida. Trata-se de uma situação em que se impõe a antecipação urgente do conhecimento do mérito da causa principal, pelo que se procede a esse conhecimento no âmbito do presente processo cautelar, nos termos do art. 121°, n°. l do CPTA". 7.Além disso quanto ao conhecimento do mérito da cansa, bem julgou a Exma. Sra. Juiz a quo ao "anular a decisão que suspendeu o pagamento da pensão de aposentação ao A. e condenar a requerida a proferir novo acto em que decida retomar o pagamento das mesmas desde a data em que o deixou de efectuar." Com efeito. 8.Motivo pelo qual, bem fundamentou a Exma. Sra. Juiz a quo quando referiu que " Os notários no exercício da sua profissão, enquanto profissionais liberais, não estão em tal situação, prevista no n°.l do art. 78° do Estatuto da Aposentação pois não trabalham para essas pessoas e serviços e, logo, não auferem remuneração por parte deles. Trabalham por conta própria. Logo, não se lhes aplica a proibição de cumulação do recebimento da pensão de aposentação com o exercício da profissão liberal de Notário..A CGA Tendo deferido o pedido de aposentação, terá de pagar a respectiva pensão, pois a situação em que o requerente se encontra não preenche a previsão das normas que constam dos artigos 78° e 79° do E.A.". * Com substituição legal de vistos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência. * Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade: AO Requerente exerceu, enquanto funcionário público, as funções de Notário - cfr. fls. 20 a 30 do PA.; BA partir de 01/03/2006, passou a exercer a profissão de Notário no seu cartório privado, como profissional liberal - cfr. fls. 20 a 30 do PA.; CRequereu que lhe fosse paga a pensão de aposentação antecipada - fls. 49 do PA.; DEm 13/02/2014, foi proferido pela Direcção da Caixa Geral de Aposentações despacho que atribui ao Requerente o direito à aposentação, fixando-se o valor da respectiva pensão em 2.890,49 € doe. de fls. 16; EEm 14/05/2014 foi-lhe pago o valor de 1.659,54€ a título de pensão - doe. de fls. 19; FAtravés de Ofício datado de 20/05/2014 a CGA comunicou ao Requerente que procedia à suspensão do pagamento da sua pensão e pediu-lhe a restituição do valor de 1.659,54€ anteriormente pago a título de pensão, alegando que o Requerente continuava a exercer funções notariais, pelo que estava sujeito ao regime de incompatibilidades previsto nos artigos 78.° e 79.° do Estatuto da Aposentação - doe. de fls. 18. DO DIREITO Do ponto de vista adjectivo toda a fundamentação de direito do requerimento cautelar é conformada segundo o bloco normativo do Código de Processo Civil, desde o pedido de que seja a providência © DATAJURIS decretada sem audiência da Requerida, artº 366º nº 1 CPC, requerendo que o Tribunal “dispense o Requerente do ónus de propositura da acção principal”, artº 369º nº 1 CPC e finalizando pelo pedido múltiplo (anular a guia para pagamento para o mês de Maio, anular a suspensão de pagamento da aposentação e creditar o valor pecuniário que referente à pensão de aposentação) ao abrigo do artº 368º CPC. Tem-se por seguro que o Recorrido não desconhece que existe um Código de Processo nos Tribunais Administrativos aprovado pela Lei 15/2002 de 22.02, subsequentemente alterado e aditado conforme legislação publicada nos termos gerais de direito aplicáveis aos actos normativos, sendo que a aplicabilidade do regime processual cível faz-se por remissão em via supletiva e não substitutiva, cfr. artº 1º CPTA. Não faz, por isso, qualquer sentido o pedido do Requerente, ora Recorrido, relativo à inversão do contencioso, que é próprio do regime dos processos cautelares regulados no CPC. No âmbito do regime do artº 121ºCPTA do que se trata é de decidir a título definitivo e urgente o mérito da questão que, em situação de normalidade, apenas viria a ser decidida na acção principal. Não significa isto que se procede à inversão do ónus sobre quem impende a interposição da acção principal, prevista no âmbito do regime dos procedimentos cautelares regulados pelo CPC (artº 369º), pois tal regime é aqui inaplicável. De modo que é no domínio do regime do CPTA que o presente recurso será objecto de apreciação e decisão, mediante o respectivo objecto fixado pelas conclusões. 1.providências conservatórias e antecipatórias - artº 112º nº 1CPTA; Para os efeitos do disposto no artº 112º nº 1 CPTA importa dilucidar se o pedido deduzido pelo Requerente ora Recorrido na petição inicial cautelar, nos seguintes termos, a)anular a guia/documento para pagamento referência 4………..- mês de extracto: Maio de 2014; b)anular a suspensão do pagamento da pensão de aposentação do requerente; c)creditar o valor mensal de €1659,54 referente ao mês de Junho de 2014 e seguintes na conta do Requerente de depósitos à ordem do B……. --- referente à pansão de aposentação devida mensalmente ao mesmo (sem prejuízo do que vier a resultar da revisão do valor da pensão). se reconduz a providências de carácter conservatório do status quo ou antecipatório do efeito pretendido na causa principal, sabido que todas as providências são mero instrumento preliminar ou incidental desta – cfr. artº 113º nº 1 CPTA. Para o efeito, e no tocante ao requisito do periculum in mora - seja o perigo de infrutuosidade ou o perigo de retardamento da sentença da causa principal - do ponto de vista funcional adere-se à doutrina que distingue três tipos de providências, consoante o objecto (causa de pedir e pedido) vise assegurar a protecção do status quo alegado pelo Requerente ou, diferentemente, vise antecipar interina e provisóriamente o direito que esse Requerente pretende ver declarado no processo principal. Segundo esta sistemática, os mencionados tipos de providência cautelar são os seguintes: §conservatórias “de asseguramento de um direito ou facto” §de regulação provisória de situações “mediante uma resolução inovadora que se destina a durar até que se obtenha uma decisão definitiva” §antecipatórias “dos efeitos da resolução definitiva”. Do ponto de vista estrutural, atento o conteúdo das medidas a decretar pelo Tribunal, conjugados o periculum in mora e a relação de instrumentalidade da providência com a causa principal, adere-se à doutrina que identifica quatro subespécies de tutela cautelar, a saber: §tutela cautelar relativa à prova §tutela cautelar reparatória e de garantia §tutela cautelar antecipatória de conteúdo assegurador §tutela cautelar antecipatória de conteúdo inovador As duas primeiras não tocam nunca no mérito da relação substancial controvertida. Inversamente, © DATAJURIS as duas últimas traduzem uma decisão que já se intromete no objecto da causa principal, tendo entre si de distintivo o facto de anteciparem diferentes tipos de efeitos da sentença principal. Explicitando, “(..) ambas actuam como as forças de protecção destinadas a manter as posições até à chegada da parte mais forte do exército, a fim de evitar a este perdas de posições que lhe custariam a reconquista (..) a instrumentalidade das providências cautelares exige que o juiz cautelar proceda a um juízo de viabilidade e a um cálculo de probabilidade sobre qual poderá ser o conteúdo da futura sentença final, já que tem de existir uma exacta correspondência entre os conteúdos e efeitos das duas decisões, a principal e a acessória, pelo menos interinamente (..) (..) pese embora o amplo poder de polícia judiciária do juiz cautelar, este tem o seu poder discricionário rigorosamente limitado por dois princípios. Um primeiro (..) O juiz cautelar tem o dever de, durante a antecipação, limitar a sua fantasia ao adiantar os efeitos correspondentes ao conteúdo hipotético da futura sentença de mérito (..) O segundo princípio (..) decorre da proibição ao juiz cautelar de decidir a causa antecipadamente ao juiz da causa principal, (..) no sentido de definitivamente anular o objecto da causa principal (..). De acordo com o entendimento da doutrina actual, em suma, a antecipação só é legítima se a incidência ou intromissão do juiz cautelar no âmbito da relação substancial, produzir efeitos jurídicos provisórios, (..) o que pressupõe que tais efeitos podem ser reversíveis e anuláveis pelo juiz da causa principal. ” (1). De acordo com este enquadramento, “(..) integram o tipo de decisões cautelares com conteúdo funcionalmente assegurador (..) as que intimem o requerido para que se abstenha de certa conduta. Os processos cautelares que desemboquem em decisões com este conteúdo, de desistat, são, por regra, acessórios de processos pelos quais se pretende a condenação do réu na prestação de facto negativo (..) (..) quando o juiz cautelar condena, por antecipação, o réu a praticar um comportamento, de fazer ou não fazer, ou a entregar uma coisa, sendo este o conteúdo do objecto imediato da causa principal, então, o juiz está a antecipar a solução da causa. E o objecto da antecipação é o hipotético regulamento para essa controvérsia principal. (..)” (2) Embora se trate de processos autónomos, “(..) as medidas cautelares não são um fim em si mesmas, pois elas nascem, por assim dizer, ao serviço de um processo definitivo, o que exige uma avaliação perfunctória quanto à probabilidade de êxito do recurso principal. Assim, em princípio, só deve ser concedida a providência à parte que no processo goze da aparência do bom direito, isto para que a demora do processo não beneficie a parte que não tem razão” (3). É o que expressamente se dispõe no artº 383º nº 4 CPC, aplicável em sede administrativa por remissão genérica do artº 1º CPTA, excepcionada pela não despicienda novidade de “convolação do processo cautelar em tutela final urgente” no artº 121º CPTA, observadas as condicionantes substantivas e adjectivas nele estatuídas (4).. 2.intimação para adopção de conduta – providência cautelar antecipatória (periculum in mora); Do que vem dito e atento o pedido e a causa de pedir no caso concreto conclui-se que a natureza das providências peticionadas se subsume no conceito de providência antecipatória de conteúdo assegurador. De facto, analisado o periculum in mora nas duas vertentes funcional e estrutural, temos que o Requerente ora Recorrido pretende antecipar a regulação jurídica do objecto (total ou parcial, não sabemos) da causa principal, no sentido de que não é legalmente admissível a ordenada reposição da verba que lhe foi paga pelo Recorrente no âmbito da relação de subscrição com a Caixa Geral de Aposentação em correlação com a opção pelo novo regime do notariado ex vi artº 107º nº 4, artºs. 113º nºs. 1 a 7 e 107º nº 1 do Estatuto do Notariado e regime de incompatibilidades constantes dos artºs. 78º e 79º do Estatuto da Aposentação. Tudo no intuito de, até à decisão definitiva no processo principal, obstar à suspensão de pagamento da pensão antecipada e reposição do valor creditado.- cfr. alíneas E e F do probatório. Em nosso critério, o objecto da requerida providência configura a necessidade de o juiz cautelar antecipar a probabilidade do juízo de legalidade e/ou licitude das reposição e suspensão ordenadas e consequente condenação do ora Recorrente Caixa Geral de Aposentações a processar a reposição dos valores de pensão suspensos a suspender a decisão de reposição do valor creditado referente ao mês de Maio/2014, matéria a decidir em sede da relação substancial controvertida nos autos principais e que constitui o “hipotético regulamento da controvérsia principal” antecipado no domínio deste procedimento cautelar. © DATAJURIS * Da inclusão do caso concreto no domínio das providências antecipatórias decorre, como é sabido, a exigência de “(..) um fumus boni iuris mais qualificado, na medida em que, existindo riscos de antecipação definitiva, o juiz cautelar deve antecipar a apreciação do mérito da causa de forma a evitar decisões antecipadas erradas (..)” (5). 3.aparência do bom direito (fumus boni iuris) - artº 112º nº 2 f) CPTA; Ainda que nem as Partes nem em sede de fundamentação de sentença se integre o caso dos autos no elenco típico adjectivo das providências nominadas, em nosso critério a hipótese concreta tem cabimento na hipótese legal de providência especificamente prevista para a abstenção de conduta que a Administração tenha adoptado ou se proponha adoptar, atento o disposto no artº 112º nº 2 f) CPTA. * O caso “(..) em que a lei permite que, por decisão judicial e a título de providência cautelar, um Tribunal Administrativo interrompa a actuação normal típica da Administração Pública, impedindo-a de adoptar uma conduta que ela própria se propõe adoptar. É um caso típico em que se impede a prática de um acto administrativo que a Administração se propõe adoptar. (..) O interessado sabe que a Administração projecta praticá-lo, sabe qual é o conteúdo do acto, sabe quais são os seus fundamentos, sabe quais são as ilegalidades que porventura o afectam, sabe que a Administração se propõe praticar o acto porque lho comunicou ao realizar a formalidade da audiência prévia, e portanto tem todas as condições para interpor uma providência cautelar e tentar obter do Tribunal que impeça a Administração de praticar o acto, antes mesmo de ela o praticar. (..)”(6) A propósito deste artº 112º nº 2 f) CPTA convém ter consciência que “(..) se os Tribunais começarem a aplicar sem qualquer critério este medida e começarem a impedir, cautelarmente embora, a prática de actos administrativos a torto e a direito, é certo e sabido que, mais semestre menos semestre, o legislador revoga esta disposição. (..)” Portanto “(..) é preciso que os órgãos de aplicação do direito não estraguem esta preciosidade. Porque este é um presente precioso que é colocado nas mãos dos cidadãos e dos seus advogados, mas que pode ser completamente estragado se, quais criancinhas na idade infantil, começarem a brincar mal com este brinquedo, e começarem a aplicá-lo a torto e a direito sem critério. (..)” (7) * Tomando boa nota da doutrina exposta e respectiva exortação à “prudente prudência”, no caso concreto de decretamento de uma providência de intimação no âmbito do artº 112º nº 2 f) CPTA, significa que o juízo de probabilidade especialmente acrescida sobre o fumus boni iuris nos termos do artº 120º nº 1 c) CPTA no tocante à ilegalidade da actuação administrativa, radica, a nosso ver, na própria complexidade jurídica subjacente à articulação do regime de incompatibilidades previsto nos artºs. 78º e 79º do Estatuto da Aposentação com o regime decorrente da privatização do notariado, nomeadamente aos notários que exerçam o seu direito de opção pelo novo regime e consequente conjugação dos artsº. 107º nºs 2 e 4 , 113º nºs. 1 a 7 do Estatuto do Notariado. 4.convolação do processo cautelar em processo principal urgente - artº 121º nº 1CPTA; No item 7 das conclusões e no tocante ao regime do artº 121º nº 1 CPTA a Recorrente levanta a questão de que “nem se mostram preenchidos os requisitos de que depende a antecipação desse juízo”. São dois os requisitos cumulativos estatuídos no artº 121º nº 1 CPTA. © DATAJURIS O primeiro consiste em que haja “manifesta urgência na resolução definitiva do caso”, que “não se compadece com a adopção de uma simples providência cautelar” que, como decorre da lei, tem tutela provisória. Diz-nos a doutrina que “(..) No ordenamento italiano, matriz do instituto da antecipação do juízo principal, vem expressamente prevista a admissibilidade do decretamento de uma providência cautelar no período que medeia a decisão de antecipação e o julgamento da causa principal, em virtude de não fazer sentido que nos casos de “manifesta urgência”, que justificam este instituto, se pudesse frustar, afinal, a utilidade da sentença final. O pressuposto “a situação não se compadece com a adopção de uma simples providência cautelar” (artº 121º nº 1) deve, por conseguinte, ser interpretado como se referindo à sua insuficiência e não à sua impossibilidade (..)” em ordem à tutela judicial efectiva e economia processual. (8) Vejamos, pois, se, no caso concreto, o eventual decretamento das providências requeridas envolvem uma tutela insuficiente da posição jurídica do Recorrido. Cabe começar pela fundamentação constante da sentença sob recurso. * Em ordem a sustentar a decisão de convolar o processo cautelar num processo principal urgente (artº 121º CPTA) e decidir a título definitivo e urgente o peticionado, fundamentou-se em sede de sentença como segue: “(..) Está em causa a suspensão do pagamento da pensão de aposentação do Requerente. A decisão que viesse a ser tomada no âmbito do processo cautelar, fosse ela no sentido de adopção ou não adopção de uma providência cautelar em que se determinasse o pagamento provisório da pensão, produziria, pela sua natureza, sempre efeitos nefastos e tendencialmente definitivos na esfera jurídica da parte vencida. Trata-se de uma situação em que se impõe a antecipação urgente do conhecimento do mérito da causa principal, pelo que se procede a esse conhecimento no âmbito do presente processo cautelar, nos termos do art° 121º,nº l do CPTA. (..)”. * Ou seja, fundamentou-se a antecipação do conhecimento de mérito com base no juízo jurídico de o decretamento das providências requeridas envolver uma violação da proibição de a sentença cautelar anular definitivamente o objecto da causa principal, por traduzir efeitos tendencialmente definitivos na esfera jurídica da caixa Geral de Aposentações. Todavia, tal não é verdade; em caso de improcedência da causa principal por sentença transitada o eventual decretamento da providência no sentido de Caixa Geral de Aposentações, ora Recorrida, a)anular a guia/documento para pagamento referência 4…………..- mês de extracto: Maio de 2014; b)anular a suspensão do pagamento da pensão de aposentação do requerente; c)creditar o valor mensal de €1659,54 referente ao mês de Junho de 2014 e seguintes na conta do Requerente de depósitos à ordem do B….. --- referente à pensão de aposentação devida mensalmente ao mesmo (sem prejuízo do que vier a resultar da revisão do valor da pensão). não impede que o beneficiário, ora Recorrido, de proceder à devolução junto da Caixa Geral de Aposentações de todos os valores indevidamente recebidos a título de aposentação, inclusivamente por via executiva a impulso da citada Entidade Administrativa. O que significa que perde sustentação jurídica o argumento de a decisão positiva cautelar prefigurar a inutilidade do objecto da acção principal. * De modo que, cabe retomar a lógica jurídica da doutrina citada e saber se, como sustenta a Recorrente no item 7 das conclusões, “nem se mostram preenchidos os requisitos de que depende a antecipação desse juízo”. No regime do artº 121º nº 1 CPTA e dependente da casuística de cada caso concreto, a convolação do processo cautelar em processo urgente principal repousa no juízo de verificação de insuficiência da providência cautelar requerida para responder à tutela da posição jurídica do Requerente, fundada na aparência do bom direito alegado. Que no caso dos autos se traduz no fumus boni iuris em sede de providência antecipatória, no © DATAJURIS sentido de receber a pensão de aposentação em acumulação com os réditos decorrentes do exercício profissional liberal a partir de 01.03.2006 e não lhe sendo aplicável o regime dos artºs. 78º e 79º do estatuto da Aposentação, como sustenta. Neste enquadramento jurídico, a eventual decisão cautelar de procedência mostra-se totalmente suficiente para tutela da posição jurídica invocada pelo ora Recorrido. Ponto é que resultem preenchidos os requisitos cautelares do fumus boni iuris, nas duas vertentes exigidas legalmente em sede administrativa – diversamente do que ocorre em sede adjectiva cível da aparência do bom direito e da ilegalidade provável da conduta da Administração expressa no acto jurídico praticado de ordenar a suspensão do pagamento das pensões e ordenar a devolução do valor recebido.- do segundo requisito do periculum in mora e, por último, da ponderação de interesses, se for caso disso. * Pelo que vem de ser dito no caso dos autos não resulta provada a urgência do julgamento antecipado por convolação do processo cautelar em processo principal urgente, cumprindo revogar a decisão neste sentido proferida em sede de sentença Neste sentido, procede a questão trazida a recurso no item 7 das conclusões, mostra-se prejudicado o conhecimento das demais suscitadas nos itens 1 a 6, referentes à decisão de mérito em sede de julgamento principal antecipado. Na medida em que não houve pronúncia sobre o mérito do peticionado na acção cautelar por via da antecipação do julgamento principal, devem os autor baixar ao Tribunal a quo para retoma da instância e emissão de julgado, se nada a tal obstar. *** Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar procedente o recurso e revogar a sentença recorrida na parte em que decretou o julgamento antecipado da causa principal, mostrando-se prejudicado o conhecimento das questões sobre este trazidas a recurso. Custas a cargo do Recorrido. Lisboa, 30.ABR.2015 (Cristina dos Santos) ……………………………………………………………… (Pedro Marchão) ………………………………………………………………… (Nuno Coutinho) …………………………………………………………………. (1) Isabel Fonseca, Introdução ao estudo sistemático da tutela cautelar no processo administrativo, Almedina/ 2002, págs. 130/134; no mesmo sentido, Vieira de Andrade, A justiça administrativa, Almedina/2004, 5ª edição, págs. 306/309, 318/319. (2) Isabel Fonseca, Introdução ao estudo…, págs. 123 e 125; Abrantes Geraldes, Temas da reforma de processo civil – III vol.; Procedimento cautelar comum, pág. 109, nota 138. © DATAJURIS (3) Fernanda Maçãs, Reforma do contencioso administrativo – O debate universitário, Vol. I, Coimbra Editora/2003, págs. 459/460. (4) Mário Aroso de Almeida, O novo regime do processo nos tribunais administrativos, Almedina/2003, págs. 263/266. (5) Isabel Fonseca, Introdução ao estudo…, pág.120; no mesmo sentido, Fernanda Maçãs, Reforma…, pág. 462 e notas (23) e (24); Mário Aroso de Almeida, O novo regime do processo … pág. 262. (6) Freitas do Amaral, As providências cautelares no novo contencioso administrativo, CJA nº 43, pág.12. (7) Freitas do Amaral, As providências…, págs. 12 e ss.. (8) Ana Gouveia Martins, Algumas questões sobre a concessão de providências cautelares no âmbito dos procedimentos de formação dos contratos, CJA nº 85, págs.13 e 14. © DATAJURIS