A LEI DE ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA NO ORDENAMENTO JURIDICO GUINEENSE E PORTUGUÊS (Perspetiva Comparada) Curso de doutoramento em direito Disciplina: direito público comparado Docente: Professor Doutor João Caupers Discente: Maria Do Céu S. Monteiro Lisboa, 2012/2013. SUMÁRIO Introdução A arbitragem como meio alternativo de resolução de conflitos e sua inserção no contexto da crise Considerações gerais e regulamentação na Guiné e em Portugal A Convenção de Arbitragem A Constituição do Tribunal Arbitral O Procedimento/funcionamento do Tribunal Arbitral A Decisão Arbitral A Impugnação O Reconhecimento e execução das sentenças Conclusão Referências Bibliográficas DELIMITAÇÃO DO TEMA O presente estudo vai-se focar sobre a Convenção de Arbitragem mas não tem por objetivo a análise de todo o regime da convenção de arbitragem mas apenas do seu conteúdo e dos seus efeitos sobretudo nas vertentes de cláusula compromissória e do compromisso arbitral. A ideia é dar a conhecer a Lei guineense de arbitragem voluntária - LAV - regulada pelo Dec. Lei nº.9/2000, enfatizando a convenção de arbitragem, tentando estabelecer alguns vasos comunicantes com a Lei portuguesa de arbitragem voluntária - LAV - mas também diferenças não raras vezes substanciais, sobretudo se comparado com o novo diploma aprovado pela Lei nº. 63/2011 de 14 de Dezembro, em vigor a partir de 14 de Março de 2012. DELIMITAÇÃO DO TEMA Outra restrição decorre de se considerar apenas a arbitragem voluntária de questões de direito privado, com exclusão da arbitragem necessária ou obrigatória e da arbitragem de litígios em que estejam em causa apenas questões de direito público, pois a LAV guineense não contempla estas modalidades. Por outro lado, procurarei abordar a questão, cingindo-me apenas à arbitragem doméstica, deixando de fora a arbitragem internacional, evitando assim alargar em demasia o objeto de estudo. I. A ARBITRAGEM COMO MEIO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO DE LITIGIOS «O princípio constitucional de amplo acesso à justiça, sendo um direito social fundamental, deve merecer na sua conceção mais ampla de acesso à justiça, a envolvência e criação de alternativas aos tribunais, utilizando procedimentos mais simples e/ ou julgadores mais informais, nomeadamente, o juízo arbitral dentro das reformas dos tribunais». Mauro CAPELLETI e Brayant GARTH (2002) – Acesso à Justiça. Tradução e Revisão – Ellen Gracie Northfleet, Edições – Sérgio António Fabris. Porto Alegre/ 1988, p. 81 e sega I. A ARBITRAGEM COMO MEIO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO DE LITIGIOS Esta alternativa, continua Capelleti, tenderia a reduzir os custos tanto para as partes como para o Estado dada as delongas e despesas frequentemente caraterísticas dos litígios e por outro lado reduziria as barreiras de custas para as partes e, pela utilização de julgadores mais ativos e informais, beneficiar substancialmente as partes mais fracas, propiciando maior facilidade de acesso a muitas pessoas. I. A ARBITRAGEM COMO MEIO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO DE LITIGIOS Capelleti, á semelhança duma parte significativa da doutrina portuguesa, nomeadamente o Barrocas, o Júdice, a Mariana França Gouveia, o Dário Moura Vicente, o Miguel Cancela de Abreu, a Cátia Marques Cebola, o Carlos Ferreira da Almeida, o Morais Leitão, o Lebre de Freitas entre outros, comungam da ideia de que a arbitragem deve ser encarada como meio alternativo de resolução de litígios. I. A ARBITRAGEM COMO MEIO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO DE LITIGIOS O surgimento dos meios de resolução alternativa de litígios está em certa medida, relacionado com a crise do Direito e da Justiça. Aliás, desta crise global, que não é apenas uma crise financeira, nem tão pouco apenas do Direito e da Justiça mas geral e do funcionamento do sistema: I. A ARBITRAGEM COMO MEIO ALTERNATIVO DE RESOLUÇÃO DE LITIGIOS já o Professor Caupers falava há 13 anos atrás, dizendo que a “crise é um pouco como o teatro, pois está em crise praticamente desde que a conheceu e que começava a ser tão natural uma justiça em crise, como um comboio atrasado ou uma estrada engarrafada”. João Caupers (2000), in “Justiça em Crise? Crises da Justiça”. Ob. Coletiva sob Organização de António Barreto (caminhos da memória;25) Publicações Dom Quixote, Lda. P. 221-227. Para a Prof. Mariana França Gouveia, deve buscar-se a razão do nascimento dos meios de resolução alternativa de litígios em dois lugares diferentes: Em primeiro lugar, na crise do direito e da justiça oficial e, Em segundo lugar, no crescente desejo do cidadão em participar na resolução dos seus conflitos. A Lei da Arbitragem Voluntária no Ordenamento Jurídico Guineense e Português: Decreto-lei nº. 9/2000, de 02 de Outubro Lei nº. 63/2011, de 14 de Dezembro II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL Os Estados guineense e português têm reconhecido e fomentado iniciativas privadas de justiça, como a arbitragem, tendo sido fortalecido, em relação a Portugal com a nova LAV, de 14 de Março de 2012 e em relação á Guiné com uma nova LAV de 2008, aprovada pela ANP, mas que nunca chegou a entrar em vigor, por razões que confesso desconhecer. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL Como vimos, os meios de resolução alternativa de litígios são parte integrante dos sistemas de justiça hodiernos, sendo impensável pensa-los hoje sem os incluir. No entanto, no que tange à Guiné, o seu sucesso só acontecerá plenamente quando fizer parte da cultura social. O que não sendo para já uma realidade, começa sem dúvida a dar os primeiros passos. No plano normativo, existe significativos avanços mas no plano naturalístico, ainda não se vislumbram assinaláveis adesões. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL Numa primeira abordagem, releva sublinhar que, a LAV guineense a par da sua manutenção face à vigência do Ato Uniforme sobre arbitragem organizada no âmbito do Tratado da OHADA (Organização para a Harmonização em África do Direito de Negócios – nomenclatura francesa), têm sido suscitadas dúvidas sobre a constitucionalidade orgânica e material do Decreto-Lei nº.9/2000, de 02 de Outubro, diploma que estabelece o regime jurídico do processo de arbitragem voluntária na Guiné-Bissau. Com efeito, tem-se entendido e defendido a posição de que a competência para legislar, nesta matéria tão sensível da área da justiça, se encontra atribuída exclusivamente à Assembleia Nacional Popular e não ao Governo. Pelo que, estaríamos perante uma matéria do âmbito da reserva absoluta da Assembleia Nacional Popular. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL Sem pretensão aqui e agora de contribuir para a polémica, quer doutrinal quer jurisprudencial, sempre se dirá que a única fonte jurídica interna de arbitragem voluntária na ordem jurídica guineense é o já mencionado Decreto-Lei nº. 9/2000, de 02 de Outubro, apesar d’alguns doutrinários nacionais afirmarem que a previsão da arbitragem se remonta aos tempos da colonização portuguesa. Por outro lado, não existe qualquer previsão constitucional relativamente à Arbitragem contrariamente ao que se passa em Portugal: Artigo 209.º n.º 2, da CRP. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL O direito de acesso á justiça é um direito constitucionalmente protegido no ordenamento jurídico guineense: artigo 32.º, faltando porém a previsibilidade da alternativa á justiça do Estado, revestir-se de dignidade constitucional. Contudo, importa referir que apesar desta omissão, a preocupação do legislador guineense não parece apartar-se de outras que se manifestam em circunstâncias análogas na experiência comparada. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL Essas experiências explicam-se na urgência de difusão por via da regulamentação de procedimentos complementares de resolução de litígios que se caraterizam pela simplicidade, pelo baixo custo, pela confidencialidade, pela celeridade e eficácia, e que possibilitem, simultaneamente, à Guiné-Bissau enfrentar os desafios de intensificação das suas relações económicas e comerciais, internas e internacionais. Relativamente às fontes jurídicas internacionais, no plano multilateral, destacam-se o Ato Uniforme sobre arbitragem voluntária organizada no âmbito do Tratado da OHADA (assinado a 17 de Outubro de 1993, em PortLouis (Ilhas Maurícias) - e a Lei-Modelo da CNUDCI, de 21 de Junho de 1985, sobre a arbitragem comercial internacional. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL Em Portugal, A arbitragem voluntária como já referi supra, encontra-se regulada pela Lei 63/2011, de 14 de Março (adiante designada abreviadamente por LAV). Por seu turno, a arbitragem institucionalizada - realizada através de centros de arbitragem de caráter permanente e pré-existentes ao litígio, reconhecidos e “certificados” pelo Ministério da Justiça - encontra-se regulada pela LAV, e bem assim, por outros diplomas legislativos. É uma das modalidades que não existe na Guiné, a par da arbitragem necessária, da administrativa, do consumo, etc. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL A Lei de Arbitragem Voluntária Portuguesa, reveste-se dum carácter moderno. Assume-se na sua exposição de motivos a ideia fundamental de que “a constituição e o funcionamento dos tribunais arbitrais devem desvincular-se de toda a desnecessária ou desrazoável intervenção dos tribunais estaduais, reconhecendo-se às partes, dentro dos limites fixados na lei, o poder e o dever de forjar soluções requeridas para a correta atuação da instituição arbitral”. A intervenção mínima ou residual do Tribunal Estadual e a consagração do princípio da autonomia do Tribunal Arbitral são os seus dois princípios basilares, expressamente reconhecidos na sua Exposição de Motivos. Uma das críticas mais frequentes que se encontrava relativamente a anterior LAV na doutrina portuguesa, estava relacionada com a excessiva judicialização dos Tribunais Arbitrais. II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL “Pretende-se com a nova LAV para além de dotar o país de uma lei mais moderna, conforme com a lei-modelo da Uncitral e em linha com as soluções adotadas com as mais modernas legislações e regulamentos de instituições arbitrais, dar novo alento à arbitragem em Portugal, tornando este país mais atrativo como potencial sede de arbitragens internacionais, nomeadamente no que respeita a conflitos entre países lusófonos”. Sofia Martins (2012), A Nova Lei Da Arbitragem Voluntária Portuguesa (Parte 2) in Revista de Arbitragem e Mediação, ANO 9. 33. ABRIL-JUNHO. 2012, coordenação: ARNOLD WALD II. CONSIDERAÇÕES GERAIS E REGULAMENTAÇÃO NA GUINÉ E EM PORTUGAL Hoje, “a intervenção estadual assume, em regra, duas vertentes essenciais: uma primeira de apoio ao processo arbitral e uma segunda de fiscalização da legalidade da sua atuação” (arts.18.º e 19.º da nova LAV). Nos termos do enquadramento legislativo atual, os Tribunais Estaduais podem ser chamados a assumir um papel decisivo no funcionamento de um processo arbitral em fases e matérias distintas como, por exemplo, na nomeação de árbitros, na nomeação do presidente do Tribunal Arbitral, na obtenção de prova, no depósito da sentença arbitral, no reconhecimento e execução de uma sentença arbitral estrangeira, no julgamento de recursos, no julgamento de ação de anulação ou na execução de uma sentença arbitral. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM A convenção de arbitragem pela definição de Barrocas, () () é o acordo pelo qual as partes se vinculam a submeter os litígios existentes ou futuros a um tribunal arbitral. Por esse ato de vontade, as partes determinam que os litígios entre si, emergentes de uma certa relação jurídica, contratual ou extracontratual, que tenham já surgido ou que venha a surgir no futuro, serão resolvidos por um terceiro através de uma decisão que formará caso julgado e é suscetível de ser executada. Barrocas, ob cit. p. 143 Manuel Pereira Barrocas (2013), Lei de arbitragem Comentada, Edições Almedina, S.A. II. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM A Convenção de Arbitragem é o alicerce da Arbitragem voluntária. Sem Convenção de Arbitragem, não é possível constituir um tribunal arbitral e sem Tribunal Arbitral não existe Arbitragem, nem Sentença Arbitral. Qualquer estrutura que se organize ou processo que se inicie em vista da pretensa resolução de um litígio, sem que exista Convenção de Arbitragem que os legitime, são juridicamente inexistentes. Quanto aos efeitos, o principal efeito da convenção de arbitragem, diz-nos Barrocas (ob. cit., pp.165 e seg.), é o de vincular as partes a submeter à arbitragem resolução dos litígios abrangidos pela convenção. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM Será uma decorrência do princípio pacta sunt servanda. Cada uma das partes da convenção adquire, reciprocamente um direito potestativo e uma sujeição quanto ao modo de resolução do litígio existente ou futuro – tem direito a que o litígio seja resolvido por arbitragem e fica sujeita a que o seja. Porém a Lei de Arbitragem da Guiné-Bissau ao contrário da sua congénere portuguesa, é omissa quer no que respeita à autonomia da Convenção de arbitragem, quer ainda sobre a regra material da sua validade. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM Isto, apesar de essa autonomia poder ser aferida da análise do n.º 1 do art. 8.º que enuncia, no capítulo das competências, que “o tribunal arbitral pode pronunciar-se sobre a sua própria competência, mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da Convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insere...”, e do n.º 2 do seu art.3.º ao dispor que “a cláusula compromissória é a Convenção através da qual as partes num contrato comprometem-se a submeter à arbitragem os litígios emergentes das suas relações jurídicas”, que poderá ser contida no próprio contrato ou num documento diverso que se refira ao mesmo contrato (vide, n.º 3, in fine do artigo citado). III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM Por outro lado, importa referir que também difere da lei portuguesa, pois não existe uma definição legal de arbitragem. Pela arrumação das matérias e, bem assim, pela localização sistemática das suas disposições, constata-se que o legislador guineense desdobrou a Convenção de Arbitragem em duas modalidades diferentes (vide, art.3.º, n.º 2, e art.4.º, n.º 1): a cláusula compromissória e o compromisso arbitral. Contrariamente à cláusula compromissória, a qual identificámos no parágrafo supra, o compromisso arbitral é a Convenção através da qual as partes submetem um litígio à arbitragem. A Cláusula compromissória será a que se encontra inserida no contrato principal ou contida num documento que a ele se refira, enquanto o compromisso arbitral será o que se encontra reduzido num escrito particular assinado por duas testemunhas, ou celebrado sob cobertura notarial, por autenticação ou reconhecimento de assinaturas. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM A forma escrita, mostra-se relevante sobretudo para fins de prova, não se impondo exigências particulares de forma para a celebração da Convenção de arbitragem. As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis, tal como resulta do art. 1.º da lei da arbitragem. O critério adotado é, assim, o critério da disponibilidade de direitos patrimoniais. A par de outras legislações, a fórmula utilizada relativamente à capacidade das partes (no caso concreto, “as pessoas capazes de contratar...”) pode levantar dificuldades práticas. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM De acordo com a redação adotada, poderemos considerar que o Estado e demais pessoas coletivas de direito púbico como acontece em Portugal, são “pessoas capazes de contratar”? Poderão estas entidades, sem quaisquer restrições, celebrar Convenções de arbitragem? No tocante aos efeitos da Convenção de arbitragem, a lei de arbitragem não faz nenhuma referência à incompetência das jurisdições estaduais, limitando-se a prever a possibilidade do tribunal arbitral poder pronunciar-se sobre a sua própria competência. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM O tribunal arbitral pronuncia-se sobre a sua competência como referimos supra, “...mesmo que para esse fim seja necessário apreciar a existência, a validade ou a eficácia da Convenção de arbitragem ou do contrato em que ela se insere” (vide, art. 8.º, n.º 1). Desta disposição resulta que ao Juiz não é reservado nenhum poder de apreciação da validade da Convenção de arbitragem. E cabe ainda ao tribunal arbitral o monopólio quer da instrução da causa, como da produção de provas (vide, artigos 21.º e 25.º). III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM A Convenção de arbitragem em Portugal Para o Prof. Carlos Ferreira de Almeida, a arbitragem tem a natureza de jurisdição contratual privada: a arbitragem voluntária é contratual na origem, privada na sua natureza e jurisdicional na sua função. Esta natureza jurisdicional (art.209.º da CRP), assim é, porque a função é desempenhada através de poder de decisão de litígios exercido por uma instância neutral. Tem natureza contratual privada porque os tribunais arbitrais são criados em conformidade com convenções da arbitragem, que constituem a fonte dos seus poderes e delimitam o âmbito da respetiva competência. Carlos Ferreira de Almeida, (2007), Convenção da Arbitragem – Conteúdo e Efeitos – t exto que serviu de base à comunicação apresentada em 15 de Julho de 2007 ao I Congresso do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Industria Portuguesa. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM As convenções de arbitragem têm natureza de negócios jurídicos bilaterais, portanto contratos, quer estejam inseridas como cláusulas compromissórias, em contratos de conteúdo mais amplo que sejam estipuladas de modo autónomo, como geralmente sucede com os compromissos arbitrais. São contratos definitivos, não são contratos-promessa, porque a eficácia entre as partes não depende da celebração de qualquer contrato posterior devido. O artigo 1.º da Lei nº.63/2011, de 14 de Dezembro, define o critério de arbitrabilidade de acordo com o princípio da disponibilidade de direitos. Desde que por lei especial não esteja submetido exclusivamente aos tribunais do Estado ou a arbitragem necessária, qualquer litígio respeitante a interesses de natureza patrimonial pode ser cometido pelas partes, mediante convenção de arbitragem, à decisão de árbitros. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM A convenção de arbitragem inclui tanto a cláusula compromissória (se tiver por objeto litígios eventuais emergentes de determinada relação jurídica contratual ou extracontratual) como o compromisso arbitral (se tiver por objeto um litígio atual, ainda que afeto a um Tribunal do Estado). As partes podem acordar em submeter a arbitragem, para além das questões de natureza contenciosa em sentido estrito, quaisquer outras que requeiram a intervenção de um decisor imparcial, designadamente as relacionadas com a necessidade de precisar, completar e adaptar contratos de prestações duradouras a novas circunstâncias. III. A CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM O Estado e outras pessoas coletivas de direito público podem celebrar convenções de arbitragem, na medida em que para tanto estejam autorizados por lei ou se tais convenções tiverem por objeto litígios de direito privado. A convenção deve adotar forma escrita, sob pena de ser considerada nula. Importante: o compromisso arbitral deve determinar o objeto do litígio; e a cláusula compromissória deve especificar a relação jurídica a que os litígios respeitem. Salvo convenção em contrário (i) a morte ou extinção das partes não faz caducar a convenção de arbitragem, (ii) A convenção de arbitragem pode ser modificada pelas partes até a aceitação do primeiro árbitro ou, com o acordo de todos os árbitros, até à prolação da sentença arbitral. (iii) A convenção da arbitragem pode ser revogada pelas partes, até a prolação da sentença arbitral. (iiii) o acordo das partes previsto supra deve revestir a forma escrita, observando-se o disposto no art.2.º da LAV. IV. SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL Na Guiné, na composição ou constituição do tribunal arbitral dá-se primazia à vontade das partes: da conjugação do n.º 1 do art.10.º com o n.º 2 do art.9.º, da LAV, resulta que os árbitros são escolhidos pelas partes (...) sempre em número ímpar, por Convenção de arbitragem ou em escrito posterior por elas assinados, com a finalidade de constituírem o tribunal arbitral. Quando resultar do acordo das partes, o litígio será resolvido por um só árbitro, podendo elas designa-lo de comum acordo. IV. SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL Quando for prevista a designação de três árbitros, caberá a cada uma das partes no compromisso de arbitragem designar um árbitro de entre os inscritos na lista estabelecida pela entidade autorizada para promover a realização de arbitragens (refira-se que é muito frequente tratar-se de centros de arbitragens), a qual procede à designação do segundo árbitro, caso uma das partes se abstenha de o fazer, e do terceiro árbitro que assume a presidência do tribunal arbitral, a menos que as partes confiem a escolha deste àqueles por eles designados no prazo para o efeito fixado, sob a confirmação daquela entidade. IV. SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL Finalmente, dispõe o n.º 9 do art.10.º, da LAV, que só podem ser nomeados os árbitros que disponham de tempo necessário para cumprir a sua missão. Embora o mesmo não ressalte da formulação literal da norma, mas ao referir-se a “árbitros que disponham de tempo...” ela parece restringir a possibilidade de escolha de árbitros às pessoas singulares que, a fortiori, estejam no pleno gozo da sua capacidade jurídica. No momento da sua nomeação pela entidade autorizada, o árbitro deve comunicar as circunstâncias que possam suscitar dúvidas sobre a sua independência na avaliação das partes. Dever esse que se mantém ao longo de todo o processo arbitral (vide, n.ºs 2 e 4 do art. 11.º). IV. SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL Tratando-se de recusa fundada na falta de independência (ou mais rigorosamente de imparcialidade) ou ainda noutros motivos quaisquer, a demanda deve juntar declaração que contenha os factos ou circunstâncias em que ela se baseia, nos termos do n.º 5 do artigo citado. Outrossim, se algum dos árbitros falecer, se escusar ou ficar permanentemente impossibilitado de exercer as suas funções, ou ainda se a sua designação ficar sem efeito, proceder-se-á à sua substituição segundo as regras aplicáveis à nomeação ou designação, mutatis mutandis. IV. SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL Também em Portugal O Tribunal Arbitral poderá ser constituído por um único arbitro ou por vários, em número ímpar, encontrando-se fixada uma regra supletiva de três árbitros na eventualidade das partes não disporem sobre o assunto. Os árbitros devem ser pessoas singulares e plenamente capazes. Os árbitros são designados na convenção de arbitragem ou em escrito posterior por elas assinado (ou fixar o modo como os mesmos serão escolhidos). Se não existir acordo quanto à designação dos árbitros, cada uma das partes designará um árbitro, cabendo aos árbitros designados pelas partes escolherem o árbitro que deve completar a constituição do Tribunal Arbitral. Se, porventura, não existir acordo nesta matéria, o árbitro será nomeado pelo Presidente do Tribunal da Relação do lugar fixado para a Arbitragem. IV. SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL Salvo convenção em contrário das partes, o presidente do Tribunal Arbitral tem a competência para preparar o processo, dirigir a instrução, conduzir os trabalhos das audiências e ordenar os debates. Por último, o artigo 10.º da LAV estabelece as regras procedimentais aplicáveis entre as partes na constituição do Tribunal Arbitral. V. O PROCEDIMENTO/FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL ARBITRAL Da análise conjugada dos artigo 2.º, n.º 1, artigo 18.º e artigo 22.º, da LAV guineense resulta que a lei da arbitragem à semelhança da lei lusitana, atribui relevo à vontade das partes na organização do processo de arbitragem, estabelecendo que na Convenção de arbitragem ou em escrito posterior, até à aceitação do primeiro árbitro, as partes possam acordar sobre as regras do processo a observar na arbitragem, no que estarão condicionados todavia pelas exigências de ordem pública e dos bons costumes, devendo as mesmas designarem quem as deva representar ou assistir no tribunal. V. O PROCEDIMENTO/FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL ARBITRAL Há, no entanto, um conjunto de princípios jurídicos constitucionais, quiçá de caráter fundamental e imperativos enunciados não só na LAV, art.23.º, a cuja observância os árbitros estão vinculados, como sejam o princípio da igualdade das partes, o princípio do direito à defesa, o princípio do contraditório, da imparcialidade, justiça, proporcionalidade, boa-fé , mas também racionalidade e veracidade e o da audição prévia das partes, oralmente ou por escrito, antes de ser proferida a decisão final. Embora, paradoxalmente, à sua violação se associe uma reprovação menos gravosa que se traduz na anulabilidade da sentença arbitral, nos termos da alínea c) do art.38.º. José Manuel Sérvulo Correia, Arbitragem Voluntária nos Contratos Administrativos, in Estudos em memória do Professor Doutor João de Castro Mendes, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa: Editora Lex, p. 31, citado por Ana Paula Carvalhal – A ARBITRAGEM ADMINISTRATIVA EM PORTUGAL in FMU DIREITO – REVISTA ELETRÔNICA, impressão de 04-06-2013, p. 12. V. O PROCEDIMENTO/FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL ARBITRAL O princípio da confidencialidade do processo arbitral que se lhes acresce, apesar da sua importância, a lei atribui-lhe um caráter supletivo, podendo por isso ser afastado por acordo das partes. Nos termos da alínea j) do n.º 2 do art. 12.º, a instância tem o início na data da receção da demanda pelo órgão habilitado pela entidade autorizada a realizar a arbitragem. Relativamente aos critérios de fixação do prazo à missão dos árbitros, a lei é igualmente omissa. V. O PROCEDIMENTO/FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL ARBITRAL No respeitante ao direito substantivo aplicável, o art.19.º dispõe que “as partes são livres de determinarem o direito que o árbitro deve aplicar ao fundo da causa”. O qual consagra na sua parte final o seguinte regime supletivo: “na ausência de indicação pelas partes do direito aplicável, o árbitro aplica a lei designada pela regra do conflito que julgar adequada”, o que no âmbito do direito privado interno, pode causar dificuldades práticas. Por outro lado, o processo arbitral pode ser julgado segundo a equidade. No que se refere à arbitragem internacional, a lei limita-se a mencionar de modo restritivo que ela deve ser entendida como aquela que cuida de interesses de comércio internacional, cujo procedimento culmina com uma decisão insuscetível de recurso, salvo se as partes tiverem um acordo diferente (ver artigos 43.º e 44.º). V. O PROCEDIMENTO/FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL ARBITRAL Nenhuma referência foi expressamente feita sobre outras formas de extinção do processo de arbitragem, nomeadamente transação, desistência, etc., para além do caso julgado, embora o art.31.º consagre a possibilidade de as partes chegarem a acordo, sem especificar por que via, no decorrer do processo arbitral, podendo “requerer ao árbitro que este acordo seja constatado” (entenda-se homologado). Os incidentes que podem afetar o árbitro pessoalmente, corno seja quando falecer, se recusar ou ficar permanente ou definitivamente impossibilitado de exercer as suas funções, ou se a sua designação ficar sem efeito, não põe termo à instância arbitral, devendo tão somente proceder-se à substituição do árbitro falecido, que se escusa, impedido ou recusado nos termos do art. 10.º. V. O PROCEDIMENTO/FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL ARBITRAL Efetivamente em Portugal, As partes podem acordar sobre as regras do processo e sobre o lugar onde funcionará o Tribunal Arbitral, o que pode resultar da escolha de um regulamento de um centro de arbitragem institucionalizado ou mesmo na “entrega” da organização e gestão do processo a uma dessas instâncias arbitrais. Sobre esta matéria, refira-se que as entidades habilitadas - autorizadas - a realizarem arbitragens voluntárias institucionalizadas estão expressamente previstas na versão atualizada da Portaria nº.81/2001, de 8 de Fevereiro. Os princípios fundamentais a observar na Arbitragem são (i) absoluta igualdade das partes, (ii) oportunidade de defesa do demandado, (iii) observância do princípio do contraditório em todas as fases, (iv) audição oral e escrita de ambas as partes, antes de ser proferida a sentença. São as seguintes alterações: Portaria n.º 350/2001, de 09/04; Portaria n.º 1516/2002, de 19/12; Portaria n.º 709/2003, de 04/08. V. O PROCEDIMENTO/FUNCIONAMENTO DO TRIBUNAL ARBITRAL O princípio da confidencialidade é um dos aspetos fundamentais na escolha da via da arbitragem, sobretudo, se tivermos em linha de conta que, nos termos do artigo 167.º do Código de Processo Civil Português, o processo civil é público. Por outro lado, importa referir que perante o Tribunal Arbitral pode ser produzida qualquer prova em direito admitido. Caso a prova a produzir dependa da vontade de uma das partes ou de terceiros e estes recusem a necessária colaboração, pode a parte interessada, com a autorização do Tribunal Arbitral, requerer ao Tribunal estadual competente que a prova seja produzida perante si, sendo os resultados remetidos ao Tribunal Arbitral (artigo 38.º da LAV). VI. A DECISÃO ARBITRAL Nos termos do n.º 1 do art.30.º, conjugado com o n.º 3 do art.32.º do Decreto-lei nº.9/2000, de 02 de Outubro, da LAV guineense a sentença arbitral é redigida e assinada no prazo de 90 dias subsequentes ao encerramento dos debates, por maioria dos árbitros designados. Na falta de maioria a decisão caberá ao Presidente do tribunal arbitral. Caso a sentença tenha sido proferida pela maioria, a recusa da sua assinatura pelo árbitro minoritário não afeta a validade do ato. VI. A DECISÃO ARBITRAL O art. 34.º enuncia o número determinado de menções obrigatórias que devem ser contidas na sentença, cuja omissão será sancionada com a nulidade da própria decisão nos termos da alínea c) do art. 35.º, como sejam a identificação das partes; a referência à Convenção de arbitragem; o objeto do litígio; a identificação dos árbitros; o lugar da arbitragem e o local e a data em que a sentença foi proferida; a assinatura dos árbitros; e a indicação dos árbitros que não puderam ou quiseram assinar. VI. A DECISÃO ARBITRAL Nulidade ainda que se associa à sentença proferida por quem não podia ser árbitro; se for nulo o compromisso arbitral; se for proferida fora dos limites da Convenção de arbitragem; se não decidir todo o litígio submetido à arbitragem; se for proferida fora do prazo ou se se provar que foi proferida por prevaricação, concussão ou corrupção passiva. Outrossim, a sentença deve ser fundamentada, salvo se outro for convencionado pelas partes. O poder jurisdicional do tribunal arbitral extingue-se com o trânsito em julgado da decisão arbitral e ou da decisão homologatória do acordo alcançado na pendência da instância arbitral. A sentença arbitral tem os mesmos efeitos das sentenças judiciais de primeira instância e reveste-se da mesma força executiva. VI. A DECISÃO ARBITRAL Em Portugal O capítulo IV da LAV, dedicado a decisão arbitral, trata de várias matérias: o prazo para a decisão, a forma de deliberação, decisão sobre a competência do tribunal arbitral, o direito aplicável, os elementos da decisão, o procedimento posterior à decisão arbitral, a extinção dos poderes do tribunal e o caso julgado e força executiva da decisão arbitral. Por razões de economia processual e de delimitação do tema, vou apenas abordar de forma perfuntória estas temáticas. VI. A DECISÃO ARBITRAL Se outra coisa não resultar do acordo entre as partes, o prazo para a decisão será de doze meses, prorrogável, por acordo das partes ou por decisão do tribunal por uma ou mais vezes; as prorrogações devem ser devidamente fundamentadas; as partes podem de comum acordo, opor-se à prorrogação por decisão do tribunal. Os árbitros que, sem justificação, obstarem a que a decisão seja proferida dentro do prazo fixado respondem pelos danos causados. Por outro lado, a falta de notificação da decisão arbitral dentro do prazo fixado não determina, a caducidade da convenção: o procedimento termina, extinguindo-se a competência dos árbitros, mas a convenção mantém a sua eficácia. VI. A DECISÃO ARBITRAL Se o tribunal arbitral é composto por mais de um árbitro, a decisão arbitral deverá ser tomada por maioria de votos, em deliberação em que todos os árbitros devem participar. As partes podem ainda convencionar que a decisão seja tomada unicamente pelo presidente ou que a questão se considere decidida no sentido do voto do presidente, o que acontecerá no caso de não se formar a maioria necessária apenas por divergências quanto ao montante da condenação em dinheiro (caso as partes não tenham acordado uma maioria qualificada até a aceitação do primeiro árbitro). O Tribunal Arbitral também pode pronunciar-se sobre a sua própria competência, nos termos do artigo 18.º da LAV. Os árbitros julgam segundo o direito constituído, a menos que as partes determinem, por acordo que julguem segundo a equidade. VI. A DECISÃO ARBITRAL A sentença arbitral deve ser fundamentada, salvo, se as partes tiverem dispensado tal exigência ou se trate de sentença proferida com base em acordo das partes, nos termos do artigo 41.º, sob pena de nulidade; reduzida a escrito e conter obrigatoriamente: (i) a identificação das partes, (ii) a referência à convenção de arbitragem, (iii) o objeto do litígio, (iv) a identificação dos árbitros, (v) o lugar da arbitragem e o local e data em que a decisão foi proferida, (vi) a assinatura dos árbitros, (vii) a indicação dos árbitros que não puderem ou não quiserem assinar. VI. A DECISÃO ARBITRAL A sentença deve conter, pelo menos, um número de assinaturas igual à maioria dos votos ou só a do presidente, caso por este deva ser proferida a sentença, desde que seja mencionada na sentença a razão da omissão das restantes assinaturas. O poder jurisdicional dos árbitros extingue-se com a notificação da decisão nos termos do artigo 44.º do LAV, podendo as partes solicitar a retificação, o esclarecimento ou mesmo uma sentença adicional nos termos do artigo 45.º. A sentença arbitral de que não caiba recurso e que já não seja suscetível de alteração nos termos do artigo 45.º tem o mesmo carater obrigatório entre as partes que a sentença de um tribunal estadual transitada em julgado e a mesma força executiva que a sentença de um tribunal estadual. VII. IMPUGNAÇÃO Resulta dos números 3 e 5 do art.2.º do Decreto-Lei 1 nº.9/2000, de 02 de Outubro, que regula a LAV guineense, que se o processo de arbitragem for julgado segundo a equidade, uma tal autorização pelas partes significa obrigatoriamente a renúncia da sua faculdade de interpor recurso contra a decisão arbitral. Se as partes não tiverem renunciado aos recursos, das decisões dos árbitros cabem, nos termos do Código de Processo Civil, os mesmos recursos que caberiam das sentenças proferidas pelos tribunais judiciais. VII. IMPUGNAÇÃO Da articulação do nº.2 do artigo 37.º com o art.38.º, resulta pacífico concluir que o recurso de anulação da sentença arbitral é interposto junto do Supremo Tribunal de Justiça - por não se verificar haver ainda instalação dos tribunais de círculo tal como prevê a Lei Orgânica dos Tribunais Judiciais - aplicando-se supletivamente o regime sobre prazos do Código do Processo Civil, prazo contado a partir da data da notificação da decisão arbitral. VII. IMPUGNAÇÃO No Ordenamento jurídico português, há dois meios de reação as decisões arbitrais: a ação de anulação; interposição de recurso. Porém, nos termos do artigo 28.º da LAV está vedada às partes a possibilidade de renunciar previamente ao seu direito de anulação da decisão arbitral e a ação deve ser interposta no prazo de 60 dias (artigo 46.º nº.6 e artigo 45.º nº.5 desta lei); outrossim, se uma das partes interpuser recurso, a questão da anulação da decisão arbitral apenas pode ser apreciada nesse recurso (artigo 27.º nº.3 da LAV). VII. IMPUGNAÇÃO Aspeto importante é a possibilidade de o tribunal poder verificar ex officio que determinadas circunstâncias podem obviar ao conhecimento de mérito do objeto de litígio por meio de arbitragem: vg., se o objeto de litígio ofender os princípios da ordem pública internacional do Estado português. VIII. RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS A prova de existência da decisão arbitral é estabelecida pela produção de exemplar mandado notificar às partes, nos termos do nº.1 do art.36.º da LAV guineense. O exequatur da decisão arbitral é acordado pelo tribunal judicial do lugar de arbitragem no território nacional, podendo proceder como fundamentos de oposição à execução nela baseada, não só os previstos no art. 813.º do Código de Processo Civil, mas também aquela em que se possa basear a anulação judicial nos termos do art. 38.º. VIII. RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO DAS SENTENÇAS Aqui em Portugal, o reconhecimento e execução das sentenças, é parte da Convenção de Nova Iorque sobre o reconhecimento e a execução de sentenças arbitrais estrangeiras. O artigo 1094.º e seguintes do Código de Processo Civil estabelece, por seu turno, as regras aplicáveis à revisão de sentenças estrangeiras, incluindo, as decisões arbitrais estrangeiras e o Tribunal competente para a revisão e confirmação é o Tribunal da Relação do distrito judicial em que esteja domiciliada a pessoa contra quem se pretende fazer valer a sentença. IX. ARBITRAGEM INTERNACIONAL No âmbito das duas LAV, a guineense e a portuguesa, entende-se por arbitragem internacional a que põe em jogo interesses de comércio internacional. SINTESE COMPARATIVA A Guiné-Bissau é uma ordem jurídica em desenvolvimento encontrando-se a atividade da arbitragem em evolução, seguindo a lógica das modernas legislações, nomeadamente a portuguesa. O Estado mostra-se profundamente empenhado em que a arbitragem se expanda como forma de poder facilitar o acesso dos cidadãos à justiça alternativa, bem assim atenuar, a profunda crise que afeta as instituições judiciais. A globalização, a desterritorialização de atividades económicas e fatores outros, impelem para soluções alternativas. Chega-se à conclusão que só utilizando os meios alternativos é possível conceptualizar a expansão de um novo espaço judiciário de Arbitragem, sem que os recursos do Estado consumam por forma insuportável as suas finanças públicas. SINTESE COMPARATIVA Apesar de alguma diversidade entre a Lei da Arbitragem Voluntária na Guiné e em Portugal, permanece uma certa harmonia de pensamento jurídico de matriz lusófona, que aproxima entre si a Guiné e Portugal em termos legislativos. Como diz o Prof. Canotilho, “ o direito é um intertexto aberto, que deve muito a experiências nacionais mas também estrangeiras”. No caso da Guiné, pela circunstância do direito português ser subsidiário do guineense, leva a que a maior parte dos textos legais sejam de inspiração quase total de textos legais portugueses. Identifiquei com interesse convergências entre estes dois ordenamentos jurídicos, assente em matriz jurídica comum, não obstante às diferenças, normais, verificadas, pela circunstância de existência de realidades culturais e quiçá jurídicas obviamente distintas. SINTESE COMPARATIVA Realidade interessante é constatarmos, por efeitos da crise global, a tendência para pôr termo ao poder dos Estados sobre à arbitragem de conflitos. Exemplo disso é nova lei de arbitragem portuguesa. Verifica-se que já não serão os Estados, moldados tal como até aqui foram concebidos, a continuar a deter o monopólio do acesso à justiça, por parte dos cidadãos. Outras instituições, como a arbitragem permite regular este bem jurídico (justiça), participando nestas grandes transformações em curso. O monopólio estatal da administração da justiça tem vindo, assim, a ser relativizado face à evolução socioeconómica dos países. A tendência moderna é da democratização da justiça através de instrumentos ou meios alternativos da solução de conflitos, evitando que cheguem às portas dos tribunais, possibilitando em ultima análise, a participação do povo na administração da justiça. SINTESE COMPARATIVA Dito isto: 1 - pode-se afirmar que a regulação da arbitragem na Guiné e em Portugal, face ao contexto cultural de cada uma destas realidades, mostra-se eficaz, em virtudes da vinculação das partes às convenções de arbitragem, que se traduz na materialização da função social do contrato e da autonomia de vontade das partes, já que foi o elemento volitivo e apenas ele a dar origem ao intuito de submeter os litígios atuais ou emergentes, oriundos de suas relações à arbitragem; 2 – A promulgação da nova lei de arbitragem em Portugal vem a confirmar a tendência hodierna para a democratização da justiça. QUADRO COMPARATIVO (Continuação) Leis de Arbitragem e a sua Interdependência com os Sistemas Judiciais Guiné Bissau Lei de Arbitragem e outros meios Portugal Decreto-Lei n.º 9/2000 de Lei nº.63/2011 de 14 de 2 de Outubro Dezembro Arbitrabilidade (Objeto/árbitros) Medidas Cautelares Produção de Prova Tribunal Judicial de 1.ª Instância Tribunal Estadual Aclaração e Retificação Possível Possível QUADRO COMPARATIVO Leis de Arbitragem e a sua Interdependência com os Sistemas Judiciais Guiné Bissau Portugal Execução Tribunal Judicial de 1ª instância Tribunal Estadual Anulação / Nulidade Tribunal Judicial de 1.ª Instância Tribunal Estadual Supremo Tribunal de Justiça, (à data da lei o Tribunal da Relação não se encontrava instalado). Se não for decisão por equidade Tribunal da Relação Sentenças Estrangeiras Código de Proc. Civil Supremo Tribunal de Justiça Código do Proc. Civil Tribunal da Relação Recurso de Sentença Estrangeira Não é Recorrível Não é recorrível Recurso Referências Bibliográficas: Fim Muito obrigada