A contribuição da psicanálise para a educação Roberta Ribeiro Barbosa1 Margaret Pires do Couto2 RESUMO: O presente artigo pretende apresentar a contribuição da psicanálise à educação. Para tanto, se fez necessário apresentar um estudo teórico sobre a sexualidade infantil, sobre o surgimento do desejo de saber nos sujeitos e sobre a transferência. Para ilustrar a discussão, apresenta-se um caso clínico, que demonstra o deslocamento do sujeito em sua pulsão de morte em pulsão de saber. Palavras-chave: Sexualidade. Pulsão de saber. Transferência. Pulsão de morte. Quais as contribuições da psicanálise à educação e ao campo da aprendizagem? Segundo Kupfer (1989), entre as obras completas de Freud, menos de 200 páginas são dedicadas às reflexões, análises e críticas sobre a educação. Estas páginas estão dispersas ao longo de sua obra em textos que tratam de diferentes questões. Essa dispersão não indica um descaso de Freud, mas, ao contrário, a educação o acompanhou por toda a extensão da sua obra. Freud escreveu um ensaio em 1905, intitulado: “Os três ensaios sobre a teoria da sexualidade”, sendo “A sexualidade infantil”, o segundo ensaio. Nesse ensaio, Freud (1905) demonstra que a pulsão sexual, pode ser decomposta em pulsões parciais. De acordo com Kupfer (1989), Freud descobre que, durante a constituição sexual dos seres humanos, há práticas de natureza perversa que, mais tarde, não resistirá à repressão, pois terá que se submeter ao domínio das práticas genitais com o objetivo da procriação. Têm-se como exemplos as práticas perversas: exibicionismo, curiosidade relacionada aos órgãos genitais das outras pessoas, manipulação dos órgãos genitais, prazer de sucção, prazer ligado à defecação, entre outros. As perversões adultas seriam resultados da permanência de uma dessas perversões parciais infantis que se recusaram ao domínio da genitalidade. Assim, Kupfer (1989) afirma que as pulsões parciais possuem e a sexualidade infantil confirma um caráter errático. A pulsão sexual é passível de se dirigir a outros fins que não sejam necessariamente sexuais, já que o objeto pelo qual se satisfaz lhe é indiferente e o seu objetivo pode ser atingido por caminhos diversos. Contribuindo desta forma, para os estudos de Freud e a educação. Nesse caso, a pulsão sexual é capaz de dirigir-se por caminhos socialmente úteis, ou seja, é passível de sublimação, tendo a educação um papel primordial neste processo. Com isso, torna possível que o individuo se volte para atividades socialmente aceitáveis e valorizáveis, sendo elas: a produção científica, artística e todas aquelas que promovem uma qualidade de vida aos seres humanos. Desse modo, de acordo com Kupfer (1989), para Freud, a origem propulsora do desenvolvimento intelectual é sexual. A pulsão poderá ser sublimada em pulsão de saber. No entanto, Freud nunca se preocupou em construir métodos educativos ou técnicas. Esperava que os próprios educadores, tomando conhecimento das teorias psicanalíticas, se encarregassem disso. Assim, Kupfer (1989) exemplifica: o educador, orientado psicanaliticamente, poderia oferecer argila a uma criança que manipulasse suas fezes em vez de agir com fúria e recriminação, ameaçando esta criança com castigos. No intuito de ilustrar a discussão da contribuição da psicanálise ao campo do saber, apresentar-se-á o caso de João³, um garoto de 11 anos, que foi encaminhado a Clínica de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva, com a queixa inicial de dificuldades de aprendizagem e oferecimento do seu corpo ao perigo. Esta queixa foi trazida por sua avó que possui a guarda de João devido ao abandono da mãe. João, frequentemente, trazia nos atendimentos, discursos de morte retratados pelos filmes, pela música, pelas estórias e pelo diálogo. Têm-se como exemplo as estórias relatadas de assassinato e de cadáver, as conversas sobre o momento da morte dele e da estagiária, o relato dos filmes, Exterminador do futuro, Palhaço assassino e Boneco assassino, entre outros. De acordo com a avó, constantemente, João estava envolvido em acidentes, sendo necessária, certa vez uma intervenção cirúrgica. Este oferecimento do corpo ao perigo e o discurso de morte revelam a tendência à autodestruição, ou seja, a presença da pulsão de morte na subjetividade da criança e sua colocação em ato. No decorrer dos atendimentos, foi possível perceber o deslocamento operado por João para a dimensão mortífera de seus atos. Como diz Freud (1913), João estava se deslocando para discursos socialmente úteis: ele disse que, quando fosse adulto, seria bombeiro ou químico, profissões que demandam cuidado, já que trabaRevista de Psicologia l 1 lham com o perigo. Também começou a produzir desenhos que, de acordo com ele, são “desenhos artísticos”. É neste momento que João demonstra seu interesse pela natureza e pela vida. João passa então a demonstrar interesse por outras coisas que não diretamente pela morte, apesar de ela estar implícita na profissão que diz querer seguir. Enfim, percebeu-se a possibilidade de reorientação de sua pulsão de morte em pulsão de saber. REFERÊNCIAS FREUD, Sigmund. A sexualidade infantil. In:______. Três ensaios sobre a Teoria da Sexualidade. Trad. de Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1996. p. 177- 206. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas,7.) ______. O interesse educacional da psicanálise. Trad. de Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1996. p. 224- 226. (Edição standard brasileira das obras psicológicas completas,13.) KUPFER, Maria Cristina. Freud e a educação: o mestre do impossível. São Paulo: Scipione, 1989. (Série: Pensamento e Ação no Magistério). NOTAS DE RODAPÉ 1 Aluna do Curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva. Psicóloga e Professora do Curso de Psicologia do Centro Universitário Newton Paiva. 2 2l Revista de Psicologia