CURSO DE DIREITO HERMENÊUTICA JURÍDICA Prof. Ubiratan Rodrigues da Silva Plano de Ensino: Vl. ANTINOMIAS JURÍDICAS OBJETO: ANTINOMIAS JURÍDICAS OBJETIVOS: - (Re)conceituar as antinomias jurídicas; - Conhecer a natureza das antinomias; - Estabelecer critérios para resolver antinomias jurídicas. O FENÔMENO DA ANTINOMIA JURÍDICA A tragédia grega sobre Antígona, filha de Édipo, escrita por Sófocles provavelmente no ano de 442 a.C., tratou da idéia de contradição entre as Leis do Direito Natural e do Direito Positivo. A peça gira em torno da antinomia entre um édito baixado por Creonte – Rei de Tebas – norma esta que proibia a celebração fúnebre em honra de Polinicies (irmão de Antígona), morto em combate em defesa de Argos (por isso considerado traidor) e uma Lei universal-divina de que a família tinha o dever de enterrar piedosamente os familiares. Antígonas entendia que tal Lei universal transcendia a do poder de um soberano: o édito não passava de um Decreto de um titular do Poder proibindo que se enterrasse determinada pessoa, pois ela teria agido em traição à Pátria. Antígona se levantou contra o chefe do governo perguntando: “De onde vem a tua ordem? Ela nasceu ontem, enquanto o princípio que eu defendo é imemorial, não tem data. A tua ordem se dirige a um caso particular, mas o princípio comanda todas as nossas consciências”. OBS: A antinomia, neste caso, foi solucionado com Antígona aplicando o Direito Natural e enterrando o irmão com as devidas honrarias e cerimônias fúnebres tradicionais, porém arcou com a condenação provinda de seu tio, o rei Creonte, de viver sozinha em uma caverna. CONCEITOS GERAIS: Plutarco de Queronéia, em 1613, distinguiu a antinomia tanto em sentido amplo, que ocorria entre sentenças e proposições, quanto a sentido estrito, existente entre leis; J. H. Zedler, em 1732, a conceitua como conflito de leis que ocorrem quando duas leis se opõem ou mesmo se contradizem; Em 1770, Baumgarten faz menção à antinomia entre Direito Natural e Direito Civil, no seu livro Philosophia generalis. A idéia do conflito normativo como premissa do conceito adotado modernamente surgiu no período de consolidação de idéias políticas e jurídicas da Revolução Francesa, através de John Gilissen, que firmou a preponderância da lei enquanto fonte do direito, o controle da legalidade das decisões judiciárias e, principalmente, a concepção do Direito como sistema, imprescindíveis para o contato com a problemática da antinomia jurídica em termos de profundidade. Também J. E. M. Portalis, dirigindo a Comissão elaboradora do Código Civil Francês, evidenciou a necessidade de ordenamento sistemático do Direito, tendo como base fundamental deste sistema a Constituição do Estado. Maria Helena Diniz (2001): “Foi preciso que o direito fosse concebido como um sistema normativo para que a antinomia e sua correção se relevassem como problemas técnicos. A antinomia jurídica aparece como elemento do sistema jurídico e a construção dos conflitos normativos, pois todo o sistema deve e pode alcançar uma coerência interna”. Paulo Dourado de Gusmão (2000): “Sistema jurídico, a unificação lógica das normas do direito. Para obtêla, elimina o jurista contradições porventura existentes entre normas e entre princípios; estabelece hierarquia entre as fontes do direito, escalando-as; formula conceitos, extraídos do conteúdo das normas e do enunciado nos princípios, agrupa normas em conjuntos orgânicos e sistemáticos, levando em conta a função que devem elas cumprir, como é o caso das instituições; estabelece classificações, ou seja, aponta o lugar de cada norma no sistema”. CONCEITO USUAL → Incompatibilidades possíveis ou instauradas entre regras, valores ou princípios jurídicos, pertencentes validamente ao mesmo sistema jurídico, tendo de ser vencidas para a interpretação de unidade e da coerência sistemática e para que se alcance a efetividade máxima de pluralista teleologia constitucional. → As regras jurídicas não são editadas pelo legislador com o propósito de unidade, mas ao aderirem ao ordenamento jurídico, embora desvinculados dos propósitos de sua origem, formam um todo único com o ordenamento. Edição do Ordenamento Jurídico Estado totalitário: Valores do absolutismo do poder Estatal. Estado Liberal: Valores pautados na harmonia da liberdade ampla do particular. Ordenamento Jurídico do Brasil: “[...] constitui-se em Estado Democrático de Direito [...]” (caput Art. 1º, CF/88) Alexandre Sormani (Artigo: Harmonia Sistemática do ordenamento jurídico? R. CEJ, Brasília, nº 18, p. 117-119, jul./set.2002): 1 – interpreta que os fundamentos contidos nos incisos do Art. 1º não permitem a compreensão de um estado simplesmente liberal, mas com vertentes para o campo social; por isso conclui que a melhor denominação seria “Estado social democrático de Direito”. 2 – afirma a impossibilidade de se conhecer a natureza do ordenamento jurídico por intermédio da interpretação de apenas uma regra isolada (pela distinção entre norma e proposição jurídica). 3 – no conflito aparente de normas, a hierarquia axiológica existente em um determinado estado não deve ser abandonada, mas também nenhum dos dispositivos em confronto devem ser totalmente eliminados ou ignorados pela exegeta, a fim de se preservarem os valores essenciais à dignidade humana, insculpidos na atual Carta Magna. 4 – [...] havendo conflito aparente de normas jurídicas válidas e vigentes, será aplicável aquela que proteger um valor hierarquicamente superior, ou seja, o valor que tiver maior identidade com a preservação da dignidade da pessoa humana, concepção nuclear do estado (social) democrática de Direito. Ex: Detenção de um militar pelo não cumprimento de uma ordem de seu oficial superior. A CF/88, Art. 5º, LXVIII, prevê HC. Já o Art. 142, § 2º, afirma não caber HC em relação às punições militares. Como resolver? Configurações Hipotéticas de Antinomias Jurídicas (Freitas, 2004, p. 103-112) onde: NA = Norma Anterior; NP = Norma Posterior; PS = Princípio Superior; NAS = Norma Anterior Superior; NAP = Norma Anterior Posterior; NPI = Norma Posterior Inferior; NG = Norma Geral; NE = Norma Especial; NAE = Norma Anterior Especial; NPG = Norma posterior Geral; NS = Norma Superior; NI = Norma Inferior; NSG = Norma Superior Geral; NIE = Norma Inferior Especial. 1) NA x NP prepondera a NP; mas se a NP Colidir com PS ou com a NAS, a incompatibilidade em favor de NAS, ou, o critério cronológico será ultrapassado em prol do PS. 2) PS x NPI eleito o comando do PS (= NAS). No conflito entre uma MP (medida provisória, que tem força de lei) x Súmula = NAS (regra não legislada); se a MP contrariar, por exemplo, o principio da justa indenização, preponderará a súmula, que representa um PS. 3) NG x NE prepondera a NE. Porém entre a NE x PS, prepondera o PS (Ex: se uma NE afrontar o PS de proteção ao ato jurídico perfeito Art. 5º, XXXVI, CF/88). 4) NE x PS prevalecerá o PS. Ex: se a NE afrontar o PS de proteção ao ato jurídico perfeito (Art. 5º, XXXVI, CF/88) 5) NAE x NPG choque entre os critérios de especialidade e cronológico; resolvido pelo critério da hierarquização, isto é, da NAE que, como afirma Francesco Ferrara o Direito especial “è un sistema autonomo di principi elaboratosi per um particolare atteggiamento di certo rapporti” 6) NAE x PS preponderá, por sua condição hierárquica, o PS. 7) NS x NI vai prevalecer a NS 8) NS x PS ou PS x PS revelam situações indesejáveis que só uma interpretação hierarquizadora tem a possibilidade de resolver. embora haja alguma dúvida doutrinária deve prevalecer a NIE. 9) NSG x NIE 10) NSG x PS x NIE vai preponderar o domínio constante do PS. OBSERVAÇÃO Segundo FREITAS (2004, Cap. 5, p. 113-130): INTERPRETAR É HIERARQUIZAR. Deve prevalecer sempre o “METACRITÉRIO” HIERARQUICO AXIOLÓGICO DICAS DE ESTUDO: 1. BOAVENTURA, Bruno José Ricci. In JUS NAVIGANDI: O FENÔMENO DA ANTINOMIA JURÍDICA. Disponível em: http://jus2.uol.br/doutrina/imprimir.asp?id=6707. Acesso em: 3 / 5 /2008. 2. FREITAS, Juarez. A INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DO DIREITO, 4ª Edição. São Paulo: Malheiros, 2004.