Artigo: Estudo de caso: Proposta de Remissão aos maiores de 18( dezoito) anos e possibilidade de aplicação de medida socioeducativa Aluna: Luciana Costa Aglantzakis Professor: João Batista Costa Saraiva O presente estudo surge diante de um caso concreto ocorrido na cidade de Almas-TO, na Justiça Estadual do Estado do Tocantins. Este artigo é a análise do instituto da remissão cumulada com medidas socioeducativas, em situação elencada em BOC circunstanciado, sob análise judicial, cujo infrator era maior de 18(dezoito) anos no momento da audiência, , devido ato infracional praticado em face de terceiro e análogo ao artigo 155, caput do Código Penal. O douto órgão ministerial ofereceu em audiência proposta de remissão com a proposta de medida socioeducativa de prestação de serviços a comunidade, bem como o compromisso de outras condições em prol de formação e reeducação do adolescente infrator. Iniciado o procedimento Judicial a remissão serve de instituto com o propósito semelhante ao instituto da transação penal da Lei de Juizados Especiais Cíveis, com a ressalva de que é necessário o consentimento do menor e seus pais, mesmo que tácito, para que depois surja o perdão para o possível ato infracional e atingido finalidade educacional em prol do melhor interesse do adolescente. Considero que mesmo que o adolescente em conflito com a lei esteja, em certo momento processual, com idade superior a 18(dezoito) e menor de 21( vinte e um) anos é permitida a cumulação da remissão com medida socioeducativa, baseando-se no artigo 127 do ECA, pois este instituto não tem a feição de pena e visa à reeducação do adolescente, desde que homologado pelo Poder Judiciário, conforme precedentes do STJ. Nesse sentido a Jurisprudência do STJ, veja-se: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA. HABEAS CORPUS. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE TRÁFICO REMISSÃO ILÍCITO PELO DE ENTORPECENTES. JUÍZO SINGULAR. APLICAÇÃO DE FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PROSSEGUIMENTO REGULAR DO FEITO. ARTS. 227 DA CF E 4º DO ECA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃOCONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. 1. Tratando-se de menor inimputável, não existe pretensão punitiva estatal propriamente, mas apenas pretensão educativa, que, na verdade, é dever não só do Estado, mas da família, da comunidade e da sociedade em geral, conforme disposto expressamente na legislação de regência (Lei 8.069/90, art. 4º) e na Constituição Federal (art. 227). 2. De fato, é nesse contexto que se deve enxergar o efeito primordial das medidas socioeducativas, mesmo que apresentem, eventualmente, características expiatórias (efeito secundário), pois o indiscutível e indispensável caráter pedagógico é que justifica a aplicação das aludidas medidas, da forma como previstas na legislação especial (Lei 8.069/90, arts. 112 a 125), que se destinam essencialmente à formação e reeducação do adolescente infrator, também considerado como pessoa em desenvolvimento (Lei 8.069/90, art. 6º), sujeito à proteção integral (Lei 8.069/90, art. 1º), por critério simplesmente etário (Lei 8.069/90, art. 2º, caput). 3. Mostra-se prematuro o deferimento da remissão, em razão da natureza do delito, bem como pelo fato de o menor ter se envolvido com o tráfico, o que revela a fragilidade em que se encontra no contexto familiar e social. 4. Ordem denegada. (HC 139.950/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 03/12/2009, DJe 01/02/2010) HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE FURTO. MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE INTERNAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. ATO DESPROVIDO DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. FALTA DE PREVISÃO LEGAL. REITERAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. INTERNAÇÃO-SANÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a internação, medida sócio-educativa extrema, só está autorizada nas hipóteses taxativamente elencadas no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedente. 2. O ato infracional cometido pelo menor - furto -, embora seja socialmente reprovável, é desprovido de violência ou grave ameaça à pessoa. 3. Somente ocorre reiteração, para efeito de incidência da medida de internação, quando são praticadas, no mínimo, três ou mais condutas infracionais graves. 4. Os processos nos quais foi concedida a remissão não se prestam a configurar antecedentes, nos termos do art. 127 da Lei n.º 8.069/90. Precedentes. 5. Conforme o disposto no art. 122, § 1.º, da Lei n.º 8.069/90, a medida de internação, imposta em razão de descumprimento injustificado de medida socioeducativa, não poderá exceder o prazo de 03 (três) meses. Precedentes. 6. Ordem concedida para, cassando o acórdão impugnado, anular a decisão de primeiro grau no que diz respeito à medida socioeducativa imposta e determinar que outra seja proferida, permitindo-se ao Paciente aguardar em liberdade assistida a prolação de novo decisum. (HC 155.060/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 23/03/2010, DJe 12/04/2010) Cabe ressaltar, que remanesce, mesmo havendo doutrina em sentido contrário, a possibilidade de aplicação da medida de internação até os 21 anos, aplica-se o ECA, com fulcro no artigo 2º, p.u e 104, p. único e 121 § 5º. Nesse sentido, trago à baila, a brilhante exposição de Valter Ishida, 1verbis: “ Ademais, interpretação diversa permitiria que menores cometessem graves atos infracionais, às vésperas de completar dezoito anos, sem que a sociedade, representada pelo Estado- Juiz , pudesse lhes impor qualquer tipo de medida penal( já que inimputáveis na esfera penal) ou educativa( pois as medidas do ECA somente seriam executáveis até completarem 18 anos)” 1 Estatuto da Criança e do Adolescente. Doutrina e Jurisprudência. Editora Atlas, São Paulo, 2006, Pág. 190. Há doutrina em sentido contrário utilizando-se do argumento lógico da impossibilidade de aplicar no instituto da remissão a cumulação de medida socioeducativa. Nesse sentido, pronuncia-se Paulo Lúcio Nogueira, litteris:2 “Entendemos que a remissão não se coaduna com a aplicação simultânea de qualquer medida socioeducativa, pois não pode haver perdão acompanhado de punição, o que não deixa de ser um contra-senso: perdoar e punir”. Em explicação didática sobre o tema, o tema é explicitado com maior precisão por DEL CAMPO e OLIVEIRA3, verbis: “ A remissão judicial, em qualquer de suas modalidades, ao contrário da remissão ministerial, pode ser cumulada com medida socioeducativa em meio livre, ou seja, com exceção da semiliberdade e da internação( artigo 127 do ECA). Note-se que , para a imposição de medida pela autoridade judiciária, é preciso que existam ao menos indícios de materialidade e autoria, ainda que não se exija a prova cabal do cometimento da infração. Embora alguns julgados isolados, por interpretação literal do art. 188 do ECA, entendam que a remissão é ato discricionário do Magistrado que pode ser concedida em qualquer fase, a jurisprudência dominante vem acatando a tese de que somente pode ser concedida após a oitiva do infrator e ouvido o Ministério Público, a fim de que o juiz possa traçar um perfil ainda que perfunctário, do adolescente, de sua estrutura familiar e do ato praticado, decidindo, fundamentadamente, pela conveniência do benefício e por qual medida cumulativa a ser aplicada”. Cabe ressaltar que o descumprimento da medida é motivo para internação cautelar de até 03 ( três) meses, razão pela qual recomenda-se atuação do Poder Judiciário para reprimir 2 Estatuto da Criança e Adolescência Comentado. Editora Saraiva, 1998, São Paulo, pág. 208. DEL CAMPO, Eduardo Roberto Alcântara e OLIVEIRA, Thales Cezar. Estatuto da Criança e Adolescente. Editora Atlas, Série Leituras Jurídicas- Provas e Concursos, ano de 2005, vol. 28, pág. 170. 3 comportamentos nocivos à sociedade, sendo de bom alvitre que àqueles que estão na idade civil adulta cumprindo medidas socioeducativas decorrentes de época em que portavam a condição de adolescentes, portem-se com disciplina e senso de responsabilidade, caso não queiram cumprir medida excepcional de internação provisória ou definitiva com o limite máximo até os 21( vinte e um) anos de idade. Nesse sentido, trago à baila, algumas decisões do STJ nessa linha de argumentação: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – ECA. HABEAS CORPUS. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO REMISSÃO PELO DE ENTORPECENTES. JUÍZO SINGULAR. APLICAÇÃO DE FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PROSSEGUIMENTO REGULAR DO FEITO. ARTS. 227 DA CF E 4º DO ECA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃOCONFIGURADO. ORDEM DENEGADA. 1. Tratando-se de menor inimputável, não existe pretensão punitiva estatal propriamente, mas apenas pretensão educativa, que, na verdade, é dever não só do Estado, mas da família, da comunidade e da sociedade em geral, conforme disposto expressamente na legislação de regência (Lei 8.069/90, art. 4º) e na Constituição Federal (art. 227). 2. De fato, é nesse contexto que se deve enxergar o efeito primordial das medidas socioeducativas, mesmo que apresentem, eventualmente, características expiatórias (efeito secundário), pois o indiscutível e indispensável caráter pedagógico é que justifica a aplicação das aludidas medidas, da forma como previstas na legislação especial (Lei 8.069/90, arts. 112 a 125), que se destinam essencialmente à formação e reeducação do adolescente infrator, também considerado como pessoa em desenvolvimento (Lei 8.069/90, art. 6º), sujeito à proteção integral (Lei 8.069/90, art. 1º), por critério simplesmente etário (Lei 8.069/90, art. 2º, caput). 3. Mostra-se prematuro o deferimento da remissão, em razão da natureza do delito, bem como pelo fato de o menor ter se envolvido com o tráfico, o que revela a fragilidade em que se encontra no contexto familiar e social. 4. Ordem denegada. (HC 139.950/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 03/12/2009, DJe 01/02/2010) HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO CRIME DE FURTO. MEDIDA SÓCIO-EDUCATIVA DE INTERNAÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. ATO DESPROVIDO DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA. FALTA DE PREVISÃO LEGAL. REITERAÇÃO NÃO DEMONSTRADA. INTERNAÇÃO-SANÇÃO POR PRAZO INDETERMINADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a internação, medida sócio-educativa extrema, só está autorizada nas hipóteses taxativamente elencadas no art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Precedente. 2. O ato infracional cometido pelo menor - furto -, embora seja socialmente reprovável, é desprovido de violência ou grave ameaça à pessoa. 3. Somente ocorre reiteração, para efeito de incidência da medida de internação, quando são praticadas, no mínimo, três ou mais condutas infracionais graves. 4. Os processos nos quais foi concedida a remissão não se prestam a configurar antecedentes, nos termos do art. 127 da Lei n.º 8.069/90. Precedentes. 5. Conforme o disposto no art. 122, § 1.º, da Lei n.º 8.069/90, a medida de internação, imposta em razão de descumprimento injustificado de medida socioeducativa, não poderá exceder o prazo de 03 (três) meses. Precedentes. 6. Ordem concedida para, cassando o acórdão impugnado, anular a decisão de primeiro grau no que diz respeito à medida socioeducativa imposta e determinar que outra seja proferida, permitindo-se ao Paciente aguardar em liberdade assistida a prolação de novo decisum. (HC 155.060/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 23/03/2010, DJe 12/04/2010). Diante da jurisprudência acima, em face do descumprimento da medida socioeducativa aplicada em face da remissão, o julgado retromencionado ressalva que é possível a medida cautelar de internação provisória no máximo de 03( três) meses, situação excepcional até a prolação final do mérito em que o magistrado velando pelos princípios que visem reeducar o maior de idade até a idade de 21( vinte e um) anos , nesses casos, adotem a melhor medida judicial, em face do principio da brevidade e da condição especial de pessoa em desenvolvimento, inserta em cada ser humano, que geralmente tornam-se adultas por estudos técnicos somente com 25 ( vinte e cinco) anos de idade. A aplicação de medidas socioeducativas ao maior de 18( dezoito) anos por atos praticados na adolescência revela um perfil do Juizado da Infância e Juventude que tem cuidado em construir uma personalidade saudável nos menores para que estes, quando adultos possam ser ressocializados e, também tem uma feição moralizadora, no sentido, de que o advento da maioridade não significa impunidade, mas sim responsabilidade por atos praticados em período de jurisdição especial, de proteção especial( artigo 227 § 3º, CF/88). Por fim, se o Estatuto da Criança e Adolescente reservou espaço para que a medida socioeducativa ultrapassasse o limite dos 18(dezoito) anos é porque deve ser considerado como parâmetro necessário como especial, devido à vulnerabilidade física e psíquica, diferencial do direito a uma categoria especial de pessoas, como forma até de tutelar os direitos fundamentais de pessoa em desenvolvimento de forma objetiva, mesmo que essas não considerem necessária a intervenção do Estado. Uma atuação nessa linha de argumentação tem a função de prestigiar a dignidade humana em formação, e em cada caso concreto o Juiz desenvolva um parâmetro de proteção integral ao adolescente observando o princípio da proporcionalidade evitando-se medidas de ressocialização e de educação que violem a dignidade do adulto até os 21(vinte e um) anos, por ser uma medida inadequada e desnecessária.