DETERMINANTES SOCIAIS DE SAÚDE MENTAL Claudia de Souza Lopes Departamento de Epidemiologia Instituto de Medicina Social Universidade do Estado do Rio de Janeiro Transtornos mentais Produzem 8% da Carga Global de Doença (Murray & Lopez, 1996). Transtornos depressivos – espera-se que sejam responsáveis pela maior carga de doença no mundo no ano de 2020. Depressão – fator de risco mais importante para “carga global de doença” entre as mulheres no Brasil (FENSPTEC, 2000). Final report of the project Estimations of the Burden of Disease in Brazil 1998. Technologies in health for quality of life, Brazil. 2002. Rio Janeiro, FIOCRUZ. 2 Prevalência de TMC na comunidade. Indivíduos com transtornos mentais na comunidade – 90% apresentam transtornos mentais comuns (TMC) Sintomas de depressão/ansiedade de menor gravidade, queixas somáticas 18 a 27% nos países desenvolvidos (Weich et al, 2001; Patel & Kleinman, 2003) 19 a 35% nos países em desenvolvimento (Araya, 2001; Ludermir & Mello Filho, 2003; Lima 2004) 3 Prevalência de TMC em Unidades de Atenção Geral à Saúde no Brasil AUTOR ANO LOCAL INSTRUMENTO Busnello et al. 1983 Centro de Saúde RS SRQ-20 clínica Mari 1986 1987 Centro de Saúde / SRQ-20 Ambulatório Geral GHQ12(2/3) de Hospital - SP CIS TMC: 47 a 56% Morbidade Psiq. Grave: 25 a 27% Iacoponi 1989 Centro de Saúde TMC: 53% Villano 1995 Ambulatório GHQ-12 Medicina Integral CIDI-PHC (Geral) em Hosp. Universitário RJ TMC: 41,8% (GHQ 2/3) 20.9%(GHQ - 4/5) Transtornos Mentais: CIDI: 38% Fortes 2004 Unidades do PSF Petrópolis TMC: 56% (GHQ 2/3) 33% (GHQ 4/5) (Adaptado, Fortes, 2004 e Villano et al, 1997) SRQ20 GHQ - 12 RESULTADOS Entrevista Casos Possíveis: 55% Casos Confirm.: 48,5% 4 TABLE 1. PREVALENCE OF CMD IN PRIMARY HEALTH CARE COUNTRY Nicaragua(25) Method Sample Size Prevalence (%) PSE 171 58 Chile(7) CIS-R 170 53.0 Chile* CIDI 274 52.5 Brazil(16) CIS 260 52.3 India(24) CIS-R 335 46.5 Brazil* CIDI 393 35.5 United Kingdom* CIDI 428 24.8 Netherlands* CIDI 340 23.9 Turkey* CIDI 400 16.4 Italy* CIDI 250 9.8 Sudan* CIDI 269 9.5 China* CIDI 576 7.3 Fonte: Araya, R. (2000) The Growing Public Health Importance of Common mnetal disorders. The forgotten reality of the less developed world. Epidemiol Psichiatr Soc; 9(4):241-8. 5 Brasil – últimos 40 anos – grandes mudanças demográficas e sociais População cresceu de 52 milhões para 172 milhões de habitantes Grande fluxo migratório das regiões rurais para as cidades Condições de moradia inadequadas Altas taxas de violência e criminalidade Mudanças nas formas tradicionais de apoio social Redução do tamanho médio da família – de 8,5 para 4,5 pessoas Família “estendida” diminui drasticamente - família nuclear Mudanças na economia e fontes de trabalho Necessidade cada vez maior de qualificação Maior número de horas de trabalho, maior competitividade Entrada maciça das mulheres no mercado de trabalho - 25% são chefes de família, recebem salários mais baixos, dupla jornada Combinação de fatores – pode explicar a elevada prevalência de TMC na população urbana brasileira? 6 Ambiente social e saúde mental Estudos conduzidos na última década – voltados para a organização no trabalho, grau de isolamento social, e senso de controle na vida. Avaliação do ambiente de trabalho - preocupação crescente de que tais condições contribuam para a carga de morbidade psiquiátrica na população. Condições de trabalho estressantes predizem uma pior saúde mental? Este efeito é individual ou contextual? Ou ambos? Até que ponto existe uma variabilidade que depende do local de trabalho? 7 8 Determinantes Sociais de Saúde Mental em População de Funcionários Públicos do Rio de Janeiro: Estudo Pró-Saúde: Claudia S. Lopes (*), Eduardo Faerstein(*), Dora Chor(**), Guilherme L. Werneck (*)(***) * Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado Rio de Janeiro ** Escola Nacional de Saúde Pública, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro *** Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro 9 ESTUDO PRÓ-SAÚDE: Idéias centrais Foco principal: estudo de determinantes sociais Desfechos de interesse – principais Transtornos mentais Hipertensão Obesidade / ganho de peso Qualidade de vida (WHOQOLbref) Estudo de coorte prospectivo População grande centro urbano Idade laboral Funcionários públicos 10 Alguns determinantes de interesse Posição sócio-econômica: precoce e tardia/ trajetória de vida Eventos de vida produtores de estresse – EVPE (incl. vitimização, discriminação) Estresse no trabalho (modelo demanda/ controle) Apoio social / rede social Ocupação Circunstâncias domésticas e estilo de vida 11 Estudo Pró-Saúde Desenho – Estudo de coorte, prospectivo Censos – Todos os funcionários técnicoadministrativos de uma universidade no estado do Rio de Janeiro Fase 1 – 1999 Fase 2 - 2001 Fase 3 – 2006/2007 Questionários auto-preenchíveis / escalas Análise dos dados – Riscos Relativos – GLM 12 População de Estudo (elegíveis N = 4177) Fase 1 1999 Fase 2 2001 4030 (90,6%) 3574 (82,6%) Fases 1 e 2 3253 (78,2% da população elegível) 13 Avaliação do papel dos Determinantes sociais no desenvolvimento (incidência) de TMC Não-casos de TMC na Fase 1 (1999) 2 anos EVPE, Vitimização Apoio social, Circunstâncias domésticas Casos de TMC na Fase 2 (2001) Vitimização Estresse no trabalho 14 Avaliação do papel dos Determinantes sociais na manutenção de TMC Casos de TMC na Fase 1 (1999) 2 anos EVPE, Vitimização Apoio social, Circunstâncias domésticas Casos de TMC na Fase 2 (2001) Vitimização Estresse no trabalho 15 Medidas e instrumentos • Transtornos mentais comuns - GHQ-12 – duas últimas semanas, dicotômico - ponto de corte 2/3 para casos – Fases 1, 2 e 3 • Estresse no ambiente de trabalho – Modelo demanda/controle (Karasek e Theorell) – Fase 2 • EVPE – perguntas dicotômicas (sim/não) – morte parente próximo, dificuldades financeiras graves, rompimento de relação amorosa, etc. – Fase 1 • Vitimização – assalto/roubo mediante uso de violência, agressão física - Fase 1 + ferido por arma, testemunha – Fase 2 • Apoio social - “Medical Outcome Study” – Fase 1 16 PREVALÊNCIA DE TRANSTORNOS MENTAIS COMUNS ENTRE OS FUNCIONÁRIOS DA UNIVERSIDADE Censo 2001 Censo 1999 30% 33% 70% 67% 17 Prevalência de Transtornos Mentais Comuns de acordo com Gênero 77% 64% 36% 23% Homens TMC = 0 TMC = 1 Mulheres 18 Prevalência de TMC na população de estudo, segundo a idade % 30 29 28 27 26 25 24 23 22 <= 24 25 a 34 35 a 44 45 a 54 >= 55 19 Prevalência de Transtornos Mentais Comuns segundo Local de Trabalho 73% 67% 33% 27% Campi TMC = 0 TMC = 1 Hupe 20 Prevalência de Transtornos Mentais Comuns por Ocupação (classificação de acordo com o esquema EGP - Erikson-Goldthorpe-Portocarero) 29% 35% 29% Nível Administrativos Apoio/serviços superior/chefia gerais 21 Prevalência de Transtornos Mentais Comuns segundo características sócio-demográficas e econômicas da população de estudo (n=3252) Característica Escolaridade 1o grau 2o grau 3o grau Situação Conjugal Casado/vive em união Solteiro/viúvo/divorciado Renda per capita (tercis) Mais baixo Intermediário Mais elevado Presente N % TMC Ausente N % P valor 243 393 382 33,7 34,1 31,0 479 758 850 66,3 65,9 69,0 0,22 601 403 32,5 34,5 1251 784 67,5 66,0 0,39 367 312 291 36,2 33,2 28,9 646 629 715 63,8 66,8 71,1 0,002 22 Incidência e persistência de TMC após dois anos de seguimento, segundo a ocorrência de EVPE, RRs ajustados* e IC 95% Estudo Pró-Saúde 1999-2001 EVPE (Fase 1 - 1999) Problema sério de saúde Internação hospitalar Dificuldades financeiras graves Morte de parente Mudança de moradia Rompimento relação amorosa Assalto/roubo Agressão física N (%) Incidência RR (IC 95%) Persistência RR (IC 95%) 702 (21,8) 238 (7,4) 1,4 (1,2-1,7) 1,4 (1,1-1,8) 1,2 (1,0-1,3) 1,0 (0,9-1,2) 1.592 (49,2) 409 (12,6) 271 (8,4) 1,5 (1,2-1,7) 1,1 (0,8-1,3) 1,3 (1,0-1,7) 1,3 (1,1-1,5) 1,0 (0,9-1,2) 1,1 (1,0-1,3) 532 (16,5) 374 (11,6) 128 (4,0) 1,3 (1,1-1,6) 1,4 (1,1-1,7) 1,9 (1,4-2,5) 1,1 (1,0-1,3) 1,1 (0,9-1,2) 1,3 (1,1-1,5) * Ajustado por sexo, idade e renda 23 Incidência de TMC, após dois anos de seguimento, segundo o relato de baixo apoio social. RRs ajustados e IC 95%: Estudo Pró-Saúde 1999-2001 Baixo Apoio social 1999 Incidência TMC 2001 N (%) Apoio global 608 (39,5%) 1,80 (1,54 – 2,09) Afetivo/ Interação 629 (38,5%) 1,72 (1,48 – 2,01) Emocional/ Informação 608 (39,0%) 1, 72 (1,48 – 2,01) Material 571 (37,7%) 1, 52 (1,31 – 1,76) ________________________ RR ajustados (IC 95%) 24 Ajustado por sexo, renda e idade Associação entre experiência de violência física (assalto/roubo com violência e/ou agressão física) e TMC Violência Física Incidência de TMC Persistência de TMC ____________________________________________ N (%) RR ajustado N (%) RR ajustado (95% CI) (95% CI) ___________________________________________________________ Não sofreu 359 (20.9) 1.00 383 (53.6) 1.00 Violência 1999 ou 2001 95 (26.5) 1.2 (1.0-1.4) 139 (63.5) 1.2 (1.0-1.3) 1999 e 2001 35 (44.9) 2.1 (1.6-2.7) 40 (58.8) 1.1 (0.9-1.3) * Ajuste por sexo, idade, renda e outros eventos de vida estressantes (EVPE) 25 Psychological Demands LOW Active Control HIGH Low Strain HIGH LOW High Passive Strain Adapted from Theorell (1996) Modelo demanda/controle 26 Características do trabalho e transtornos mentais comuns Table 2 – Prevalence of CMD (GHQ-12) according to quadrants of job stress, social support at work, shift-work and occupational status, unadjusted and adjusted prevalence ratios (PR) and their 95% confidence intervals (95% CI) PróSaúde Study, Rio de Janeiro, Brazil, (Phase 2- 2001) _____________________________________________________________________________________ CMD Model 1** Model 2*** N (%) Unadjusted PR Adjusted PR Adjusted PR (95% CI) (95% CI) (95% CI) ____________________________________________________________________________________________ Job Stress Quadrants* High strain Passive Active Low strain 226 (48.71) 272 (31.16) 260 (32.58) 335 (29.05) 1.68 (1.47-1.91) 1.07 (0.94-1.23) 1.12 (0.98-1.28) 1.00 1.54 (1.35-1.75) 1.05 (0.92-1.21) 1.10 (0.96-1.26) 1.00 1.35 (1.18-1.55) 1.02 (0.89-1.17) 1.05 (0.92-1.20) 1.00 Social support at work Yes No 432 (25.52) 667 (40.70) 1.00 1.59 (1.44-1.76) 1.00 1.56 (1.41-1.73) Not applicable Occupational Status Professional Routine non-manual Manual workers 256 (28.93) 786 (35.73) 85 (29.82) 1.00 1.24 (1.10-1.39) 1.03 (0.84-1.27) 1.00 1.08 (0.95-1.22) 0.98 (0.79-1.23) 1.00 1.11 (0.98-1.26) 0.97 (0.76-1.23) Shift-work Yes No 340 (36.56) 689 (31.38) 1.17 (1.05-1.29) 1.00 1.08 (0.98-1.21) 1.00 1.07 (0.96-1.19) 1.00 _____________________________________________________________________________________ * High strain (high job demands and low control); low strain (low job demands and low control); active (high job demands and high control); and passive (low job demands and high control). 27 ** Model 1. Adjusted by sex, age, and per capita monthly income *** Model 2. Adjusted by sex, age, per capita monthly income, and social support at work Efeitos contextuais e saúde mental Estudos futuros – ELSA Medidas do local de moradia - Características de Contexto – Capital Social/Ambiente/Insegurança Eficácia coletiva É produzida pelo compartilhamento de valores de uma coletividade em sua capacidade conjunta de ação. Combina escalas de Coesão Social e Controle Social Informal Qualidade do ambiente Nível de Desordem Física Índice de Problemas na Vizinhança Violência/insegurança Violência Percebida, Vitimização Pessoal e Taxas de Homicídio nas regiões Vulnerabilidade do espaço social - jovens em situação de risco (por ex. de 15 a 25 anos, que não trabalham), proporção de mães solteiras, proporção de desempregados de uma forma 28 geral/trabalho informal, etc. - IBGE