A COOPERAÇÃO DESCENTRALIZADA NO BRASIL
Gustavo Cezário e Marinana Andrade
INTRODUÇÃO
Ao estruturar um diálogo entre análises teóricas e vivência dos atores, o presente artigo
busca diminuir a distância entre os fatos e as reflexões sobre a cooperação
descentralizada. Espera-se, assim, estimular o avanço da discussão da temática no país,
aproximando-se de entendimentos comuns entre os diversos atores deste processo. As
idéias aqui descritas resultam de uma compilação, elaborada pelo Centro de Direito
Internacional (CEDIN) e pela Confederação Nacional de Municípios (CNM),
especialmente a partir dos debates ocorridos durante a Conferência Mundial sobre o
Desenvolvimento de Cidades em Porto Alegre, evento no qual o tema da cooperação
descentralizada foi abordado em várias oportunidades.
Neste contexto, o presente documento faz, inicialmente, (I) um breve histórico da
cooperação descentralizada ao longo dos anos, (II) seguido de diferentes abordagens
sobre a temática nos dias de hoje. Feito isto, passar-se-á a (III) uma análise sobre a
importância da cooperação descentralizada, atentando-se, especialmente, ao caso
brasileiro. Concluída a seção sobre a relevância deste processo, serão discutidos (IV) os
riscos, as limitações e os desafios da cooperação descentralizada, tendo como pano de
fundo a realidade brasileira.
I) O SURGIMENTO DA COOPERAÇÃO DESCENTRALIZADA
Inicialmente, faz-se necessário um breve resgate histórico da cooperação internacional,
a fim de compreender o contexto de seu surgimento, o qual tem consequências nas
características que delineiam o fenômeno. A cooperação, como é hoje entendida, tem
seu início após a Segunda Guerra Mundial, com o Plano Marshall. A visão neste
momento era a de uma cooperação oficial realizada entre Estados Nações e regulada por
acordos internacionais. A partir da intensificação da globalização, novos atores
começam a surgir no cenário internacional. Entre eles, destacam-se as empresas
transnacionais, as redes de organizações não-governamentais e os movimentos sociais.
Surge, daí, o conceito da Cooperação Interinstitucional:
Ocorre entre diferentes instituições públicas e/ ou privadas de países diferentes, através de
convênios entre as partes envolvidas. Não passa necessariamente ao conhecimento do governo
federal. Sabe-se que ocorre intensamente entre universidades, centros de pesquisa (cooperação
científica), empresas, ou entre ONGs. (APOSTTOLOVA e INOUE, 1995, p. 16)
No final do século XX, nas décadas de 80 e 90, e, principalmente, neste início do século
XXI, houve uma intensificação da atuação internacional de governos subnacionais. É
nesse contexto que o basco SOLDATOS (1990) introduz o conceito de Paradiplomacia
para designar as relações internacionais dos governos não-centrais.
A evolução desse fenômeno pode ser verificada por meio de diversos acontecimentos.
Segundo PAQUIN (2003), a província de Quebec no Canadá já desempenhava um
papel internacional desde o início do século XX. O surgimento da International Union
of Local Authorities (IULA) demonstra, já em 1913, a concepção de um associativismo
mundial de autoridades locais. Além disso, o fenômeno de cidades irmãs é datado da
década de 50, quando a França e a Alemanha elaboraram conexões entre cidades que
dividiam interesses e compreensões comuns voltados a uma política de segurança do
pós-guerra.
Casos brasileiros servem ainda para ilustrar esse contexto de surgimento da noção sobre
a atuação internacional dos governos locais. BRIGAGÃO (2005) recorda, assim, a
manifestação de protesto do então governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola,
em 1960, por não ter participado nas negociações da Associação Latino-Americana de
Livre Comércio (ALALC) em Montevidéu. Um outro exemplo é a criação de uma
secretaria de relações internacionais no governo do estado de Minas Gerais, em 1964,
mas que se limitou ao texto de seu decreto.
Essas iniciativas não se limitaram a ocasiões pontuais, ganhando uma perspectiva
multilateral. Na primeira Conferência do Centro das Nações Unidas de Assentamentos
Urbanos (Habitat), realizada em Vauncouver, 1976, o tema da descentralização política
seria defendido, estimulando inclusive um maior intercâmbio entre nações de
experiências locais. O idealismo dessa conferência, entretanto, resultou em mínimas
ações por parte de alguns países. Por certo, “não haveria tanta surpresa se analisarmos
um quadro global de poderes centralizados e repressões” (UNCHS, 2001, p.48). Na
América Latina, por exemplo, o período ditatorial centralizou ainda mais o poder no
governo federal.
Percebe-se, assim, que a inserção internacional de governos locais não é um fenômeno
novo. Contudo, as ações observadas até o início da década de 80 eram ainda incipientes.
As oportunidades internacionais eram percebidas pelas autoridades locais mais como
uma forma de se realçar na política doméstica antes de qualquer outro motivo. Não
havia uma clareza sobre as capacidades e mesmo outras vantagens da participação dos
governos locais em âmbito global. Isto se dá especialmente a partir da década de 90,
com a intensificação dos fluxos internacionais e com a maior presença dos governos
locais em discussões internacionais, como as promovidas pela Organização das Nações
Unidas. É a partir de então que se solidifica a noção do enfrentamento dos problemas
sociais como uma pauta internacional e, ainda, que este passa pelo empoderamento dos
governos locais.
II) COOPERAÇÃO DESCENTRALIZADA: POSSÍVEIS ABORDAGENS
A partir da constatação da existência fática desta nova forma de relações internacionais
via governos não-centrais, diferentes abordagens buscaram entender o fenômeno da
cooperação descentralizada. Neste contexto, podem ser percebidas algumas
convergências nas definições e nos conceitos. Se por um lado parece haver acordo entre
os autores quanto à participação dos governos não-centrais neste processo, por outro,
percebe-se uma discrepância quanto à definição da abrangência da participação dos
atores, de seu alcance geográfico e da natureza das atividades desenvolvidas neste
processo, como bem sistematizado por HAFTECK (2003).
Uma das primeiras definições acerca da cooperação descentralizada foi feita pela
Comissão da Comunidade Européia, em 1992. De acordo com essa organização,
trataria-se o fenômeno de:
Uma nova abordagem da cooperação que busca estabelecer relações diretas entre
instituições de representação local, além de estimular a capacidade dessas instituições para
elaborar e executar projetos de desenvolvimento com participação direta da população,
levando em consideração seus interesses e pontos de vista sobre desenvolvimento. 1
(Commission of the European Communities, 1992).
A definição recebeu críticas por englobar diferentes tipos de instituições (associações,
municípios, regiões, universidades, fundações, sindicatos). Segundo alguns autores, são
igualados dentro desta perspectiva atores essencialmente diferentes, o que
comprometeria a compreensão deste processo de cooperação. Além disso, esta definição
não traria instrumental para diferenciação entre cooperação descentralizada e
cooperação Interinstitucional.
Já a abordagem francesa, buscando restringir o conceito de cooperação descentralizada,
definiu-a como sendo aquela inerente às parcerias formais entre autoridades locais (ou
regionais) de diferentes países. A crítica desta vez foi ao fato de essa forma de entender
a cooperação descentralizada significar, para alguns, uma limitação exacerbada do
fenômeno, que não abrangeria sua completude.
Neste sentido, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento - PNUD – optou
por elaborar um conceito que levasse em consideração critérios geográficos. Ainda que
a referência seja o espaço de jurisdição específico de autoridades locais, os atores da
cooperação descentralizada poderiam ser quaisquer agentes ou instituições da
comunidade local. A crítica a esse último conceito é que novamente há uma confusão
desse termo com a Cooperação Interinstitucional.
A visão italiana acerca deste processo manteve o foco sobre o desenvolvimento
humano, tratando do assunto como parcerias entre regiões (governos subnacionais) de
diferentes países que conseguiria integrar esforços da sociedade civil provenientes de
uma mesma área geográfica. Uma cooperação que poderia ser estimulada por pequenos
projetos de irmanamento entre cidades ou pelo Ministério do Exterior e Organizações
Internacionais (como as Nações Unidas). Nesse sentido, a cooperação descentralizada
seria definida como:
As ações de cooperação para o desenvolvimento carregadas por autoridades locais italianas,
individualmente ou em consórcio, com assistência de instituições provindas de organizações
da sociedade civil no território correspondente da administração competente, promovendo a
participação de vários componentes representativos da sociedade civil em países parceiros no
processo de decisão visando o desenvolvimento sustentável do território.2
1
Traduzido do original: “a new approach to co-operation that seeks to establish direct relations with the
bodies of local representation and to stimulate these bodies’ capacity to create and execute development
projects with the direct participation of the population groups concerned, taking in consideration their
interests and their points of view on development”.
2
Traduzido do original: “the action of development cooperation carried out by Italian local authorities,
individually or in consortium, with the assistance of entities belonging to organised civil society in the
corresponding territory of administrative competence, executed in partnership primarily with counterpart
institutions of developing countries, promoting the active participation of various components
representative of civil society in partner countries in the decision-making process aiming at their
territory´s sustainable development”. Elaborado durante a Convenção Nacional sobre cooperação
Embora as abordagens estabelecidas pelos atores acima analisados sejam distintas,
HAFTECK (2003, 336) buscou uma sistematização baseada em possíveis pontos de
convergências. Ao reunir tais características, o autor elaborou a seguinte definição:
Cooperação descentralizada consiste em uma relação substancial colaborativa entre
governos subnacionais de diferentes países, visando um desenvolvimento local sustentável
que implica em algumas formas de trocas e suportes conduzidas por estas instituições ou
outros atores locais.3
Tal definição tem como principal mérito o fato de reconhecer a liderança dos governos
locais neste processo, assim como perceber a importância do engajamento dos demais
atores da esfera local para o desenvolvimento da cooperação descentralizada. O que
parece faltar a essa visão é o reconhecimento da relevância da participação dos
governos centrais e das agências internacionais como partes/promotores deste
fenômeno.
O Quadro 1, reproduzido abaixo, explicita as mais importantes características da
cooperação descentralizada, de acordo com a perspectiva proposta por Hafteck.
descentralizada (National Convention on Decentralizes Cooperataion, Italian Ministry os Foreign Affaris,
1999).
3
Traduzido do original: “Decentralized Cooperation consists in substantial collaborative relationships
between sub-national governments from different countries, aiming at sustainable local development,
implying some form of exchange or support carried out by these institutions or other local based actors.”
(p.336)
Quadro 1 - Concepção da cooperação descentralizada
Objetivo da
cooperação
Natureza das
Atividades
Liderança de atores
Pró-ação de demais
atores locais
Estímulo ao
Processo
Busca-se
a
promoção
de
um
desenvolvimento a longo-prazo construído
sobre a perspectiva local, envolvendo,
sobretudo, os países do sul.
Troca de pessoal e conhecimento
Intercâmbio e Suporte
mediante contribuições monetárias ou em
Cultural, Social, Econômico
gênero (como serviços, treinamentos,
e Político.
materiais, modelos jurídicos e políticos).
Foco sobre um espaço geográfico
específico de ação conduzido por
autoridades locais (o que no Brasil
corresponderia aos municípios), visando à
Governos Locais.
aproximação
das
áreas,
e
consequentemente, da população em que
se encontram as dificuldades.
A participação dos diversos atores da
comunidade local é a base fundamental
Participação da Sociedade
para a sustentabilidade e eficácia dos
Civil, Ong e Setor Privado.
projetos, sobretudo no que tange a leitura
dos problemas locais.
Enquanto o envolvimento dos governos
centrais gera o debate interno sobre a
descentralização política e as respectivas
competências, as agências internacionais
Governos Centrais e
podem contribuir em mobilizar recursos e
Agências Internacionais
disseminar
experiências.
No
caso
brasileiro, os governos estaduais poderiam
ser
enquadrados
aqui
caso
não
considerados como governos locais.
Desenvolvimento Local
Sustentável.
Fonte: Adaptado de HAFTECK (2003, p. 335) por Gustavo Cezário.
O conceito e o escopo da cooperação descentralizada geram ainda muitas discussões,
em grande parte, por se tratar de uma temática relativamente nova e que traz uma
mudança de paradigma nas relações internacionais, na medida em que insere nesta
novos e importantes atores. O Brasil não está alheio a este processo. Assim como em
outros países, ainda falta um entendimento comum dos atores acerca da proporção e do
real delineamento deste fenômeno. Este fato, contudo não diminui a importância desta
nova forma de cooperação, especialmente para os entes subnacionais brasileiros. Neste
sentido, os dizeres de André Costa, ex-deputado federal e diplomata de carreira
elucidam acerca da necessidade de dar-se a devida atenção à cooperação
descentralizada:
A dinâmica complexa da globalização aponta para o fortalecimento do poder local, que
em muitas circunstâncias se revela um espaço de mediação eficaz entre as demandas
dos cidadãos e o caráter transnacional. Diante dessa realidade cada vez mais presente, é
importante que todo o processo democrático seja aprofundado e estimulado do nível
local ao global. (BRIGAGÂO, 2005, p. 11)
III) A RELEVÂNCIA DA COOPERAÇÃO DESCENTRALIZADA
Apesar das divergências acadêmicas acerca da exata definição da cooperação
descentralizada, o fato é que se trata de uma realidade. Deve-se dizer que esta
cooperação vem ocorrendo de forma heterogênea em diferentes partes do mundo,
estando alguns países bastante avançados com relação à institucionalização e à
legislação sobre o assunto. Esta heterogeneidade se repete no âmbito brasileiro, já que
há bastante discrepância na maneira como a cooperação descentralizada é entendida e
praticada. Alguns entes federados a têm como parte cotidiana de suas ações políticas,
enquanto outros não a percebem como um instrumento possível de política local.
Este tópico tem como objetivo identificar e analisar o perfil da cooperação
descentralizada, dando ênfase ao caso do Brasil. Com isso, pretende-se demonstrar a
importância que este processo pode ter no desenvolvimento de políticas locais. Neste
sentido, são propostas as seguintes dimensões perpassadas pela cooperação: (a)
conhecimento local e reconhecimento internacional, (b) novos instrumentos de
desenvolvimento, (c) a importância dos municípios de fronteira, (d) integração e política
externa brasileira, (d) promoção cultural, econômica e turística e (f) fontes de recursos.
a) Conhecimento Local e o Reconhecimento Internacional
A maior parte dos problemas enfrentados pelas comunidades locais, em áreas como
saúde, educação e planejamento urbano tende a ser solucionada por técnicos locais, sem
envolvimento de consultores externos ou mesmo de técnicos dos governos centrais.
Neste contexto, o empoderamento dos gestores locais, por meio de intercâmbios
internacionais, possibilita que o conhecimento permaneça no território ao final do
processo, além de garantir que a demanda local seja atendida.
A compreensão desses dois eixos, conhecimento local e engajamento político, são
fundamentais para o presente debate. Do conhecimento local, entende-se o
envolvimento da comunidade nas decisões de interesse público, sem o intuito de retirar
a responsabilidade principal dos governos em executar políticas de desenvolvimento.
Para que essas políticas sejam efetivas é essencial que, ademais da capacitação dos
indivíduos e das organizações, os governos promovam mudanças político-culturais.
Segundo a corrente de Desenvolvimento de Capacidades, a diferença de performance
econômica e de qualidade de vida entre os países é determinada, em primeira instância,
pelo grau de conhecimento local e de institucionalização, ao invés de riquezas naturais e
de capital investido. A cooperação descentralizada deve ser e vem sendo utilizada como
um catalisador do conhecimento de técnicos para atender às demandas de suas
localidades.
Neste contexto, de ampliação das capacidades locais, a Organização das Nações Unidas
vem afirmando que as Metas do Milênio só poderão ser alcançadas quando houver o
comprometimento dos governos locais. Assim, sobretudo ao final da Guerra Fria, a
agenda internacional aborda cada vez mais temas que passam por competências dos
governos locais como pode ser observado nos Objetivos de Desenvolvimento do
Milênio: ensino básico universal, redução da mortalidade infantil, sustentabilidade
ambiental, rede global de parcerias. Portanto, já há um reconhecimento internacional
sobre a necessidade de se fazer ouvidas as vozes das cidades e da participação desses na
cooperação internacional para o desenvolvimento.
b) Novos Instrumentos de Desenvolvimento
O fracasso da cooperação tradicional é um dos grandes explicativos para o surgimento
de novos modelos. Após mais de cinqüenta anos de avaliação sobre os projetos de
cooperação internacional entre Estados Nações, pode-se perceber que muito pouco foi
gerado de desenvolvimento nos países do sul. A conclusão alcançada pelo mainstream
da cooperação internacional é que as dificuldades enfrentadas nesses países devem ser
tratadas com uma visão integral, em que o território passa a ser protagonista (ou seja, os
indivíduos deixam de ser objetos para serem sujeitos da cooperação).
O novo modelo de cooperação internacional, portanto, tem como principal premissa
celebrar o compartilhamento de experiências entre iguais baseado no saber local. Para
tanto, o empoderamento das esferas locais torna-se objetivo prioritário para a
consecução de um verdadeiro desenvolvimento humano. Logo, a cooperação
descentralizada apresenta um grande potencial como instrumento de construção de
capacidades, fundamentada em princípios básicos como: reciprocidade,
complementaridade, exercício democrático participativo, descentralização política e
enfoque no local. Este último permite maior flexibilidade para adaptações necessárias a
efetividade do projeto.
c) Municípios de Fronteira
Os municípios de fronteira se deparam diariamente com a necessidade concreta de
interação internacional com os povos vizinhos. Esta se dá nas mais diversas áreas como
segurança, infra-estrutura, desenvolvimento econômico, políticas sociais e mesmo na
promoção cultural. Dos 5562 municípios no Brasil, 588 são municípios de faixa de
fronteira, isto é, apresentam parte ou a totalidade do seu território em uma distância de
até 150 quilômetros da linha de fronteira. Em situações como essa, as relações
internacionais dos governos locais deixam, claramente, de ser uma opção para se
tornarem uma obrigação.
Casos freqüentes de uso dos serviços públicos por cidadãos de outros países são
observados em setores como saúde, educação, saneamento urbano nos dois lados da
fronteira. O problema é que não há repasse de recursos para esse tipo de atendimento,
sendo necessário o deslocamento de recursos de outros setores. A legislação da faixa de
fronteira (Lei 6634/79) está, no momento, sendo debatida no Congresso, já que há a
percepção de que ela dificulta investimentos externos nestes municípios, muitos deles
fontes de grandes riquezas minerais e de importância estratégica do ponto de vista
econômico.
É importante destacar que, além das questões práticas relacionadas aos serviços
públicos dos municípios de fronteiras, estes também enfrentam inúmeros percalços
devido às mudanças cambiais. A economia destes municípios é atingida de maneira
ímpar pelas variações do câmbio, já que com a desvalorização do dólar perde-se
competitividade em inúmeros setores, sobretudo devido a presença de diversas zonas
francas existentes nas fronteiras com outros países. Já no campo comercial, há uma série
de demandas que não podem ser relevadas, como a padronização das leis de aduanas, a
facilitação de importação e exportação para as áreas vizinhas, além de um melhor
monitoramento das transações de bens e serviços.
Há também de se atentar para questões culturais e a possibilidade de atração de turismo
como eixos importantes para a realidade dos municípios de fronteira, por estarem
conectados a realidades culturais diversas. Projetos que tenham por fim o
estabelecimento de diálogo entre os diferentes lados da fronteira podem ter como
consequência uma melhor convivência entre as comunidades, além de movimentar o
turismo local.
Por fim, não se pode deixar de considerar a importância da questão da segurança nas
regiões de fronteira. Os municípios de fronteira vivenciam cotidianamente as
preocupações com relação à segurança de seu território e de suas populações, questão
que fica ainda mais evidente no recente conflito entre Colômbia, Equador e Venezuela.
Projetos de lei que afetam esses municípios são constantemente discutidos no
Congresso sem haver uma participação adequada dos governos locais. O grupo de
trabalho do governo federal que discutia essa temática foi desativado e não há,
atualmente, uma política integrada no país para tratar desse assunto. Realidades como
essas enfatizam a relevância de envolver o governo federal na cooperação
descentralizada. Logo, o impacto desse tipo de cooperação internacional é ainda mais
evidente quando se aprofunda a análise sobre os municípios de fronteira.
d) Integração e Política Externa Brasileira
A temática dos municípios de fronteira chama atenção ainda para o processo de
integração que tem sido fomentado mundialmente por canais de interação estabelecidos
entre governos locais. Dentro da União Européia, por exemplo, já existe um corpo
consultivo formado por governos locais que, cada vez mais, ganha relevância.
Semelhantemente, em janeiro de 2007, foi instalado o Foro Consultivo de Municípios,
Estados federados, Províncias e Departamentos do Mercosul com o intuito de ser um
espaço concreto de participação desses atores, capazes de dar resposta aos desafios da
integração e do desenvolvimento nas escalas regional e local, de acordo com a Carta do
Rio.
O processo de integração, potencializado por governos locais, vai além das áreas de
fronteira e blocos regionais. Países como a França utilizam a cooperação
descentralizada como forma complementar de sua política externa, promovendo espaços
de diálogo com outros países por meio de ações como o Encontro de Cooperação
Internacional Descentralizada e Federativa Brasil-França. Essa iniciativa específica tem
sua origem nas celebrações do Ano do Brasil na França em 2005. No ano seguinte, em
Marselha, esse encontro se realizaria pela primeira vez, tendo como encaminhamento a
criação de um Comitê Binacional que se reuniria na segunda edição desse encontro em
Belo Horizonte, novembro de 2007. Por ser a França um Estado Unitário, a coordenação
dessa cooperação se encontra no nível nacional, sendo a Presidência da República a
responsável do lado brasileiro – o que mais uma vez demonstra a necessidade de uma
interação entre os governos locais e o governo central.
O Brasil, impulsionado pelos governos locais, muito tem avançado nesse tema. Ao
analisar a política externa do país, podemos perceber que as três prioridades referentes à
relação sul-sul já são tratadas no nível subnacional. O Mercosul, primeiramente,
apresenta o Foro Consultivo com representação dos governos locais. Uma segunda
prioridade é o Foro de Diálogo Índia-Brasil-Africa do Sul, na qual, recentemente,
autoridades locais e membros da sociedade civil desses três países se reuniram em Nova
Deli, janeiro de 2008, para a criação de um Fórum de Governança Local. Outra
prioridade brasileira é a África, sobretudo os países de língua portuguesa. Nesse sentido,
em abril de 2008 foi realizado o Encontro de Governos Locais Lusófonos com
participação do governo federal.
Por isso, a cooperação descentralizada deve ser vista como um instrumento para
fomentar o processo de integração e aprofundar o diálogo federativo dentro do país.
Para tal, é preciso discutir os papéis e a interação dos diferentes atores dentro dessa
atuação internacional.
e) Promoção Cultural, Econômica e Turística
A histórica mobilidade internacional do cidadão gerou cidades multiculturais que
estimulam a cooperação descentralizada. Os famosos Chinatown, espalhados em
inúmeros centros urbanos no mundo, são hoje ilustrações de como uma mesma
comunidade convive com culturas distintas. Os imigrantes, em diversas localidades, são
responsáveis por inúmeras atividades de cooperação internacional com os respectivos
países de origem, sendo estas, em grande medida, relacionadas com aspectos culturais.
No Brasil, atualmente, o melhor exemplo é a Celebração de 100 anos de Imigração
Japonesa em que uma série de atividades está sendo realizada no âmbito dos governos
locais.
Essas atividades culturais no âmbito da cooperação descentralizada promovem
desenvolvimento econômico, ora via parcerias comerciais, ora via investimentos
externos diretos. Gestores locais em missão internacional conseguem abrir, assim,
oportunidades de troca de produtos e serviços. Mais do que isso, sabe-se que políticas
locais afetam diretamente a atração de investimento externo – seja condicionado pela
qualidade de infra-estrutura do território ou mesmo por aspectos políticos como o nível
de democracia participativa. Por isso, os governos locais se lançam internacionalmente
em busca de novos modelos de gestão mais competitivos no cenário global.
Há, ainda, diferentes formas de incrementar o turismo via cooperação descentralizada.
Casos como as cidades de Porto Alegre e Belo Horizonte, que se especializaram em
realizar grandes eventos internacionais, são interessantes formas de atração de turistas.
No caso mais específico da capital mineira, há um projeto de irmanamento com Buenos
Aires que, durante um período, criou linhas de crédito por meio da folha de pagamento
dos funcionários municipais a fim de financiar a visita no país vizinho. Podem ser
citados também os que se utilizam dos eventos internacionais para divulgar as belezas
de suas cidades, criando uma marca internacional. Entre as últimas ações neste sentido,
podem ser citados os catálogos internacionais de filmes, nos quais os governos locais
cadastram inúmeros lugares do seu território que podem servir para filmagens com
valores específicos para disponibilizar esses espaços públicos, atraindo, por fim, mais
turistas e, consequentemente, dinamizando a economia local.
f) Fontes de Recursos
A prática tem demonstrado a necessidade de os governos locais encontrarem novas
fontes de recursos. Isto se deve ao imperativo de serem atendidas as demandas cada vez
mais exigidas pela população e repassadas pelo governo central no processo de
descentralização. Atualmente, o governo federal concentra aproximadamente 60% da
arrecadação, restando 25% para o estado e apenas 15% para os municípios no Brasil.
Percebe-se, neste contexto, que a cooperação descentralizada é uma forma de encontrar
recursos do sistema financeiro internacional. Nesse sentido, os bancos e as agências
internacionais têm, de forma crescente, atentado para os governos municipais e
estaduais como possíveis parceiros para investimentos empréstimos.
As parcerias desenvolvidas neste setor levam a uma ampliação do próprio conceito de
recurso. Há uma clara tendência a que não só os recursos financeiros sejam percebidos
como tal, englobando-se também recursos humanos, técnicos e de infra-estruturas no
âmbito daqueles passíveis de serem alcançados por meio da cooperação descentralizada.
Essa nova forma de compreender o que possa ser recursos é o princípio básico da
cooperação sul-sul, em que países como o Brasil realizam uma cooperação prestada a
diversos outros países emergentes.
IV) OS RISCOS, AS LIMITAÇÕES E OS DESAFIOS DA
COOPERAÇÃO DESCENTRALIZADA
Apesar do importante desenvolvimento da cooperação descentralizada nos últimos anos,
existem questões que limitam este processo. Nesta seção, será feita uma análise
daqueles que vêm se mostrando alguns dos principais obstáculos para esta forma de
cooperação. Novamente, o Brasil será tido como pano de fundo para este exame, o qual
perpassará a questão da (a) ausência de instituições maduras que levem a cabo a
cooperação descentralizada, (b) a falta de critérios para a atuação internacional, (c) a
fragilidade de arcabouço jurídico brasileiro frente à cooperação descentralizada e,
finalizando, (d) a questão dos financiamentos internacionais e a lei de responsabilidade
fiscal.
a) Ausência de Instituições Maduras
As instituições envolvidas na cooperação descentralizada encontram-se naturalmente
imaturas, dado a contemporaneidade do tema. Isso pode ser observado nos diversos
níveis de análise: local, regional, nacional e mesmo internacional.
Os municípios brasileiros, de modo geral, não estão plenamente convencidos da
importância de agir internacionalmente, havendo a necessidade de um constante
trabalho de conscientização para a manutenção ou criação de uma área internacional (ou
mesmo a denominação de um responsável no caso dos municípios menores). Há um
problema freqüente de as Câmaras dos Vereadores afetarem politicamente o prefeito
que busca participar de atividades internacionais. É comum ainda observar-se que não
há uma comunicação adequada entre as áreas internacionais do estado com as dos
municípios, prejudicando a capacidade desses estabeleçam funções complementares.
Quanto ao Governo Federal, deve-se reconhecer que já houve significativo avanço com
a criação da Assessoria Especial de Assuntos Federativos e Parlamentares – AFEPA –
no âmbito do Ministério das Relações Exteriores – MRE -, assim como pela atuação da
Presidência da República. Todavia, há ainda um longo caminho a ser percorrido. Neste
sentido, pode ser citado, por exemplo, o fato de o tema da cooperação descentralizada
existir até finais de 2006 como uma área da Agência Brasileira de Cooperação, e ter
sido extinta na reestruturação.
Dentro das Associações de Governos Locais (como é o caso da Confederação Nacional
de Municípios), ainda não está bem definida a forma mais efetiva para os municípios
atuarem internacionalmente (até porque essa área existe dentro da CNM há pouco mais
de um ano e meio). Quando se trata das entidades estaduais de municípios, há ainda
mais dificuldade para se introduzir essa temática porque não há uma visão consolidada
de como a área internacional é meio para alcançar melhorias nos setores como
educação, saúde e transporte. Tudo isso em um contexto em que as agências
internacionais começam a elaborar editais e programas para autoridades locais (como é
o caso da União Européia), mas com dificuldades ainda de se adequar esses editais às
especificidades do país e de cada localidade.
b) Falta de Critérios para a Atuação Internacional
A ausência de critérios acerca da cooperação descentralizada cria inúmeros riscos e
limitações. Um dos primeiros riscos é a banalização dessa atuação internacional com
acordos que não apresentam resultados práticos. Neste contexto, um exemplo típico tem
sido o do irmanamento entre cidades. Ainda que muitos irmanamentos ganhem
relevância atualmente, sabe-se de casos em que a Câmara Legislativa aprova esse tipo
de parceria pelo simples fato do vereador ou o prefeito ter visitado e simpatizado por tal
localidade.
Um outro fator preocupante é a ingerência externa por meio da cooperação
descentralizada. Isto é, governos nacionais/agências internacionais utilizam a
cooperação como forma de ingerência política, econômica e cultural no campo
doméstico de outro Estado, já que esse tipo de cooperação dificilmente passa pelo
governo central. Isso pode acontecer ainda com outras instituições como ONGs e
Empresas Privadas que oferecem uma cooperação técnica ou certa quantia de recurso
financeiro via terceiro setor em troca da exploração de recursos naturais. Uma possível
ilustração seriam as atividades internacionais na Amazônia em que a biodiversidade
brasileira é cadastrada (ou mesmo patenteada) e depois vendida a outras localidades.
Outro caso interessante é a possibilidade de outros Estados estimularem
posicionamentos contrários ao governo central já existentes em certas localidades no
país, gerando um quadro de guerra civil.
Um último fator a ser apresentado é a ausência de um monitoramento e avaliação da
cooperação descentralizada, de modo a dificultar a distinção entre experiências bem
sucedidas e demais com impactos negativos. Geralmente não há uma definição clara de
objetivos e nem indicadores de mensuração para avaliar se tal projeto esta realmente
gerando desenvolvimento ou não. Há necessidade de se criar critérios e parâmetros para
essa nova forma de cooperação.
c) Fragilidade de Arcabouço Jurídico
São relativamente poucos os doutrinadores do Direito que analisam o tema da
cooperação descentralizada no Brasil. Entre eles, a maioria tende a defender a
necessidade de que a Constituição Federal especifique a possibilidade de atuação
externa dos municípios e estados membros. Neste sentido, opinam Antonio Paulo
Cachapuz de Medeiros (2007) e José Vicente da Silva Lessa (2002). Entendem eles que
a CF limita a ação externa dos municípios e dos estados membros ao não expressar esta
possibilidade e ao dispor sobre a atuação internacional da União. Apoiam-se, para tanto,
no art. 21 da CF, segundo o qual compete à União manter relações com Estados
estrangeiros e participar de organismos internacionais e no art. 84, VIII, que dispõe
caber ao Presidente da República manter relações com Estados estrangeiros e celebrar
tratados, convenções e atos internacionais, sendo estes sujeitos à aprovação do
Congresso Nacional.
Além disso, parte da objeção à capacidade jurídica internacional dos governos nãocentrais vem da doutrina clássica do Direito que dispõe acerca do tradicional conceito
de soberania dos Estados nacionais. Segundo este conceito, a soberania está fortemente
associada à capacidade dos Estados de conduzir sua política externa e de manter
relações diplomáticas com Estados estrangeiros. Ao permitir que os governos nãocentrais conduzam suas próprias relações internacionais, a soberania dos governos
centrais poderia estar ameaçada pela existência de projetos dos entes subnacionais que
não coincidam com os do Estado.
Atualmente, há uma proposta de regulamentação da ação externa de estados membros e
municípios no Senado Federal. Trata-se, na verdade, de uma proposta de substitutivo
feito ao Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 98, de 2006. De acordo com ele, estados e
municípios poderiam fechar convênios internacionais no âmbito de suas competências,
com aprovação prévia do Ministério das Relações Exteriores. Estes convênios seriam
regidos por normas estaduais e municipais, segundo cada caso específico.
Além disto, nos últimos meses, o governo federal fechou dois Protocolos que prevêem a
possibilidade de a cooperação descentralizada ocorrer. Tratam-se de documentos
adicionais aos acordos-quadro já existentes entre Brasil e Itália e Brasil e França. Neste
sentido, houve, portanto, um avanço no que concerne ao arcabouço jurídico sobre este
âmbito da cooperação.
Algumas cidades têm se adiantado neste processo. Exemplo disso é o Decreto
Municipal (LEI Nº 14.471) de julho de 2007, que consolida a legislação municipal
sobre cidades-irmãs da cidade de São Paulo. O decreto prevê:
“Acordos e programas de ação com o fim de fomentar o mais amplo conhecimento
recíproco, para fundamentar os intercâmbios sociais, culturais e econômicos, em
especial os relativos à organização, administração e gestão urbana (...) a realização de
acordos bilaterais visando à troca de conhecimentos sobre as raízes étnicas, folclóricas e
musicais de cada um dos países nos quais se situam as cidades-irmãs”.
Não fica, contudo, plenamente esclarecido se uma norma municipal que trate de matéria
internacional pode ser considerada constitucionalmente válida.
Além da possibilidade de aprovação do substitutivo que regulamentaria a ação externa
dos entes federados, outras se colocam de acordo com o arcabouço jurídico brasileiro.
Juridicamente, o mais apropriado seria tratar desta temática na Constituição Federal já
que se trata de uma questão de competência de entes federados. Além disto, uma ação
mais efetiva do governo federal na criação de acordos que tratem da cooperação
descentralizada poderia ser uma chance de firmar-se um arcabouço jurídico sobre a
temática.
d) Financiamento Internacional e a Lei de Responsabilidade Fiscal
Há ainda outras questões relacionadas à legislação sobre ação externa de entes
federados, especificamente, no âmbito dos financiamentos internacionais a municípios.
A Comissão de Financiamentos Externos (Cofiex), do Ministério do Planejamento,
estabeleceu normas para operação de crédito externo por meio da Resolução n° 294.
Segundo ela, apenas municípios acima de 100 mil habitantes poderiam realizar
financiamentos internacionais. Esta norma leva à impossibilidade de 95% dos
municípios brasileiros usarem os financiamentos externos como via para o
desenvolvimento local.
É fato que há uma constante preocupação do governo federal com o endividamento dos
municípios, o que serve de argumento para restringir a cooperação financeira
internacional. Todavia o Presidente da Confederação Nacional de Municípios
demonstrou em uma pesquisa apresentada em fevereiro de 2008 que “em relação ao
endividamento fiscal, somente sete dos 5.562 municípios do país estão acima do nível
determinado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que é 1,2 vezes o orçamento anual”.
Isso demonstra que os municípios brasileiros apresentam condições (pelo menos fiscais)
de ampliar o financiamento internacional. Há, contudo, uma incapacidade jurídica dos
governos locais oferecerem garantias próprias a esses financiamentos internacionais, o
que dificulta a prática destes financiamento.
e) Despreparo Técnico para a Atuação Internacional
Uma última limitação a ser apresentada refere-se ao despreparo técnico dos gestores
locais para tratar do tema internacional. Primeiro, é difícil encontrar quadro profissional
nos pequenos e médios municípios que saibam se comunicar e elaborar documentos em
outros idiomas. Segundo, o know-how em formatar projetos de acordo com as
exigências das agências internacionais não é algo difundido. Terceiro, não há grande
capacidade de adequar o conhecimento de outros países à realidade local. Quarto, há
uma tendência de substituir certa prioridade local por pautas estabelecidas
externamente, concentrando todo o corpo técnico (que já é escasso) nesse tipo de
atividade. Quinto, permanece uma concepção das relações internacionais de soma zero
(ao invés de soma variável), levando uma competição dos governos locais improducente
ao desenvolvimento.
Percebe-se, portanto, que o desenvolvimento da cooperação internacional passa pela
preparação dos técnicos da administração pública, para que percebam e utilizam o
âmbito internacional como um instrumento apto a auxiliar nas demandas locais.
CONCLUSÃO
Há ainda muito a se avançar na temática da cooperação descentralizada no Brasil.
Contudo, percebe-se que os principais atores envolvidos neste processo fazem, hoje,
parte de uma ampla discussão que objetiva um desenvolvimento prático da participação
dos governos subnacionais no âmbito internacional.
Neste sentido, importantes questões se colocam: como amadurecer o fenômeno no
Brasil? Qual é o papel e o nível de interação entre governo local, governo central,
agente internacional, sociedade civil e iniciativa privada dentro da cooperação
descentralizada, a fim de que ela possa ser mais eficiente? Que tipos de entidades
poderiam auxiliar os governos locais brasileiros a melhorar a sua capacidade de gestão
da cooperação descentralizada? Que arcabouço jurídico seria o mais adequado para
regular a cooperação descentralizada no Brasil? Quais são as condições essenciais para
um governo local desenvolver a cooperação descentralizada, reconhecendo as
limitações apresentadas acima?
O processo de internacionalização pode trazer benefícios sociais, econômicos e políticos
nos mais diversos âmbitos da administração pública. Seja pelo eixo das organizações e
instituições internacionais ou pelo eixo dos próprios governos não-centrais, percebe-se
que há um imperativo para que municípios e estados deixem de se focar somente no
âmbito nacional.
O fato de a institucionalização das relações internacionais dos governos subnacionais
ainda não ser uma política suficientemente madura leva a duas sérias conseqüências. A
primeira delas é que não há um pólo realmente conhecedor de assuntos internacionais
na maioria dos corpos administrativos das grandes e médias cidades. As políticas
executadas são esporádicas e, por falta de centralização das informações relativas aos
processos de internacionalização, elas se perdem antes de serem devidamente
absorvidas pela administração pública. Já os pequenos municípios (até 50 mil
habitantes), que representam 90% da realidade brasileira, são geralmente excluídos do
processo de internacionalização. A segunda conseqüência é a espécie de mitificação que
ocorre em torno das práticas internacionais dos municípios. A falta de constância e de
conhecimento na área internacional fazem com que as possibilidades sejam pouco e mal
aproveitadas.
Trata-se, este, de um meio importante para o desenvolvimento local, que deve ser
utilizado pelos governos subnacionais como forma de atender as demandas locais. Cabe,
neste momento, aos governos subnacionais um papel ativo na articulação da imensa
rede das relações internacionais, a qual possibilita, a todo tempo, novos investimentos,
tecnologias e intercâmbios culturais na seara das políticas públicas locais.
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