fls. 519 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Registro: 2015.0000520636 Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO e QFAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE DEFENSORES PÚBLICOS - APADEP. ACORDAM, em 2ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Dado provimento ao recurso, v.u., vencida a 3ª Juíza em questão de ordem, que declara.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores CARLOS VIOLANTE (Presidente) e VERA ANGRISANI. São Paulo, 28 de julho de 2015. LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI RELATOR Assinatura Eletrônica Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. ACÓRDÃO fls. 520 2 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO 2ª Câmara Seção de Direito Público Apelante(s): ESTADO DE SÃO PAULO E OUTRO Apelado: ASSOCIAÇÃO PAULISTA DOS DEFENSORES PÚBLICOS Comarca/Vara: SÃO PAULO/13ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA Juíza prolatora: ALBERTO ALONSO MUÑOZ VOTO Nº. 15.106 Apelação cível Associação Paulista dos Defensores Públicos Subteto constitucional Pretensão de recebimento de 100% do subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal Ação coletiva como instrumento de controle de constitucionalidade Liminar proferida pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle abstrato, cujos fundamentos não aproveitam ao caso em exame Impossibilidade de exclusão de limite remuneratório imposto por norma constitucional em sede de ação coletiva Sentença reformada Recurso provido. Trata-se de ação coletiva ajuizada pela ASSOCIAÇÃO PAULISTA DOS DEFENSORES PÚBLICOS em face da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO e da DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, visando à exclusão da incidência do subteto remuneratório previsto no artigo 37, inciso XI, da CF, em relação aos associados da autora, aplicando-se, a estes, mesmo teto remuneratório incidente sobre os membros do Tribunal Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. Apelação Cível n° 1004415-59.2014.8.26.0053 fls. 521 3 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO de Justiça de São Paulo, ou seja, 100% (cem por cento) dos subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal (fls. 30). A ação foi julgada procedente (fls. 413/416), para o fim de (i) declarar o direito dos associados da APADEP à aplicação do Justiça do Estado de São Paulo e; de (ii) condenar a parte ré a aplicar aos associados da autora o teto remuneratório de 100% do subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, devendo ainda pagas as diferenças devidas em razão do reajuste dos vencimentos ao limite remuneratório, respeitada a prescrição quinquenal no que concerne aos efeitos patrimoniais da sentença. Apelam a Fazenda Pública e a Defensoria Pública do Estado de São Paulo (fls. 418/49), postulando a reforma do julgado. O recurso foi regularmente processado e contrarrazoado (fls. 459/478). A d. Procuradoria de Justiça apresentou parecer pelo provimento do recurso (fls. 494/498). É o relatório. A Associação Paulista de Defensores Públicos APADEP ajuizou ação coletiva em face do Estado de São Paulo Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. mesmo teto remuneratório incidente sobre os membros do Tribunal de fls. 522 4 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO postulando a procedência do pedido para que se exclua a incidência do subteto remuneratório previsto no artigo 37, inciso XI, da CF, em relação aos associados da autora, aplicando-se, a estes, mesmo teto remuneratório incidente sobre os membros do Tribunal de Justiça de São Paulo, ou seja, 100% (cem por cento) do subsídio mensal dos Ministros do Supremo Não merece acolhida a preliminar de ilegitimidade da Defensoria Pública do Estado de São Paulo para figurar no polo passivo da demanda, pois como bem salientou a douta Procuradoria de Justiça, a alegação de ausência de capacidade processual esvazia o disposto no art. 134, §2º, da Constituição Federal, que assegura à Defensoria Estadual a autonomia administrativa e a iniciativa de sua proposta orçamentária. Nessa medida, é oportuno o reconhecimento da capacidade judiciária da Defensoria para ser parte em processo que discute o teto remuneratório de seus membros. Posto isso, são necessárias algumas notas acerca do manejo da ação coletiva como instrumento de controle de constitucionalidade do subteto remuneratório estabelecido no artigo 37, XI, da Constituição Federal. Conquanto sujeita a ponderações da doutrina e estudiosos do tema, a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal vem admitindo a utilização da ação civil pública como instrumento de controle incidental de constitucionalidade, Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. Tribunal Federal (fls. 30). fls. 523 5 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO em que a controvérsia constitucional constitui fundamento do pedido, causa de pedir ou questão prejudicial. De outra parte, não se admite a utilização da ação coletiva quando a declaração de inconstitucionalidade constitui o objeto do inconstitucionalidade. Se intentada nesses termos, restaria configurada subtração indevida da competência do STF, admitindo-se, inclusive, reclamação constitucional1. Ora, as implicações do manejo da ação civil pública como instrumento de controle são bem elucidadas por Gilmar Ferreira Mendes: Por causa das características da ação civil pública, seria lícito indagar sobre sua adequação para o controle de constitucionalidade das leis na modalidade de controle incidental ou concreto. Em outros termos, seria possível que o juiz, ao apreciar pedido formulado em ação civil pública, afastasse topicamente a incidência ou a aplicação de dada norma federal ou estadual em face da Constituição Federal? Qual seria a eficácia dessa decisão? É fácil ver, desde logo, que a ação civil pública não se confunde, pela própria forma e natureza, com processos cognominados de “processos subjetivos”. A parte ativa nesse processo não atua na defesa de interesse próprio, mas procura defender interesse público devidamente caracterizado. Afigura-se difícil, se não impossível, sustentar que a decisão que, eventualmente, afastasse a incidência de uma lei considerada inconstitucional, em ação civil pública, teria efeito limitado às partes processualmente legitimadas. Como observado, a ação civil pública aproximase muito de processo sem partes ou de processo objetivo, no qual a parte 1 Cf. NOVELINO, Marcelo, Direito constitucional, 6ª ed, São Paulo, Método, 2012, p.276. Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. pedido formulado, que é hipótese reservada da ação direta de fls. 524 6 autora atua não na defesa de situações subjetivas, agindo, fundamentalmente, com o escopo de garantir a tutela do interesse público. Não foi por outra razão que o legislador, ao disciplinar a eficácia da decisão proferida na ação civil, viu-se compelido a estabelecer que “ a sentença civil fará coisa julgada erga omnes”. Isso significa que, se utilizada com o propósito de proceder ao controle de constitucionalidade, a decisão que, em ação civil pública, afastar a incidência de dada norma por eventual incompatibilidade com a ordem constitucional, acabará por ter eficácia semelhante à das ações diretas de inconstitucionalidade , isto é, eficácia geral e irrestrita. [...] É certo, ademais, que, ainda que se desenvolvam esforços no sentido de formular pretensão diversa, toda vez que na ação civil pública ficar evidente que a medida ou providência que se pretende questionar é a própria lei ou ato normativo, restará inequívoco que se trata mesmo é de impugnação direta de lei. Nessas condições, para que não se chegue a um resultado que subverta todo o sistema de controle de constitucionalidade adotado no Brasil, tem-se de admitir a completa inidoneidade da ação civil pública como instrumento de controle de constitucionalidade, seja porque ela acabaria por instaurar um controle direto e abstrato no plano da jurisdição de primeiro grau, seja porque a decisão haveria de ter, necessariamente, eficácia transcendente das partes formais. Estabelecidas essas premissas, difícil admitir o cabimento desta ação coletiva que, em última análise, pretende a extensão dos efeitos de liminar concedida em ação direta de inconstitucionalidade, bem como a não incidência de norma constitucional autoaplicável. Com efeito, a tutela que ora se pretende tem face coletiva em sentido estrito, porquanto implica a exclusão do subteto remuneratório previsto no artigo 37, XI, da CF aos associados da APADEP, e outra face de direito individual homogêneo, à medida que cada associado terá sua remuneração recalculada quando do afastamento da Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO fls. 525 7 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO regra. Nesse contexto, é inegável que se buscam, por meio de ação civil pública proposta perante a Justiça Estadual, efeitos idênticos à medida liminar obtida perante o Supremo Tribunal Federal, em Assim, rigorosamente, a via eleita é inadequada. Não obstante, passo à análise do recurso interposto. No mérito, assiste razão às apelantes. Senão, vejamos. Conforme exposto na exordial, a principal tese apresentada pela Associação autora pode ser assim sintetizada: como, por força de decisão do STF o teto remuneratório dos membros dos Tribunais estaduais passou a equivaler 100% (cem por cento) do subsídio dos ministros do STF, e, tendo em vista que o artigo 37, XI, da CF, assegurou o mesmo limite remuneratório a todas as carreiras jurídicas no âmbito estadual, portanto, por questão de coerência e, sob pena de violação dos princípios da isonomia e da razoabilidade, o mesmo limite remuneratório deve ser aplicado aos Defensores Públicos do Estado de São Paulo. Ora, a r. decisão referida pela autora foi proferida pelo E. Supremo Tribunal Federal na ADI 3854 e foi assim ementada: Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. sede de controle abstrato. fls. 526 8 EMENTA: MAGISTRATURA. Remuneração. Limite ou teto remuneratório constitucional. Fixação diferenciada para os membros da magistratura federal e estadual. Inadmissibilidade. Caráter nacional do Poder Judiciário. Distinção arbitrária. Ofensa à regra constitucional da igualdade ou isonomia. Interpretação conforme dada ao art. 37, inc. XI, e § 12, da CF. Aparência de inconstitucionalidade do art. 2º da Resolução nº 13/2006 e do art. 1º, § único, da Resolução nº 14/2006, ambas do Conselho Nacional de Justiça. Ação direta de inconstitucionalidade. Liminar deferida. Voto vencido em parte. Em sede liminar de ação direta, aparentam inconstitucionalidade normas que, editadas pelo Conselho Nacional da Magistratura, estabelecem tetos remuneratórios diferenciados para os membros da magistratura estadual e os da federal. Verifica-se que a r. decisão refere-se aos membros da Magistratura, tendo sido decidido que é impossível a diferenciação entre os membros da Justiça Federal e da Justiça Estadual, ante o caráter do sistema de âmbito nacional. Nessa ordem, em que pese o elevado papel que exerce ativamente a Defensoria Pública como expressão e instrumento do regime democrático, não há a pretensa igualdade, nem se podem remontar os mesmos fundamentos da liminar, deferida em votação não unânime e em caráter precário pelo STF, para excluir, em definitivo e em sede de ação civil pública, a incidência do subteto remuneratório previsto em norma constitucional auto-aplicável aos defensores públicos. Tampouco se cogita que a aguardada Emenda Constitucional nº 80/2014 permitiu a equiparação constitucional em relação à política remuneratória da magistratura e do Ministério Público, Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO fls. 527 9 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO pois, ao determinar a aplicação do artigo 93 da Constituição para as Defensorias, ressalvou a expressão no que couber, em nada alterando o subteto ora impugnado. Ademais, consoante asseverado no julgamento do questões poderiam ser consideradas, como o fato de que há verbas específicas recebidas pela categoria e não incluídas no teto, além de outros tantos agentes públicos que não estão incluídos na pretendida equiparação. Finalmente, deve ser registrado o cunho político da questão, que reiteradamente ocupa a pauta da associação autora, ora apelada. Cite-se, como exemplo, a notícia2 veiculada no site da entidade intitulada "Eleições 2014: O que pensam e quais as propostas dos candidatos a senador e governador em São Paulo para a Defensoria Pública?". Dentre as quatro questões formuladas aos candidatos, a terceira versava justamente sobre a equiparação: 03. De acordo com a Constituição Federal, a Defensoria Pública é instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado. Nestes temos, e considerando que o Defensor Público tem como missão constitucional, a orientação jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa dos direitos individuais e coletivos, em todos os graus, judicial e extrajudicialmente, de forma integral e gratuita, dos necessitados, ao candidato parece razoável que Defensores Públicos percebam remuneração diversa das dos demais atores do sistema jurídico nacional? 2 http://www.apadep.org.br/revista/eleicoes-2014-o-que-pensam-e-quais-propostas-dos-candidatossenador-e-governador-em-sao-paulo-para-defensoria-publica/ Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. Agravo de instrumento nº 2044747-16.2014.8.26.0000, inúmeras outras fls. 528 10 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Ora, a importância de se conhecer a proposta dos candidatos sobre o tema denuncia que a questão remuneratória deve ser resolvida na arena política, no âmbito de reformas constitucionais e legislativas, e não em sede de ação civil pública, com impactos diretos no Por esses fundamentos, pelo meu voto, dou provimento ao recurso. Para fins de prequestionamento, tem-se por inexistente violação a qualquer dispositivo constitucional infraconstitucional invocado e pertinente à matéria em debate. LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI Relatora Apelação nº 1004415-59.2014.8.26.0053 Voto nº 15.106 ou Este documento foi assinado digitalmente por LUCIANA ALMEIDA PRADO BRESCIANI. Se impresso, para conferência acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/esaj, informe o processo 1004415-59.2014.8.26.0053 e o código 194C921. orçamento e gestão pública.