1
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS – GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NA RELAÇÃO
PROFESSOR X ALUNO: UM OLHAR PSICOPEDAGÓGICO.
POR
JACILDA MENDES DA SILVA
RIO DE JANEIRO
2005
2
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS – GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NA RELAÇÃO
PROFESSOR X ALUNO: UM OLHAR PSICOPEDAGÓGICO.
Monografia
apresentada
à
Universidade
Cândido Mendes para obtenção parcial do grau
de Especialista em Psicopedagogia orientado
pelo professor M.S. Nilson Guedes de Freitas.
Por: Jacilda Mendes da Silva.
Rio de Janeiro
2005
3
AGRADECIMENTOS
Antes de tudo meu obrigado a Deus que me conduziu até aqui e me
abençoou, dando- me forças ao longo dessa caminhada.
A meu pai (em memória) que apesar de ter sido alfabetizado já na vida
adulta, enfrentou todos os obstáculos, se formando em Direito aos 54 anos de idade,
deixando para mim a grande lição de que não existem barreiras que não possam ser
ultrapassadas se confiarmos em Deus e fizermos a nossa parte.
Aos meus filhos por todo o incentivo.
A minha amiga Heloisa, incentivadora e verdadeiro exemplo de educadora.
A minha nora que muito me auxiliou com materiais e incentivos.
Aos meus professores e em especial ao meu orientador Nilson Guedes de
Freitas por ter me dado o maior apoio e encorajamento, possibilitando meu
desenvolvimento e produtividade.
Agradeço ainda com carinho a todos os amigos que me apoiaram na
realização desse trabalho, inclusive Simone que muitas vezes deixou seu trabalho para
digitar meus trabalhos.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a todos que por motivo de
força maior, pararam no meio do caminho, encorajandoos a retomarem a caminhada.
5
Os educadores, apesar das suas dificuldades, são
insubstituíveis, porque a gentileza, a solidariedade, a
tolerância, a inclusão, os sentimentos altruístas, enfim,
todas as áreas da sensibilidade não podem ser ensinadas
por máquinas e sim por seres humanos.
Augusto Cury
6
RESUMO
O objeto desta monografia é demonstrar a hipótese de que a afetividade na
relação professor x aluno é fator fundamental para o favorecimento da aprendizagem e
também apontar caminhos para um olhar ou atuação psicopedagógica que viabilize uma
relação de qualidade entre professor e aluno. A metodologia utilizada nesta pesquisa foi
bibliográfica, com a finalidade de conhecer melhor, selecionar e definir os principais
autores que falam sobre o tema e as principais questões que o envolvem. Esta monografia
procura identificar a importância da afetividade na relação professor x aluno como um
componente fundamental para o desenvolvimento da aprendizagem. Apresenta a
perspectiva de Freire em relação a aprendizagem, que faz parte de um processo sóciohistórico essencial e discorre sobre a afetividade a partir de teóricos como Piaget e Wallon
e outros nos quais me embasei. Tem por objetivo mostrar, principalmente, para
profissionais ligados a área de educação, a responsabilidade de proporcionar um
desenvolvimento intelectual, afetivo e social de cada educando, aponta para algumas
divergências na relação professor x aluno que precisam ser repensadas e indica. A
afetividade como um caminho para a superação de dificuldades na aprendizagem. Como
considerações finais, propõe um novo olhar, um olhar psicopedagógico sobre a relação
professor x aluno, entendendo a importância da atuação deste profissional nesta relação
tanto no auxílio do aluno, quanto no do professor, para que se estabeleça um ambiente de
diálogo, troca e respeito mútuo e assim crie-se um clima favorável à aprendizagem.
Palavras chaves: afetividade, sentimento, aprendizagem.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 08
1. O PROFESSOR E A CONSTRUÇÃO DA AUTO-ESTIMA DO ALUNO .................. 13
2. A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE ....................................................................... 23
3. ESCOLA COMO ORGANIZAÇÃO APRENDENTE ................................................... 32
4. PRAZER E TERNURA NA EDUCAÇÃO ................................................................... 39
CONCLUSÃO .................................................................................................................... 48
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 51
ANEXOS ............................................................................................................................. 53
ÍNDICE ............................................................................................................................... 55
8
INTRODUÇÃO
Este trabalho, até mesmo por exigência do titulo com que se batiza, propõese fundamentalmente tentar descobrir o problema por que os alunos que não são tratados
com afetividade apresentam mais dificuldades de aprendizagem nas classes de
alfabetização.
A presença do afeto na sala de aula é um ponto importante, pois quando se
fala de afeto, fala-se do estabelecimento de relações de respeito, prazer no convívio,
solidariedade, cooperação e compreensão do “outro”. Um toque, um gesto, um olhar, um
sorriso, muitas vezes dizem mais do que uma palavra. Sentir-se querido e aceito pelo grupo
é muito bom, traz segurança, eleva a auto-estima. E no caso dos alunos, estes são
extremamente sensíveis ao estudo emocional do professor e deste depende criar um
ambiente de confiança e de compreensão das dificuldades de aprendizagem de cada um,
ambiente este que favoreça o ensino e a construção da personalidade dos alunos. Assim, os
professores, através de suas atitudes e palavras, de sua postura e até de seu tom de voz,
estabelecem o “clima”
da sala de aula, que pode ser um clima onde o afeto, respeito e a
boa convivência estejam presentes ou um clima árido e seco onde se tornam tensos e
difíceis as relações entre professores e alunos.
O desenvolvimento intelectual tendo dois componentes: um cognitivo e
outro afetivo, aponta para o fato de que há aspectos do afeto que se desenvolvem e que este
inclui sentimentos, interesses, desejos, tendências, valores e emoções em geral, além de
apresentar várias dimensões incluindo os sentimentos subjetivos (amor, raiva, depressão) e
aspectos expressivos (sorriso, gritos, lágrimas). O afeto se desenvolve no mesmo sentido
que a inteligência e é responsável pela ativação da atividade intelectual.
9
Neste sentido pode-se dizer que a auto-estima mantém uma estreita relação
com a motivação e com interesse da criança por aprender e que o afeto é o princípio
norteador da aprendizagem.
Depois de desenvolvido o vínculo afetivo, a aprendizagem, a motivação e a
disciplina como meio para conseguir o auto-controle da criança e seu bem estar são
conquistas significativas, pois a escola se torna local privilegiado para reconciliação entre o
conhecimento e o amor.
Portanto essa pesquisa bibliográfica tem como objetivo geral descobrir que a
importância da afetividade na relação professor x aluno possibilita sucesso de
aprendizagem nas classes de alfabetização.
Baseado na leitura de SNYDER o capitulo 1 tem como objetivo entender a
necessidade de recuperar o prazer e a alegria de aprender e deixar claro que a escola precisa
estabelecer um clima de aceitação e compreensão entre alunos e professores, pois nas
relações entre sujeitos e meio ambiente que se formam as representações sociais e que se
tratam de elaborações mentais criadas a partir do real com o objetivo de interpretá- lo e que
possui sua raiz no social. Nesse capitulo temos os teóricos: FREINET, PAULO FREIRE e
SNYDERS.
O capítulo seguinte tem como objetivo perceber que a dimensão afetiva é de
fundamental importância para que o aluno tenha um domínio funcional da inteligência. A
escola deve ser um ambiente flexível, motivador, rico em sentimentos e emoções.
Porquanto as crianças quando nela ingressam tem muitas expectativas em relação ao
professor.
Quando se consegue estabelecer uma interação sadia de descobertas e
desafios, bem como de carinho, sinceridade, afeto e confiança pode-se determinar uma
condição de promoção e crescimento dos alunos, pois o afeto se desenvolve no mesmo
sentido que a inteligência e é responsável pela ativação da atividade intelectual.
10
O presente capítulo descrito oportuniza o conhecimento sobre outros
teóricos: ROSSINI, BUSCAGLIA, WALLON, PAROLIN e FREIRE.
O penúltimo capítulo tem como objetivo enfatizar as unidades escolares a
criarem climas organizacionais significativos para que a escola tenha ambientação coletiva
e afetiva de aprendizagem.
A aprendizagem não é um amontoado sucessivo de coisas que se vão
reunindo, ao contrário, trata-se de uma rede ou teia de interações neuronais extremamente
complexas e dinâmicas, que vão criando estados gerais qualitativamente novos no cérebro
humano.
Embora um indivíduo possa aprender muito interagindo com os objetos e
com as pessoas, a complexidade do mundo acaba demostrando que ele procure ajuda para
formalizar aquilo que faz intuitivamente. Contudo, todo encantamento desaparece quando o
sistema educacional tem como base apenas a transmissão de informação.
A sociedade está cada vez mais dependente do conhecimento, é necessário
questionar e mudar certos pressupostos que fundamentam a educação atual, para que ela
não esteja restrita, apenas ao período escolar. Esse capítulo tem como base a visão de vários
teóricos como: VALENTE, DELVAL, HELENE e KELSO.
Dando prosseguimento ao último capítulo, precisamos reintroduzir na escola
o princípio de que toda morfogênese do conhecimento tem algo a ver com a experiência do
prazer, como diz SALTINE, encher a vida cotidiana de ternura exige uma invenção
sensorial que vai desde a vivência perceptível até a significação do mundo.
O ambiente pedagógico tem de ser lugar de fascinação e inventividade,
tendo com principal objetivo propiciar o prazer, dinamizando o conhecimento.
11
SALTINE, FREIRE, KISHIMOTO, ALMEIDA, também fazem parte deste
capítulo e ressaltam prazer na educação fazendo uma ponte entre educação e sentimento,
compromisso social, as emoções e a importância do brincar.
Faz-se, extremamente, necessário reencantar a educação, promover a
sensibilidade, criar ambiente de aprendizagem que favoreçam o ensino e a construção da
personalidade mais humana dos alunos.
O professor deve tentar levar o aluno a compreender o contexto cultural,
social e político, afim de que se torne capaz de participar do processo de construção da
sociedade, compreendendo e organizando sua experiência de vida. Este educador deve
trabalhar no sentido de formar um cidadão consciente, crítico e participativo.
Nas próximas pesquisas sugere-se
a assessoria psicopedagógica aos
docentes, pois percebe-se, claramente que os professores, principalmente, os que trabalham
com classes de alfabetização precisam ser bem resolvidos no tocante à afetividade, para que
possibilitem aos alunos prazer durante a aprendizagem e depois dela.
Os pais e responsáveis de alunos das classes de alfabetização devem também
ser alcançados pela assessoria psicopedagógica, porquanto a família, ainda é um elo forte
dessa corrente chamada educação e precisa ser alicerçada por profissionais que entendem a
educação como solução para quase tudo. E quando os familiares estiverem com sua
afetividade centrada, possibilitarão um “encontro” escola- família, mais significativo.
Sugere-se que o Projeto Político Pedagógico de unidades escolares que
tenham classes de alfabetização organizem seu currículo priorizando o trabalho
interdisciplinar e com valores, pois é sabido que através de um currículo integrado há maior
possibilidade de aprendizagem, porque o indivíduo é pleno e não deve aprender de forma
fragmentada. Quando há integração e prazer, o fazer pedagógico e o aprender caminham
juntos.
12
A partir desta visão o que se percebe é que um trabalho realizado
afetivamente e coletivamente contribui para que alunos se sintam construtores do saber e se
relacionem com o professor, entendendo o papel deste como organizador e mediador do
processo de aprendizagem. Portanto necessita-se construir um sistema educativo que
supere a clássica contraposição entre razão e emoção, cognição e afetividade, e que rompa
com uma concepção, por nós tão conhecida, que atribui ao desenvolvimento do intelecto,
dos aspectos cognitivos e racionais, um lugar de destaque na educação, relegando em
segundo plano os aspectos afetivos e emocionais.
13
1. O PROFESSOR E A CONSTRUÇÃO DA
AUTO - IMAGEM DO ALUNO.
Como todos nós professores sabemos, muitos são os fatores e aspectos que
influenciam e interferem na aprendizagem, tanto dentro como fora do espaço escolar. O que
ocorre na escola, no entanto, deve ser objeto de nossa reflexão, uma vez que podemos
analisar, pensar e modificar a nossa prática sempre que observarmos que algumas crianças
não aprendem ou não se interessam pelos trabalhos que estão sendo desenvolvidos.
Para que os alunos tenham êxito na aprendizagem, é necessário que esta seja
significativa, ou seja, que as atividades sejam desafiadoras, isto é, nem muito complicadas
que não possibilitem agir e pensar, nem tão fáceis que não precisem mobilizar
conhecimentos e avançar; que permitam que os alunos estabeleçam relações entre os novos
conteúdos e os conhecimentos já existentes; e que possibilitem aos alunos experimentar o
sucesso, verificando que seu esforço valeu a pena.
As duas primeiras questões dizem respeito diretamente à didática das áreas,
bastante discutidas atualmente e sem dúvida essenciais para a aprendizagem, no entanto,
quando pensamos nas intervenções pedagógicas, precisamos considerar alguns aspectos do
próprio conteúdo, para que o aluno possa compreender o que está fazendo. Por exemplo,
normalmente uma criança realiza um exercício de separe as sílabas (muito visto nas salas
de aula) de forma mecanizada, separando a palavra de duas em duas letras, no entanto, o
faz sem saber porque está fazendo e para que está fazendo e se pedirmos que ela explique,
provavelmente a resposta que receberemos será: A minha professora falou que tem que ser
14
assim!!. Este é um exemplo de aprendizagem, de um procedimento sem compreensão, sem
significado de uso.
É essencial, portanto, proporcionar boas situações de aprendizagem para
garantir a todos condições de aprender, mas não é só com isso que devemos contar. Todos
nós, professores, podemos localizar, em nossa prática, alunos que não se “interessam” ou
não conseguem aprender nas mesmas situações que outros, mesmo que as propostas
didáticas sejam bem pensadas e estruturadas. Pensar a motivação em uma perspectiva
construtivista implica conhecer e reconhecer o aluno como pessoa, com suas características
individuais e psicológicas. Se as motivações não vêm apenas dos materiais e de como as
atividades são propostas, o que mais a pode determinar?
Enquanto aprendemos sobre algo, também estamos aprendemos sobre nós
mesmos, o quanto somos capazes ou não, o quanto é difícil, no que é difícil, como
procedemos e como devemos proceder, em que temos mais facilidade ou não... Será que
conseguimos estar atentos a estas outras aprendizagens de nossos alunos?
Um mau desempenho na escola, entre outras coisas pode ser fruto de uma
auto-imagem negativa como aprendiz/aluno que reforça um sentimento de incapacidade,
impedindo o aluno de “ousar aprender”. Várias são as queixas de incapacidade feitas pelos
alunos em relação a certos conteúdos, muitos acreditam que não sabem escrever porque não
têm idéia, ou que não acertam as contas porque não nasceram para elas. Nesses casos, todos
os esforços com lições extras e trabalho complementares pouco resolvem, pois a questão é
muito maior e anterior, o aluno não acredita que é capaz. E qual é o nosso papel nestes
casos?
A criança tem um auto conceito negativo, uma baixa auto-estima precisa de
uma atenção especial do professor e atuar nestas circunstancias requer do professor uma
competência profissional e esta não pode ser contemplada apenas pelas relações de empatia
pessoal. É claro que simpatias existem e isso não deixa de acontecer na sala de aula, nem
entre o professor e seus alunos. São relações pessoais que se estabelecem. Mas isso não
pode gerar a educação, temos que pensar, refletir sobre este aspecto do acolhimento do
15
professor e sobre sua importância na construção da auto-imagem do aluno, de como este se
vê em relação aos outros.
O professor tem um lugar de poder, de destaque, é alguém que, em última
instância, dá notas, emite conceitos, repreende, castiga, reprova. Tem poder e precisa saber
usar dele com profissionalismo e ética, e isso muitas vezes não é fácil, principalmente
porque não estamos atentos às sutilezas destas relações no dia-a-dia. São nestas relações e
em outras experiências interpessoais com pais, professores, amigos, etc, que o aluno tece a
visão de si mesmo e, portanto, queiramos ou não, atuamos diretamente neste processo.
Assim, poderemos ajudar, desde que acreditemos nesse aluno.
Na maioria das vezes, por não conseguirmos diagnosticar e localizar a
dificuldade de cada aluno, caímos em algumas armadilhas e acabamos por reforçar essa
imagem negativa que a criança tem de si mesma, prejudicando assim o processo ensino x
aprendizagem.
Um exemplo bem claro é quando muitas vezes o professor pede o caderno
do aluno para fazer correção e verifica que a atividade está sem fazer, então ele
imediatamente diz: Fulano, eu tinha certeza que você não tinha feito! O que você quer da
vida garoto? Ou então quando ao ser solicitadas por um aluno para explicar uma questão
que não está entendendo, o professor diz: Fulano pula essa questão, faz a outra que é mais
fácil, essa você não vai entender!
Sabemos que todas as palavras têm um conteúdo intelectual, mas muitas
vezes não nos damos conta que cada uma tem também um conteúdo emocional, portanto ao
dizer “tinha certeza” ou faça a mais “fácil”, o professor estará reforçando uma imagem
negativa, um sentimento de incapacidade, afirmando que não acredita mais nele. A visão
que temos do aluno nem sempre é revelada na nossa fala, mas nos olhares, risos, atitudes
diversas. São às vezes expressões sutis, simples que nem nos damos conta, em outras
situações arrebatadoras, mas sempre são reconhecidas pelos alunos e incorporadas às suas
manifestações como aprendizes.
16
Se estivermos mais atentos aos nossos alunos, aos comentários que fazemos,
às atitudes que tomamos, teremos condições de ajudá-los a se fortaleceram, a encarar os
desafios propostos, a criar uma imagem melhor de si mesmos e, conseqüentemente, de
aceitarem o desafio e de se darem o direito de aprender.
O papel do professor deve ser de colaborador do aluno durante o processo de
aprendizagem, devemos estar “do mesmo lado do campo, no mesmo time” e, dessa forma,
poderemos conseguir resultados mais satisfatórios, tanto no que se refere aos alunos – que
eles aprendam e fiquem contentes por aprender – como também poderemos observar que
nossos esforços valeram a pena. Assim, poderemos escrever juntos a história dessa
parceria.
Então o que é ser um bom professor? Esse questionamento não é algo novo,
tão pouco esgotado de investigação e pesquisa. Quando falamos do perfil do professor,
devemos partir da indagação sobre o que determina seu desempenho na prática pedagógica
e como se realiza o ato pedagógico escolar, no entanto, não devemos nos esquecer de que
para esta prática afluem às contradições do contexto escolar, os conflitos psicológicos, as
questões das ciências e as concepções de valor daqueles que compõe o ato pedagógico: o
professor e o aluno.
É necessário recuperar o prazer e a alegria de aprender e deixar claro que a
escola, necessariamente, não precisa ser chata e ritualista, porém para tanto como afirma
Snyders, (1993, p. 27):
(...) somente se o aluno sentir a alegria presente na escola é que ele reprimirá sua
inclinação à distração, à preguiça, à facilidade. Pode-se realmente ajudá-lo a
progredir exortando-o primeiro a despojar-se daquilo que o tenta?
1.1. Professor, a chave de um bom relacionamento.
Sabemos que ser professor hoje no Brasil não é nada fácil e nem temos
como objetivo condenar alguém, conhecemos bem de perto as salas superlotadas, a falta de
recursos didáticos, os programas extensos e complicados, os baixos salários e a formação
17
que pouco nos prepara para a realidade, entre tantos outros problemas que acabam por
desanimar o professor. No entanto, não podemos deixar que essas tensões do dia-a-dia nos
tirem o gosto pelo que fazemos, pois segundo Freinet (1967, p.78):
(...) um educador, já sem gosto pelo trabalho, é um escravo do ganha pão e que
um escravo não poderia preparar homens livres e ousados; que não podes
preparar os alunos para construírem, amanhã o mundo dos seus sonhos, se já não
acreditares nesse sonho; que não podes prepará-lo para a vida, se já não acreditas
nessa vida, que não poderás mostra-lhes o caminho se te deixas ficar sentado,
cansado e desanimado, na encruzilhada dos caminhos.
Sabemos, no entanto que o professor é a figura principal de qualquer sistema
educacional. Por isso, qualquer pessoa que queira ingressar no magistério deve procurar
saber se realmente tem vocação para a profissão.
Em que consiste essa vocação? Quais os fatores principais que constituem a
motivação para o ensino?
Quando se deseja abraçar determinada ocupação ou ingressar em cursos
profissionais, é necessário, antes de tudo, conhecer em que consiste essa profissão, quais as
aptidões necessárias ao seu melhor desempenho, qual a personalidade mais adequada,
enfim, qual o preparo indispensável ao bom exercício profissional, pois enquanto
educadores, críticos e conscientes da realidade de nossa sociedade temos o dever de
acreditar na possibilidade de transformação, e acreditar nisto começa por acreditar em
nosso trabalho, na força que ele exerce sobre a vida de várias pessoas, vidas estas que sendo
transformadas, também geram transformação. Neste sentido entendemos também que tanto
a escola como a formação do professor são destinadas a contribuírem para a perpetuação da
sociedade em que vivemos, no entanto, se queremos mudanças não podemos simplesmente
esperar por elas, pois as mudanças só virão a partir do momento em que os principais
interessados se mexerem, e como interessados que somos, estaremos ajudando a mudar a
sociedade a partir do momento em que colaboremos para mudanças dentro da escola, e
mudar nossa postura com os alunos é um grande passo.
Entendemos que nas relações entre sujeito e meio ambiente que se formam
as representações sociais e que se tratam de elaborações mentais criadas a partir do real
18
com o objetivo de interpretá- lo e que possuem sua raiz no social. Por isso no nosso
cotidiano quando perguntamos sobre as características do professor a pais, alunos,
funcionários e professores ouvimos muitas respostas, percebendo e identificando através
delas diferentes concepções/representações que passam pelo imaginário de cada um, no
entanto, todos são unânimes quanto à importância de características que melhorem e
facilitem a relação professor – aluno.
A função essencial do educador é a ajudar a criança a desenvolver os seus
conhecimentos e sua personalidade, a fim de integrá- la na sua comunidade da maneira mais
completa possível, é uma pessoa que por conseguinte procura antes de tudo guiar, orientar,
encorajar, estimular, descobrir e canalizar os interesses dos alunos e em casos de problemas
de conduta, tais como instabilidade, rebeldia, excessivo retraimento, inatenção, o educador
tem de empregar solução diferente para cada caso.
Normalmente não nos damos conta da importância que tem para o aluno
perceber que nos fixamos nele, que sabemos que ele existe no meio de uma turma de tantos
outros, de saber que ele não passa despercebido. O interesse do professor pelos alunos tem
que ser comunicado, pois esta comunicação afeta de forma direta a visão/percepção que
estes têm do professor e conseqüentemente influenciam na dedicação às tarefas e à
aprendizagem.
Neste sentido o professor à medida que possua um bom relacionamento com
seus alunos, que construa uma relação mais próxima com estes estará contribuindo para a
motivação e interesse dos alunos.
É impossível encontrar a fórmula do professor ideal, mas acreditamos que o
caminho para isso começa na formação do professor, formação esta que deve estar voltada
para a reflexão constante da prática, pois segundo Paulo Freire (1996: 96):
(...) na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da
reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de
ontem que se pode melhorar a próxima prática.
19
Pois refletindo a todo o momento o professor estará observando e revendo o
seu fazer pedagógico, buscando desta forma trabalhar de modo que o conhecimento seja
construído e não transmitido, desta forma também o professor estará mais próximo do
aluno, atuando junto com ele e entenderá o quanto se aprende pela convivência, agindo
assim o professor atuará de modo eficiente. Pois a partir do momento em que o professor
observa, se surpreende, investiga, registra, reflete, transforma, revê, se relaciona e atua, sua
prática torna-se mais rica.
1.2. Fazer pedagógico, autoridade ou autoritarismo?
Há muito tempo a escola vem estruturando (através da disposição das
cadeiras em fila na direção do professor, do material didático, da chamada) a relação
professor-aluno para que esta aconteça de modo bem definido, onde um fala e transmite e
outro ouve e recebe, de forma bem mecânica. Deste modo ao longo do tempo esta relação
tem ficado marcada pela distância e separação entre professor e aluno, como se apenas um
fosse sujeito do processo educativo e também pela autoridade que a instituição escolar
investe ao professor, no momento em que lhe impõe cobranças e exigências.
Essa
autoridade concedida ao professor é legitimada pelo fato de que uma de suas funções é
deter os instrumentos de controle pedagógico, com os quais pode autoritariamente exigir,
controlar e submeter os alunos a seu programa. Podemos dizer então, que a escola e tudo
dentro dela, inclusive as relações interpessoais são parte integrante de uma sociedade
injusta e desigual e contribuem para manter as relações de poder da mesma forma como
vêem sendo estruturadas há séculos, onde quem tem o poder tem também o saber e onde os
pobres são excluídos tanto da escola quanto da participação nas decisões.
(...) Dar lições do alto da cátedra, marcar deveres, corrigir, vigiar, interrogar —
sem respirar sequer—, classificar e recompensar com uma boa nota ou com um
santinho, tal é a função que se tem reservado desde sempre ao professor primário
e cuja tradição nos tem marcado com uma tara desumana, perigosamente inscrita
nos reflexos quase naturais de todo àquele que pretenda ensinar crianças. ... E
acrescentamos que nenhum adulto, inclusive professores, aceitariam para si
20
mesmos o regime de suspeita, de comando e de troça que, ainda de modo geral, é
o da grande maioria das nossas escolas. (FREINET, 1967:130)
Percebemos que a percebemos que a autoridade, tão necessária a prática
pedagógica, passa a ser exercida como autoritarismo, onde ocorrem situações de
classificação, recompensa, correção, vigilância, indiferença, comparação e tantas outras
criadas pelo professor para manter a tão sonhada disciplina dentro de sala de aula.
Percebemos que alguns professores têm como compreensão de um bom processo de
ensino-aprendizagem o autoritarismo, onde fica estabelecido que o detentor do saber é o
professor, cabendo aos alunos somente ouvir sem questionar, e assim muitos deles
acreditam e conduzem sua prática, levando a um estilo de aprender em que a passividade e
atitude acrítica são as marcas. E através dessa prática fica claro para o aluno que quem
possui o saber passa a ter poder sobre quem não o possui, e isso se materializa de forma
bem clara nas salas de aula através das palavras e frases ditas pelos professores.
O desrespeito, o despreparo e a falta de habilidade na administração de certos
conflitos são fatores predominantes dentro da sala de aula deixando bem claro o quanto a
posição de detentor do saber, de juiz que determina quem “vai para o céu ou para o
inferno”, calam a voz do aluno que tem medo do poder que o professor possui de fazê-lo
passar vergonha, poder este legitimado por uma sociedade onde quem tem o conhecimento
tem emprestado o poder. Assim o poder exercido pelo professor dentro de sala de aula tem
se mostrado como o grande causador da distância entre estes e alunos,
quando os
professores em nome da idealizada disciplina e do respeito utilizam-se de recursos baseados
no autoritarismo e no poder acabam por provocar nos alunos um comportamento baseado na
passividade, no medo e algumas vezes na revolta e violência, aumentando cada vez mais a
distância nessa relação.
O professor controla o comportamento do aluno em nome da disciplina,
porém tudo isso sem que haja uma maior compreensão dos motivos pelos quais deve haver
disciplina na sala de aula, pois, segundo Makarenko (Apud FRANCO, 1986:63):
A disciplina deve ser acompanhada da compreensão da sua necessidade, da sua
obrigação, do seu significado de classe. ... A disciplina deve ser entendida como
21
a soma da influência educativa (instrução, métodos, interação professor-aluno,
conteúdos, etc.) num processo de cooperação e comprometimento com a
formação do homem necessário à construção de uma nova sociedade. A
disciplina, portanto, não pode ser alcançada com a dispersão das forças
pedagógicas. (...) Só se alcança a disciplina através do trabalho conseqüente do
coletivo da escola, de uma escola onde o aluno se sinta feliz e co-responsável
pelo êxito escolar, uma escola em que cada aluno deve, sobretudo, estar
convencido de que a disciplina é a forma de melhor conseguir o fim visado pela
coletividade.
Quanto à indisciplina podemos entendê- la como uma linguagem, e é preciso
que o professor esteja atento para ouvir e compreender o que os alunos querem dizer
através de seu comportamento, talvez estejam sinalizando que a escola não lhes
proporciona alegria, satisfação e tampouco uma aprendizagem consistente, que é chata, que
não aprendem e sim repetem o que as vezes nem tem sentido para eles e que não sentem
nenhum prazer em sentarem-se nos bancos escolares.
Ao estabelecer um perfil do aluno que considera ideal/padrão, o professor
está deixando de relacionar-se mais diretamente com os outros alunos e de incentivá- los
devidamente, chegando muitas vezes até a constrangê- los.
Neste sentido FREINET
(1967:38), no livro Pedagogia do Bom Senso, fala sobre a necessidade do educador “ sê
humano” e se pôr no lugar da criança:
Põe-te no lugar dessa criança que acabas de humilhar, com uma nota má ou uma
posição inferior na classificação. Lembra-te do teu próprio orgulho quando
estavas entre os primeiros, e de todos os maus sentimentos que te agitavam
quando outros te passavam à frente (...) Então compreenderás e hás-de suprimir a
classificação.
Os alunos em sala de aula precisam sentir-se livres, sem preocupações,
medo ou angústias que possam ser causadas pelos possíveis erros, antes, devem aprender
com esses erros, eles devem ser matéria de estudo. Uma vez que cada aluno se sinta aceito
e compreendido pelo professor, ocorrerá a formação de um clima propiciador de maior
segurança, onde cada aluno diante de dificuldades surgidas acabará encontrando liberdade,
ajuda e valorização que facilitarão a aprendizagem. No entanto, sem que haja uma boa
relação entre professor e aluno é difícil que este último não sinta medo ou vergonha de seu
erro.
22
Outra conseqüência do autoritarismo manifestado em sala de aula é a falta
de respeito dos professores com as experiências trazidas pelos alunos e a transformação da
escola num mundo diferente do que vivemos. Sobre isso FREIRE diz que:
O desrespeito à leitura de mundo do educando revela o gosto elitista, portanto
antidemocrático, do educador que, desta forma, não escutando o educando, com
ele não fala. Nele deposita seus depoimentos.
(FREIRE,1996:139)
Muitos professores em nome de um conteúdo sistematizado e do plano de
curso a ser cumprido, passam por cima das questões que realmente são relevantes para os
alunos não levando em conta suas aspirações, seus desejos e sua história, desassociando
desta forma o conteúdo escolar da vida, negando ou desprezando a realidade que o aluno
vê e conhece, principalmente quando se tratam de alunos das classes populares, seus
saberes e vivências são consideradas diferentes dos ensinados na escola. Quando passa por
cima das idéias, vivências, saberes e leitura de mundo do aluno, o professor reduz sua
função à transmissor de conhecimentos, deixando assim de ser parceiro do aluno na
construção do conhecimento, ou como diz Sócrates, parteiro de idéias.
Serei um parteiro especial. Um parteiro de idéias e pensamentos. Como um
criança se origina de uma célula, um embrião, e aos poucos é gestada e
transformada em um bebê, todos nós concebemos e fecundamos idéias que ao
serem gestadas se transformam. Mas, não há auxilio no sentido de nos ajudar a
exteriorizar tais idéias e a mostrar a beleza de nossas criações. Todo o mundo
quer mostrar suas idéias e ninguém nos auxilia a trazê-las à luz.
(Apud.
SALTINI, 1999:60)
Neste sentido o professor não pode ser autoritário, aquele que fala horas a
fio sem dá voz ao aluno, mas aquele que estabelece uma relação de diálogo e que acredita
que o aluno tem capacidade de gerar idéias e que tais idéias precisam e devem ser
respeitadas para que haja a verdadeira aprendizagem.
23
2. A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE
As crianças ao ingressarem na escola têm varias expectativas em relação ao
professor, constroem suas hipóteses e formulam conceitos, e esta relação é referencial para
toda criança e não deixa de ser uma relação entre seres humanos com histórias de vida,
expectativa, alegrias e tristezas. Quando a criança encontra, na escola, um ambiente
educativo flexível, motivador, construtivo e rico em sentimentos e emoções, desenvolve-se
com mais facilidade. Quando se consegue estabelecer uma interação sadia, gratificante, de
descobertas e desafios, bem como de carinho, sinceridade, afeto e confiança pode-se
determinar uma condição de promoção e crescimento dos alunos e despertar nestes um
desejo pelo saber, pelo crescer e pelo conhecer.
No entanto, para que o professor possa estar promovendo este ambiente é
necessário que esteja a todo o momento revendo e refletindo sobre sua prática.
2.1. A importância do afeto no ambiente escolar.
Na maioria das vezes na sala de aula são privilegiados os aspectos
cognitivos, deixando-se de lado o aspecto afetivo, no entanto, estabelecer vínculos afetivos
no espaço da sala de aula é muito valioso para a aprendizagem, pois como afirma Rossine
(2001:15):
24
(...) a falta de afetividade leva a rejeição aos livros, am carência de motivação
para a aprendizagem, à ausência de vontade de crescer. Se o ser humano não está
bem afetivamente, sua ação como ser social estará comprometida, sem expressão,
sem força, sem vitalidade. Isto vale para qualquer área da atividade humana,
independentemente de idade, sexo, cultura.
Portanto, a presença do afeto na sala de aula é um ponto importante, pois
quando se fala de afeto, fala-se do estabelecimento de relações de respeito, prazer no
convívio, solidariedade, cooperação e compreensão do “outro”. Um toque, um gesto, um
olhar, um sorriso, muitas vezes dizem mais do que uma palavra. Sentir-se querido e aceito
pelo grupo é muito bom, traz segurança, eleva a auto-estima. E no caso dos alunos, estes são
extremamente sensíveis ao estado emocional do professor e deste depende criar um
ambiente de confiança e de compreensão das dificuldades de aprendizagem de cada um,
ambiente este que favoreça o ensino e a construção da personalidade dos alunos.
Assim, os professores, através de suas atitudes e palavras, de sua postura e
até de seu tom de voz, estabelecem o “clima” da sala de aula que pode ser um clima ode o
afeto, respeito e a boa convivência estejam presentes ou um clima árido e seco onde se
tornam tensas e difíceis às relações entre professores e alunos.
Compreendemos a atividade como um conjunto de conhecimentos aplicados
por pessoas com a finalidade de favorecer o desenvolvimento de outras pessoas. E pessoas
são constituídas de um conjunto de características – nem só cabeças pensantes, nem só
corpos atuantes, mas também de afetos, emoções e sentimentos que permeiam todas as
atitudes e relacionamentos. Um ambiente de trabalho alegre, cooperativo e amistoso, em
que haja lugar para o afeto e a emoção e se possam expressar sentimento, fortalece vínculos
positivos entre aluno e aluno, entre professor e aluno, e entre o aluno e as tarefas escolares.
Quem se sente respeitado em todos os aspectos aceita mais facilmente o outro com suas
características, sua funções e seus papéis. O grupo se articula, convive melhor e o trabalho
flui.
A dimensão afetiva tem uma profunda influencia sobre o desenvolvimento
intelectual, ela pode acelerar ou diminuir o rítimo de desenvolvimento e pode determina
sobre que conteúdos a atividade intelectual se concentrará, ao que dará mais importância.
25
Piaget em sua teoria considera o desenvolvimento intelectual como tendo dois
componentes: um cognitivo e outro afetivo e aponta para o fato de que há aspectos do afeto
que se desenvolvem e que este inclui sentimentos, interesses, desejos, tendências, valores e
emoções em geral além de apresentar várias dimensões, incluindo os sentimentos subjetivos
(amor, raiva, depressão) e aspectos expressivos (sorrisos, gritos, lágrimas). Na visão de
Piaget (1995:125), o afeto se desenvolve no mesmo sentido que a inteligência e é
responsável pela ativação da atividade intelectual.
Em vários livros, podemos ver que o autor descreve cuidadosamente o
desenvolvimento afetivo e cognitivo do nascimento até a vida adulta, fixando-se na
infância. Através de seus estudos verifica-se que as crianças tornam-se capazes de investir
afeto e ter sentimentos validados nelas mesmas, uma vez que suas capacidades afetivas e
cognitivas sejam expandidas através da contínua construção. Neste sentido podemos dizer
que a auto-estima mantém uma estreita relação com a motivação e com o interesse da
criança por aprender e que o afeto é o princípio norteador da auto-estima.
Depois de desenvolvido o vínculo afetivo, a aprendizagem, a motivação e a
disciplina como meio para conseguir o auto-controle da criança e seu bem estar são
conquistas significativas, pois a escola se torna local privilegiado para a reconciliação entre
o conhecimento e o amor. Não podemos nos esquecer, no entanto, da questão familiar, pois
uma criança que tem suas necessidades afetivas atendidas desde cedo tornar-se-á mais
satisfeita consigo mesma e com os outros, criará uma auto-imagem positiva e terá mais
facilidade e disposição para aprender. Como afirma BUSCAGLIA (2000:138):
(...) o homem possui tanto necessidades físicas quanto emocionais (...) se estas
não forem satisfeitas, podem ser tão devastadoras como a fome, tão
desconfortáveis quanto a falta de um abrigo, tão incapacitante quanto a sede. A
frustração, o isolamento a ansiedade provocadas por necessidades emocionais
não satisfeitas, podem, como uma privação física, produzir a morte, ou um grau
de morte na vida, como uma neurose ou uma psicose.
A criança precisa encontrar braços abertos e mãos carinhosas; deve ser
desde cedo acostumada a ouvir histórias, e ter um tempo exclusivo de dedicação dos pais;
deve viver em um ambiente tranqüilo, sem gritos, sem violência, onde se sinta amada;
26
nunca deve ser comparada a outra, e quando for preciso deve ser chamada a atenção, mas
tudo deve ser bem justificado e ainda, deve ter como exemplos o pai e a mãe. Outro
aspecto muito citado diz respeito ao fato de não podermos deixar que a criança faça tudo o
que quer, de sermos justos, pois “saber dizer não é fundamental” e que os limites devem ser
colocados desde cedo, pois a superproteção cria dependências em excesso.
Muitas são as tarefas no sentido de atender as necessidades afetivas das
crianças, enfim, cabe-nos ajudá- las a acreditar em si mesmas, pois o que a criança pensa de
si mesma é mais importante do que ela sabe e como nós educadores sabemos, as crianças,
assim como qualquer pessoa, aprendem melhor quando estão satisfeitas com elas mesmas.
A criança que se sente amada, aceita, valorizada e respeitada, adquire autonomia, confiança
e aprende a amar, desenvolvendo um sentimento de auto- valorização e importância. A
auto-estima é uma coisa que se aprende. Se uma criança tem uma opinião positiva sobre si
mesma e sobre os outros, terá maiores condições de aprender. No entanto, o sentimento de
“não sou ninguém” levará a criança a não se esforçar muito, a não ter desejo de aprender, a
ficar indiferente diante do êxito ou do fracasso. E esse sentimento pode criar problemas de
aprendizagem e de comportamento.
Falar de afetividade na relação professor-aluno na perspectiva Walloniana, é
falar de emoções, disciplina, postura, do conflito eu-outro, uma constante na vida da
criança – em todo o meio de qual faça parte – seja a família, a escola ou outro ambiente que
ela freqüente. Para este autor, as teorias sobre emoções têm base mecanicista e difíceis de
serem compreendidas. Primeiro, ele as vê como reações incoerentes e tumultuadas e, em
segundo lugar, destaca o poder ativador que têm as emoções, consideradas por ele
positivas. Para o autor, estudar a criança exigiria estudar também o meio em que ela se
desenvolve, pois para Wallon (1979:73) o meio possui grande importância no
desenvolvimento infantil, e “o conceito de meio inclui a dimensão das relações humanas, a
dos objetos físicos e a dos objetos de conhecimento e o meio é o campo sobre o qual a
criança aplica as condutas de que dispõe, e ao mesmo tempo, é dele que retira os recursos
para sua ação”. (GALVÃO, 1995:100)
27
Com isso, o autor quer dizer que a sociedade intervém no desenvolvimento
psíquico da criança, através de suas repetidas experiências e das dificuldades para
ultrapassá- las, já que ela, diferentemente de outros seres vivos, depende por muito tempo de
seus semelhantes adultos. O recém-nascido, por exemplo, não consegue diferenciar-se do
outro nem mesmo no plano corporal. Essa diferenciação começa no primeiro ano de vida
pela interação com os objetos e seu próprio corpo. É essa construção do eu corporal que dá
condição à formação do eu psíquico, chamado de estágio personalista.
A dimensão afetiva, que é de fundamental importância , seja do ponto de
vista da construção da pessoa como do ponto de vista do conhecimento, sendo, portanto,
marcante para o desenvolvimento da espécie humana que se manifesta a partir do
nascimento e estende-se pelo primeiro ano de vida da criança. Uma criança normal, quando
já está se relacionando afetivamente bem com o seu meio ambiente, em particular com sua
mãe, sente necessidade de ser objeto de manifestações afetivas para que, assim, seu
desenvolvimento biológico seja perfeitamente normal.
As reflexões acerca da afetividade na importante e difícil relação entre
professor e aluno, feitas à luz dos principais fundamentos teóricos, deixam claro que
afetividade e inteligência se misturam, dependendo uma da outra para evoluir, visto que a
dimensão afetiva é um elemento marcante para o desenvolvimento da espécie humana.
Wallon (1968:121) destaca a importância de uma disciplina diferente da que
a criança recebe em casa, ainda na escola maternal, além da relação pessoal entre ela e seu
educador. Para isso, é de fundamental importância que o professor esteja consciente de sua
responsabilidade, tomando decisões de acordo com os valores morais e as relações sociais
de sua época, considerando ainda as condições de vida familiar e social de seus alunos.
O respeito mútuo, de fundamental importância para a criança, deve ser
trabalhado em exercício de cooperação, na convivência em grupo, a partir da experiência
histórica de cada uma e de seu nível de desenvolvimento. São os esquemas afetivos,
28
construídos na inter-relação da criança com o seu meio, que irão formar o caráter da
criança, e o sentimento de respeito que a criança nutre em relação a outras pessoas.
Podemos, então, concluir que, para a prática pedagógica algumas teorias
contêm elementos comuns que são indispensáveis para o desenvolvimento da
aprendizagem. Identificamos a necessidade de que o professor veja seus alunos com mais
atenção, para entender suas condutas e não fazer julgamentos precipitados, que o professor
deva estar, antes de tudo, comprometido com a educação, com o conhecimento, de forma a
contribuir com a formação da pessoa, do desenvolvimento da sua personalidade, como
participante do grupo social em que vive e que investir na formação do professor é o passo
que a escola deverá dar para lidar com a questão da transferência, que vai além de suas
habilidades teóricas e metodológicas.
Enfim, fica evidente a importância que tem para nós, educadores, o
conhecimento da afetividade, quer seja através das emoções, da força motora das ações ou
do desejo e da transferência, para o melhor desenvolvimento da aprendizagem do aluno e,
conseqüentemente, para uma melhor relação entre este e o professor. A escola, portanto,
deve voltar-se para a qualidade das suas relações, valorizando o desenvolvimento afetivo,
social, e não apenas cognitivo como elementos fundamentais no desenvolvimento da
criança como um todo.
2.2. O clima emocional e a aprendizagem
Os profissionais da educação tem abordado este tema “ aprendizagem” como
uma construção que é individual e coletiva, solitária e participativa, objetiva e subjetiva,
contextualizada em uma realidade pensada e vivida, em um jogo de mediação entre o
sujeito e o objeto de conhecimento.
Nessa perspectiva, a construção do eu-sujeito acontecerá concomitante à
construção da realidade. Será a qualidade da vida afetiva da criança ao longo dos primeiros
anos de vida, que valorizará suas aprendizagens. A temperatura do campo afetivo em que a
criança viver será propulsor das aprendizagens produzidas por ela.
29
A escola e os educadores tem que buscar entender, com os olhos que
desvelam, a vida afetiva e sua repercussão no ato de aprender e de ensinar. Temos que
saber que uma criança não aprende qualquer coisa, em qualquer lugar e com qualquer um,
ou seja, que elegemos com quem aprendemos e, mesmo assim, aprendemos de forma
diferente, apesar do mesmo disparador.
O ser humano é visto como o ser do conhecimento – um sujeito inteiro, com
múltiplas facetas, que faz parte de um grupo e ao mesmo tempo, se diferencia dele, enfim.,
que é parte de um todo coeso, não deixando de ser ímpar.
Podemos afirmar que as primeiras experiências relacionadas a aprendizagem
são oriundas da relação mãe- filho (ou quem estiver fazendo esse papel) e da afetividade
que se estabelece nesse processo. Como afirma Parolin (2005, p.72)
(...) o que vai embasar o processo de desenvolvimento da compreensão do mundo
externo é a relação afetiva existente entre esse par educativo. É nessa relação que
se estabelecem os primórdios do que será essa pessoa como aprendiz, sem
esquecermos de considerar o caráter social e afetivo, além do familiar na
construção do estilo de aprendizagem de uma pessoa.
O ser cognoscente aprende em diferentes situações e, com suas
aprendizagens, torna-se senhor de si mesmo, do seu mundo e das múltiplas redes
relacionais que ele conseguir gerir e gerenciar. Nós como educadores necessitamos ter
claro que esse movimento tem um clima emocional, tem um tom relacional e é momento
privilegiado em que aprendizes e educadores autorizam-se a conhecer e a conhecer-se.
Como afirma Freire (1996, p.23):
“ (...) desde o começo do processo, vai ficando cada vez mais claro que, embora
diferentes entre si, quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado
forma-se e forma ao ser formado ... Quem ensina aprende ao ensinar e quem
aprende ensina ao aprender”
É nossa tarefa como educadores reconhecer cada aluno como alguém
singular, contempla- lo em sua individualidade, estabelecer um campo emocional que
30
favoreça a manifestação desse Ser e viabilizar uma ação pedagógica que contemple o
aprendiz em sua totalidade e plenitude.
A aprendizagem acontece em um contexto sócio-afetivo e educativo, num
clima emocional entre pessoas comprometidas entre si e com conhecimento, uma
perspectiva de busca dos instrumentos necessários para viver e o conviver.
É a partir do que a criança recebe em seu berço de seus cuidadores que ela
desenvolverá o seu sentimento de pertencimento, reconhecendo-se como parte de uma
comunidade e como única e ímpar. A escola tem um papel importante e singular na
constituição do sujeito, papel, aliás, que tem aumentado significativamente ao longo dos
tempos, já que cada vez mais as crianças ficam mais tempo na escola aos nossos cuidados.
A escola é parceira da família na construção do cidadão, pois é ela a instituição que tem
peculiaridade de ser fortemente socializadora tanto do conhecimento quanto das
experiências e entre as pessoas.
Reconhecer as emoções como parte do ato de aprender é identificar a
reciprocidade entre afetividade e inteligência como um agente interativo à atividade de
construir conhecimento, é essencial para que nós educadores possamos planejar e
administrar uma ação verdadeiramente educativa.
2.3. Diferenciando afetividade, sentimento e emoção
É importante para nós educadores sabermos diferenciar esses três conceitos:
afetividade, sentimento e emoção para que compreendamos as emoções em seus aspectos
educativo e suas repercussões em sala de aula.
A afetividade é um conceito bem abrangente, em cujo bojo encontra-se o
desenvolvimento da pessoa. Ela é tão importante quanto a inteligência e não é sentimento e
nem emoção. Ela nasce antes da inteligência e é, portanto, ponto de partida para o
desenvolvimento de uma pessoa. A partir da interação com o outro, a criança socializa-se e
31
começa a manifestar-se emocionalmente. A afetividade e a inteligência constituem um par
inseparável e que evolui a partir das experiências vividas, modifica-se e fica mais elaborado
à medida que a criança amadurece suas relações.
A emoção é a expressão da afetividade e a afetividade integra sentimentos e
emoções. A afetividade tende a tornar-se mais moral, pois, à medida que sofre influência
da atividade racional, ela se modifica. A vida afetiva sofre influência da vida intelectiva, e
vice-versa.
Enquanto um indivíduo se desenvolve, suas necessidades afetivas vão
tornando-se prioridades cognitivas.
O sentimento caracteriza-se por ser mais estável. Como exemplo temos a
paixão que é emoção e o amor sentimento.
O sentimento, para Wallon, é psicológico e duradouro. Por revelar um
estado mais permanente, diferencia-se da emoção, que é orgânica e explode, portanto
efêmera. Vale a pena afirmar que as emoções podem ser educadas
A função postural- movimento das emoções está diretamente ligada a
atividade intelectiva e é por meio da análise dos movimentos que podemos entender o curso
do pensamento. È fácil observar uma pessoa tentando entender algo por intermédio de suas
expressões faciais, seus movimentos de braços, assopro, suspiros, coçar de cabeça, retirar a
franja da testa, etc...
Ao mesmo tempo, a função postural dá sustentação à atividade de reflexão
mental. Entre ambas, há uma relação de reciprocidade. Assim, quando durante a leitura de
um texto, confrontamo-nos com problemas difíceis de serem resolvidos, mudar de posição,
levantar a cadeira, ou andar um pouco são recursos que podem ajudar. Propiciam a
superação do estado de estagnação e paralisia em que a mente parece entrar, é como se as
variações tônicas desobstruíssem o fluxo mental. (GALVÃO, 1998, p. 71)
32
3. ESCOLA COMO ORGANIZAÇÃO APRENDENTE
À medida que a sociedade torna-se cada vez mais dependente do
conhecimento, é necessário questionar e mudar certos pressupostos que fundamentam a
educação atual. Isto significa expandir o conceito de aprendizagem; ele não deve estar
restrito ao período escolar e pode ocorrer tanto na infância quanto na vida adulta. A escola
será um – entre muitos outros – dos ambientes em que será possível adquirir conhecimento.
Para tanto, ela terá que incorporar os mais recentes resultados das pesquisas sobre
aprendizagem e assumir a função de propiciar oportunidades para o aluno gerar e não só
consumir conhecimentos (Valente. 1999), desenvolvendo, assim, competências e
habilidades para poder continuar a aprender ao longo da vida.
Os mais recentes estudos sobre aprendizagem fornecem importantes
resultados que podem ser usados na análise do que acontece com a educação hoje. O
trabalho de Piaget mostrou que as pessoas têm uma capacidade de aprender a todo o
momento, desde os primeiros minutos de vida. Aprendemos a andar, a falar, a ser
profissionais, a manter uma família, a educar os filhos, etc... Quando crianças, aprendemos
muitos conceitos científicos e construímos nossas próprias teorias sobre como as coisas
33
funcionam e como as pessoas pensam. Aprendemos tudo isso vivendo, fazendo coisas e
interagindo com as pessoas, não somente sendo ensinados por meio de aulas formais. Além
disso, como mostrou Juan Delval (2000:121), um estudioso da psicologia do
desenvolvimento e discípulo de Piaget, as pessoas também têm a capacidade de ensinar,
transmitindo cultura e valores que a sociedade tem acumulado, tal fato acontece desde a
primeira interação mãe-filho. Portanto, não só adquirimos informações como também
somos capazes de transmiti- las a partir dos primeiros anos de vida, fazendo isto
constantemente. Aprendemos e ensinamos porque precisamos resolver problemas reais e
interagir com as pessoas.
Além disso, essas experiências de aprender e ensinar é prazerosa, e não nos
damos conta de que estamos aprendendo ou ensinando. Nessas situações, temos a
oportunidade de vivenciar uma, “experiência ótima”, alcançando um sentimento de
excitação e de divertimento relembrados como bons momentos da vida. No entanto, a
experiência ótima não é atingida por meio de atitudes passivas ou fáceis; em geral, ela
acontece quando as pessoas estão inteiramente envolvidas, mergulhadas na situação e
dando o máximo de si.
Embora um indivíduo possa aprender muito ao interagir com os objetos e
com as pessoas, a complexidade do mundo acaba demonstrando que ele procure ajuda para
formalizar aquilo que faz intuitivamente. A escola tem essa função. Contudo, todo o
encantamento de aprender sem ser formalmente ensinado desaparece.
A criança, antes de entrar na escola, é motivada para a aprendizagem e
assume uma atitude de ativa busca de informação. Nesse período, anterior à entrada na
escola, a sociedade oferece certas atividades que podem ser vistas como intervenções
educacionais precoces, como jogos e playgrounds, que têm a função de enriquecer o
ambiente e facilitar o desenvolvimento da criança. Todavia, a criança continua buscando
ativamente a informação e realizando atividades que contribuem para a construção do seu
conhecimento.
34
Durante a educação escolar – educação infantil, fundamental, média e
universitária – gradativamente a predisposição de caçador – ativo de informação é
oprimida, e os estudantes não aprendem mais interagindo com o meio que os cerca, mas
sendo formalmente ensinados. Eles são encorajados a serem receptores passivos de
informação e adquirem a idéia de que aprender não é divertido, bem como de que essa
atividade sempre depende de um professor que prepara a aula e entrega a informação em
uma bandeja de prata. Nesse período, é muito difícil encontrar alunos engajados em uma
experiência, provavelmente, está acontecendo fora da escola quando as crianças e os
adolescentes têm a chance de aprender sem serem formalmente ensinados.
A predisposição de receptor – passivo é produto de um sistema educacional
que funcional com base na transmissão de informação. Essa modalidade de ensino é
desenvolvida por meio de um currículo oculto e começa a ser mais efetiva após o segundo
ciclo (4ª série), quando os conteúdos são fragmentados e as disciplinas são ministradas por
diferentes professores. A estratificação de conteúdos continua até a universidade e, assim, a
escola não promove o desenvolvimento de habilidades de aprendizagem que auxiliam as
pessoas a aprender e a continuar a aprender após a educação escolar. Elas deveriam
aprender a buscar a informação, aprender como usá- la e, desse modo, apropriarem-se de tal
experiências, convertendo-a em algo pessoal.
3.1. Aprendência: A unidade entre processos vitais e cognitivas.
O termo “aprendizagem” deve ceder o lugar ao termo “aprendência”
(“apprenance”) que traduz melhor, pela sua própria forma, este estado de estar em
processo – de – aprender, esta função do ato de aprender que constrói e se
constrói o seu estatuto de ato existencial que caracteriza efetivamente o ato de
aprender, indissociável da dinâmica do vivo. (HELENE, 1997: p.95)
Os abundantes documentos oficiais da União Européia sobre as mutações no
mundo de hoje ressaltam três choques básicos: o choque da sociedade da informação, o
choque da mundialização e o choque da civilização científica e técnica. É a esse fenômeno
complexo que se referem os diversos nomes: Sociedade de informação (SI), Sociedade do
conhecimento (knowledge society), Sociedade aprendente (learning society; em francês,
35
société cognitive). Os diferentes nomes indicam ênfases no enfoque analítico e na proposta
sócio – pedagógica.
SL é a sigla ainda predominante nos documentos da União Européia, mas
ela denota um certo ranço de apego tecnicista ao código binário (bits).
Sociedade do conhecimento é terminologia mais rica. O conhecimento – e
não os simples dados digitalizados – é e será o recurso humano, econômico e sócio-cultural
mais determinante na nova fase da história humana que já se iniciou. Com a expressão
sociedade aprendente pretende-se inculcar que a sociedade inteira deve entrar em estado de
aprendizagem e transformar-se numa imensa rede de ecologias cognitivas.
A proposta de uma sociedade aprendente – enfaticamente assumida por
vários documentos da União Européia – parece apostar tudo no equacionamento entre
educação e empregabilidade como a via para a superação das exclusões. É negável que isto
implica, de certo modo, uma adequação ao predomínio da lógica do mercado. Os
documentos a que aludimos situam a questão da transformação do mundo do trabalho e a
funcionalização da educação com vistas a um novo conceito de “empregabilidade” dentro
da mundialização marcada por um “pensamento único”. Sem sair deste marco, produzem
um discurso abundante sobre a importância da dimensão social, que caracterizaria o
“modelo europeu”. Este modelo é idealizado nesses documentos como “imbuído de uma
forte ética de solidariedade”.
3.2. Aprendizagem continuada ao longo da vida.
Aprendizagem continuada ao longo da vida significa que, se uma pessoa
tiver o desejo de aprender, ela terá condições de fazê- lo, independentemente de onde e
quando isto ocorrerá. Para tanto, é necessária a confluência de três fatores: que ela tenha
predisposição de aprendizagem, que a informação esteja organizada (para facilitar a
aprendizagem) e que existam pessoas que pensam auxiliar o aprendiz no processo de
aprender (agentes de aprendizagem).
36
Se o propósito é facilitar a aprendizagem continuada ao longo da vida, a
sociedade deve oferecer recursos e mecanismo para as pessoas satisfazerem o desejo de
aprender pelo uso da predisposição de aprendizagem que demonstram desde os primeiros
minutos de vida. A sociedade deveria estar consciente de que as pessoas aprendem de
diferentes maneiras e deveria oferecer vários tipos de ambientes de aprendizagem. Até o
momento, a escola tem sido praticamente o único ambiente disponível. Está ficando cada
vez mais evidente que a sociedade está preocupada com a disseminação de outros
ambientes, como, por exemplo, a produção de bens e serviços que hoje é feita por
“organizações de aprendizagem”, ou a criação de facilidades que permitem às pessoas
adquirirem conhecimento enquanto fazem compras no supermercado ou visitam um museu.
O não entendimento dessas novas tendências da sociedade do conhecimento
tem acarretado uma série de problemas. Primeiro cria-se um descompasso na vida das
pessoas à medida que novas habilidades são exigidas, mas estas não são condizentes com a
formação recebida no período escolar. A escola impõe uma predisposição, enquanto as
coisas mais importantes na nossa vida são adquiridas por meio de ações pouco valorizadas
no âmbito acadêmico. Segundo, as instituições educacionais criadas com a finalidade de
suprir a demanda imposta à vida do profissional, principalmente pelas organizações de
aprendizagem que pressupõem um constante aprimoramento, não estão contribuindo para
que as pessoas adquiram habilidades de aprendizagem continuada ao longo da vida. Muito
pelo contrário, o que está sendo oferecido são atividades baseadas na predisposição de
receptor-passivo. Na verdade, está surgindo uma indústria que, em nome da aprendizagem
continuada ao longo da vida, acaba oferecendo um processo de certificação continuada ao
longo da vida: cursos de curta duração, os quais usam uma abordagem tradicional de ensino
certificam os participantes aqui demonstram ter adquirido uma habilidade específica, porém
nada é mencionado sobre processos de aprendizagem ou aprender a aprender. Terceiro, a
escola está tornando-se um buraco negro na vida das pessoas, consumindo um tempo
significativo da vida delas e não conseguindo contribuir para o preparo de cidadãos para a
sociedade do conhecimento.
Segundo o Relatório do Desenvolvimento Humano, 1999, publicado pelo
Programa da Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, 1999), uma população
37
mínima do planeta tem acesso à informação, entende, exercita e beneficia-se da idéia de
aprendizagem continuada ao longo da vida. Como disse Sebastião Salgado (2000) elas
estão em uma acelerada viagem para o futuro. Quanto às demais, para uma será possível
entender e beneficiar-se dessas idéias e o restante, infelizmente, terá muita dificuldade para
isso, porque a maior preocupação ainda é a sobrevivência.
Para aqueles que poderão vir a entender essas idéias e que poderão vir a
aprender continuadamente ao longo da vida, a escola ainda é o caminho a ser trilhado. Isto
significa que o papel da escola e as contribuições que ela pode propiciar os indivíduos
numa tiveram tanta importância como agora. No entanto, à medida que ela impõe uma
agenda que nega e castra a predisposição de aprendizagem das pessoas, passa a ser
contraprodutiva. Com isso, ela ainda está preparando profissionais obsoletos e tornando-se
dispensável neste novo cenário de inúmeras oportunidade de aprendizagem que se
descortina. Há uma preocupação e mobilizações intensas na maioria das organizações da
nossa sociedade, porém pouca ou quase nenhuma no âmbito da escola. A ironia é que a
instituição que mais pode contribuir para aprendizagem continuada ao longo da vida e
beneficiar-se dela é a que menos se tem mobilizado.
O aprender não se resume em aprender coisas, se isto fosse entendido como
ir acrescentando umas coisas aprendidas a outras, numa espécie de processo acumulativo
semelhante a juntar coisas num montão. A aprendizagem não é um amontoado sucessivo de
coisas que vão reunindo. Ao contrário, trata-se de uma rede ou teia de interações neuronais
extremamente complexa e dinâmica, que vão criando estados gerais qualitativamente novos
no cérebro humano. É a isto que dou o nome de morfogênese do conhecimento. Neste
sentido, a aprendizagem consiste numa cadeia complexa de saltos qualitativos de autoorganização neuronal da corporeidade viva, cuja clausura operacional (leias-se: organismo
individual) se auto-organiza enquanto se mantêm numa acoplagem estrutural com seu meio.
Kelso (1996: p.156) deixa claro que seu objetivo é, efetivamente “mudar a
maneira como encaramos a questão do aprender” .
38
(...) longe de enxergar a mudança numa só coisa, como se costuma fazer ao
observar o desempenho numa tarefa determinada, apresentarei evidências de que
a inteira configuração de atratores se modifica e reestrutura, às vezes
drasticamente, quando se aprende uma determinada tarefa. À aprendizagem não
se limita a reforçar um traço na memória ou conexões sinápticas entre imputs e
outputs: ela modifica o sistema inteiro. No atual estado das pesquisas, ninguém
ainda sobe exatamente o que acontece num sistema complexo como o cérebro
humano quando ocorre a aprendizagem. (...) No atual momento, as observações
de que dispomos nos dizem unicamente que, quando as pessoas acabam de
aprender algo, sucedeu uma mudança global em seu cérebro (p.162).
Para Kelso (1996:p.171) a questão seria determinar de que maneira a
configuração dos atratores dinâmicos, já presentes no indivíduo, especialmente em seu
cérebro/mente, evoluem ao longo do processo de aprendizagem. E sua hipótese – chave soa
assim:
(...) É a inteira configuração de atratores que se modifica com a aprendizagem, e
não apenas o padrão de coordenação que está sendo aprendido. Em síntese, a
configuração do conjunto dos atratores do sistema dinâmico e complexo
cérebro/mente – hoje parcialmente observáveis e medíveis – muda com os
processos de aprendizagem .
Quando alguém aprende algo novo, não é apenas esse elemento novo –
motórico, lingüístico, conceitual, etc... – se acrescenta ao que supostamente já foi adquirido,
mas ocorre uma reconfiguração do seu cérebro/mente inteiro sobram muitas perguntas, por
exemplo: essa remexida ocorre sempre, em qualquer aprendizagem, ou só naqueles
momentos em que existe uma aprendizagem significativa? E nesse caso, que faz que ela seja
vivenciada como significativa? Evidentemente, ninguém pretende afirmar que todos os
instantes da aprendizagem sejam igualmente reconfigurantes em relação ao sistema
complexo de atratores do cérebro/mente. O que, sim, se quer propor, como teoria
explicativa do sucesso ou insucesso da aprendizagem, é que qualquer processo pedagógico
somente será significativo ara os aprendentes na medida em que se produz essa
reconfiguração do sistema complexo cérebro/mente (corporeidade inteira).
39
4 . PRAZER E TERNURA NA EDUCAÇÃO
Desde o surgimento da Escola Nova aprendemos que na constituição de
conhecimentos estão envolvidos, além das operações mentais, as emoções e os
sentimentos.O movimento de renovação pedagógica, do início
do século 20, via a
educação como um processo espontâneo que acompanha a evolução da criança.
Recentemente o principio ganhou força com o postulado de que existe até mesmo uma
inteligência emocional. Em suma: não dá para ensinar pensando só na cabeça do aluno. O
coração também é importante.
Essa versão do desenvolvimento e da aprendizagem influenciou a pedagogia
e didática do século 20. Isso mudou o modelo de relação hierárquica fria e distante que
denominou a pedagogia até fins do século 19.
O ambiente pedagógico tem de ser lugar de fascinação e inventividade. Não
inibir mas propiciar, aquela dose de alucinação consensual entusiástica requerida para que o
processo de aprender aconteça como mixagem de todos os sentidos. Reviravolta dos
sentidos – significados e potenciamento de todos os sentidos com os quais sensoriamos
corporalmente o mundo. Porque a aprendizagem é, antes de mais nada, um processo
corporal. Todo conhecimento tem uma inscrição corporal. Que ela venha acompanhada de
sensação de prazer não é de modo algum, um aspecto secundário.
Precisamos reintroduzir na escola o princípio de que toda morfogênese do
conhecimento tem algo a ver com a experiência do prazer quando esta dimensão está
ausente, a aprendizagem vira um processo meramente instrucional. Informar e instruir
acerca de sabores já acumulados pela humanidade é um aspecto importante da escola, que
deve ser, neste aspecto, uma central de serviços qualificados. Mas a experiência de
aprendizagem implica, além da instrução informativa, a reinserição e construção
personalizada do conhecimento. E nisso o prazer representa uma dimensão – chave,
Reencantar a educação significa colocou a ênfase numa versão da nação como ensejamento
e produção de experiências de aprendizagem.
40
A vida “se gosta”, Por isso os educadores, deveriam analisar de que forma a
vida dos alunos é uma vida concreta que, em seu mais profundo dinamismo vital e
cognitivo, sempre gostou de si, ou ao menos tentou e volta a tentar gostar de si. A não ser
que a própria educação cometa o crime de anular essa dinâmica vital de desejos de vida,
transformando os aprendentes em meros receptáculos instrucionais, pensando na
“transmissão de conhecimentos” supostamente já prontos.
A questão da qualidade cognitiva e social da educação deve ser encarada,
primordialmente, desde o seu pivô pedagógico, ou seja, a partir das experiências do prazer
de estar conhecendo.
4.1. Educação e sentimento.
A discussão sobre pedagogia pós- moderna reenfatiza o caráter “plurisensorial” do conhecimento ligado ao entre jogo entre certezas e incertezas, nos processos
adaptativos que a vida real nos impõe. Nosso cérebro/mente está neuronalmente
predisposto para lidar com vacilações, agüentando-as e superando-as, conforme lhe é
conveniente. Este é um dos pontos mais fascinante do tema prazerosidade!
O cérebro/mente está feito para a fruição do pensar. Pro isso a ênfase no
pensar próprio não apenas como pensamento que consegue tomar forma e articular-se, mais
também como uma experiência humanamente
gostosa – é um tema pedagógico
fundamental. O conhecimento só emerge em sua dimensão vitalizadora quando tem algum
tipo de ligação ao prazer. O afeto buscando prazer se transforma em interesse e esse por sua
vez provoca a interação com o meio adquirindo sucessivamente o conhecimento.
(SALTINI, 1999, p.81)
Encher a vida cotidiana de ternura exige uma invenção sensorial que vai
desde a vivência perceptual mais próxima até a desarticulação de complexos códigos que
nos indicam corredores preestabelecidos de semantização do mundo, É necessário uma
inversão sensorial para ressignificar a vida diária, para ascender, como nos grandes ritos
41
iniciativos, a uma alteração do estado de consciência que nos obrigue a deslocar as
fronteiras dentro das quais foi aprisionado nosso sistema de conhecimento.
4.2 . Conhecimento e compromisso social.
Educar e fazer emerger vivências do processo de conhecimento. O “produto”
da educação deve levar o nome de experiências de aprendizagem, e não simplesmente
aquisição de conhecimentos supostamente já prontos e disponíveis para o ensino concluído
como simples transmissão.
Deve-se lembrar que duas coisas devem andar juntas, a melhoria pedagógica
e o compromisso social. A educação só consegue bons “resultados” quando se preocupa
com gerar experiências de aprendizagens, criatividade para construir conhecimentos e
habilidades para saber “acessar” fontes de informação sobre os mais variados assuntos. A
escola não deve ser concluída como simples agência repassadora de conhecimentos prontos
mas como contexto e clima organizacional propício a
iniciação em vivências
personalizadas do aprender a aprender. A flexibilidade é um aspecto cada vez mais
imprescindível de um conhecimento personalizado e de uma ética social democrática.
“Conhecimento” virou tema obrigatório. Fala-se muito em “sociedade do conhecimento” e
agora também em “sociedade aprendente”. É importante saber decodificar criticamente e
encarar positivamente o desafio pedagógico expressado numa série de novas linguagens.
Toda educação implica doses fortes de instrução, entendimento e maneja de
regras e reconhecimento de saberes já acumulados pela humanidade. Embora importante,
essa instrução não é o aspecto fundamental da educação já que este reside nas vivências
personalizadas de aprendizagem que obedecem à coincidência básica entre processos vitais
e processos cognitivos.
No mundo de hoje, o aspecto instrucional da educação já não consegue dar
conta da profusão de conhecimentos disponíveis e emergentes mesmo em áreas específicas.
Por isso não deveria preocupar – se tanto com a memorização dos saberes instrumentais,
privilegiando á capacidade de
“acessá- los”, decodificá-los e manejá- los. O aspecto
42
instrucional deveria estar em função da emergência do aprender ou seja, da morfogênese
personalizada do conhecimento.
É preciso substituir a pedagogia das certezas e dos saberes pré – fixados por
uma pedagogia da pergunta, do melhoramento das perguntas e do “acessamento” de
informações. Em suma, por uma pedagogia da complexidade que saiba trabalhar com
conceitos transversáteis, abertos para a surpresa e o imprevisto.
Toda morfogênese do conhecimento é constituída por níveis emergentes a
partir dos processos auto organizativos da corporeidade viva. Por isso todo conhecimento
tem uma inscrição corporal e se apóia numa complexa interação sensorial. O conhecimento
humano nunca é pura operação, mental. Toda ativação da inteligência está entretecida de
emoções.
É preciso pensar a educação a partir dos nexos corporais entre seres
humanos concretos, ou seja, colocando em foco a corporeidade viva, na qual necessidades e
desejos formam uma unidade. A escola e o agir pedagógico têm uma função social
específica na medida em que existem, parecida e especificamente, para criar as
oportunidades básicas para a morfogênese do conhecimento.
O reencantamento da educação requer á união entre sensibilidade social e
eficiência pedagógica. Portanto, o compromisso ético político do educador deve manifestar
– se primordialmente na excelência pedagógica e na colaboração para um clima
esperançador no próprio contexto escolar.
4.3 . O brincar também tem sua importância.
Na pré-escola a interrelação do professor com o grupo de alunos e com cada
um em particular é constante, se dá o tempo todo, seja na sala, no pátio, seja nos passeios e
é em função dessa proximidade objetiva que se dá a interação com os objetos e a
construção de um conhecimento altamente envolvente. Essa interrelação é o fio condutor, o
suporte afetivo do conhecimento. Nesse caso, o educador serve de continente para a
43
criança. Poderíamos dizer, portanto, que o continente é o espaço onde podemos depositar
nossas pequenas construção e onde elas tomam um sentido, um peso e um respeito, enfim,
onde elas são acolhidas e valorizadas, tal qual um útero acolhe um embrião.
A criança deseja e necessita ser amada, aceita, acolhida e ouvida para que
possa despertar para a vida da curiosidade e do aprendizado.
O papel do professor é específico e diferenciado do das crianças. Ele prepara
e organiza o micro- universo onde as crianças buscam e se interessam. A postura desse
profissional se manifesta na percepção e na sensibilidade aos interesses das crianças que em
cada idade diferem em seu pensamento e modo de sentir o mundo.
Observamos que as crianças da pré-escola têm atitudes e brincadeiras que se
assemelham aos comportamentos dos povos primitivos.
Crianças pequenas, por exemplo, querem interagir com os objetos
manipulando-os com todo o seu corpo, não só com as mãos, pois esta é uma necessidade
natural do seu desenvolvimento. Devemos usar cones, esferas, cilindros e cubos de todos os
tamanhos e cores, de forma que as crianças possam brincar tanto com as partes internas
como com as externas desses objetos espaciais primários, assim como com os quatro
elementos fundamentais da natureza: o ar, a água, a terra e o fogo.
É importante que o educador tenha um planejamento de coesões-problema
para cada objeto da sala de aula e do pátio, local onde também se faz educação. Mas para
isso é necessário que o educador seja antes de tudo um curioso, um pesquisador,
possibilitando assim a criança descobrir verdades, ao invés de impor conteúdos.
(...) O papel do mestre deve ser o de iniciar à pesquisa e de fazer tomar consciência
dos problemas, e não op de ditar a verdade. De fato, é preciso não esquecer que
uma verdade imposta deixa de ser uma verdade: compreender é inventar ou
reinventar e “dar uma lição” prematuramente é impedir a criança de encontrar ou
redescobrir as soluções por si mesma. (FREIRE, 1972, p. 98)
44
Brincar faz parte do desenvolvimento da criança. A criança brinca para
entender seu mundo, para expressar-se, para organizar-se e, principalmente para socializarse. Os jogos, as brincadeiras e os brinquedos são atividades fundamentais para uma infância
sadia e um desenvolvimento adequado. As atividades lúdicas, sejam elas jogos ou
brincadeiras, viabilizam que a criança se desenvolva sob os aspectos da organização das
coisas relacionadas ao seu cotidiano, desenvolvem a linguagem e seus significados, as
estruturas do pensamento, a criatividade, a concentração, enfim, os inúmeros aspectos da
ordem do desenvolvimento e, portanto, da aprendizagem.
Admite-se que o brinquedo represente certas realidades. Uma representação é
algo presente no lugar de algo. Representar é corresponder a alguma coisa e
permitir sua evolução, mesmo em sua ausência. O brinquedo coloca a criança na
presença de reprodução: tudo que existe no cotidiano, a natureza e as
construções humanas. Pode-se dizer que um dos objetivos do brinquedo é dar a
criança um substituto dos objetos reais, para que possa manipula-los.
(KISHIMOTO, 1997, p. 18)
Se concordarmos que o brincar faz parte da infância e é promotor de
desenvolvimento e de aprendizagem, concordamos também que as brincadeiras, os jogos e
os brinquedos são ferramentas indispensáveis ao professor em sala de aula, tornando
também sua aula prazerosa. Contudo, na prática, não tem acontecido dessa forma. Ainda
existe a concepção enganosa de que o professor que ensina é aquele que “dá aula”, ou seja,
o que comanda as ações do aluno e dá conteúdos. Alguns professores, felizmente a cada dia
menos, ainda acreditam que as brincadeiras e os jogos são “matação de tempo”, ou o que é
pior, para os momentos fora do contexto da aprendizagem – exemplifico: “quem terminar
pode pegar um jogo”, ou ainda “se você não terminar a tarefa, não poderá brincar”, ou o
que é pior, “hoje não é dia de trazer brinquedos!”.
A liberdade e o espaço livre que o lúdico abre em sala de aula e na vida das
crianças possibilita que ela demonstre suas compreensões e hipóteses com mais
fidedignidade. Nessa perspectiva, os adultos dessa criança também ficam mais livres para
orientar, contra-argumentar, interagir de forma mais próxima possível, pois pode-se criar
um clima favorável às aprendizagens desejada, ou até mesmo, a parceria na brincadeira.
45
Nem sempre aprender é prazeroso, no entanto, podemos trabalhar, para que a
criança possa entender esses momentos com a seriedade que eles requerem. Para que isso
aconteça, o professor necessita dimensionar com muita clareza do que a criança é capaz e
qual a verdadeira necessidade de cada atividade. Será que uma criança de 5 anos de idade
precisa mesmo fazer determinada lição? Precisa mesmo ficar quieta depois do recreio? A
criança que só vive o desprazer e não é respeitada em sua condição infantil não tem por que
se esforçar para mais uma dificuldade.
Quanto mais livre for o espaço da criança para expressar-se, mais livre as
idéias, mais livres os corpos, mais livre a criatividade, a sensibilidade, a capacidade e a
possibilidade de produção. No entanto, para que esse espaço exista, necessitamos,
inicialmente trabalhar com o professor. Se o educador não se renovar e ressignificar a sala
de aula como um espaço privilegiado para a criança ser criança e manifestar-se como tal,
continuaremos repetindo uma escola de tempo passados para crianças com olhos no
amanhã. É urgente reinventarmos, em sala de aula, o espaço relaxado e descontraído das
aulas prazerosas e, nem por isso, menos importante ou descompromissadas com a
aprendizagem.
4.4 . Indisciplina ou explosões emocionais?
Existem muitas queixas dos educadores a respeito de conseguir disciplina,
entendida por como ordem, silêncio e postura adequada em sala de aula. Como diz Almeida
(2001, p. 74)
(...) a emoção é um estado fisiológico que perturba o comportamento do
indivíduo. Sua presença é marcada por manifestações que perturbam, ou até
mesmo impossibilitam a atividade do indivíduo. Cada emoção contém um
determinado conjunto de sintomas que a caracteriza. (...)
Assim sendo entende-se que trabalhar tendo em vista as emoções de todos
que compõe o par educativo é necessidade premente dos educadores. Ainda mais, é
essencial reconhecer que as manifestações afetivas na escola acontecem de modo
46
simultâneo e, muitas vezes, despercebidas das atividades cognitivas, sem que o professor
tenha clareza disso.
A indisciplina ou as explosões emocionais, para a maioria dos professores,
representam um ponto de atrito, de desencontro e, por vezes, o fator impeditivo no
relacionamento do professor com o aluno e do aluno com a construção do conhecimento e a
conseqüente aprendizagem. Ou ainda, o que é pior, muitas vezes, a indisciplina é a única
linguagem que, realmente, atinge o professor ou os pais da criança.
Se a escola não cria um contexto adequado para que o aluno viva suas
emoções em campo protegido e com vistas a sua formação global, ele próprio acaba
abrindo esse espaço, na maioria das vezes, de forma inadequada, sendo denominado pelos
professores como falta de interesse, desatenção e indisciplina.
Indisciplina em sala de aula é matéria de reflexão, de estudo e de trabalho do
professor queixoso. O professor é o grande responsável pela turma. Disciplina em sala de
aula se constrói em grupo e na relação.Disciplina é uma mistura capciosa de conhecimento,
percepção, clareza de objetivos, interesses, diálogo e bom humor. A medida que os dias e
as aulas vão se desenvolvendo e as dificuldades e as diferenças vão surgindo, o professor
necessita construir com os alunos um contato claro que auxilie todos e que seja um agente
facilitador da circulação de conhecimentos, de idéias, de pessoas, de humores, de objetos,
de direitos e de deveres.
Esse contrato deverá ser feito esclarecendo os objetivos da aula, criando com
os alunos regras de bom convívio e de trabalho, garantindo o respeito às individualidades é
a participação de todos, em um ambiente propício à aprendizagem.
Discutir, conversar, ouvir, mudar, avaliar, reorganizar: eis a receita para se
conseguir disciplina. Disciplina entendida como a forma do sujeito ou grupo organizar –
se, viver e conviver com as regras do seu contexto familiar e social a partir do
entendimento desses pontos. Quando se fala de disciplina não se refere ao “Silêncio, agora
eu vou falar ...”,ou ainda, ” Enquanto alguém estiver falando, eu não começo a minha aula
47
..., mas à organização que viabiliza um entendimento mútuo entre educador e aprendiz, que
pode ser um professor e um aluno, um aluno aprendendo com outro aluno, etc...
Disciplina é um tipo de relação que se estabelece entre pessoas que se
respeitam e sabem que têm o que aprender umas com as outras. Disciplina se constrói e se
reconstrói a cada instante e adequaçâo do grupo, assim como o resultado produtivo, deve
ser a forma de avaliação. Disciplina aqui é compreendida como possibilidade de
enfrentamento das situações de conflito entre o professor, o aluno e o conhecimento, sem
que se percam os respectivos papéis sociais e o objetivo do processo de escolarização que é
construir o cidadão instrumentalizado para ser feliz. Como diz FREIRE (1996, p.146)
(...) Estou convencido, porém, de que a rigorosidade, a séria disciplina
intelectual, o exercício da curiosidade epistemológica não me fazem
necessariamente um ser mal – amado, arrogante, cheio de mim mesmo. Ou, em
outras palavras, não é a minha arrogância intelectual a que fala de minha
rigorosidade científica. Nem a arrogância é sinal de competência nem a
competência, por outro lado, de certos arrogantes, mas lamento neles a ausência
de simplicidade que, não diminuindo em nada seu saber, os faria gente melhor.
Gente mais gente.
Não se pode esquecer que as regras em sala de aula são necessárias, pois
garantem a convivência sadia e as aprendizagens que se estabelecem neste espaço
educacional, porém elas devem estar compromissadas com a infância e com as crianças que
aprendem e não com o programa, com os pais que exigem coisas, com a direção.
Brincar é coisa séria e deve ser encarado dessa forma pelos educadores de
um modo geral e não como indisciplina.
48
CONCLUSÃO
Ter conhecimento de como o aluno constrói seu conhecimento, compreender
as dimensões das relações com a escola, com os professores, com o conteúdo e relacionálos aos aspectos afetivos e cognitivos, permite uma atuação mais segura e eficiente. Devese considerar que o desenvolvimento deste ser se dá harmoniosamente e equilibradamente
nas diferentes condições orgânica, emocional, cognitiva e social. Pode-se afirmar que o ser
humano é singular e a ele, somente a ele pertence sua situação, sua relação com o processo
eu lhe for oferecido e o desenrolar deste. Porém, o impedimento para aprender não está
atrelado somente aos fatores orgânicos. O estado emocional determina e permeia todo tipo
de relação, sendo esta uma proposta educacional formal ou não. O processo de construção
do conhecimento se dá em base sólida de acordo com a afetividade que se tem perante o
objeto de estudo e o desconhecido, pressupondo-se que todo desconhecido é novo e o novo
tem que associar-se ao já aprendido, modificando-se e aumentando-o.
O problema elucidado em nossa pesquisa é que uma criança quando não é
tratada com afetividade encontra dificuldades em “crescer”, em lidar com as novas
propostas e pode estar transportando suas más relações familiares para o espaço escolar. É
importante que o professor tenha consciência de que a criança traz consigo a bagagem
natural cultural e também traz todas as referências afetiva.
No aspecto social, destaca-se o ambiente, a quantidade e a qualidade de
estímulos recebidos e o valor dado à aprendizagem pela família e/ou meio social
comunitário.
Sugere-se que a atuação da psicopedagogia deva ter como base pensar a
forma como a criança pensa e não propriamente o que aprende. Ter um olhar
psicopedagógico de um processo de aprendizagem é buscar compreender como eles
utilizam os elementos do seu sistema cognitivo e emocional para aprender. É também
49
buscar compreender a relação do aluno com o conhecimento, a qual é permeada pela figura
do professor e pela escola.
Percebe-se através desta pesquisa a necessidade do professor ter um olhar
observador, buscando significado no olhar de seu aluno, procurando estar em sintonia com
ele para assim poder ajudá- lo de modo efetivo. Outra iniciativa fundamental é o diálogo,
porque na relação com o outro, é necessário que haja comunicação e no caso de professoraluno é a importante que essa comunicação ocorra através de um relacionamento afetivo,
pois a dimensão afetiva possui lugar central tanto no processo de construção do indivíduo
quanto no processo de construção do conhecimento.
Propõe-se então que as relações entre as crianças e o professor ocorram de
forma dialógica, traduzindo assim um ambiente de cooperação, trabalho coletivo,
pensamentos e reflexão sobre a ação, colaborando assim para uma aprendizagem
significativa.
Sabemos que todas as pessoas que compõem a comunidade escolar são de
extrema importância para a vida escolar do aluno, porém é com o professor que ele tem
contato direto e diário.
Observamos que a importância dada a afetividade na relação professor-aluno
revela trocas de sentimentos e de respeito mútuo e os professores precisam estar atentos
para que sejam coerentes com sua prática, pois de a outra forma o aluno não encontrará a
segurança necessária para o desenvolvimento.
Defendemos com este trabalho a hipótese de que a relação professor-aluno
deva existir desde sempre para que ela a aprendizagem decorra com mais facilidade e
destacamos também a importância da atuação do psicopedagogo diante de relações de
relações de conflito que possam acarretar dificuldades de aprendizagem, atuando junto ao
aluno e ao professor, colaborando principalmente para que este último seja capaz de
construir, refletir e reconstruir sua prática e ser antes de tudo um educador, tendo um
pensar e um fazer que critique a realidade que o cerca e não reproduza a esta realidade.
50
O professor deve tentar levar o aluno a compreender o contexto cultura,
social e político, a fim de que se torne capaz de participar do processo de construção da
sociedade, compreendendo e organizando sua experiência de vida. Este educador deve
trabalhar no sentido de formar um cidadão consciente, crítico e participativo.
A partir desta visão o que se percebe é que um trabalho realizado
afetivamente e coletivamente contribui para que alunos se sintam construtores do saber e se
relacionem com o professor, entendendo o papel deste como organizador e mediador do
processo de aprendizagem. Portanto necessita – se construir um sistema educativo que
supere a clássica contraposição entre razão e emoção, cognição e afetividade, e que rompa
com uma concepção – por nós tão conhecida – que atribui ao desenvolvimento de intelecto,
dos aspectos cognitivos e racionais, um lugar de destaque na educação, relegando em
segundo plano, os aspectos afetivos e emocionais.
51
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
— ALMEIDA, R. A emoção na sala de aula. São Paulo: Papirus, 1999.
— ANTUNES, Celso. Alfabetização emocional: novas estratégias. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1999.
— AQUINO, Julio Groppa. Relação professor x aluno. São Paulo, 1996.
— ARROYO, Miguel G. Ofício de mestre:imagens e auto-imagens. Petrópolis, RJ:
Vozes , 2000.
— ASSMANN, Hugo.
Reencantar a educação: rumo a sociedade aprendente.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.
— BUSCAGLIA, Leo F. Amor. 21ª edição. Rio de Janeiro. Record: Nova Era, 2000.
— CYRULNIK, Boris. Os alimentos do afeto. Editora Ática, 1995
— DEVAL, Juan. Psicologia do desenvolvimento. Petrópolis, 2000.
— FREINET, C. Pedagogia do bom senso. Moraes Editora, 1967.
— FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1996.
— FURLANI, Lúcia Maria Teixeira. Autoridade do professor: meta, mito ou nada
disso. São Paulo: Cortez, 2000.
— GALVÂO, Isabel. Henri Wallon: Uma concepção dialética do desenvolvimento.
Editora Vozes, 1998.
— KISCHIMOTO, Tizuko Morchida. Jogo , brinquedo, brincadeira e educação. São
Paulo: Cortez, 1996.
52
— MORAES, Pedro. A relação professor x aluno: o que é, como se faz. Edições
Loyola, 1995.
— PAROLIN, Isabel. Professores formadores: a relação entre a família, a escola e a
aprendizagem. Curitiba: Positivo, 2005.
— PIERRE, Weil. A criança, o lar e a escola. Petrópolis: Vozes, 1998.
— PIAGET, Jean. A tomada de consciência. Trad. Edson B. de Souza. São Paulo:
Melhoramentos. USP, 1977
— RANGEL, Mary. Representações e reflexões sobre o bom professor. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1999.
— REGO, Tereza Cristina. Vygotsky: uma perspectiva sócio cultural da educação. 3ª
edição. Rio de Janeiro: Vozes, 1995.
— Revista Pátio: As dimensões do aprender. Ano IV n° 15, novembro de 2000 / Janeiro
2001.
— ROSSINE, Maria Augusta Sanches. Pedagogia afetiva. Petrópolis, RJ: Editora Vozes,
2001.
— SALTINE, Cláudio João Paulo. Afetividade e inteligência. Editora DP&A, 1999.
— SNYDERS, Georges. Alunos Felizes. Editora Paz e Terra, 1993. Rio de Janeiro
— WALLON, Henri. Psicologia e educação da criança. Lisboa: Universidade, 1979.
— VALENTE, Armando José. Aprendizagem continuada ao longo da vida. Editora
Artmed, 1999.
53
ANEXOS
54
55
ÍNDICE
INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 08
1. O PROFESSOR E A CONSTRUÇÃO DA AUTO-ESTIMA DO ALUNO ............. 13
1.1 – Professor, a chave de um bom relacionamento ......................................... 16
1.2 – Fazer pedagógico, autoridade ou autoritarismo? ..................................... 19
2. A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE ................................................................. 23
2.1 – A importância do afeto no ambiente escola .............................................. 23
2.2 – O clima emocional e a aprendizagem ....................................................... 28
2.3 – Diferenciando afetividade, sentimento e emoção ..................................... 30
3. ESCOLA COMO ORGANIZAÇÃO APRENDENTE ............................................. 32
3.1 – Aprendência: A unidade entre processos vitais e cognitivos .................... 34
3.2 – Aprendizagem continuada ao longo da vida ............................................. 35
4. PRAZER E TERNURA NA EDUCAÇÃO .............................................................. 39
4.1 – Educação e sentimento .............................................................................. 40
4.2 – Conhecimento e compromisso social ...................................................... 41
4.3 – O brincar também tem sua importância .................................................... 42
4.4 – Indisciplina ou explosões emocionais? ..................................................... 45
CONCLUSÃO ............................................................................................................... 48
56
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 51
ANEXOS ....................................................................................................................... 53
ÍNDICE .......................................................................................................................... 55
57
FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PROJETO A VEZ DO MESTRE
Pós Graduação “ Lato Sensu”
Título da monografia: “ A importância da afetividade na relação professor x aluno: um
olhar psicopedagógico”.
Data da entrega: ____/____/_______
Avaliação: Como você avaliaria esta monografia?
Esta monografia foi confeccionada com muito empenho, dedicação e sacrifício,
devido a falta de tempo, onde cada detalhe foi pesquisado com o objetivo de tornar este, um
trabalho de qualidade. Foi percebido interesse por parte do orientador Nilson Guedes de
Freitas em acompanhar passo a passo todo o processo de confecção, a fim de assegurar o
sucesso da pesquisa. De maneira geral o trabalho teve bom êxito.
Avaliado por: ___________________________________________ Grau: __________
__________________________, _____ de __________________ de 200___
58
59
Download

universidade cândido mendes pós – graduação “lato sensu”