XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012
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EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA: UM CONCEITO EM TRANSFORMAÇÃO
Luiz Fernando Conde Sangenis – FFP/UERJ
RESUMO:
O conceito de extensão universitária, nas duas últimas décadas, tem transitado da
polissemia a um entendimento mais uníssono por parte da própria comunidade
acadêmica. Como causas desta transformação, podemos apontar a criação do Fórum de
Pró-Reitores das Universidades Públicas Brasileiras e o surgimento do Edital ProExt, de
responsabilidade do MEC/Sesu, indutor de ações extensionistas que se caracterizam
pela preocupação com a inclusão social. De prima pobre e com status inferior, antes o
ensino e a pesquisa, a extensão tem buscado encontrar o seu lugar e o seu papel no
âmbito da universidade brasileira. Entendida, cada vez mais, como vocacionada à
grande articuladora da tríade que forma a extensão, com o ensino e a pesquisa, torna-se
responsável por uma reforma da autocompreensão da universidade e das suas relações
internas, e desta com a comunidade. Pretende retirar da extensão o caráter de "terceira
função" para dimensioná-la como filosofia, ação vinculada, política, estratégia
democratizante, metodologia, sinalizando para uma universidade voltada para os
problemas sociais com o objetivo de encontrar soluções através das pesquisas básica e
aplicada, visando realimentar o processo ensino-aprendizagem como um todo e
intervindo na realidade concreta. Em sua relação com a pesquisa, juntas, seriam
responsáveis pela criação e recriação de conhecimentos capazes de provocar
transformações sociais. Por seu turno, em relação ao ensino, propugnaria
transformações curriculares que determinariam um novo conceito de sala de aula e de
aprendizagem.
Palavras-chave: extensão universitária, concepção de extensão, universidade pública
1.
Extensão: oceano de pluralidades
Da tríade indissociável que caracteriza a ação universitária, a extensão – que
com o ensino e a pesquisa a compõem – é a que mais causou equívocos e interpretações
das mais variadas, especialmente, quando partimos para o enunciado das definições. O
que é extensão, o que a caracteriza, quais seus objetivos, qual seu papel dentro e fora da
universidade?
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Num oceano de pluralidades, nem sempre conseguimos o consenso dos que
aportam em terra segura. Ao contrário do ensino e da pesquisa, a extensão tem sentido
polissêmico. E isso não se deve à abundância de produções bibliográficas que venham
discutir o tema. A reduzida produção sobre a extensão, tomando por critério
comparativo a correspondente literatura sobre o ensino ou a pesquisa, ainda é marcada
por divergências quanto ao objetivo e o significado da extensão universitária.
Considerando esta insipiente literatura, destacamos os trabalhos de Botome
(1996), de Mesquita (1997) e de Nogueira (2005). Consultando-os encontramos
diversos conceitos de extensão universitária. Mesquita menciona, ao menos, dezenove
conceitos diferentes, aos quais classifica de “vulgares”; divide-os em cinco categorias,
assim caracterizadas: (1) oferta de cursos; (2) prestação de serviços; (3) atividade
complementar ao ensino e à pesquisa; (4) compensação ou “remédio” para suprir as
falhas do ensino regular; (5) e, finalmente, instrumento político-social.
Pesquisa realizada pela Comissão Permanente de Avaliação da Extensão
(CPAE) do Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas
Bra¬sileiras, em 2007, levantou informações sobre as concepções de extensão das
Instituições Públicas de Educação Superior referentes aos anos de 1993 e 2004.
Concepção de Extensão nas Instituições Públicas de Educação Superior – 1993
Concepção
Função de articulação
entre a Sociedade e a
Universidade
Função que leva a
Universidade ao
cumprimento de sua
missão social
Função de prestação de
serviço por parte da
Universidade
Função de politização da
Universidade
Função de
alimentação/retroaliment
ação do ensino e da
pesquisa (resposta
espontânea)
Função de articulação do
ensino com a pesquisa
(resposta espontânea)
Outras
f
61
%
98,4
55
88,7
40
64,5
34
54,8
5
8,1
4
6,4
16
25,8
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Concepção de Extensão nos instrumentos legais nas instituições públicas de educação
superior – 2004
Concepção
Articulação entre a
universidade e a
sociedade
Articulação do ensino
Articulação da pesquisa
Promoção de
interdisciplinaridade
Transmissão do
conhecimento produzido
pela universidade
Prestação de serviços
Cumprimento da missão
social da universidade
Outros
f
71
%
98,6
66
65
58
91,7
90,3
80,6
58
80,6
55
64
76,4
88,9
6
8,3
2. Extensão: um conceito em mutação
A origem da extensão brasileira foi marcada pelo assistencialismo e por uma
atitude soberba da universidade, entendida como torre do saber, que, benemeritamente,
concedia à comunidade a chance de ilustrar-se ou de resolver seus problemas ao
usufruir das conquistas do saber acadêmico e científico. Vigorava uma dicotomia entre
ensino, pesquisa e extensão. Ao longo de anos esta realidade não se alterou
significativamente.
Os primeiros registros oficiais sobre Extensão Universitária aparecem no
Estatuto da Universidade Brasileira / Decreto-Lei no 19.851, de 1931 e na Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional no 4.024, de 1961, centrados na modalidade
de transmissão de conhecimentos e assistência.
A Reforma Universitária de 1968, Lei 5.540, tornou a Extensão obrigatória em
todos os estabelecimentos de ensino superior e nas universidades, como cursos e
serviços especiais estendidos à comunidade.
Com o fortalecimento da sociedade civil durante os anos 80 é discutido um novo
paradigma para a universidade brasileira, sua relação com a sociedade e o papel da
extensão. Nesse movimento é criado, em reunião na UnB, o Fórum de Pró-Reitores de
Extensão das Universidades Públicas (1987), que expressa o novo conceito no I
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Encontro Nacional de Pró-Reitores de Extensão. Em 1988 é aprovada na Constituição o
princípio da indissociabilidade ensino – pesquisa – extensão.
O conceito de Extensão definido pelo Fórum, naquela época, foi básico para o
desenvolvimento conceitual, expresso no Plano Nacional de Extensão que explicita sua
praxis nos princípios da indissociabilidade e ação transformadora, com interação social
e interdisciplinaridade.
Após o Plano Nacional de Extensão (1999-2001), elaborado pelo FORPROEX Fórum dos Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras e pela
Secretaria de Educação Superior, e mais as iniciativas das políticas indutoras do MEC,
ficou fortalecida a ideia de que a finalidade da extensão universitária é a de servir de
instrumento de política social com o objetivo de superação das desigualdades sociais
existentes.
A extensão entendida como prática acadêmica que interliga a Universidade nas
suas atividades de ensino e de pesquisa, com as demandas da maioria da população,
possibilita a formação do profissional cidadão e se credencia, cada vez mais, junto à
sociedade como espaço privilegiado de produção do conhecimento significativo para a
superação das desigualdades sociais existentes. (Brasil, MEC/Sisu, FORPROEXT)
O MEC procura consolidar esta concepção de extensão na comunidade
acadêmica utilizando instrumentos indutores, dos quais o mais destacado é o ProExt, em
razão de ser uma das poucas possibilidades de financiamento das ações de extensão. O
próprio MEC veicula em seu portal a seguinte informação:
O Programa de Extensão Universitária (ProExt)
tem o objetivo de apoiar as instituições públicas de
ensino superior no desenvolvimento de programas
ou projetos de extensão que contribuam para a
implementação de políticas públicas. (grifo nosso)
(Brasil, Portal do MEC)
Criado em 2003, o ProExt abrange a extensão universitária com ênfase na
inclusão social.
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Os temas do ProExt deixam clara a tônica na inclusão social:
* formação de professores para o sistema educacional;
* atenção integral à família;
* combate à fome;
* erradicação do trabalho infantil;
* combate ao abuso e à exploração sexual de crianças e adolescentes;
* juventude e desenvolvimento social;
* geração de trabalho e renda em economia solidária;
* promoção e/ou prevenção à saúde;
* violência urbana;
* direitos humanos;
* educação de jovens e adultos;
* atenção à pessoa idosa, à pessoa com deficiência e às populações indígenas e
quilombolas;
* atividades complementares ao Programa Brasil Alfabetizado;
* educação ambiental e apoio ao desenvolvimento comunitário;
* inclusão étnica;
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* apoio à organização e desenvolvimento comunitário;
* inclusão social dos usuários de drogas;
* inclusão digital;
* apoio às atividades de escolas públicas;
* ensino de ciências;
* Educação de jovens e adultos, incluindo apoio ao desenvolvimento de sistemas locais
e regionais de educação, alfabetização e letramento. (BRASIL, MEC/Sisu)
Não é sem razão que, apesar da palavra declarada, a extensão ainda sofre para
deixar de se tornar atividade menos nobre da tríade – hierarquicamente encabeçada pela
pesquisa, e seguida pelo ensino – e, consequentemente, a prima pobre da universidade.
Numa mesma instituição, constatamos o desvalor dos que também cuidam da prática,
que se imiscuem no mundo das coisas, enquanto outros, por dedicarem-se unicamente à
pesquisa, ao inventar realidades, longe do burburinho da rua, têm o direito garantido de
manter seus laboratórios e gabinetes aquinhoados com verbas de editais generosos
quando encontram méritos e competências investigativas. A universidade custa a
superar antigas hierarquias entre tipos de saber que remontam a tradição aristotélica.
Por sua vez, aqueles que se dedicam à extensão tentam, com esforço, enobrecer
a ação extensionista. Talvez, daí, segundo um ponto de vista, se defenda como meritória
a concepção de universidade que mantém relação com a população com o objetivo de
oxigenar a vida acadêmica. Em consequência, a produção do conhecimento, via
extensão, se faria na troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, tendo como
consequência a democratização do conhecimento, a participação efetiva da comunidade
na atuação da universidade e uma produção resultante do confronto com a realidade.
Esta nova concepção de extensão pretende superar a compreensão tradicional de
disseminação de conhecimentos produzidos pela universidade, a ciência, a técnica e a
arte. Cursos, conferências, seminários, simpósios foram os meios preferenciais para a
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divulgação do conhecimento científico; o conhecimento técnico, por sua vez, ensejava a
prestação de serviços, via assessoriais, consultorias e ações assistenciais; e, finalmente,
os eventos de difusão cultural, divulgariam a produção de arte e cultura.
3. Extensão: um novo conceito em formação
Houve a necessidade de questionamento sobre as ações desenvolvidas pela
extensão; de função inerente à universidade, a extensão começou a ser percebida como
um processo que articula o ensino e a pesquisa. A produção do conhecimento, via
extensão, se faria na troca de saberes sistematizados, acadêmico e popular, tendo como
conseqüência a democratização do conhecimento, a participação efetiva da comunidade
na atuação da universidade e uma produção resultante do confronto com a realidade. A
pesquisa, tanto a básica quanto a aplicada, deveria ser sistematicamente direcionada ao
estudo dos grandes problemas, podendo fazer uso de metodologias que propiciassem a
participação das populações na condição de sujeitos, e não na de meros espectadores.
Concebida e institucionalizada como processo educativo, cultural e científico,
caberia à extensão articular o ensino e a pesquisa e viabilizar a relação transformadora
entre a universidade e a sociedade. Trata-se de uma reforma da autocompreensão da
universidade e das suas relações internas, e desta com a comunidade. Pretende retirar da
extensão o caráter de "terceira função" para dimensioná-la como filosofia, ação
vinculada, política, estratégia democratizante, metodologia, sinalizando para uma
universidade voltada para os problemas sociais com o objetivo de encontrar soluções
através das pesquisas básica e aplicada, visando realimentar o processo ensinoaprendizagem como um todo e intervindo na realidade concreta.
A afirmação de que a extensão é parte indispensável do pensar e fazer
universitários, exige um esforço pela institucionalização dessas atividades, tanto do
ponto de vista administrativo como acadêmico, o que implica a adoção de medidas e
procedimentos que redirecionam a própria política das universidades.
A partir desta nova compreensão do papel articulador da extensão, com relação à
pesquisa, haveria muitas possibilidades de articulação do trabalho da academia com
setores da sociedade. Priorizando as metodologias participativas, universidade e
comunidade seriam, juntas, responsáveis pela criação e recriação de conhecimentos
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capazes de provocar transformações sociais, bem como identificar o que deve ser
pesquisado e para quais fins e interesses se buscam novos conhecimentos.
Quanto ao ensino, discutem-se formas alternativas de superação da forma
tradicional da organização curricular, estruturado em torno de um conjunto rígido de
disciplinas. Os currículos tornar-se-iam mais flexíveis e abertos. Para tanto, é necessário
criar um novo conceito de sala de aula, que não se limite ao espaço físico da dimensão
tradicional, mas compreenda outros os espaços, dentro e fora da universidade.
Atividades complementares, por exemplo, abririam possibilidades de envolvimento, em
que se realiza o processo histórico-social com suas múltiplas determinações, passando a
expressar um conteúdo multi, inter e transdisciplinar, como exigência decorrente da
própria prática.
O estágio curricular é outra possibilidade promissora para viabilizar a extensão
enquanto momento da prática profissional, da consciência social e do compromisso
político. Idealmente, poderiam ser obrigatórios para todos os cursos, iniciando-se, de
modo desejável, nos primeiros períodos, e estar integrado a projetos decorrentes dos
projetos pedagógicos dos cursos e à temática curricular.
Referências Bibliográficas:
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Ensino Superior. Fórum de PróReitores de Extensão nas Universidades Públicas Brasileiras. Comissão Permanente de
Avaliação da Extensão Universitária. João Pessoa: Universidade Federal da Paraíba,
Editora Universitária, 2006.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Ensino Superior. Fórum de PróReitores de Extensão nas Universidades Públicas Brasileiras. Indissociabilidade entre
ensino-pesquisa-extensão e a flexibilização curricular: uma visão da extensão. Porto
Alegre: UFRGS; Brasília: MEC/Sesu, 2006.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Ensino Superior. Fórum de PróReitores de Extensão nas Universidades Públicas Brasileiras. Plano Nacional de
Junqueira&Marin Editores
Livro 3 - p.006051
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Extensão
Universitária:
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http://www.renex.org.br/documentos/Colecao-Extensao-
Universitaria/01-Plano-Nacional-Extensao/Pl
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Ensino Superior, disponível em
http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=12241&Ite
mid=487, acesso em 03/03/2012.
BOTOME, S.P. Pesquisa alienada e ensino alienante: o equívoco da extensão
universitária. Petrópolis: Vozes, 1996.
MESQUITA FILHO, Alberto. “Integração Ensino-Pesquisa-Extensão.” Revista
Integração,
v.
9,
p.
138-143,
1997,
disponível
em:
http://ecientificocultural.com/ECC2/artigos/epe.htm, acesso em 01/03/2012.
NOGUEIRA, Maria das Dores Pimentel. Políticas de Extensão Universitária
Brasileira. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005.
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