TÓPICOS PARA REFLEXÃO ACERCA DE ALGUNS ASPECTOS RELEVANTES DO ACTUAL REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS 1. Introdução do problema em análise - notas históricas Historicamente, as custas processuais eram apuradas por referência a uma taxa que se aplicava aos actos praticados pelos litigantes. Porém, após uma progressiva evolução empreendida a esse nível, a matéria das custas processuais consolidou-se nos Dls ns 21278, de 26/5 de 1932, 22780, de 29/6 de 1933 e 24090, de 29/6 de 1934. Com efeito, estes representaram uma significativa evolução nesta matéria. Evolução que se torna mais veemente com os Dls ns 25882, de 1/10 de 1935, e 28676, de 20/5 de 1938. Em 26.08.1940, o DL nº 30688 publicou o CCJ. Revertendo à actualidade, importa atermo-nos ao DL nº 34/2008, de 26 de Fevereiro, que incorporou no nosso ordenamento jurídico o denominado Regulamento das Custas Processuais, cuja última alteração foi operada pelo DL nº 52/2011, de 13/04. 2. As custas judiciais e o direito comparado Fizemos uma averiguação acerca da matéria das custas processuais nos Estados membros do Conselho da Europa. Assim, com esta amostra, pudemos constatar que na maior parte destes países o montante das custas judiciais é enformado em função do valor da causa. No entanto, em alguns países esta regra não tem aplicabilidade. As custas podem representar uma percentagem do valor da acção, um montante fixo ou uma combinação dos dois critérios e, por via de regra, cabe à parte vencida suportar as custas da parte vencedora. Na hipótese de uma sentença parcialmente procedente, a maioria destes Estados deixam na esfera do poder de apreciação discricionária do juiz a decisão quanto às custas. Nos Estados em que as custas apenas são contadas após o termo do processo, evita-se o risco de o Autor ter de pagar, a título de despesas e de outros custos, um montante superior àquele que é susceptível de lhe ser concedido a título da sua pretensão, nomeadamente se esta é acolhida parcialmente. 3. Perspectiva Crítica A primeira crítica a tecer ao sistema de custas processuais vigente no nosso ordenamento jurídico é a da delonga na devolução do dinheiro que as partes despenderam para o efeito. Daí que defendamos a alteração de paradigma no que concerne às custas processuais. É nosso entendimento que estas deverão ser suportadas por quem dá causa à acção e não por quem recorre ao tribunal para ver os seus direitos tutelados. Em segundo lugar, cumpre-nos referir que não podemos concordar com a taxa de justiça especial para pessoas colectivas comerciais. Estamos perante uma solução que foi incorporada no ordenamento jurídico português, com base no exemplo de países conjuntural e estruturalmente diferentes do nosso. Uma taxa sancionatória excepcional, fixada pelo Juiz, entre 2 e 15 UCs é, igualmente, de repudiar, evitando-se a subjectividade e o despautério de alguns Magistrados, reportando-se a lei, ainda, a “casos excepcionalmente graves” e permitindo o aumento das multas discricionariamente. A regra geral de fixação da base tributável gera incerteza jurídica e financeira, factor de insegurança e arbitrariedade, pois inviabiliza decisões uniformes. As inovações relativas à taxa de justiça em processo penal e contra-ordenacional comportam iniquidades que poderão, eventualmente, redundar em reclamações ou recursos sobre a justeza dos critérios para determinada quantificação. Quanto à Nota Justificativa de Custas de Parte, questionamos quais as razões que levaram o legislador a encurtar o prazo de 60 para uns escassos 5 dias (quando a mais das vezes a Secretaria não notifica a “baixa” dos autos do Tribunal Superior). Com a entrada em vigor do RCP, a reclamação da conta de custas só será admitida mediante depósito imediato de 50% do seu valor, descontadas as custas de parte, o que configura uma solução inaceitável, por injusta, desproporcionada e ainda mais onerosa para o reclamante. Ainda no que tange a conta de custas, o pagamento faseado da conta previsto no RCP comporta um anátema: as prestações são agravadas em 5%, contrariando o espírito de quem só pode pagar nesta modalidade por insuficiência económica, reconduzindo-se esta solução a algo similar a um contrato de mútuo que o responsável pela mesma celebra com o Estado. A acrescer a tudo isto, o DL nº 52/2011, de 13/4 introduziu uma alteração no art. 6º, nº 3 do RCP, alteração essa que implica que as taxas de justiça foram novamente agravadas, pois o legislador, que outrora previu, sendo essa a filosofia intrínseca, uma redução na ordem dos 25% para as partes que recorram aos meios electrónicos para a apresentação das suas peças processuais, decidiu na última alteração reduzir tal desconto para 10%. Finalmente, diga-se que mais uma vez o legislador não consagra a isenção de custas para Advogados, à semelhança do que preconizou para outros agentes judiciários. Não vislumbramos motivos para tal distinção, em prejuízo dos Advogados e entendemos mesmo que esta exclusão será violadora do princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado. Em suma, parece resultar implícito que a ratio legis do legislador hodierno, em matéria de custas processuais, é servir-se do aumento do seu custo para conseguir diminuir a pendência nos tribunais. 4. Conclusões 1. A Ordem dos Advogados deverá pugnar por uma alteração de paradigma no que concerne às custas processuais, porquanto, na nossa opinião, estas deverão ser suportadas por quem dá causa à acção e não por quem recorre ao tribunal para ver os seus direitos tutelados. 2. Quanto ao desconto aplicável às partes, que recorrem aos meios electrónicos, esta diminuição merece a nossa veemente censura já que os Advogados têm elevados custos fixos, de molde a dotarem os seus escritórios das tecnologias necessárias para o efeito. 3. A solução que consagra a admissibilidade da liquidação da taxa de justiça em duas prestações é a adequada e a Ordem dos Advogados deve pugnar para que tal normativo se mantenha. 4. A Ordem dos Advogados deve pugnar para que seja inserida uma alteração no Regulamento das Custas Processuais no sentido deste isentar de custas os Advogados, à semelhança do que preconizou para outros agentes judiciários. 5. A Ordem dos Advogados deverá pugnar para que nos próximos anos, atento o contexto de recessão económica, à escala mundial, não haja um aumento do valor das custas judiciais, consolidadas pelo período de duração daquela. Tal medida encontra a sua razão de ser no facto de não ser previsível um aumento dos salários, a breve trecho, e na não menos relevante circunstância de a administração da justiça ser um bem essencial, com assento constitucional. 6. A Ordem dos Advogados deverá pugnar para a taxa de justiça especial para pessoas colectivas comerciais seja abolida. É uma solução inadequada à nossa realidade económicosocial, que já demonstrou não se tratar de uma medida apta a atingir o objectivo do descongestionamento dos tribunais. 7. A Ordem dos Advogados deve empreender todos os esforços no sentido de pugnar para que o sistema judicial se torne, efectivamente, operante e não permitir que o legislador levante obstáculos à boa administração da justiça com base em critérios de racionalidade económica. 8. A Ordem dos Advogados deve pugnar para que seja assegurado o direito fundamental à justiça, não apenas por via do mecanismo do Acesso ao Direito, mas também através de uma adequada regulamentação das Custas Processuais. 9. A Ordem dos Advogados deve pugnar para que se eliminem do RCP os critérios arbitrários na tributação dos processos judiciais, atribuindo-se ao Juiz o poder de influir no custo de um processo, o que contende com os princípios da igualdade e da separação de poderes. Os Advogados, José Rodrigues Lourenço – 2930p Ana Sofia de Sá Pereira – 10933p João Lobo do Amaral – 11371p Largo de São Domingos, 14 – 1º 1169-060 LISBOA-PORTUGAL Tel. +351 21 8823556 | + 351 236 209 650 [email protected] www.oa.pt