Constituição na era positivista:
O
positivismo liberal-individualista
seguintes modelo de Constituição:
inspirou
os
i) Cartas liberais: À Constituição cabia:
a) disciplinar o poder estatal (estabelecer a estrutura
básica do Estado, a espinha dorsal dos poderes e
respectivas competências) e;
b) proclamar a essência dos direitos fundamentais
(direitos de liberdade) dos indivíduos em face ao
Estado, marcada por inteira indiferença pelo
conteúdo das relações sociais daí seu aspecto
“frouxo” – espírito anticoletivista. (BONAVIDES,
14ª ed. p. 229 e ss. ou 13ª ed. p. 204).
03 princípios fundamentais marcam esse período
(CANOTILHO):
a) Subsidiariedade: intervenção estatal somente quando
a sociedade não resolve seus problemas;
b) Estado mínimo: redução ao mínimo possível das
atividades do Estado – enxugamento da máquina pública;
c) Neutralidade: Estado não deve intervir nas relações
econômicas e sociais – segurança jurídica e Império do
laissez faire, laissez passer.
A finalidade da Constituição (telos) é a racionalização e
limitação do poder (SCHIER).
i.1) 1ª fase das cartas liberais:
a) conceito político de Constituição;
b) ênfase nas leis infra-constituicionais;
c) a ideologia da constituição se encontra
nos preâmbulos e nas declarações de
direitos,
entendidos
como
meros
princípios do direito, sem eficácia
vinculante
i.2) 2ª fase: Constituição belga 1832
Consolida-se o conceito jurídico de Constituição,
com a caracterização jurídica dos textos
constitucionais e a transformação dos direitos de
liberdade em direitos positivos e acionáveis
(BONAVIDES, p. 205). Ainda prevalecia o Estado de
direito de feição liberal.
Escolas Positivistas:
A crença na ciência, a fé no progresso e evolução do homem são ícones da
filosofia positivista[1], de modo que é possível enumerar as seguintes
características desta corrente:
•baseia-se no método das ciências naturais e da matemática e considera-se o único
permitido;
•busca a ‘verdade’ existente no objeto, que pode ser a lei (formalismo) ou algo dado na
realidade (realismo);
•opõe-se a qualquer tipo de metafísica ou crença religiosa;
•seu objetivo é desenvolver métodos científicos do conhecimento até a exatidão;
•funda-se na união do princípio empírico com resultados de pesquisa lógica
matemática;
•rejeita toda decisão de valor (p. ex. baseada em ideais de justiça) porque eram tidas
como puramente irracional.
[1]
Cujo grande expoente é Auguste COMTE e sua lei dos três estágios baseada na rejeição (em função do reconhecimento da
impossibilidade de se conhecer o absoluto) da metafísica e da religião enquanto produtoras de conhecimentos e relações invariáveis e
semelhantes, que só poderiam ser obtidas pelo espírito positivo e pelo conhecimento dele advindo. Cf. REALE, Giovane. ANTISERI, Dario.
História da filosofia do romantismo até nossos dias. Vol III. 6ª ed. Trad. n/d. São Paulo: Paulus, 2003., p. 299.
Por tudo isso, no direito, o positivismo pode ser
dividido em duas correntes:
01ª) – as correntes formalistas: norma jurídica é o próprio objeto
dado (fato). Cumpre ao intérprete buscar o seu conceito verdadeiro
através de uma interpretação ‘pura’ que envolva meramente a lógica
dos conceitos e significados da língua, sem nenhum conteúdo de
valor (relativo a justiça da decisão, ética, etc...).
A Escola da Exegese, predominante na França no período imediato
após a promulgação do Código de Napoleão (1804) e Escola da
Jurisprudência dos Conceitos (Alemanha) são exemplos de
correntes formalistas.
Essas duas escolas inauguram a era das grandes codificações, tida
como principal fonte do direito.
Período das Cartas Constitucionais Liberais.
02ª) as correntes positivistas realistas: crítica ao
positivismo jurídico formalista. Substituem a norma pela
realidade ou algum outro dado demonstrável na
realidade, como ‘interesse social’, ‘fato social’ ou ‘espírito
do povo’.
O direito, por conseguinte é reduzido à análise de algum
desses objetos, de modo que aqui é a norma pura que é
considerada abstrata, metafísica, ideal e vazia, sem
conexão da realidade.
Exemplos:
•Escola histórica (1814) de Savigny
•Escola da Jurisprudência dos Interesses (Philip Heck)
•Escola da Teoria do Interesse Social (Roscoe Pound)
•Escola de Uppsala (Alf Ross)
•Escola do Positivismo Sociológico (Duguit).
Normativismo prevaleceu.
Desse modo, o juspositivismo formalista deve
ser pensando a partir de cinco coordenadas
caracterizadoras [1]:
[1]
Conferir: BRONZE, Fernando José. Lições de Introdução ao direito. Coimbra: Coimbra Editora, 2002, ps. 315 e ss.
1ª Coordenada político-institucional:
Positivismo está ligado ao Estado moderno do
contratualismo individualista, ou Estado representativo
demo-liberal de Direito[1] o qual tentou dominar
juridicamente o poder, estruturando-se em três princípios:
a) o princípio da separação dos poderes, b) o da legalidade
e c) o da independência e da função meramente aplicadora
do poder judicial[2].
2ª) Coordenada especificamente jurídica: traduz a
identificação do direito com a lei[3], enquanto expressão da
vontade geral, possuindo as seguintes características:
generalidade, abstração, formalidade e permanência[4].
[1]
Idem, p. 324.
Ibidem.
[3] Ibid., p. 331.
[4] Ibid., ps. 333-334.
[2]
3ª) Coordenada axiológica: abarca os valores
defendidos pelo positivismo: o formalismo revelado na
igualdade perante a lei (decorrente do entendimento de
liberdade como a faculdade de cada um obedecer apenas a
leis gerais, universais, objetivas, pré-determinadas e estáveis)
e a certeza do direito ou segurança jurídica, vista como
garantia ao exercício, em termos previsíveis, da liberdade de
cada um em função da aplicação da lei como o resultado da
racionalidade abstrata e universal dos juristas[1].
4ª) Coordenada funcional, consubstanciada no
contraste entre pensamento jurídico e pensamento político,
uma vez que na teoria juspositivista, em razão do ‘dogma da
onipotência do legislador’, a intenção constitutiva do direito era
atribuição exclusiva do legislativo[2], cabendo ao judiciário
meramente a aplicação da lei
[1]
[2]
Idem, ps. 335-336.
BRONZE, Fernando José. op. cit., p. 337.
5ª)
Coordenada
epistemológicometodológica: Como a lei é escrita,
exige-se que dela se possa extrair uma
verdade única única, justamente porque
ela é tratada como um axioma que
funciona como ponto de partida para a
dedução, num processo silogístico formal.
Metodologia de aplicação do Direito na era dos
Códigos:
-monismo jurídico;
•racionalidade sistemática e teoria do ordenamento jurídico:
dogmas da completude do direito, da certeza das decisões e
segurança jurídica;
•direito reduzido à norma e estudado por uma teoria analítica;
•princípios da hierarquia e coerência (exigência da igualdade
formal);
•procedimento característico é a subsunção;
•pax burguesa: ênfase nos preceitos de liberdade (para contratar,
comercializar) e igualdade (formal) em detrimento da solidariedade.
Três destaques no seio do
positivismo analítico:



KELSEN: sistema dinâmico e
escalonamento hierárquico das regras
jurídicas;
BOBBIO: sistema baseado no princípio da
exclusão de incompatibilidades (unidade,
coerência e completude);
HART: sistema é união de regras primárias
e secundárias (dentre estas: julgamento,
alteração e reconhecimento).
Crise das cartas liberais (Início
séc. XX)
Principais razões:
 a) politização da sociedade;
 b) crescente ênfase no coletivo e social;
 c) florescimento de ideologias socialistas;
 d) antagonismo de posições ideológicas;
 e) reflexo no conteúdo da constituição:
tentativa de reconciliar o estado com a
sociedade, ênfase no social/coletivo em
detrimento ao indivíduo.
iii) Princípios da Constituição no Estado Social
a) princípio do compromisso conformador ou
constitutivo: cabe ao Estado intervir na sociedade
para melhor assegurar as formas de existência social;
b) princípio da democratização da sociedade:
intervenção de caráter econômico para promover a
igualdade material;
c) princípios do Estado de direito formal: função liberal
de racionalização e limitação do poder
telos: conciliar liberalismo econômico com exigências
de sociabilidade e democracia. (SCHIER).
Constituição de Bem-Estar Social








3º fase: Estado de Bem-Estar Social (Keynes):
Seu objetivo é a diminuição das desigualdades através
da realização das promessas da modernidade (dtos
fundamentais e sociais) sem abandonar o modo de
produção capitalista.
Características
- Possui rede de assistência social e regime
previdenciário abragente;
Fortemente interventor na atividade econômica,
Estado “grande” com empresas públicas em diversas
atividades como: aço, petróleo, telecomunicações,
bancos, energia elétrica, etc
- Tem seu auge na Europa entre os anos 60 e 70
– Entra em crise no início dos anos 80, séc. XX. - New
public management (Inglaterra)
Conseqüências:
Programaticidade dissolveu o sentido jurídico da constituição;
•eficácia das normas constitucionais retornaram ao debate;
•queda do grau de normatividade
•constituição se torna preponderantemente política em detrimento ao
aspecto jurídico;
•descrença na força normativa da constituição escrita, rígida, formal, porque
causa da distância com a realidade;
•surgimento de doutrinas que enfatizaram a constituição de fato, real,
material (LASSALE).
Teorias críticas do Direito
Constitucional




A tese de Lassale
Obra: A essência da Constituição – inspiração marxista
i) Concepção de constituição como “lei básica”,
suporte de validade de todas as outras leis e
tipificada pela necessariedade (como um
princípio, deve atuar e irradiar-se através das
leis comuns do país);
ii) idéia de que a lei básica é uma força eficaz
e determinante que atua sobre tudo que nela
se baseia; (LASSALE se preocupa em investigar
q força é essa);
Tese de Lassale



iii) Essa força encontra-se nos fatores reais do
poder, que tem força ativa e eficaz sobre todas
as leis e instituições jurídicas ;
iv)Desse modo, conclui que:
“a verdadeira Constituição de um país somente
tem por base os fatores reais e efetivos do
poder que naquele país vigem e as
constituições escritas não têm valor nem são
duráveis a não ser que exprimam fielmente os
fatores de poder que imperam na realidade
social”. (Cf. LASSALE, Ferdinand. A essência da Constituição. 6 ed. Rio de
Janeiro: Lumen Júris, 2001, p. 40)
Tese de Lassale




v) Conseqüências:
v.1) constituição formal só é vinculante quando
corresponde à real;
v.2) esvaziamento da normatividade
constitucional, porque o que possui força
normativa é a dimensão fática do poder e não
o texto escrito;
v.3) idéia de que os problemas constitucionais
são problemas políticos e não jurídicos
(coordenada funcional positivista)
Constituição do Estado
Democrático de Direito






Síntese das três configurações do Estado Moderno:
Forte atuação do Estado e do Direito na garantia de
direitos da pessoa humana,
distinção entre a esfera privada e a pública, Estado e
sociedade civil;
separação entre poder econômico e político;
dirigismo constitucional e Cartas programáticas, com
imposições de diretrizes normativas – teses
substancialistas (3ª fase)
redução das desigualdades, com a busca da inclusão de
todos os cidadãos nas políticas públicas (3ª fase).
Teoria Pós-positivista da
Constituição



Hesse: o resgate da força normativa da
Constituição
Insurgindo-se contra a tese de LASSALE, Hesse
enumera as seguintes conseqüências da força
determinante das relações fáticas na
normatividade da Constituição:
1º) a coincidência de realidade e norma como
“condição de eficácia da Constituição jurídica”
constitui apenas um limite hipotético extremo”.
HESSE e a força normativa da
Constituição


2º) “Entre a norma fundamentalmente estática e
racional e a realidade fluida e irracional, existe
uma tensão necessária e imanente que não se
deixa eliminar. (...) A idéia de um efeito
determinante e exclusivo da Constituição real
não significa outra coisa senão a negação da
Constituição jurídica.”(ps. 10,11).
3º) a negação da constituição jurídica implica
também a negação do Direito Constitucional e
da própria Teoria Geral do estado.
HESSE e a força normativa da
Constituição


Para não cair nessa insensatez, HESSE
propõe 03 questões fundamentais:
1º) “Existiria, ao lado do poder
determinante das relações fáticas,
expressas pelas forças políticas e sociais,
também uma força determinante do
Direito Constitucional?
HESSE e a força normativa da
Constituição


2º) Qual o fundamento e o alcance dessa
força do Direito Constitucional?
3º) Não seria essa força senão uma ficção
necessária para o constitucionalista, que
tentar criar a suposição de que o direito
domina a vida do Estado, quando, na
realidade, outras forças mostram-se
determinantes?” (ps. 11,12)
HESSE e a força normativa da
Constituição



As respostas a essas questões advém de três pontos
de pontos de partida:
1- a existência de um condicionamento recíproco
entre a Constituição jurídica e a realidade políticosocial:
O significado da ordenação jurídica na realidade e
em face dela somente pode ser apreciado se ambas,
ordenação e realidade, forem consideradas, em seu
inseparável contexto, e no seu condicionamento
recíproco. “ênfase numa ou noutra direção leva
quase inevitavelmente aos extremos de uma norma
despida de qualquer elemento de realidade ou de
uma realidade esvaziada de qualquer elemento
normativo.”
HESSE e a força normativa da
Constituição



Entre esses dois pólos, há um terceiro caminho:
pretensão de eficácia: idéia de que a
constituição tenha uma essência que deseje ser
concretizada na realidade, que deve respeitar as
condições naturais, técnicas, econômicas e sociais,;
Essa “pretensão de eficácia” é elemento autônomo
que vem associado às condições de sua realização e
faz com que a Constituição não seja mera expressão
do SER, mas constitua também um DEVER SER
porque procura imprimir uma ordem e conformação
à realidade política e social. Determinada pela
realidade social e, ao mesmo tempo, determinante
em relação a ela.
HESSE e a força normativa da
Constituição



2º) A consideração, nesse contexto, dos limites
e das possibilidades da atuação da Constituição
jurídica:
Constituição estabelece uma relação de
coordenação com a realidade e, por isso, deve
respeitar a situação histórica concreta e suas
condicionantes para que sua pretensão de
eficácia torne-se realizável.
Através da consciência geral e vontade da
Constituição ela logra converter-se ela
mesma força ativa e, embora não possa
por si só realizar nada, pode impor tarefas.
HESSE e a força normativa da
Constituição


Vontade de Constituição origina-se de três
vertentes diversas:
i) Baseia-se na compreensão da
necessidade e do valor de uma rodem
normativa inquebrantável, que proteja o
Estado contra o arbítrio desmedido e
disforme.
HESSE e a força normativa da
Constituição


ii) Reside igualmente, na compreensão de que
essa ordem constituída é mais do que uma
ordem legitimada pelos fatos (que, por isso,
necessita estar em constante processo de
legitimação);
Iii)Assenta-se também na consciência de que
essa ordem não logra ser eficaz sem o
concurso da vontade humana. Essa ordem
adquire e mantém sua vigência através de atos
de vontade.” (ps. 19, 20).
HESSE e a força normativa da
Constituição


3º) perspectiva: Devem ser investigados os
pressupostos de eficácia da Constituição:
i) quanto mais o conteúdo de uma Constituição
lograr corresponder à natureza singular do
presente, incorporando seu estado espiritual,
maior será o desenvolvimento de sua força
normativa, sendo igualmente importante que a
Constituição possa adaptar-se a mudanças das
condicionantes fáticas, devendo limitar-se a
poucos princípio fundamentais e não se
apoiando numa estrutura unilateral,
incorporando também estruturas contrárias e;
HESSE e a força normativa da
Constituição


ii) O desenvolvimento ótimo da sua força
normativa depende de uma práxis, entendida
como vontade de Constituição compartilhada por
todos os partícipes da vida constitucional.
Essa práxis implica sacrifícios para que haja o
respeito à Constituição e impõe que sejam
repelidos impulsos de reforma constitucional
fácil, ainda que momentaneamente mais
cômodas.
HESSE e a força normativa da
Constituição



iii) Também a interpretação contribui decisivamente
na consolidação da força normativa da constituição
à medida que deve adequar o sentido da proposição
normativa dentro das condições reais dominantes
numa determinada situação.
Ademais, é importante que ela mude quando haja
mudança nas relações fáticas (idéia de mutação
constitucional), respeitando, todavia, os limites
estabelecidos pela proposição jurídica.
Assim, somente quando o sentido de uma
proposição normativa não pode mais ser realizado, é
que se torna inevitável a revisão constitucional.(p.
23).
HESSE e a força normativa da
Constituição



Conclusões:
i) 1) a Constituição jurídica está condicionada
pela realidade histórica mas não configura
apenas a expressão de uma dada realidade.
“Graças ao elemento normativo, ela ordena e
conforma a realidade política e social” (p.24).
Sua força normativa tem por limites e
possibilidades o resultado da correlação entre
SER e DEVER SER;
HESSE e a força normativa da
Constituição



Conclusões:
ii) A intensidade de sua força será maior quanto
maior for a vontade de Constituição.
Todavia nenhuma vontade de constituição é
capaz de alterar as condicionantes naturais, o
que faz com que a força normativa dependa de
como a Constituição se conforme com esses
limites;
HESSE e a força normativa da
Constituição




Conclusões:
iii) Constituição não pode ser considerada
a parte mais fraca quando em confronto
com a Constituição Real.
No entanto, o direito constitucional deve
observar seus limites e possibilidades;
iv) Os princípios basilares da Lei
Fundamental não podem ser alterados
mediante revisão constitucional;
HESSE e a força normativa da
Constituição


V) A vontade de Constituição é
fundamental e decisiva para a práxis
constitucional.
Conferir a tese de HÄBERLE – sociedade
aberta aos intérpretes da constituição.
A superação do Positivismo pelo
Neconstitucionalismo



Alexy:
Caso Luth: Tribunal Constitucional Alemão
reconhece três idéias que moldam o
direito constitucional:
i) A garantia constitucional dos direitos
individuais não se restringe à aplicação
dos direitos defensivos clássicos. Ela
engloba uma ordem objetiva de valores;
A superação do Positivismo pelo
Constitucionalismo


ii) os valores (ou princípios) encontrados
nos direitos constitucionais se aplicam em
“todas as áreas do direito”, produzindo um
efeito radiante sobre todo o sistema legal;
iii) Princípios tendem à colisão. As colisões
se resolvem pela ponderação (balancing).
Neoconstitucionalismo



Figueroa:
Observa a passagem do Estado de Direito para o
Estado Constitucional, onde a Constituição tem o
papel de condicionar intensamente o discurso
filosófico jurídico, a ponto de fundar uma nova
teoria do direito, fundada no ‘paradigma do
constitucionalismo’ (160) e, entre outras coisas,
desfigurando a contraposição entre
jusnaturalismo e juspositivismo (161).
Essa nova teoria depende do processo de
constitucionalização.
Neoconstitucionalismo

Essa nova concepção ainda se revela em teorias
diversas, mas que convergem numa nova
atitude frente ao direito, que muitas vezes
resvalam para um certo neorrealismo ou um
certo neojusnaturalismo, à medida que, partem
de uma tese metateórica fundamental, que tem
impacto principalmente na cultura legicêntrica
de países continentais: se o sistema jurídico está
constitucionalizado, então é inviável uma
concepção positivista estrita do Direito (162).
Constitucionalização



FIGUEROA define constitucionalização como “o
processo e o resultado da transformação do
Direito causada pela Constituição”, gerando um
sistema constitucionalizado, o qual na
perspectiva de Ricardo Guastini possui as
seguintes características (163):
i) a presença de uma Constituição rígida, escrita
e resistente frente à legislação ordinária (163);
ii) garantia jurisdicional da Constituição, através
de alguma forma de controle de
constitucionalidade (163);
Constitucionalização



iii) Força vinculante e normativa da
Constituição (163)
iv) Sobreinterpretação da Constituição,
através de argumentos a simili, a analogia
e a invocação de princípios constitucionais
(163);
v) aplicação direta da Constituição, que
passa a regular todas as relações sociais
(164);
Constitucionalização


vi) interpretação das leis conforme a
Constituição – Controle de constitucionalidade
admite uma saída intermediária, como nas
sentenças interpretativas ou manipulativas
(164);
vii) influência da Constituição nas relações
políticas, onde, através dos princípios
constitucionais intervém na argumentação
política e nas relações entre os poderes e
permitem a análise das razões políticas
subjacentes às normas jurídicas (164).


Definição de
Neoconstitucionalismo
(Figueroa)
(neo)constitucionalismo “como a teoria ou conjunto
de teorias que têm proporcionado uma cobertura
justeórica conceitual e/ou normativa à
constitucionalização do direito em termos não
positivistas” (164-5), possuindo alguns aspectos
implícitos:
material: consiste na recepção pelo Direito e pelo
sistema jurídico de uma forte carga axiológica
através de uma moral crítica na forma dos direitos
fundamentais. O constitucionalismo deixar de ser
uma ideologia e se transforma numa teoria do direito
(165);
Neoconstitucionalismo


estrutural: está relacionado com a estrutura da norma
constitucional, à medida que a estrutura dos princípios
permitem expandir seu âmbito de influência através de
um ‘efeito de irradiação’, que revela a onipresença da
Constituição e possibilita a sobreinterpretação (165);
funcional: se expressa através do tipo de argumentação
que as normas constitucionais fomentam. Daí o Direito
passa a ser aplicado pela ‘ponderação’, exigindo, assim,
um raciocínio jurídico complexo, num esquema diferente
do subsuntivo porque demanda uma teoria da
argumentação jurídica que torne possível a
concretização de princípios (166); Se adotada a tese do
caso especial de ALEXY, a teoria do Direito tende a
converter-se em uma parte especial da teoria geral da
argumentação prática (167);
Neoconstitucionalismo


político: o conjunto dos três aspectos que
concernem ao sistema jurídico
constitucionalizado trazem conseqüências
importantes para a relação de forças entre os
poderes do Estado, à medida que, em
detrimento do Legislativo, o Judiciário ganha
força, a tal ponto de se falar em uma
‘onipresença dos tribunais’ (167).
Muitos criticam essa transferência de poder por
considerá-la uma afronta ao princípio
democrático, em especial devido à natureza
bifronte dos princípios
A emergência do
neoconstitucionalismo


A crise no paradigma liberal-individualista e da
filosofia da consciência leva à construção de um
modelo constitucional de direito, com garantia
de direitos fundamentais e sociais, aliada a
novas perspectivas metodológicas de aplicação
judicial: a hermenêutica construtivista e a teoria
da argumentação.
Foi necessário reconstruir a teoria da norma, do
ordenamento e superar categorias do
positivismo jurídico.
A Constituição como sistema

A partir da tese de K. HESSE para superar a
crítica de LASSALE, surge a necessidade de
superar as noções de Constituição Formal e
Material, em prol da de sistema constitucional.
De acordo com Schier:“...a compreensão do

[1] SCHIER, Paulo Ricardo. Filtragem constitucional. p. 87.

fenômeno constitucional, hoje, está a exigir a
leitura da Constituição enquanto norma e, ainda,
enquanto sistema possibilitador de diálogos
entre a sua realidade jurídica e material (real e
histórica).”[1]
CANARIS: o sistema aberto de
princípios


i) Idéia geral:
percepção da unidade interna e da adequação
da ordem jurídica se dá através dos “princípios
gerais do direito” enquanto elementos
constitutivos do sistema jurídico[1], donde a
“definição de sistema como uma ordem
teleológica de princípios gerais do Direito.”[2]


[1] CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do direito.
Lisboa: Calouste Gulbekian, p. 76.
[2] Id. p. 103.
CANARIS: o sistema aberto de
princípios






Esses “princípios gerais do Direito” desempenham
sua função na sua formação do sistema, através de
quatro características que são praticamente
autoexplicativas:
i) podem entrar em contradição
ii) não tem pretensão de exclusividade
iii) ostentam sentido próprio apenas numa
combinação de complementação e restrição
recíprocas
iv) precisam, para sua realização de sub-princípios e
valores singulares, com conteúdo material próprio.
[1] CANARIS, Claus-Wilhelm, op cit. p. 88.
CANARIS: o sistema aberto de
princípios

Com essas quatro características, CANARIS
elimina a compatibilidade de seu modelo
sistêmico com o de cunho axiomático-dedutivo,
e mostra que, no momento da ‘normatização’
desses princípios é necessário a sua combinação
com valores autônomos, dotados de conteúdo
material, compatíveis com o ramo do direito a
que se refere e com a situação do caso
concreto, a fim de que possa ser preenchido o
requisito da adequação valorativa.
CANARIS: o sistema aberto de
princípios



O sistema jurídico é aberto, onde se faz necessário
diferenciar entre o:
‘sistema científico’, em que a abertura é entendida como
“incompleitude e provisoriedade do próprio
conhecimento ciêntífico”, uma vez que o cientista deve
estar preparado para promover aperfeiçoamentos em
suas bases cognitivas, de modo que, esse sistema se
constitui um projeto “que apenas exprime o estado dos
conhecimentos do seu tempo”, não podendo ser
“fechado nem definitivo”, e o
‘sistema objetivo’, onde a ordem jurídica encontra
assento na idéia de codificação, cujo caráter dinâmico se
revela pela introdução de novos elementos e pela
modificação legislativa.
Sistema constitucional de
princípios e regras




O sistema jurídico-constitucional é assim definido por
CANOTILHO:
“(1) é um sistema jurídico porque é um sistema dinâmico
de normas;
(2) é um sistema aberto porque tem um estrutura
dialógica (Caliess), traduzida na disponibilidade e
<<capacidade de aprendizagem>> das normas
constitucionais para captarem a mudança da realidade e
estarem abertas às concepções cambiantes da <<verdade>>
e da <<justiça>>;
(3) é um sistema normativo, porque a estruturação das
diferentes expectativas referentes a valores, programas,
funções e pessoas, é feita através de normas; (4) é um
sistema de regras e princípios, pois as normas do sistema
tanto podem revelar-se sob a forma de princípios como sob
a forma de regras.”[1]
[1] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2004, p. 1159.
Sistema constitucional de
princípios e regras




O sistema jurídico-constitucional é assim definido por
CANOTILHO:
“(1) é um sistema jurídico porque é um sistema dinâmico
de normas;
(2) é um sistema aberto porque tem um estrutura
dialógica (Caliess), traduzida na disponibilidade e
<<capacidade de aprendizagem>> das normas
constitucionais para captarem a mudança da realidade e
estarem abertas às concepções cambiantes da <<verdade>>
e da <<justiça>>;
(3) é um sistema normativo, porque a estruturação das
diferentes expectativas referentes a valores, programas,
funções e pessoas, é feita através de normas; (4) é um
sistema de regras e princípios, pois as normas do sistema
tanto podem revelar-se sob a forma de princípios como sob
a forma de regras.”[1]
[1] CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7ª ed. Coimbra: Almedina, 2004, p. 1159.
Daí seguem-se algumas conclusões:
i)Há uma lógica coordenada pelo núcleo constitucional que vai
irradiar numa unidade sistematizada entre as diversas
disciplinas jurídicas, sem prejuízo de uma comunicação entre
elas;
ii)Todos os ramos do direito devem ser lidos a partir deste
núcleo constitucional (requisito da unidade), que mantém a
ligação coerente e organizada entre seus princípios e regras
(requisito da ordem);
iii)O direito pode ser caracterizado como um sistema composto
de normas jurídicas as quais se subdividem em princípios e
regras. Os princípios e regras constitucionais estão no lugar
mais alto da hierarquia normativa, irradiando a luz que dá
validade às normas infraconstitucionais.
Penal
Tributário
Normas Constitucionais
Princípios ou Regras
Civil
Direito do Trabalho
Existe uma interligação entre cada área do direito entre si e
também com as normas constitucionais.
Esboço do modelo de sistema no direito em forma de farol
Normas Constitucionais
Princípios e Regras
Princípio é mais
geral. Expressa a
ideologia do
sistema
constitucional.
- Explícito ou
implícito
- Positivado ou
não
Irradia para
cada ramo do
direito,
criando para
cada vertente
subprincípios
específicos.
Regra é mais
específica e
restrita
para cada
disciplina.
Princípios
Regras
DIREITO
CIVIL
DIREITO
PROCESSUAL
DIREITO
TRIBUTÁRIO
DIREITO
PENAL
Características do sistema direito:
Autonomia operativa: expressa a idéia de fechamento
e logicidade internas, qualidades que o diferencia dos
demais subsistemas sociais. Exprime também a idéia
de uma estrutura que possui unidade, ordem e
hierarquização entre seus elementos.
Abertura axiológica: ocorre com a atualização
legislativa e quando, ao determinar a norma aplicável
ao caso concreto, o aplicador busca compatibilizar
dialeticamente as normas em abstrato (dever ser)
com os valores ideológicos da sociedade em relação
ao fato (ser).
Abertura hermenêutica: ocorre sempre na
aplicação do direito:
1) na compreensão do caso concreto e na
determinação da norma válida em abstrato;
2) na adequação ao caso concreto à medida
que o intérprete “ao dizer o direito o faz a partir
da sua visão do mundo, crenças e valores”, os
quais formam o seu universo de précompreensão da norma.
Papel da tópica:
1) auxilia na eliminação de lacunas;
2) solução de antinomias aparentes;
3) complementação legislativa e
4) contribui para uma aplicação dialética do direito, pois não
permite a desvinculação ao problema, o que gera um diálogo
incessante entre o SER (fato) e o DEVER SER (norma).
Portanto, a tópica exerce um papel fundamental/necessário à
aplicação do direito.
OBS: A idéia de sistema é útil como instrumento para o direito,
de modo que não cabe dizer que o direito é um sistema, mas
sim que ele se realiza através dele.
Elementos de Hermenêutica
Constitucional Principiológica



Definição hermenêutica de norma jurídica:
É o resultado do processo compreensivo de um texto
jurídico, isto é, ela é o sentido extraído de uma
proposição ou enunciado lingüístico que proíbe, permite
ou incentiva uma conduta, atuando como uma ordem
imposta à observância de todos.
Por isso ela se constitui no comando que surge da
projeção interpretativa de uma estrutura proposicional
(fato alográfico) que só adquire sentido após a
interpretação, podendo apresentar características de um
princípio ou regra.
Princípios X Regras



Diferenciações gerais entre Princípios e Regras
Assim, princípios e regras são normas jurídicas cogentes
extraídas dos textos jurídicos, sendo que, entre essas
duas espécies de normas é possível estabelecer as
seguintes distinções, baseadas nas teses de ALEXY e
DWORKIN, no Brasil compartilhadas, entre outros, por
GRAU e BONAVIDES:
01) princípios são entendidos como “mandamentos
nucleares de um sistema” que se irradiam sobre as
demais normas, determinando sua elaboração e sua
interpretação, que deve obedecer aos valores e as
finalidades contidas nos princípios. Por isso, eles
possuem maior carga axiológica, maior grau de
abstração e generalidade que as regras;
Princípios X Regras


02)regras não permitem contradição (princípio da
exclusão de antinomias), prevalecento a lógica do tudo
ou nada na sua aplicação (ou uma regra é válida, ou não
está no sistema); já os princípios coexistem, mesmo que
contraditórios;
03) aplicação das regras se dá por enquadramento do
fato ao texto normativo; já os princípios necessitam de
concretização (atribuição de significado ao fato e ao
texto normativo para contextualizar os componentes
fáticos e textuais) através da ponderação (avaliação com
bom senso a partir do caso concreto);
Princípios X Regras


04) princípios são fontes de regras, daí que a
eles se atribui maior importância hierárquica, já
as regras funcionam como verdadeiros ‘critérios’
que orientam o cidadão no seu agir social e o
juiz em sua atividade judicante para que os
valores protegidos nos princípios gerais da
ordem constitucional sejam aplicados.
OBS> Os princípios e regras podem ser
extraídos de diversos tipos de textos legislativos,
tais como, Constituição (Lei Fundamental), Lei
Complementar, Lei Ordinária, Decreto-Lei,
Decreto Regulamentar, etc...
Tipos de Neoconstitucionalismo
(Figueroa)


O autor divide o constitucionalismo em três
formas fundamentais:
constitucionalismo (contra o positivismo)
teórico (CT): possui a tese central de que a
constitucionalização dos sistemas jurídicos
torna insustentável a infalibilidade técnica do
direito e da aplicação subsuntiva, bem como
mostra a insuficiência do modelo de regras,
tornando inviável o positivismo teórico (171);
Neoconstitucionalismo

constitucionalismo (contra o positivismo)
ideológico: exclui o dever de obediência do
Direito do legislador que não esteja de
acordo com a Constituição. Apesar de certas
ambigüidades nas posturas teóricas sobre
essa forma de constitucionalismo, Figueroa
entende que a interpretação mais plausível
funda uma obediência prima facie do Direito,
a qual é debilitada, imperfeita, limitada
alinhada com os delineamentos da ética
comunicativa (172);
Neoconstitucionalismo

constitucionalismo (contra o positivismo)
metodológico: tem por tese central a idéia
de que “a constitucionalização do sistema
jurídico demonstra a existência de uma
relação conceitual necessária entre Direito
e moral” (172), invalidando o positivismo
metodológico.
Neoconstitucionalismo


O autor conclui que o êxito do novo paradigma
constitucionalista se explica por sua
oportunidade frente às novas circunstâncias
jurídicas, históricas e sócio-políticas (181). Isso
porque:
i) Do ponto de vista jurídico, oferece uma
cobertura mais ampla dos traços próprios dos
sistemas constitucionalistas, uma vez que
engloba o aspecto material, estrutural e
funcional (181);
Neoconstitucionalismo


ii) Do ponto de vista histórico: a força reativa do
argumento de princípios associado ao constitucionalismo
(possui virtualidade maximalista – pretende expandir e
otimizar o ordenamento em virtude de um ideal,
garantindo um mínimo) é superior ao argumento da
injustiça (virtualidade minimalista – só atua frente à
situações de convulsão social, reduzindo o ordenamento
jurídico mediante a expulsão de normas extremamente
injustas - 181);
iii) Do ponto de vista sócio-político: constitucionalismo
responde melhor às necessidades de uma sociedade
política e culturalmente plurais (181-2).
Neoconstitucionalismo



Figueroa pontua, ainda, que a nova concepção de direito
não deve se basear apenas na descrição de um sistema
jurídico particular – teorias particulares do direito – mas
deve se impor progressivamente – no sentido da
constitucionalizabilidade – de modo a confirmar que, ao
menos em disposição, todo sistema jurídico tende à
constitucionalização (182).
Para demonstrar esse vínculo, dois passos podem
contribuir:
i) a negação de uma fronteira nítida entre Direito real e
social (moral social e moral crítica). Esse pressuposto se
encontra na própria ética habermasiana do discurso,
onde há a renúncia de diferenciação categorial entre o
reino da inteligibilidade e o reino fenomênico. Daí a
distinção entre Direito real e ideal se torna gradual e não
qualitativa (182);
Neoconstitucionalismo

ii) o entendimento dos princípios como
elementos que podem possibilitar que o Direito
real dirija-se ao ideal, vez que muitos deles
invocam um ideal que pode ser mais ou menos
otimizado argumentativamente (183). Essa
postura implica também numa revisão da teoria
positivista do direito, em especial na separação
entre validade das normas e sua aplicação.
Assim, “o estudo do Direito desde o lado ativo,
supõe que a teoria do Direito deve cobrir de
alguma forma as questões acerca da
aplicabilidade das normas e não somente a
questão da validade como pertença” (183).
Neoconstitucionalismo

No entanto, o autor termina dizendo que
esse câmbio de atitude não implica uma
renúncia absoluta dos postulados do
positivismo, até porque parece não ser
possível pensar uma teoria do Direito que
não seja em alguma medida positivista.
Contudo, seu progresso implica enfrentar
as novas necessidades jusfilosóficas (186).
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MODERNIDADE TARDIA NO BRASIL – cap. 1 Lenio Streck