Projeto de Educação Financeira de Adultos Foco: Mulheres beneficiárias do Programa Bolsa Família Relatório Parcial A AEF-Brasil é uma entidade da sociedade civil que promove e executa ações transversais da Estratégia Nacional de Educação Financeira - ENEF. Por meio do convênio firmado com o Comitê Nacional de Educação Financeira - CONEF, coordena, entre outros, o Programa Educação Financeira para Adultos. Este Programa busca desenvolver tecnologias sociais de Educação Financeira para Aposentados, é composto de 05 Ciclos - detalhados neste documento- desenvolvidos ao longo de 02 anos, até ser concluído e disponibilizado à sociedade. O presente relatório compartilha premissas técnicas deste programa e os resultados parciais das aprendizagens adquiridas até (dizer data), referentes ao Ciclo 1 que já foi concluído e a primeira etapa de pesquisa de campo do Ciclo 2. Estas informações são compartilhadas para fins de transparência e sistematização, entretanto, estas não devem ser consideradas informações conclusivas já que deverão ser revisadas na avaliação, prevista para ser realizada nos ciclos 4 e 5 deste programa. 1. O que é o projeto? Qual o objetivo? O projeto compartilhado neste relatório é uma iniciativa da Estratégia Nacional da Educação Financeira (ENEF), coordenado pela Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF-Brasil). Este projeto faz parte dos esforços do Programa de Educação Financeira para Adultos, que visa promover informação, formação e orientação para a população adulta, a fim de que os brasileiros e as brasileiras possam tomar decisões financeiras mais autônomas e conscientes. O objetivo do projeto é desenvolver uma tecnologia social de educação financeira voltada para as mulheres beneficiárias do Programa Bolsa Família (PBF). Segundo a Fundação Banco do Brasil, o termo tecnologia social compreende: produtos, técnicas ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade e que representem efetivas soluções de transformação social1. As tecnologias sociais já nascem com a intenção de serem facilmente reaplicáveis, a baixo custo, a fim de gerarem um impacto social em escala. Da mesma forma, este projeto já surge com o objetivo de ser um laboratório para o desenvolvimento de soluções de educação financeira aderentes à realidade das beneficiárias do PBF, efetivas, humanizadas, empoderadoras, transformadoras e escaláveis. A fim de criar condições para a escalabilidade, assegurar a viabilidade da tecnologia social e sua fácil incorporação ao PBF, desde o início, o projeto com foco nas mulheres 1 Fonte: http://www.fbb.org.br/tecnologiasocial/o-que-e/tecnologia-social 1 beneficiárias, conta com a parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social, especialmente com a Secretaria que coordena o PBF e as Diretorias envolvidas no repasse do benefício. Também é importante destacar o objetivo específico do projeto, do qual deriva o enfoque de conteúdo da tecnologia social a ser desenvolvida. Como se sabe, o termo educação financeira é um guarda-chuva que engloba inúmeros conceitos, competências, conteúdos e temas. No caso das mulheres beneficiárias do PBF, após estudos de pesquisas realizadas diretamente com as beneficiárias, notou-se que o principal desafio é a gestão do orçamento familiar. Portanto, o objetivo da tecnologia social é contribuir para o aperfeiçoamento da gestão do orçamento familiar, de modo que esta mulher consiga se planejar e se organizar para satisfazer as necessidades e planos seus e da sua família, no curto, médio e longo prazo. 2. Por que o foco nas beneficiárias do Programa Bolsa Família? Além de ser uma população vulnerável econômica e socialmente, a escolha de focar nas mulheres beneficiárias do PBF decorreu da compreensão de que contribuir para que essas mulheres consigam lidar, gerenciar e planejar o recurso que recebem e suas outras fontes de renda é essencial para que elas consigam superar a situação de pobreza ou extrema pobreza, que é o objetivo maior do PBF. De acordo com dados do MDS, atualmente, são mais de 14 milhões de beneficiários, sendo 94% mulheres. Em média, cada um dos beneficiários tem uma família de 04 pessoas, o que soma aproximadamente 56 milhões de pessoas beneficiadas pelo PBF. Pesquisas do próprio MDS, revelam que 42% dessas mulheres são chefes de família e responsáveis pela decisões financeiras. Logo, revela-se a importância da mulher na gestão dos recursos da família. Em relação à educação financeira, um dos desafios identificados é que a maioria das mulheres beneficiárias não conseguem se planejar, seja para o médio e longo prazo, e, nem poupar para emergências ou para a realização de sonhos. Dados coletados pelo MDS mostram que: 71% das mulheres relatam que no fim do mês não sobra nenhum dinheiro; no caso daquelas que terminam um mês com algum dinheiro, aproximadamente 16% gasta esta sobra com consume (roupas, comidas, etc.); apenas 14% guarda para despesas que surgirão no curto prazo. A falta de planejamento e reservas as torna extremamente vulneráveis, pois, além da maioria ter uma renda volátil, qualquer imprevisto (ex.: necessidade de remédio, geladeira parou de funcionar, etc.) torna necessário a busca por um crédito, empréstimo, o que as leva para um emaranhado de compromissos financeiros complicado de se lidar e resolver. Neste contexto, a ENEF considerou que focalizar a intervenção nesta população é extremamente relevante e pode trazer uma grande contribuição para a melhoria das condições de vida desta população. 3. Qual a estrutura e método de trabalho? Em busca de desenvolver soluções efetivas, aderentes à realidade das pessoas, as quais tenham potencial de mudar comportamentos financeiros e serem facilmente reaplicáveis, novas abordagens metodológicas se fizeram necessárias para lidar com 2 toda a complexidade envolvida no projeto. Por se tratar de uma população adulta, heterogênea e não institucionalizada, há um grande desafio em termos de fazer a tecnologia social de educação financeira chegar até as mulheres e ser incorporada em suas vidas. Primeiro, devemos considerar que o processo de aprendizagem de adultos é diferente do de crianças e adolescentes. Muitas crenças e ideias já estão cristalizadas, de forma que requerem um maior aprofundamento sobre a temática de hábitos e de tomada de decisão de adultos. Segundo, há um desafio de diferenças regionais, uma vez que o contexto da beneficiária carioca é totalmente diferente daquela que vive em uma comunidade ribeirinha, que é distinto daquela que mora no sertão do Nordeste. Por fim, o fato das beneficiárias não frequentarem uma instituição – como as crianças vão à escola – e terem uma rotina voltada para resolver as urgências da família e/ou trabalhar, tornase um desafio reunir essas mulheres e criar um processo educacional sistemático. Dada toda esta complexidade, optou-se por adotar no projeto uma combinação das seguintes áreas de conhecimento: 1. Design de serviços: é uma abordagem transdisciplinar que integra uma série de ferramentas e métodos com o intuito de desenvolver serviços ou experiências centradas no ser humano, que contribuam para seu bem-estar ou melhorem sua vida de alguma forma. 2. Ciências comportamentais: é um campo de conhecimento que visa observar cientificamente e compreender o comportamento humano e os processo de tomada de decisão. Engloba a psicologia, neurociência, economia, etc. Em especial, no que diz respeito à educação financeira, a psicologia econômica trás uma série de descobertas e referencias sobre como estimular mudanças comportamentais em relação ao dinheiro. 3. Administração pública: campo de conhecimento que visa compreender e identificar caminhos de intervenção no processo de formulação de políticas públicas e de organização do Estado – em seus programas, políticas e serviços. A estrutura do projeto está baseada na abordagem metodológica do design thinking – que se utiliza do modelo mental dos designers para gerar inovações sociais - que se baseia nos seguintes princípios: 1. Foco no ser humano: como ponto de partida para a solução está a compreensão da pessoa a quem se quer beneficiar. 2. Colaboração: compreensão e integração dos diversos agentes envolvidos no desafio. 3. Experimentação: criar protótipos para testar e refinar as ideias, abrindo espaço para erra rápido e barato e ter maior probabilidade de efetividade das soluções finais. Com base nisso, o projeto foi estruturado por ciclos, conforme detalhado abaixo: 3 Ciclo 1 - Compreensão: imersão no contexto das mulheres beneficiárias e das pesquisas e documentos do PBF, a fim de entender o funcionamento do programa e os padrões de comportamento financeiro das beneficiárias. Abrangeu 4 meses de pesquisa de campo, em profundidade, com mais de 80 mulheres, em 14 municípios brasileiros, contemplando as regiões Norte, Nordeste e Sudeste, zona urbana, rural e comunidades ribeirinhas. Ciclo 2 - Definição e Experimentação: com base nos achados do Ciclo 1, no Ciclo 2, são geradas ideias de caminhos para contribuir para o aperfeiçoamento da gestão do orçamento familiar. Com base em critérios de viabilidade, são escolhidas ideias que se tornarão protótipos - isto é, amostras iniciais do que pode vir a ser a tecnologias social, que já trazem uma demonstração do conteúdo, linguagem, formato, etc. e servem para experimentar e obter evidências do potencial e aderência daquele instrumento. Durante este Ciclo, ocorrem 3 rodadas de prototipagem, a cada rodada os protótipos são refinados, excluídos ou incorporados, até que se chegue na definição da tecnologia social. Durante as experimentações, 1.500 mulheres participarão da prototipagem, com o intuito de propiciar evidências sobre os elementos que funcionam e devem constar numa tecnologia social e daqueles que devem ser repensados. Ciclo 3 - Sistematização: ao fim das rodadas de teste (ciclo 2), a tecnologia social resultante será sistematizada e será disponibilizada em formatos que facilitem a disseminação e adoção por organizações governamentais ou não governamentais. Ciclos 4 e 5 - Aplicação em maior escala, avaliação e revisão da tecnologia social: para que a reaplicação e a incorporação da tecnologia social à programas e políticas já existentes ocorra de forma mais fundamentada, será realizado um piloto envolvendo 1500 mulheres em grupo de tratamento e 1500 mulheres num grupo de controle. A tecnologia social será aplicada por agentes locais, os quais anteriormente serão selecionados e preparados para atuarem como aplicadores e multiplicadores das metodologias de educação financeira, na ponta. Em seguida da capacitação dos agentes locais, serão formados os grupos de tratamento e controle, os quais passarão por uma primeira avaliação que coletará dados sobre o nível de conhecimento de temas relacionados à educação financeira e sobre alguns comportamentos financeiros específicos. Após 6 meses, uma nova avaliação será conduzida buscando as diferenças entre o grupo que teve acesso a tecnologia social e o grupo que não usou os materiais. Com base nesses resultados, a tecnologia social e as estratégias de disseminação da mesma serão revisadas. 4. Qual o status do projeto? No momento, o projeto encontra-se no Ciclo 2, tendo encerrado a primeira rodada de prototipagem. Mais de 500 mulheres beneficiárias do PBF participaram dos testes dos protótipos, gerando inúmeras descobertas e evidências que direcionarão o trabalho nas próximas rodadas de prototipagem. 5. Até o momento, quais os principais aprendizados? 4 Primeiro, existe uma grande de distância entre o que as mulheres consideram importante e seu comportamento diário. Por exemplo, muitas entendem a importância de guardar dinheiro para imprevistos, mas, as urgências do dia a dia as consomem e a formação de reservas para imprevistos ou sonhos não ocorre. Essa distância entre conhecimento ou informação e comportamento ou ação varia de acordo com a situação de vida da mulher e características atitudinais dela. Por exemplo, aquelas mulheres que conseguem reconhecer, visualizar e verbalizar seus sonhos, tendem a ter maior motivação para a gestão e o planejamento de seus recursos, em relação àquelas que acreditam que sua vida não tem futuro. Além do sonho, o quanto aquela mulher está em movimento, agindo e buscando, acaba influenciando sua relação com o dinheiro. Quanto mais inerte, mais dificuldade de se empoderar e se instrumentalizar para tomar decisões financeiras mais conscientes e responsáveis. Independentemente de quanto sonhem e se movimentem, pelo fato da maioria dessas mulheres terem muitas preocupações e questões imediatas a serem resolvidas, pouco tempo e baixa escolaridade, é importante abordar a educação financeira de forma lúdica, a partir de situações concretas, evitando conceitos e abstrações (por exemplo, porcentagem), em linguagem simples e acessível e reduzindo ao máximo o conteúdo escrito. Para que o conhecimento possa se traduzir em ação, junto do processo educacional é preciso propor e oferecer instrumentos intuitivos, de uso simples, que possam ser facilmente aplicados no dia a dia. Quanto maior o envolvimento das famílias nos objetivos financeiros, mais fácil se torna o controle dos recursos e a ponderação dos gastos. Os filhos e o marido (companheiro) são canais importantíssimos para auxiliar a mulher no processo de gerir e planejar as finanças do lar. Além da família, os lembretes em suas formas mais variadas (seja por mensagens de celular seja por ímã de geladeira) são fundamentais para sustentar o processo de mudança de hábito. Percebe-se uma grande dificuldade das mulheres em relação ao relacionamento com os bancos e seus produtos. Embora muitas tenham conta poupança – que é por onde recebem o benefício – a maioria não se considera usuária de serviços financeiros e possui dificuldade de entender os conceitos, procedimentos e direitos. Talvez um dos principais pontos de alavancagem para a gestão do orçamento familiar, seja apoiar as mulheres do PBF a criarem reservas para emergências. Isso evitaria que elas tivessem que recorrer a formas mais caras de obter dinheiro, no caso de um imprevisto. Ademais, uma reserva contribui para reduzir o estresse e ajuda a mulher 5 a tirar de foco apenas o curtíssimo prazo e se concentrar em planejar um pouco mais a frente. Esses são apenas alguns dos inúmeros aprendizados sobre as beneficiárias do PBF e seu comportamento financeiro. São essas descobertas e as interações com as mulheres e agentes locais que possibilitarão o desenvolvimento de uma tecnologia social de gestão do orçamento familiar que tenha sentido e contribua efetivamente para a vida das beneficiárias e das famílias do PBF. Iniciativa: Coordenação: Patrocínio: Colaboração: 6