A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA NO
TRIBUNAL DO JÚRI 1
Bruna Eitelwein Leite 2
RESUMO
A monografia trata da possível influência que a mídia exerce sobre os jurados
que compõem o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri. A pesquisa realizada
com os jurados do Tribunal do Júri da Comarca de Tenente Portela – RS, acerca da
existência de influência midiática, é o cerne do trabalho. Aborda-se a sistemática do
Tribunal do Júri, a sua história, a função de seus membros, bem como o respeito
que este tem pelo princípio da presunção de inocência. Ademais, disserta sobre a
mídia, a liberdade de imprensa que, quando exercida de forma ilimitada, ocasiona o
desrespeito ao princípio da presunção de inocência e de inúmeras garantias
constitucionais do réu, acarretando o conflito entre direitos fundamentais. Além
disso, em razão de sua liberdade, os meios de comunicação podem manipular as
opiniões do público sobre os fatos publicados, uma vez que utilizam o
sensacionalismo como forma de chamar atenção para a notícia, além de existir
interesse notório por publicações relacionadas a crimes, o que colabora para o
tratamento do crime como forma de espetáculo e acarreta na execração pública do
suposto autor do crime. Conclui que no conflito entre a liberdade de imprensa e os
direitos fundamentais do suspeito/réu aquela deve ceder em razão destes para que
se tenha um julgamento justo, livre de influências midiáticas, que demonstre a livre
convicção dos jurados.
Palavras-chave: Tribunal do Júri. Jurados. Presunção de Inocência.
Liberdade de Imprensa. Influência Exercida pelos Meios de Comunicação. Colisão
entre Direitos Fundamentais.
1
2
Artigo extraído do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial para
obtenção do grau de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul, aprovado, com grau máximo, pela banca examinadora,
composta pelos professores Vitor Antônio Guazzelli Peruchin (orientador), Marcelo Caetano
Guazzelli Peruchin e Marcus Vinicius Boschi, em 10 de junho de 2011.
Acadêmica de Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul. E-mail: [email protected]
INTRODUÇÃO
Vivencia-se em quase todas as residências brasileiras a presença dos meios
de comunicação; os brasileiros, de uma forma ou outra, recebem informações, as
mais variadas, sobre tudo o que acontece no país e no mundo. No entanto, o
problema está na qualidade dessas informações, pois a notícia tornou-se, em
muitos casos, uma poderosa arma nas mãos da imprensa sensacionalista, e é
neste momento que ela pode tornar-se perigosa, pois informar para garantir
audiência produz um prejuízo enorme à privacidade, à honra, à imagem e a
presunção de inocência do suspeito/acusado. Diante de uma equiparação de
forças entre quem produz e publica a notícia e de quem é denunciado, estes serão,
provavelmente, transformados em sujeitos perigosos para os olhos do mundo e
terão sua condenação pública decretada, o que poderá influenciara íntima
convicção os membros do Tribunal do Júri.
A partir deste contexto, fez-se uma pesquisa sobre o Tribunal do Júri no
Brasil, bem como relatou-se acerca dos jurados que compõem o Conselho de
Sentença do referido Tribunal e a função exercida por eles. Ademais, analisamos o
respeito ao princípio da presunção de inocência dentro do Júri frente a gama de
informações que, muitas vezes, são divulgadas sobre um determinado fato
criminoso.
Após, foi abordada a liberdade de imprensa, utilizada, na maioria das vezes,
de forma exagerada e com intuito lucrativo; e o problema da influência que os meios
de
comunicação
possam
vir
a
exercer
sobre
o
público
em
geral
e,
consequentemente sobre os jurados e, em razão disso, o conflito existente entre a
liberdade de imprensa e o princípio da presunção de inocência.
Em razão do que foi exposto nos capítulos anteriores, ao final analisou-se a
pesquisa de campo realizada com os Jurados do Tribunal do Júri da Comarca de
Tenente Portela – RS, que foi elaborada com o objetivo de descobrir a real influência
da mídia sobre a opinião dos jurados em relação determinado fato criminoso,
quando este é amplamente divulgado e, a consequente concorrência desta
influência no resultado do julgamento.
1 TRIBUNAL DO JÚRI
Reconhecida pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, XXXVIII, a
instituição do Tribunal do Júri possui a função de julgar, originariamente, crimes
dolosos, tentados ou consumados contra a vida, definidos nos arts. 121 a 128 do
CP, sendo-lhe atribuído também o julgamento dos crimes conexos, conforme prevê
o art. 78, I, do CP. Possui organização definida mediante lei ordinária, assegurados
a plenitude de defesa, o sigilo das votações e a soberania dos veredictos.
Excepcionalmente, em razão da prerrogativa de função, alguns crimes dolosos
contra a vida não serão julgados pelo Júri.
Na definição de Mário Rocha Lopes Filho,
O Tribunal do Júri é uma forma de exercício popular do poder judicial, daí
derivando sua legitimidade, constituindo-se um mecanismo efetivo de
participação popular, ou seja, o exercício do poder emana diretamente do
povo, que tem como similar os institutos previstos na Constituição
Federal.3
Sobre a finalidade do Tribunal popular, argumenta Guilherme de Souza Nucci:
“em verdade, nasceu o júri, na Inglaterra em 1215, como um direito fundamental,
pois era uma garantia de julgamento imparcial, feito pela própria sociedade, contra o
absolutismo do soberano” 4.
É composto por um Juiz de Direito, denominado Juiz Presidente, e por mais
vinte e cinco jurados sorteados, anteriormente inscritos na lista anual, conforme
prevê o artigo 477 do Código de Processo Penal.
Da lista geral serão sorteados (e não escolhidos) 25 jurados para cada
reunião (conjunto de sessões, julgamento do mês), cujos nomes serão
colocados na urna da reunião, da qual, a cada sessão do respectivo mês
(julgamento de cada réu), serão sorteados os 7 jurados (Conselho de
5
Sentença).
3
4
5
LOPES FILHO, Mário Rocha. O tribunal do júri e algumas variáveis potenciais de influência.
Porto Alegre: Núria Fabris, 2008. p. 15.
NUCCI, Guilherme de Souza. Júri: princípios constitucionais. São Paulo: Juarez de Oliveira, 1999.
p. 36.
GIACOMOLLI, Nereu José. Reformas (?) Do Processo Penal: Considerações Críticas. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 95.
Os jurados são pessoas do povo que não precisam conhecer o sistema penal
brasileiro, nem seu ordenamento jurídico para que possam julgar seus semelhantes
pelo cometimento de crime doloso contra a vida.
Na definição de Adriano Marrey, Alberto Silva Franco e Rui Stoco:
Jurado é órgão leigo, incumbido de decidir sobre a existência da imputação,
para concluir se houve fato punível, se o acusado é seu autor e se
ocorreram circunstâncias justificativas do crime ou de isenção de pena,
agravantes ou minorantes da responsabilidade daquele. São chamados
“juízes de fato” para distingui-los dos membros da Magistratura – “juízes de
direito”. 6
Cumpre salientar que a função dos jurados é decidir e votar sobre matéria de
fato. Votado os quesitos, decidida a matéria fática, o Juiz de Direito, Presidente do
Tribunal do Júri, aplica o direito ao caso concreto. Nas palavras de Flávio Prates e
Neusa Felipim dos Anjos Tavares:
Os jurados decidem sobre matéria de fato, aspectos circunstanciais do
episódio submetido a julgamento, votando nesse mister quesitos que lhe
são apresentados, ajustando o Juiz-presidente da seção às respostas
fornecidas aos quesitos do Direito aplicável. 7
Podem ser jurados os cidadãos maiores de 18 anos que possuam notória
idoneidade, conforme explicita o art. 436 do Código de Processo Penal. Serão
convocados os cidadãos que deverão exercer a função de jurado, através da lista
geral de jurados, elaborada pelo Juiz Presidente do Tribunal do Júri.
Possuindo o nome incluso na lista geral, tem o cidadão o dever de estar à
disposição do Poder Judiciário, pois o serviço prestado ao Tribunal do Júri é
obrigatório. O exercício da função de jurado constitui serviço público relevante e
apenas estarão isentos desta obrigação quem exerça as atividades constantes no
rol do artigo 437 do Código de Processo Penal.
6
7
MARREY, Adriano et al. Teoria e Prática do Júri. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 107.
PRATES, Flávio Cruz; TAVARES, Neusa Felipim dos Anjos. A influência da mídia nas decisões do
conselho de sentença. Direito & Justiça, Porto Alegre, v. 34, n. 2, p. 34, jul./dez. 2008. Disponível
em: <http://verum.pucrs.br/F/JSQ4PEMN6HVE7KCYJHB8GS8FUR81FEN1HCNXX41GKETDVK5L4B37826?func=full-set-set&set_number=004325&set_entry=000002&format=999>. Acesso em: 25 mar.
2011.
Sendo a instituição do Júri composta por julgadores do povo, que possuem
opiniões pré-definidas, em regra incutidas pela mídia, e inúmeros preconceitos e
que, ainda, na maioria das vezes, não possuem conhecimento técnico, é possível
afirmar que ao longo do julgamento, tais questões podem influenciar na decisão do
jurado, ferindo o princípio da presunção de inocência, que é uma das garantias
constitucionais balizadoras do direito penal brasileiro e deveria ser respeitado
durante os julgamentos feitos pelo Tribunal do Júri.
O princípio da presunção surge como meio de limitar o poder de punir do
Estado, que, ao longo da história, tratou o acusado como culpado desde o início do
processo penal, sem atribuir a este qualquer direito. Segundo Michelle Kalil Ferreira:
Seu marco principal ocorreu no final do século XVIII, em pleno iluminismo,
quando na Europa Continental, surgiu a necessidade de se insurgir contra o
sistema processual penal inquisitório de base romano-canônica, que vigia
desde o século XII. Nesse período e sistema o acusado era desprovido de
toda e qualquer garantia. Surgiu, daí, a necessidade de se proteger o
cidadão do arbítrio do Estado que, a qualquer preço, queria sua
condenação, presumindo-o, como regra, culpado [...]. 8
O referido princípio foi proclamado, pela primeira vez, na Declaração de
Direitos do Homem e do Cidadão, no ano de 1789. Posteriormente, foi recepcionado
pela Declaração Universal de Direitos do Homem, da ONU, em 1948.
Na Constituição Federal de 1988, o princípio da presunção de inocência está
previsto no art. 5°, LVII e assegura ao réu de um processo criminal que não seja
considerado culpado até que tenha transitado em julgado a sentença penal que o
condenou.
Foi recepcionado pela Magna Carta de 1988, pois é com ela que o Brasil se
torna um Estado Democrático de Direito e, nas palavras de Maria Elisabeth Queijo:
Há uma estreita vinculação entre a forma e o regime de governo adotados,
o Direito Penal e o Direito Processual penal. Aliás, a maior ou menor
8
FERREIRA, Michelle Kalil. O Princípio da Presunção de Inocência e a Exploração Midiática.
Revista Jurídica do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 9, p. 150181, jul./dez. 2007. p. 165. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/27368>.
Acesso em: 22 fev. 2011.
proteção aos princípios de Direito Penal e Processo Penal, em dado
ordenamento jurídico, é um importante termômetro de quanto se está mais
próximo ou mais distante de um regime democrático ou ditatorial.
Nas ditaduras verifica-se, inexoravelmente, a supressão ou redução
substancial de direitos e garantias na esfera penal e processual penal.
Em contrapartida, é no Estado Democrático que os princípios de Direito
Penal e o Processo Penal encontram maior proteção.
O Estado Democrático nasceu da luta contra o absolutismo e seus
princípios advêm de três movimentos: a Revolução Inglesa; a Revolução
Americana e a Revolução Francesa. Desses três movimentos advieram
declarações de direitos, que prestigiaram, entre outros, direitos e garantias
9
penais e processuais penais.
A garantia constitucional da presunção de inocência é provisória e
antecipada, poderá ser modificada com sentença transitada em julgado e garante
que, desde o início do processo, o réu seja considerado inocente. Visando tutelar a
liberdade pessoal do investigado/réu, há “necessidade da sentença penal
condenatória transitada em julgado para haver a alteração do estado jurídico de
inocente para o de culpado”.
10
Nas palavras de Alexandre de Moraes:
O princípio da presunção de inocência consubstancia-se, portanto, no
direito de não ser declarado culpado senão mediante sentença judicial com
trânsito em julgado, ao término do devido processo legal (due processo of
law), em que o acusado pôde utilizar-se de todos os meios de prova
pertinentes para sua defesa (ampla defesa) e para a destruição da
credibilidade das provas apresentadas pelo acusado (contraditório). 11
Diante do exposto, analisaremos no próximo capítulo o confronto entre essa
importante garantia instituída em favor do réu e a liberdade de imprensa, uma vez
que esta, ao ser exercida com excessos, gera o confronto já citado e fere a
Constituição Federal.
2 MÍDIA
9
10
11
QUEIJO, Maria Elizabeth. Princípios constitucionais no direito penal: ensaios penais em
homenagem ao Professor Alberto Rufino Rodrigues de Sousa. Porto Alegre: Ricardo Lenz ,
2003. p. 590.
GOMES, André Luís Callegaro Nunes. Presunção de inocência ou de não-culpabilidade. Não ser
considerado culpado é o mesmo que ser presumido inocente? Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n.
1791, 27 maio 2008. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/11310>. Acesso em: 3 mar.
2011.
MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação infraconstitucional.
São Paulo: Atlas, 2003. p. 386.
2.1 LIBERDADE DE IMPRENSA
Surgiu na França, em 1789, com a Declaração dos Direitos do Homem e do
Cidadão e posteriormente foi prevista na declaração Universal dos Direitos do
Homem, em 1948.
Segundo Francisco José Karam,
A luta pela liberdade de imprensa tem já alguns séculos e sua origem está
na própria luta pela liberdade literária constrangida pela Igreja. Com o
aparecimento dos primeiros jornais periódicos, no final do século XVI, a luta
toma nova dimensão em escala social. Este processo chega a dois
momentos marcantes; a Independência dos Estados Unidos, em 1776
(quando a liberdade de imprensa passa a ser entendida como suporte da
própria liberdade social), e a Revolução Francesa, que, a partir de 1789,
proclamou também a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,
dispondo que a liberdade de exprimir idéias e opiniões era um dos direitos
mais preciosos da humanidade. 12
O Brasil, por ter se tornado um Estado Democrático de Direito, assegurou aos
cidadãos, na Constituição de 1988, a liberdade de pensamento, de expressão, de
culto, bem como a liberdade de imprensa.
Nos dizeres de Volnei Ivo Carlin,
É verdade que, nos países desenvolvidos, há uma reconhecida importância
pelo Direito Constitucional ao direito à informação, sendo fácil perceber que
a maior razão pela qual se protege o direito de informar é, precisamente,
porque a sociedade será mais livre e democrática na proporção em que der
oportunidade de acesso aos seus integrantes do que ocorre em seu próprio
meio.13
Em decorrência do regime e da forma de governo que adotamos, a liberdade
de imprensa surge como um direito assegurado a todos os meios de comunicação
em massa, bem como aos cidadãos, na busca da efetivação e da preservação da
liberdade. Foi disciplina pelo ordenamento jurídico pátrio, no intuito de impedir que o
Estado cerceie ou dificulte a circulação e o acesso às informações, bem como
interfira na liberdade destas informações.
12
13
KARAM, Francisco José. Jornalismo, ética e liberdade. São Paulo: Summus, 1997. p. 16-17.
CARLIN, Volnei Ivo. A justiça e a mídia. Revista do Instituto de Pesquisas e Estudos, Bauru, n.
23, p. 23-29, ago./nov. 1998. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/bitstream/handle/
2011/20177/A%20justi%C3%A7a%20e%20a%20m%C3%ADdia.pdf?sequence=1>. Acesso em: 7
mar. 2011. p. 23.
Sobre a finalidade da liberdade de imprensa, Flávio Prates e Neusa Felipim
dos Anjos Tavares se manifestam dizendo que:
Cumpre observar que o direito de informar, ou ainda, a liberdade de
imprensa leva à possibilidade de noticiar fatos, que devem ser narrados de
maneira imparcial. A notícia deve corresponder aos fatos, de forma exata e
factível para que seja verdadeira, sem a intenção de formar nesse receptor
uma opinião errônea de determinado fato. O compromisso com a verdade
dos fatos que a mídia deve ter vincula-se com a exigência de uma
informação completa, para que se evitem conclusões precipitadas e
distorcidas acerca de determinado acontecimento. 14
Para Carla Gomes de Mello, “[...] a liberdade de informação só existe diante
de fatos cujo o conhecimento seja de extrema importância ao indivíduo, afim de que
venha a ajudá-lo a participar do mundo em que vive”. 15
Em razão da previsão da liberdade de imprensa na Magna Carta de 1988,
há a impossibilidade de censura, o livre exercício da profissão, a liberdade de
informação e liberdade de pensamento. Assim sendo, a liberdade de imprensa
surge como meio de defesa às liberdades a que tem direito o cidadão, tendo sido a
imprensa declarada livre, divulgando fatos ocorridos no mundo e manifestando-se, a
todo o instante, sobre esses fatos de forma global.
Ocorre que, a liberdade de imprensa não pode ser tida como absoluta,
sofrendo restrições, nos termos do parágrafo 1º do artigo 220 da CF/88. Sendo
assim, as restrições à liberdade de imprensa dizem respeito à honra, à imagem, à
intimidade e à vida privada. Bem como, dentro do processo penal, ao princípio da
presunção da inocência.
Para Alexandre de Moraes,
Apesar da vedação constitucional da censura prévia, há necessidade de
compatibilizar a comunicação social com os demais preceitos
constitucionais, como por exemplo, a proteção dos direitos da criança e do
adolescente. 16
14
15
16
PRATES; TAVARES, 2008, p. 35.
MELLO, Carla Gomes de. Mídia e Crime: Liberdade de Informação Jornalística e Presunção de
Inocência. Revista de Direito Público, Londrina, v. 5, n. 2, ago. 2010. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/direitopub/ article/view/7381/6511>. Acesso em: 13 dez.
2010. p. 109.
MORAES, 2003, p. 2009.
Nos dizeres de Maurício Jorge D’ Augustin Cruz:
É que o disposto no artigo 220 está intimamente relacionado, também, à
dignidade da pessoa humana. A constituição não permite um total sacrifício
do particular ao interesse social. A relação tem um limite, que é a dignidade
da pessoa humana. 17
Dessa forma, a liberdade de imprensa e o direito à informação deveriam ser
utilizados pelos meios de comunicação apenas como forma de transmissão de
informações e de notícias ocorridas no cenário mundial, cumprindo assim a sua
finalidade, sem que houvesse prejuízo ao indivíduo e, consequentemente,
desrespeito às garantias individuais. Não é correta a utilização de tal liberdade para
veiculação de notícias especulativas, que invadam e firam a privacidade e dignidade
da pessoa.
Segundo Carla Gomes de Mello,
Sabe-se que não é permitido aos meios de comunicação, se utilizar da
prerrogativa da liberdade de informação jornalística, que lhe é garantida
pela Constituição Federal, para divulgar notícias que ofendam a outras
liberdades igualmente garantidas, tais como a intimidade, a vida privada e a
presunção de inocência. 18
No item que será abordado em seguida, dissertaremos sobre como a mídia,
por ser possuidora da liberdade de imprensa, exerce poder sobre o pensamento da
população, forma opiniões e fere as garantias individuais dispostas na Magna Carta.
2.2 INFLUÊNCIA EXERCIDA PELOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOBRE AS
DECISÕES DOS JURADOS
Primeiramente, cumpre salientar a influência que mídia exerce na formação
da opinião de seu público.
A mídia atua como propagadora dos acontecimentos mundiais, sendo, dessa
17
CRUZ, Maurício Jorge D’Augustin. O caso da escola infantil da base: liberdade de imprensa e
presunção de inocência. Porto Alegre: PUCRS, 2003. Dissertação (Mestrado em Ciências
Criminais), Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2003. p.
106.
18
MELLO, 2010, p. 119.
forma, importantíssima no exercício do direito à informação. Assim, os indivíduos se
utilizam dos meios de comunicação para que possam se manter informados e para
que consigam se comunicar, dentro de seus ambientes sociais, sobre os
acontecimentos ocorridos no mundo.
Nos dizeres de Sálvio De Figueiredo Teixeira,
A Imprensa, por sua vez, tornou-se indispensável à convivência social, com
atividades múltiplas, que abrangem noticiário, entretenimento, lazer,
informação, cultura, ciência, arte, educação e tecnologia, influindo no
comportamento da sociedade, no consumo, no vestuário, na alimentação,
na linguagem, no vernáculo, na ética, na política, etc. Representa, em
síntese, o mais poderoso instrumento de influência na sociedade dos
nossos dias. 19
Contudo, as informações veiculadas pelos meios de comunicação nem
sempre são verdadeiras, podendo ser definidas como parciais, pois retratam a forma
pela qual o jornalista que a escreve enxerga determinada situação ou fato, bem
como demonstram somente uma versão sobre o ocorrido, ocultando informações
precisas e veiculando somente o que retrata a forma de pensar de determinado
veículo de imprensa.
Segundo Ana Paula Albrecht Schifino,
Os comunicadores da Televisão têm a chance de situar o público diante da
parte que mais lhe interessa destacar, não que mintam intencionalmente,
mas comunicam sob a perspectiva de um ponto de vista determinado por
eles. 20
Ademais, além das informações não serem prestadas de maneira precisa e
não serem imparciais, em razão da liberdade que a imprensa possui, ela acaba por
explorar determinados assuntos de maneira exacerbada e sensacionalista,
19
20
TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A imprensa e o judiciário. Revista do Instituto de Pesquisas e
Estudos, Bauru, n. 15, ago./nov. 1996. Disponível em: <http://bdjur.stj.gov.br/xmlui/
bitstream/handle/2011/20397/imprensa_judiciario.pdf?sequence=3>. Acesso em: 20 mar. 2011.
p. 15.
SCHIFINO, Ana Paula Albrecht. Comunicação e poder: uma leitura semiológica da
campanha institucional RBS “O amor é a melhor herança. Cuide das crianças”. Porto
Alegre: PUCRS, 2009. Dissertação (Mestrado em Comunicação Social), Faculdade de
Comunicação Social, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, 2009. Disponível
em: <http://tede.pucrs.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=2189>. Acesso em: 20 mar.
2011. p. 14.
cometendo excessos e estabelecendo a suposta verdade do caso. Ainda, a mídia
elege os assuntos que, condizendo com o seu interesse, são considerados
importantes e terão grande divulgação.
Agindo dessa maneira, a imprensa está tratando a notícia como meio para
obtenção de lucros, não se preocupando com a veracidade e fidedignidade das
informações. O que mais importa é que determinado meio de comunicação seja o
único a publicar determinado evento, que este tenha grande propagação no cenário
nacional e até mundial e que os espectadores se interessem por ele. Para que isto
ocorra, buscam-se inúmeros artifícios como a dor sentimental, o sofrimento físico, a
emoção, a comoção, o espetáculo, a tragédia, etc, tudo no intuito de que o
recebedor da notícia seja influenciado por ela e sequer analise a veracidade de seu
conteúdo.
Segundo Carla Gomes de Mello, “o veículo midiático sensacionalista faz da
emoção o principal foco da matéria, esquecendo-se do conteúdo da notícia a ser
repassada, se é que ela existe”. 21
Cumpre salientar que no Brasil a taxa de analfabetismo é elevada
22
, bem
como existem baixos índices educacionais e culturais. Em recente publicação, o
Ministério da Cultura divulgou que o índice de leitura em nosso país é de 4,7 livros
por ano, o que demonstra que ainda vivemos em uma pátria de poucos leitores e a
leitura é o meio através do qual se desenvolve o conhecimento e o senso crítico
para análise das informações que nos são prestadas.
Nesse ínterim, explicita Leila Souza,
O conhecimento pode ser encontrado através da leitura e esta, por sua vez,
possibilita formar uma sociedade consciente de seus direitos e de seus
deveres; possibilita que estes tenham uma visão melhor do mundo e de si
21
22
MELLO, 2010, p. 111.
Segundo INAF Brasil (Indicador de Analfabetismo Funcional), com base em pesquisa realizada no
ano de 2009 com pessoas de 15 a 64 anos, 7% da população é totalmente analfabeta, 68% da
população é analfabeta funcional (21% analfabeto funcional rudimentar e 47% é analfabeto
funcional básico) e 25% da população é alfabetizada (INSTITUTO BRASILEIRO DE OPINIÃO
PÚBLICA E ESTATÍSTICA (IBOPE). Indicador de Analfabetismo Funcional. Brasil, [2009].
Disponível em: <http://www.ibope.com.br/ipm/relatorios/relatorio_inaf_2009.pdf>. Acesso em: 10
mar. 2011.
mesmos.
23
Assim sendo, não havendo o hábito da leitura na maioria da população, como
demonstrou a pesquisa, o público alvo das notícias veiculadas nos meios de
comunicação acaba não conseguindo filtrar o conteúdo destas, formando sua
opinião sobre determinado assunto somente com base no que foi veiculado pela
mídia. Pode-se dizer que a mídia “produz, então, seus maiores efeitos socializadores
nas camadas sociais e culturais mais frágeis”. 24
Conforme salienta Joan Ferrés,
Se compararmos os efeitos da leitura e do ato de assistir à televisão
observaremos um paradoxo surpreendente: enquanto apenas aqueles que
sabem ler costumam apegar-se à leitura, a maior dicção à televisão
costuma ocorrer entre aqueles que não dominam a sua linguagem.
Enquanto somente os que sabem ler correm risco de uma influência
negativa das leituras, ocorre o contrário com a televisão: quanto menos for o
conhecimento dos códigos maior será o risco de uma influência negativa. 25
Contudo, em razão da informação ser prestada a todas as pessoas da mesma
forma, não há somente manipulação da opinião de pessoas desinformadas ou que
não conseguem entender o conteúdo da informação, são igualmente influenciadas
as pessoas que detém informação, seja esta cultural, educacional, social ou política.
Isto ocorre pela relação que os indivíduos vêm estabelecendo com os meios de
comunicação, em razão da necessidade de manterem-se informados e com a falta
de tempo para pesquisarem em diversos e diferentes meios de comunicação, cada
vez mais o que se enxerga é que a imprensa, principalmente a televisão, faz parte
do cotidiano das pessoas e influencia estas. Elege-se um jornal, um telejornal, ou
um site da internet, geralmente ligados à mesma empresa de comunicação, para
inteirar-se dos acontecimentos mundiais. Assim, o que acaba acontecendo é a
absorção de notícias dotadas de conteúdo valorativo que determinado meio de
comunicação impõe.
Nos dizeres de Graça Caldas,
23
24
25
SOUZA, Leila. A importância da leitura para a formação de uma sociedade consciente. [S.d.].
Disponível em: <http://dici.ibict.br/archive/00001095/01/aimportanciadaleitura.pdf>. Acesso em: 11
mar. 2011.
FERRÉS, Joan. Televisão e educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996. p. 79.
Ibid., p. 79.
Sabe-se, que a aquisição do conhecimento e a formação crítica de leitores
não se dá pela leitura única de um veículo, mas justamente pela
comparação entre eles. É exatamente pelo acesso ao contraditório, à
percepção e ao reconhecimento de diferentes visões e interpretações de um
mesmo fato, pela polifonia das vozes, que é possível efetuar uma leitura do
mundo que vá além da leitura das palavras. 26
Influência maior ocorre quando determinado assunto é noticiado por todos os
meios de comunicação da mesma forma, com as mesmas opiniões e dados. Neste
caso, é quase impossível que o público não seja manipulado pelas informações
prestadas pela mídia, pois os diferentes veículos transmissores do evento o
propagam da mesma maneira, com o igual intuito de estabelecer a única verdade
sobre o caso, ficando estabelecida, na convicção das pessoas, a verdade da mídia.
No âmbito do direito penal, a influência da mídia é exacerbada e
sensacionalista, conforme afirma Carla Gomes de Mello:
O crime, desde os tempos mais remotos, onde predominavam execuções
públicas que se constituíam em verdadeiros espetáculos de horror,
fascinava a população e era notícia. A mídia, sabedora desse fascínio e
atração do público pelos acontecimentos violentos, desde então, explora o
assunto. 27
Como os crimes possuem grande valor moral, a imprensa aumenta a
publicidade quando da prática de um delito, especialmente, quando se trata de crime
doloso contra a vida, emitindo juízos de valor sobre o fato delituoso. E, como não há
a multiplicidade de opiniões sobre o delito cometido, o leitor acaba por influenciar-se
com a única opinião emitida nos meios de comunicação.
Nas palavras de Mário Rocha Lopes Filho,
[...] A mídia está presente na vida de todo e qualquer cidadão, durante as
vinte e quatro horas diárias, despejando toda e qualquer sorte de
informações. Há uma massificação evidente, especialmente na esfera
criminal, quando o noticiário, a respeito de determinado evento, monopoliza
quase todos os horários da mídia falada e escrita. 28
26
27
28
CALDAS, Graça. Mídia, escola e leitura crítica do mundo. Educação Social, Campinas, v. 27, n.
94, p. 117-130, jan./abr. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/es/v27n94/a06v27n94.pdf>.
Acesso em: 7 mar. 2011. p. 126-127.
MELLO, 2010, p. 113.
LOPES FILHO, 2008, p. 81.
Utilizando-se do interesse da população pelos crimes, a mídia escolhe, dentro
os inúmeros delitos que são praticados diariamente, os que mais irão impressionar e
chocar a população, pois atitudes cruéis e más estão dentre as notícias mais
rentáveis e possibilitam a manipulação da sociedade para o fortalecimento do direito
penal, para a seleção dos criminosos e para ocultação de inúmeros outros
problemas sociais.
Segundo Luiz Flávio Gomes,
Não existe “produto” midiático mais rentável que a dramatização da dor
humana gerada por uma perda perversa e devidamente explorada, de forma
a catalisar a aflição das pessoas e suas iras. Isso ganha uma rápida
solidariedade popular, todos passando a fazer um discurso único: mais leis,
mais prisões, mais castigos para os sádicos que destroem a vida de
inocentes indefesos. 29
Um exemplo da grande publicidade dada aos crimes é o caso Nardoni, no
qual o pai de Isabela Nardoni, Alexandre Nardoni, e sua madrasta, Ana Carolina
Jatobá, foram denunciados pelo Ministério Público em razão de suposta prática de
crime doloso contra a vida da menina. Neste caso, antes da propositura da ação
penal pública incondicionada, a mídia publicou durante vários meses, todos os dias,
informações sobre o caso. Houve participação dos meios de comunicação na fase
do inquérito policial, durante a reconstituição do fato criminoso, assim como
simulações sobre o crime foram realizadas em inúmeros programas de televisão, o
que ocasionou a condenação pública do casal que apenas era tido como suspeito.
Recorda-se que durante um bom tempo qualquer informação que tivesse
relação com o caso era veiculada, até como os réus se alimentavam dentro da
prisão foi divulgado. Houve transmissão, em tempo real, da sentença de
pronúncia, que foi lida pelo Juiz de Direito que a prolatou, bem como o julgamento
pelo Tribunal do Júri, que durou cinco dias, teve cobertura televisiva e diversos
programas de televisão comentaram as teses de defesa e acusação. A decisão
dos jurados, que condenou os réus, foi amplamente divulgada no cenário mundial
com o intuito de comprovar que a justiça teria sido feita, diante dos clamores
29
GOMES, Luiz Flávio. Casal Nardoni: inocente ou culpado? (parte 1). Disponível em:
<http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20100315111040784>. Acesso em: 20 mar.
2011.
públicos pela condenação.
Em relação à influência da mídia no caso Nardoni, cabe citar excelente
exposição de Carla Gomes de Mello:
Tomemos como exemplo, a edição n. 2057, da Revista Veja, de 23 de
abril de 2008. Na capa, estampados estão os rostos do pai e da madrasta
suspeitos de terem assassinado a menina Isabela. Logo abaixo da
imagem, o título impactante, cujo final nos chama atenção, uma vez que
escritos em tamanho maior e em cores diferentes da utilizada no início do
texto: “Para a polícia, não há mais dúvida sobre a morte de Isabela:
FORAM ELES”. 30
Flávio Prates e Neusa Felipim dos Anjos Tavares citaram outro exemplo que
teve forte divulgação midiática, que foi o caso Reichtofen, in verbis::
Veja-se, por exemplo, o polêmico julgamento de Suzane Reichtofen e dos
irmãos Cravinhos em que antes do julgamento ocorrer uma emissora de
televisão colocou no ar um membro do Ministério Público e o advogado de
Defesa da ré. Os dois debateram acerca das teses que seriam usadas
durante o julgamento, ou seja, o julgamento estava acontecendo no ar,
perante o público e o apresentador do programa exaltando que agora é que
se veria se existe justiça neste país. Como se a condenação de Suzane
fosse a exata medida de justiça para todos os crimes. 31
A imprensa peca em seu jornalismo investigativo, pois ao retratar a notícia de
forma parcial, divulgando o nome dos envolvidos e seus semblantes, interfere na
vida dessas pessoas e de seus familiares, execrando o suspeito ou acusado,
expondo-o ao julgamento social, pois conforme explicita Marília Denardin Budó, as
notícias sobre os crimes “são tratadas sempre de uma forma maniqueísta. Divide-se
os dois lados da questão: o bem e o mal, sendo que de cada lado há um estereótipo
a ser reforçado, e todos devem assumir seus papéis”.32
Nos dizeres de Carla Gomes de Mello,
Holofotes cinematográficos são dirigidos ao suspeito do crime com o intuito
de revelar sua identidade e personalidade. Em poucos segundos, sabe-se
de tudo, detalhadamente, a respeito da vida desse cidadão e de seus
familiares. Tudo é vasculhado pela mídia. Bastam alguns momentos para
30
31
32
MELLO, 2010, p. 118.
PRATES; TAVARES, 2008, p. 37.
BUDÓ, Marília Denardin. Mídia e crime: a contribuição do jornalismo para a legitimação do sistema
penal.
UNIrevista,
Florianópolis,
v.
1,
n.3,
2006.
Disponível
em:
<http://www.unirevista.unisinos.br/_pdf/UNIrev_Budo.PDF>. Acesso em: 10 set. 2010. p. 10.
que eles se vejam em todas as manchetes de telejornais, revistas e jornais.
A mídia, assim, vai produzindo celebridades para poder realimentar-se
delas a cada instante, ignorando a sua intimidade e privacidade. 33
Assim, é notório que os juízos de valor emitidos pela mídia impossibilitam a
defesa do acusado e ferem diretamente o princípio da presunção da inocência, pois
contaminam a opinião pública. Dessa forma, surgem, por parte da população,
manifestações por “justiça”, clama-se pela condenação e pela não impunidade da
pessoa que, aos olhos da sociedade, passou a ser a culpada pelo crime. Em função
disso, “a criação de novos tipos penais, assim como os aumentos de penas de tipos
já existentes são justificados perante a sociedade, gerando uma verdadeira
necessidade de repressão penal para acalmar o alarde público”. 34
Assim, explicita Marília Denardin Budó:
Prega-se, então, um Estado mínimo no que diz respeito ao social e ao
econômico, e um Estado máximo em relação ao direito penal, o que traz a
tendência à criminalização, especialmente à criminalização contingente,
decorrente de fatos concretos, principalmente os que são mediados pelos
órgãos de comunicação, com grande repercussão. 35
Ocorre a condenação popular do suspeito/réu, não se considerando em que
situações o crime foi cometido, se realmente foi praticado da forma que a notícia
expõe, os problemas sociais, emocionais e psicológicos que atormentam a vida do
indivíduo. Nada disso importa, o que se pretende, muitas vezes, é que essa pessoa
seja excluída da sociedade que o condenou e que acredita que ele mereça uma
pena cruel e perpétua.
Para Carla Gomes de Mello,
Não se importa a sociedade manipulada pela mídia se contra o suspeito
houve tortura que o levou a confessar o ato criminoso, se, da mesma
maneira, houve força excessiva, se está preso inocentemente e sem
necessidade, se os direitos dele estão sendo violados, se eles tem a chance
de não ser considerado culpado e se ele faz jus a um julgamento justo. [...]
36
Decretando a condenação pública do suspeito/réu, a imprensa acaba por
33
34
35
36
MELLO, 2010, p. 116-117.
BUDÓ, 2006, p. 6.
Ibid., p. 5.
MELLO, 2010, p. 118.
exercer grande poder e manipulação sobre a opinião de pessoas que poderão ser os
jurados escolhidos para julgar o fato criminoso. Sendo assim, tais pessoas
receberam previamente, por parte da mídia, diversas informações que, na maioria
das vezes, não condizem com a realidade e que irão influenciá-las na hora do
julgamento.
Cumpre salientar que as notícias veiculadas pelos meios de comunicação
podem até influenciar o juiz de direito que irá julgar o caso ou que irá pronunciar o
réu ou não, pois verifica-se, nos casos concretos, que muitos juízes decretam a
prisão preventiva dos réus com base no clamor da sociedade por justiça.
Neste sentido, se manifesta Carla Gomes de Mello:
A força que os meios de comunicação produzem e projetam ao noticiarem
um crime é passível de influenciar até mesmo o juiz, no momento adequado
de decidir. Muitas vezes, pelo temor de gerar nos cidadãos a sensação de
insegurança jurídica, juízes decidem da maneira como espera a mídia e
toda a sociedade por ela influenciada [...]. 37
Sustentando a influência da mídia sobre os jurados que compõem o Conselho
de Sentença do Tribunal do Júri, manifestam-se Flávio Prates e Neusa Felipim dos
Anjos Tavares:
[...] É valiosa a pretensão de que o réu seja julgado por seus pares, como
garantia da justiça, mas nem sempre, ou até mesmo poucas vezes, estes
“pares” terão o equilíbrio e o discernimento para filtrar o que foi
reiteradamente incutido em seus pensamentos antes do julgamento do
processo que irão decidir. Dificilmente um jurado consegue manter-se isento
diante da pressão da mídia e do prévio julgamento “extrajudicial” transmitido
diariamente para suas casas. 38
Em sentido contrário, se manifesta Mário Rocha Lopes Filho, com base em
pesquisa realizada perante a 1ª Vara do Júri de Porto Alegre:
Registra-se, por pertinente – e seria hipocrisia negar – a hipótese de a mídia
ou outras formas de pressão já referidas, produzirem, potencialmente,
influência no julgamento, entretanto, diante das pesquisas não se
conseguiu, ao menos por ora, vislumbrar eventual indício de ter sido a
decisão proferida unicamente vinculada à pressão veiculada pela imprensa
ou por elementos de convicção colhidos no trabalho jornalístico, opinião
37
38
MELLO, 2010, p. 118.
PRATES; TAVARES, 2008, p. 38.
pública, etc.
39
2.3 LIBERDADE DE IMPRENSA X PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
Diante do que foi exposto com relação à liberdade imprensa e sobre o
princípio da presunção da inocência, conclui-se que esses dois direitos ou garantias
fundamentais se chocam. Portanto, cabe tentar achar solução, com base em
argumentos doutrinários, para o impasse que se vislumbra.
Contudo, cabe utilizar as definições de Canotilho para explicar o que são
direitos ou garantias fundamentais. No que concerne aos direitos o referido autor
sustenta que: “direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídicoinstitucionalmente garantidos e limitados espacio-temporalmente”.40
Quanto à garantias, Canotilho esclarece que:
Rigorosamente, as clássicas garantias são também direitos, embora
muitas vezes se salientasse nelas o caráter instrumental de proteção dos
direitos. As garantias traduziam-se quer no direito dos cidadãos a exigir
dos poderes públicos a proteção dos seus direitos, quer no
reconhecimento dos meios processuais adequados a essa finalidade
[...].41
Maurício Jorge D’Augustin Cruz disserta sobre as semelhanças existentes
entre a liberdade de imprensa e a presunção de inocência:
Ainda, é imperioso lembrar que tanto um quanto outro são direitos
fundamentais ligados às liberdades públicas, e têm como premissa fundante
clara limitação de poder. Independentemente da Carta que os tenha
garantido, estavam insculpidos como direitos subjetivos públicos, ou seja,
determinam conduta negativa do Estado, extensiva aos particulares. São
princípios ligados ao Estado Democrático de Direito de forma indissolúvel.
Chega-se ao limite de afirmar que não existe democracia sem liberdade de
imprensa ou presunção de inocência. 42
Quando a liberdade de imprensa é utilizada para publicação de notícias de
crimes de forma imparcial e sensacionalista, que exponham o suspeito e que o
39
LOPES FILHO, 2010, p. 36
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra:
Almedina, 2003. p. 393.
41
Ibid., p. 396.
42
CRUZ, 2003, p. 146.
40
condenem publicamente, está-se ferindo diretamente o princípio da presunção de
inocência, que deve ser preservado, podendo somente ser quebrado, no âmbito
processual, com a observância do devido processo legal.
Segundo Carla Gomes de Melo quando ocorre o choque entre a liberdade de
imprensa e a presunção de inocência se está “diante de uma colisão de direitos
fundamentais”.43 Para resolver tal conflito argumenta a autora: “porém, como os
direitos em conflito não podem ser hierarquizados, o caso concreto dirá qual deles
devem recuar”.44
Maurício Jorge D’ Augustin Cruz sustenta que:
Nossa hipótese de trabalho foi a de que existe efetivamente uma eficácia
horizontal do princípio da presunção de inocência, sendo ele de ordem direta
ou indireta, imediata ou mediata. Este recorte significa que não só as condutas
públicas devem se abster da prática de atos que frustrem seu exercício, mas
também a conduta dos particulares deve ser no mesmo sentido.45
Assim, quando os referidos direitos fundamentais se chocarem deve haver o
uso do princípio da proporcionalidade que “autoriza somente restrições ou limitações
que sejam adequadas, necessárias, racionais ou razoáveis”. 46
Utilizaremos a definição do referido princípio definida por Jairo Gilberto
Schäfer e Nairane Decarli:
O princípio da proporcionalidade permite que o magistrado; diante da
colisão de direitos fundamentais, decida de modo que se maximize a
proteção constitucional, impedindo o excesso na atividade restritiva aos
direitos fundamentais. O objetivo não é anular um ou outro princípio
constitucional, mas encontrar a solução que mantenha os respectivos
núcleos essenciais. 47
Dessa forma, na colisão entre os dois direitos fundamentais, não sendo
possível a compatibilização entre eles, a liberdade de imprensa deve ceder, de
43
44
45
46
47
MELLO, 2010, p. 119.
Ibid., p. 119.
CRUZ, 2003, p. 146.
Ibid., p .152.
SCHÄFER, Jairo Gilberto; DECARLI, Nairane. A colisão dos direitos à honra, à intimidade, à vida
privada e à imagem versus a liberdade de expressão. Prisma Jurídico, São Paulo, v. 6, 2007. p.
131.
forma proporcional e adequada, frente ao princípio da presunção de inocência, uma
vez que não é razoável que a liberdade de imprensa prevaleça em detrimento de
direitos e garantias fundamentais do indivíduo.
3 MATERIAL, OBJETO E MÉTODO
3.1 O CAMPO DE PESQUISA
Primeiramente, cumpre salientar que a pesquisa foi realizada perante os
jurados que compõem o Conselho de Sentença do Tribunal do Júri da Comarca de
Tenente Portela – RS. Cabe observar que a referida cidade, situada na região
noroeste do Estado, segundo resultados do Censo realizado em 2011, possui 13 mil
698 habitantes.
48
Objetivou-se realizar a investigação neste local, pois, até então,
nenhuma pesquisa desse âmbito havia sido realizada.
3.2 MÉTODO E MATERIAL
Para realização da pesquisa foi utilizado o método quantitativo, utilizando-se
de perguntas pessoais feitas aos jurados com o objetivo de verificar, sob o ponto de
vista de cada membro do Conselho de Sentença, a possível influência que a mídia
poderia ter sobre estes. Os resultados da pesquisa foram submetidos à análise da
Empresa ZN Consultoria e Estatística, que elaborou a estatística do trabalho através
do programa de computador Excel.
3.3 COLETA DE DADOS
Em contato com o Dr. Juiz de Direito titular da Comarca de Tenente Portela RS, Mateus da Jornada Fortes, através de ofício, demonstrou-se o conteúdo da
pesquisa, com apresentação dos questionários que seriam realizados, tendo sido
esclarecidos os objetivos da análise. Com a permissão concedida pelo magistrado,
buscou-se a última lista geral dos jurados da Comarca, contida em edital, publicado
48
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Censo 2010. 2010.
Disponível em: <http://www.censo2010.ibge.gov.br/dados_divulgados/index.php?uf=43>. Acesso
em: 25 mar. 2011.
em 14 de fevereiro de 2011.
Posteriormente, entrou-se em contato com os jurados para que, através de email ou pessoalmente, respondessem o questionário elaborado. Foram enviados
através de e-mail ou entregues pessoalmente aos jurados 40 questionários, dos
quais obteve-se resposta efetiva de 22 jurados. Após, tendo sido os questionários
respondidos e entregues, foi feita a análise estatística dos resultados obtidos.
3.4 ASPECTOS ÉTICO-LEGAIS
Os participantes da pesquisa estavam em pleno gozo de suas faculdades
mentais e, por questões de privacidade e segurança, estavam cientes de que suas
identidades não seriam reveladas.
4 RESULTADOS
Analisaremos cada tabela de resultados com explicação acerca de seu
conteúdo.
Tabela 1 - Caracterização da amostra quanto ao sexo
Sexo
Feminino
Masculino
Frequência
absoluta (n)
12
9
Frequência
relativa (%)
57,1
42,9
A primeira pergunta realizada teve como finalidade estabelecer o sexo dos
jurados. Percebemos que a maior parte da amostra (57,1%) é do sexo feminino.
Tabela 2 - Caracterização da amostra quanto à idade
Idade (anos)
18 a 30
30 a 35
35 a 40
40 a 45
45 a 50
50 a 55
Mais de 55
Frequência
absoluta (n)
1
4
5
2
7
2
0
Frequência
relativa (%)
4,8
19,0
23,8
9,5
33,4
9,5
0,0
A Tabela 2 caracteriza os respondentes quanto à idade classificada em 7
grupos. Observa-se que nenhum deles possuía mais de 55 anos e grande parte
(85,7%) estava na faixa de 30 a 50 anos.
Tabela 3 - Caracterização da amostra quanto ao grau de instrução
Grau de instrução
Ensino fundamental
Ensino Médio incompleto
Ensino Médio
Superior incompleto
Superior
Frequência
absoluta (n)
1
0
4
2
14
Frequência
relativa (%)
4,8
0,0
19
9,5
66,7
A Tabela 3 caracteriza os entrevistados de acordo com o grau de instrução. É
interessante notarmos que 66,7% da amostra possui ensino superior completo e
23,8% possui Ensino Médio ou menor escolaridade.
A verificação do grau de escolaridade faz-se necessár, pois é através deste
que se consegue visualizar a capacidade que o jurado possui para julgar o caso
concreto com base em sua íntima convicção, sendo imparcial e não sendo
influenciado.
Tabela 4 - Meio de comunicação usado para obter informação
Meio de comunicação
Telejornais
Jornais
Rádio
Internet
Revistas
Frequência
absoluta (n)
15
12
11
18
13
Frequência
relativa (%)*
71,4
57,1
52,4
85,7
61,9
*Não soma 100% pois a questão era de múltipla escolha
A Tabela 4 apresenta os meios de comunicação mais utilizados para obter
informação. O meio mais utilizado é a internet (85,7%). A pergunta número quatro foi
realizada para que se descobrissem as espécies de mídias utilizadas pelos jurados
com o intuito de obter informação e conhecimento. Cabe salientar que na cidade de
Tenente Portela existem três sites na internet, sendo dois pertencentes a jornais
locais, que, com atualização diária, informam a população acerca das notícias que
ocorrem no município e na região
Tabela 5 - Frequência com que se informa dos fatos
que acontecem no mundo
Frequências
Diariamente
Semanalmente
Mensalmente
Frequência
absoluta (n)
20
1
0
Frequência
relativa (%)
95,2
4,8
0,0
Observa-se, segundo a Tabela 5, que grande parte da amostra (95,2%) se
informa diariamente. A relevância de tal pergunta cinge-se no intuito de saber qual a
relação que é estabelecida entre os jurados e os meios de comunicação, se estes
últimos fazem parte da vida daquele de forma cotidiana ou não.
Tabela 6 - Frequência
da
resposta
sobre
os
meios
de
comunicação interferirem ou não na opinião do público
Opinião
Interfere
Não interfere
Interfere em partes
Frequência
absoluta (n)
11
0
10
Frequência
relativa (%)
52,4
0,0
47,6
Com a Tabela 6 visualiza-se que 52,4% dos entrevistados acredita que os
meios de comunicação interferem na opinião de seu público. A importância dessa
pergunta cinge-se no intuito de visualizar se os jurados acreditam que a mídia
interfere na opinião do público, e, consequentemente, nas suas próprias opiniões .
Tabela 7 - Frequência da opinião sobre confiabilidade dos
meios de comunicação
Opinião
Confiáveis
Confiáveis em partes
Pouco confiáveis
Frequência
absoluta (n)
0
20
0
Frequência
relativa (%)
0,0
100,0
0,0
A Tabela 7 nos mostra que todas as pessoas entrevistadas acham que os
meios de comunicação são confiáveis “em partes”. O objetivo de tal questionamento
foi a verificação concreta da confiança que os jurados depositam nos meios de
comunicação, bem como a credibilidade que conferem às notícias veiculadas por
estes meios.
Tabela 8 - Possibilidade de formar opinião sem influência
dos meios de comunicação
Opinião
Frequência
absoluta (n)
Frequência
relativa (%)
6
5
10
28,6
23,8
47,6
Sim, é possível
Não é possível
É possível em partes
A Tabela 8 refere-se a pergunta sobre a possibilidade de formar opinião sem
influência dos meios de comunicação, e a quase maioria, 47,6%, respondeu que é
possível em partes formar opinião sem a influência da mídia, o que nos faz concluir
que a imprensa, em determinados casos, pode influenciar na formação de opinião,
segundo os respondentes.
Tabela 9 - Opinião
sobre
a
informação
da
imprensa
influenciar as respostas
Opinião
Influenciam
Não influenciam
Influenciam em partes
Frequência
absoluta (n)
Frequência
relativa (%)
7
9
5
33,3
42,9
23,8
A Tabela 9 mostra a distribuição de acordo com a pregunta sobre a
possibilidade de haver influência da imprensa na votação de quesitos de aumento
ou diminuição de pena. Nota-se que 42,9% da amostra acredita que as informações
obtidas através da imprensa não influenciam quesitos como aumento ou diminuição
da pena.
Tabela 10 - O que mais deve ser levado em conta, na opinião
dos jurados
Opinião
As provas produzidas
nos autos do processo
As informações produzidas
pela mídia
Ambas concorrem para
o resultado final
Frequência
absoluta (n)
Frequência
relativa (%)
7
33,3
0
0,0
14
66,7
Na Tabela 10 percebe-se que 66,7% acreditam que tanto as provas
produzidas nos autos do processo quanto as informações produzidas pela mídia
concorrem para o resultado final da sentença. Essa pergunta, juntamente com as
perguntas sobre a influência da mídia na votação dos quesitos (Tabela 9); sobre a
possibilidade de formação de opinião sem a influência da mídia (Tabela 8) e também
sobre a possibilidade de haver interferência da mídia na formação de opinião dos
indivíduos (Tabela 6), serviram de base para a construção do nosso trabalho.
Se estas respostas forem analisadas e confrontadas, perceber-se a
contradição que elas expressam, pois, num primeiro momento, 52,4% dos jurados
afirmaram que a mídia influencia a formação da opinião do público. Respondendo a
pergunta seguinte, sustentaram (47,6%) que é possível, em partes, formar opinião
sem influência da mídia, após, responderam (42,9%) que a opinião expressa pelos
meios de comunicação não interfere na votação de quesitos como aumento ou
diminuição de pena e, por último, responderam (66,7%) que as provas dos autos
devem ser somadas às informações obtidas pela mídia para que se decida pela
condenação ou absolvição.
Contudo, quando da elaboração das perguntas, sabíamos que, dificilmente,
algum jurado responderia diretamente que a mídia o influencia. Portanto, as
perguntas foram elaboradas no intuito de, implicitamente, investigar se realmente
existe a influência dos meios de comunicação sobre as decisões das pessoas que
compõem o Conselho de Sentença.
Por fim, cabe analisar as tabela 8, 9 e 10 conjuntamente com a pesquisa
realizada por Mário Rocha Lopes Filho, publicada no livro O Tribunal do Júri e
algumas variáveis potenciais de influência.
A parte da investigação que vamos comparar com a nossa pesquisa é a
etapa da realização de questionários com o Conselho de Sentença da 1ª Vara do
Júri de Porto Alegre, no que concerne à influência da mídia sobre a decisão dos
jurados.
Segundo o livro, responderam os jurados sobre a indagação acerca do fato de
que se mídia escrita ou falada, falando sobre a impunidade, poderia sugestionar o
entrevistado em relação ao julgamento. Conforme aduz Mário Rocha Lopes Filho:
“Respondendo a indagação, 77,8% dos jurados informaram não se deixarem
influenciar pelas notícias veiculadas pela mídia; o restante (4,6%) admitiu eventual
sugestionamento por parte dos meios de comunicação [...]”.49
Comparando as duas pesquisas, é possível concluir que há resultado diverso.
Acreditamos que na época em que foi realizada a pesquisa que está sendo utilizada
como comparação, qual seja, no ano de 2008, o contexto era diverso, não havia
tanto sensacionalismo na publicação de notícias. Ademais, os locais em que foram
realizadas se diferem, uma representa a opinião dos jurados da Vara do Júri de
Porto Alegre, tendo sido enviados 700 questionários com a resposta de 147, e a
outra representa a Vara do Júri da Comarca de Tenente Portela, na qual o número
de jurados não passa 72, e se obteve resposta de 22 jurados.
Portanto, com a velocidade, a quantidade e o sensacionalismo das
informações obtidas na atualidade, é possível perceber que a comparação entre as
duas pesquisas deve apresentar resultado diverso.
CONCLUSÃO
É notório o interesse do público por notícias relacionadas a crimes e à
violência; a mídia, conhecedora de tal interesse, explora os referidos assuntos de
maneira exacerbada, deturpando os fatos, ferindo a dignidade dos envolvidos e
49
LOPES FILHO, 2008, p. 127.
originando a condenação antecipada do suspeito acusado sem que haja o trânsito
em julgado da sentença condenatória.
No decorrer da presente pesquisa, percebe-se a tênue influência dos meios
de comunicação sobre o processo penal, sobre os julgamentos, sobre os jurados, e,
enfim, sobre a população como um todo. Embora o referido assunto seja de
conhecimento geral, quando analisado de forma minuciosa, traz à tona a capacidade
e o poder de tal veículo de informação.
A mídia, ao influenciar o povo mediante as notícias que publica,
principalmente sobre um fato criminoso, acaba por formar a opinião de pessoas que
poderão compor o corpo de jurados que irá julgar o caso noticiado, pondo em risco a
imparcialidade dos mesmos e, portanto, ferindo diretamente o princípio da
presunção da inocência. Havendo, assim, o confronto entre o princípio da presunção
da inocência e a liberdade de imprensa.
Então, em razão da opinião expressa na notícia ser considerada a verdade
sobre o caso, surge um clamor público pela condenação do suspeito na prática do
crime, exigindo-se a atuação rigorosa do direito penal, necessitando a sociedade de
uma resposta deste ramo do direito. Clama-se por direito penal máximo e por
direitos sociais mínimos na consecução do processo e também exige-se que o
direito penal seja a prima ratio, ou seja, que este ramo do direito resolva os
problemas sociais.
Difundem-se entre a população, portanto, opiniões e desejos de que ao
suposto criminoso seja aplicada uma pena rigorosa que o faça sofrer emocional e
fisicamente. E que pelo fato de ser “bandido” não deva ter seus direitos e garantias
fundamentais respeitadas. A sentença penal condenatória é decretada pela
sociedade, não havendo possibilidade de exercício do direito de defesa.
Assim, quando um fato criminoso é veiculado na imprensa, há um enorme
desrespeito à dignidade da pessoa do suspeito/réu, pois sua identidade é revelada,
sua privacidade é invadida e sua condenação é decretada.
A mídia tornou-se uma verdadeira forma de poder, veiculando notícias e
opiniões sensacionalistas com o objetivo de obter lucros. A escolha das notícias que
serão divulgadas e da forma como serão escritas, no intuito de manipular o leitor, é
feita no interesse das empresas da comunicação, em benefício de uma parcela
pequena da sociedade que se vale do sensacionalismo jornalístico para obter lucros
e desviar a atenção da sociedade para inúmeros outros problemas sociais.
Sendo assim, o presente trabalho conclui que muitas vezes, em decorrência
da influência que a mídia exerce sobre a opinião pública, a liberdade de imprensa
deve ceder frente aos direitos fundamentais que ela fere, para que nos jurados que
venham a julgar um determinado caso, não seja incutida uma opinião prévia e
nenhuma forma de pré-conceito; para que seja respeitado o princípio da presunção
da inocência, e, ainda, para que as sentenças proferidas pelo plenário do júri não
sejam oriundas de um juízo de valor produzido pela mídia.
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