PLANEJAMENTO COMO MECANISMO DE EFETIVAÇÃO DAS POLÍTICAS EDUCACIONAIS VOLTADA PARA PROJETO PEDAGÓGICO MORAES, Aline C. A. 1 SALERNO, Soraia K. 2 Resumo O trabalho discute o planejamento no campo da gestão escolar como elemento político importante no espaço de ideais democráticos em unidades de ensino. Objetiva-se como elemento chave a construção do projeto pedagógico em unidades escolares, considerando que o mesmo não é mero desejo social, mas sim algo a ser materializado ao longo das implicações históricas, políticas, econômicas e sociais. A pesquisa de cunho qualitativo é resultado de um projeto de pesquisa desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina, tendo como foco a rede estadual do Paraná, a partir da cidade de Londrina. Palavras-chave: Planejamento – Políticas Educacionais – Projeto Pedagógico. Introdução Partimos de um conceito basilar da administração como um processo racional de planejar, organizar, dirigir e controlar recursos humanos financeiros e informacionais, com vistas à realização clara de um objetivo. A racionalidade presente no conceito basilar dá suporte a diversas concepções na educação. No entanto, a concepção que nos apoiamos é a de uma educação emancipadora que de fato oportunize o acesso ao conhecimento historicamente produzido para classe majoritária. Este trabalho é fruto de pesquisa vinculada ao projeto desenvolvido na Universidade Estadual de Londrina. Destaca-se a importância do planejamento como base de uma ação profissionalizada à prática educacional que, pela indissociabilidade técnico-política, promove a participação, a transparência das decisões e regras do jogo. 1 Graduanda em Pedagogia pela Universidade Estadual de Londrina. Bolsista do Projeto de Iniciação Científica Gestão Administrativa e Planejamento Educacional. [email protected] 2 Docente da Universidade Estadual de Londrina. Doutora em Políticas Educacionais e Sistemas Educativos pela Unicamp. Coordenadora do Projeto de Pesquisa – Gestão Administrativa: planejamento educacional em questão (GAPEq). 2 A opção metodológica para este estudo pauta-se na pesquisa qualitativa, ressaltando o planejamento como instrumento relevante nas práticas administrativas e buscando a compreensão do planejamento educacional no atual paradigma difundido no campo educacional, frente à Teoria Geral da Administração, tendo claro que os dois, tanto o planejamento quanto a conexão com o contexto social são interdependentes. Educação como processo Administrativo O planejamento, instrumento administrativo de caráter político, é o recorte que fazemos a partir do campo da administração com vistas à efetivação de uma educação emancipadora no espaço das políticas educacionais, sendo trabalhado como meio para confluências de intencionalidades, configurador de identidade, e momento de pesquisa e reflexão intimamente ligado à avaliação das decisões. A função da avaliação é a de buscar alternativas que identifiquem correção de problemas, a transformação da realidade para o meio que almejamos. O planejamento como um mecanismo racional, que mencionamos no âmbito da administração, é o instrumento que possibilita a confluência de interesses e necessidades de um determinado coletivo, bem como a disseminação de políticas do sistema de ensino no qual a unidade escolar está jurisdicionada. Sendo assim, o planejamento educacional no campo da gestão escolar 3 comporta esta dupla função. Para Kaufman (1976), o planejamento é o enfoque sistemático para abordar os processos da educação. Outra definição que Padilha traz: Planejamento é um processo que se preocupa com ‘para onde ir’ e ‘quais maneiras adequadas de chegar lá’, tendo em vista a situação presente e possibilidades futuras, para que o desenvolvimento da educação atenda tanto as necessidades do desenvolvimento da sociedade, quanto às do individuo (COARACY apud PADILHA, 2003, p. 31). Também verbalizado por Gandim (1994, p.20): “Planejar é transformar a realidade na direção escolhida", "planejar é dar certeza e precisão à própria ação” planejar é realizar um conjunto orgânico de ações, proposto para aproximar uma realidade a um ideal" e "planejar é realizar o que é importante essencial e além disso sobreviver" [...]” , estas proposições só podem se tornar possíveis a partir de um direcionamento, ou seja, de algo que aponte 3 Os termos de Gestão e Administração da Educação são utilizados na literatura educacional ora como sinônimos, ora como termos distintos. Consideramos aqui Gestão da Educação como processo políticoadministrativo contextualizado, pelo qual a prática educativa é organizada, orientada e viabilizada. 3 caminhos que a escola deverá tomar. Devem, finalmente, assegurar dentro da gestão escolar a definição dos objetivos, a fixação de uma ordem prioritária de ações e progressões lógicas em execução ou em constante reajuste. A organização administrativa faz-se possível com direcionamentos apontados no planejamento, pois, de nada adianta uma gestão sem direcionamentos e confluências de necessidades do coletivo. A importância do planejar no contexto da gestão se dá pelo fato de ser uma ferramenta que vem assegurar as trajetórias pedagógicas, políticas e sociais do ambiente escolar, tal como uma base de sustentação. Para Popkewitz (1997, p 27), “a escola é um conceito que pressupõe estruturas administrativas do governo na sociedade civil e autoridade pública, para sua coordenação e avaliação necessitamos de um eixo, e este é o planejamento educacional”. Planejar é o primeiro passo para uma educação de qualidade, pois dinamiza toda a organização escolar a fim de efetivar intenções, assim como estruturar mudanças estratégicas da prática pedagógica do profissional da educação, proporcionando uma tomada de consciência do caráter político de sua atuação como formador de novas gerações. Assim, a prática pedagógica fundamentada no planejamento dinâmico e abrangente, com propostas claras, significativas, e geridas em uma base sólida, está ligada à organização curricular pela qual queremos atingir determinado fim, procurando adaptá-la a situações concretas e selecionando as quais solidificarão os objetivos mais adequados nas políticas educacionais. A ação voltada para o projeto pedagógico deve ser uma atividade consciente, fundamentada em opções político-pedagógicas, tendo como referências permanentes situações concretas, isto é como aspectos socioculturais, políticos e econômicos, pois entendemos educação como prática social. O planejamento, tanto no campo administrativo como no do ensino, é um ato pedagógico, podendo ou não se referir a uma visão errônea que o educando mantém, pois este não é neutro, mas carregado de marcas e características de uma dimensão política. As unidades escolares possuem a incumbência de elaborar e executar sua proposta pedagógica, definindo sua identidade. Para tanto, o aspecto do registro é importante para a composição da memória institucional, é a conotação do produto do planejamento, a apresentação sistematizada e justificada das decisões tomadas relativas à ação a ser executada (FERREIRA, 2003; PADILHA, 2OO3). O compromisso político requer o envolvimento do trabalho com a realidade ambientada ligada à participação no projeto educativo proposto. O planejamento, então, orienta a ação e a efetivação de um plano sistemático. Segundo Kaufman (1976, p.25) “Es um 4 processo de planificacion ,implanta y control que requiere la aplicacion de la dinâmica de la administracion educactiva sobre uma base ordenada e lógica”. Outro pressuposto fundamental é o início do processo humano que se dá em um contexto de valores acerca dos êxitos e fracassos, num processo de planejamento. Neste contexto, a escola é orientada a construir e definir sua identidade. O planejamento educacional é visto como parte da administração que traz à superfície intenções e mobilizações de recursos, pessoas objetivando metas e fins claros para os participantes deste processo. Planejamento como ferramenta política O Planejamento é reconhecido como ferramenta política em práticas administrativas que elaboram as relações sociais dos sujeitos, diferentemente dos teóricos que o defendem como mera relação de trabalho-trabalhador, deixando em falta a relação fazer e pensar. O planejamento é o componente do processo de administração e exerce papel principal perante o administrador com foco em intenções políticas, trabalho e recursos ao fim predeterminado. Sua implantação ou o seu desenvolvimento envolve a análise de cada uma das ações previstas, realinhando recursos quando possível. Nosso foco é tratar o planejamento como ferramenta resultante dos diálogos pedagógicos no âmbito da administração, algo que registra e diagnostica a realidade escolar, seja em nível de município ou estado. O quesito administrativo é algo em constante movimento pedagógico e efetua o papel da organização e compreensão do projeto pedagógico. O planejamento é a base da ação profissionalizante necessária à pratica políticoeducacional, pelo papel de deixar claras as intenções políticas envolvendo o processo de discussão, tomada de decisão e negociação de registro do mesmo. Desta forma, não pode ser visto como processo imóvel e neutro, mas sim como algo criativo e digno de mutações. Segundo Salerno (2007, p. 21): Um estudo sobre o planejamento educacional como ferramenta para conceber a manifestação dos que o executam e ou dele participam não pode partir de uma microvisão – a unidade escolar, focada num estabelecimento de ensino – mas deve reconhecer a rede de influências sociais, econômicas, políticas e culturais que participam do jogo da construção permanente do sistema educacional. 5 Isso significa que os elementos do planejamento estão recheados de implicações sociais, têm um significado genuinamente político. Por esta razão, é uma atividade de reflexão acerca das nossas opções e ações. Temos que pensar detidamente sobre o rumo dado a estas ações para não ficarmos reféns dos rumos preestabelecidos dos interesses dominantes da sociedade. A ação de planejar deve ser conduzida como uma atividade consciente, alicerçada em opções político-pedagógicas e tendo como referência permanentes situações didáticas concretas (isto é, a problemática social, econômica, política e cultural que envolve a escola, professores, gestores). Planejamento na unidade escolar voltado para Projeto Político Pedagógico O planejamento como ferramenta é o recurso da experiência humana, é analisado como reflexo de determinações políticas, econômicas e históricas que transferem a responsabilidade sobre sua elaboração do Estado para Escola. Este é voltado para cumprimento do projeto educativo, é administração a serviço do campo pedagógico, intrinsecamente ligados. A gestão da educação enquanto tomada de decisões se realiza a cada momento da vida escolar, quer planejando, construindo o projeto pedagógico, quer avaliando a realidade educacional que subsidiará esta construção. Os projetos pedagógicos ganham sua significação na articulação com um projeto mais amplo de sociedade que se deseja ter e pela qual se luta. “Na verdade nenhuma sociedade se organiza a partir da existência prévia de um sistema educativo, o que implicaria na tarefa de compreender certo perfil ou tipo de ser humano que, na seqüência, poria a sociedade em marcha. Pelo contrário, o sistema educativo se faz e se refaz no seio mesmo da experiência” (FREIRE, 1988, p. 47). Integrada com essa ideia não se pode esquecer que vivemos numa época de crise, de grandes transformações e, portanto, de crise na educação, fato que por si só já justificaria uma discussão sobre a construção do projeto político pedagógico. “Projeto é meta, mas torna concreto e gerador de movimento quando transposto para a compreensão das pessoas e por elas assumida” (FERREIRA, 2003, p. 112). O termo projeto implica sempre na memória algo além da referência, é um exercício prospectivo, uma vez que organizamos algo que está por vir, mas que tem como referência o caminho já percorrido e o ponto e as circunstâncias em que o processo se encontra. O projeto pedagógico possui uma intencionalidade explícita, visto que ele deve partir da discussão coletiva dos problemas da escola e da busca de soluções para os mesmos, a partir 6 do compartilhamento de ações pelos vários segmentos escolares. Construído contando com a participação coletiva, tornando-o um instrumento realmente democrático, rompendo com estruturas cristalizadas e fragmentadas. Corresponde a um posicionamento da escola frente ao horizonte e às possibilidades que ela pode alcançar, a partir do envolvimento dos seus autores. A convergência e a fusão de ideias... “se fará ao se entender e ser proposto uma organização que se funda no entendimento compartilhado dos professores, dos alunos e demais interessados na educação” (GADOTTI; ROMÃO, 1997, p. 42). Além de ser um instrumento democrático, um projeto é sempre um empreendimento, organização de ações em função de necessidades e desejos de sujeitos concretos. É um vir a ser. O projeto tem por objetivo principal, articular o trabalho de toda a escola, buscando transformações da realidade escolar. Não deve ser visto apenas como burocracia escolar, mas como proposta do exercício democrático e planejatório a ser cumprido; ele propõe o exercício da democracia, por meio da participação da comunidade escolar, bem como o processo da autonomia da escola, que quando conquistada possui flexibilidade de definir os seus objetivos, levando em conta suas operacionalidades. Neste sentido, o projeto pedagógico produzido pelo planejamento é um mecanismo considerado como um momento de repensar a escola, pois o processo é a forma de conduzir-se para o futuro, mudando o presente. Vemos que o papel do planejamento é o de emergir das intenções políticas, elevando o perfil organizacional do plano. Outro fator refere-se ao planejamento que deve ser priorizado, pelo seu caráter político e o qual deve ascender aos mecanismos reguladores, fiscalizadores do ambiente escolar e do sistema de ensino, pois, caso contrário, teremos um enunciado vazio com pouca ou nenhuma correspondência com o que de fato ocorre, ou seja, uma prática meramente burocrática, formalista, que não contribui para a transformação da realidade. Assim, poderemos traduzir planos em ações concretas, pois um plano deve ser elaborado a partir de bases no quadro geral, pontuado por seus limites de recursos, objetivos, possibilidades e prioridades. Outro mecanismo necessário é o de avaliação e readaptação. Nenhum planejador pode prever precisamente seus ônus e bônus, mas pode, com frequência, submeter seu plano a uma readaptação contínua, na medida em que for necessário. Para que este seja reajustado, é preciso dispor de meios consideráveis, capazes de permitir o acompanhamento permanente de sua execução, progressos e fracassos. Um primeiro pode estar em execução e constante reajuste, enquanto que já se começa a estabelecer um novo. O rendimento de um sistema está diretamente ligado a sua eficiência interna, daí a avaliação do que se põe em prática. 7 Em síntese, o planejador, administrador ou gestor terá sempre que levar em conta dados de uma investigação rigorosa do contexto escolar, sua realidade, perfil potencializador e necessidades, operacionalizando e racionalizando cada vez mais suas metas, assim como a regulação do planejamento pontuado no projeto pedagógico, podendo adotar novos métodos que permeiem a melhora dos resultados obtidos, que esteja para além dos padrões vigentes, desenvolvidos pelas organizações burocratas. Perspectivas para a efetivação do Projeto Político Pedagógico Uma perspectiva para a escola efetuar seu projeto pedagógico se identifica no plano, um guia de orientação contendo as diretrizes e meios de realização do trabalho escolar, demandando qualidade técnica e política. Sua função prática é orientar, lembrando sempre que o mesmo não pode ser um documento rígido e absoluto, levando em conta que a escola está em constante movimento. Para atender às finalidades do projeto pedagógico, a escola tem que estar alinhada em fins educacionais, rompendo com estruturas engessadas tradicionais nas quais os meios se sobressaem aos fins. É necessário que as relações internas e interpessoais sejam coerentes com uma filosofia educacional emancipadora. Quanto à sua prática, temos que evidenciar opções claras na direção e superação de problemas que possam acontecer no decorrer do movimento escolar, assegurando a racionalização, organização e coordenação do trabalho, de modo a possibilitar a realização de um ensino efetivo de qualidade, evitando a improvisação e rotina. O projeto materializa-se por diferentes meios e pessoas, pelo trabalho da direção, da secretária, do porteiro, do supervisor, do coordenador, dos pais, dos estudantes, dos professores, entre outros. Porém, chamamos a atenção para as atividades de ensino e de aprendizagem, desenvolvidas pelo coletivo escolar. Essa aproximação do projeto com a atividade de ensino e aprendizagem necessita estar contextualizada socialmente no espaço escolar e, no nosso entendimento, pressupõe o movimento dos projetos pedagógicos. De outro modo, os projetos configurados institucionalmente como atividade não apenas legitimam a participação coletiva como instauram uma nova ordem teórico-metodológica na organização do trabalho pedagógico. Isto é uma lógica de trabalho na qual se considera uma natureza coletiva e concreta, com a criação e utilização de instrumentos voltados para a efetivação do trabalho escolar. Assim, quebra-se a cultura de organização e produção do trabalho educacional inspirada na lógica taylorista/fordista, cunhada pela fragmentação do trabalho. 8 Para que isso aconteça, é indispensável a formulação de um projeto de baixo para cima, de perfil profundamente democrático, com a participação de todos, na discussão das raízes da gestão escolar, e, assim, desaguar num amplo e definitivo projeto pedagógico flexível e de vanguarda que trabalhe com sujeitos e o meio no qual estão inseridos, obtendo a participação e o envolvimento coletivo. Outra questão que é necessário pontuar é de que o projeto seja efetivado por meio de quebra de paradigmas e não por idiossincrasias, desenvolvendo-se na horizontalidade, superando as relações de verticalidade concebidas pela burocracia. Por maior complexidade que envolva a organização escolar, é imprescindível ter uma interação entre gestores, professores e alunos, obtendo um suporte estrutural cuja dinâmica concretiza o fenômeno educativo com instrumentos de ação de ordem objetiva, coerente e flexível. REFERÊNCIAS BORDIGNON, G.; GRACINDO, R. V. Gestão da educação: município e escola. In: FERREIRA, N. S.; AGUIAR, M. A. (Org.). Gestão da Educação: impasses, perspectivas e compromissos. São Paulo: Cortez, 2001. DOURADO, L. F. A escolha de dirigentes escolares: Políticas e gestão da educação no Brasil. In: FERREIRA, N. S. (Org.). Gestão democrática da Educação: atuais tendências, novos desafios. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2006. FERREIRA, N. S. C. A gestão da educação e as políticas de formação de profissionais de educação: desafios e compromissos. In: ______. Gestão democrática da Educação. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2003. FREIRE, P. Pedagogia do oprimido. São Paulo: Summus, 1988. GADOTTI, M. Pressupostos do projeto pedagógico. In: Conferência Nacional de Educação para Todos, v.1. Anais. Brasília: MEC, 1994. ______.; ROMÃO, J. E. Autonomia da escola: princípios e propostas. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1997. GANDIM, D. Planejamento como prática educativa. 7. ed. São Paulo: Loyola, 1994. PADILHA, P. R. Planejamento dialógico: como construir o projeto político pedagógico da escola. 4.ed. São Paulo: Cortez, 2003. 9 POPKEWITZ, T. S. Reforma Educacional: uma política sociológica – poder e conhecimento em Educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. KAUFMAN, R. A. Planificacíon de sistemas educativos. México: Trillas, 1990. SALERNO, S. K. Administração educacional e escolar: planejamento, política e gestão. Campinas: Alínea, 2007.