O consumo retrô: valorizando o passado, evocando emoções. Vânia Braz de Oliveira [email protected] Resumo O presente trabalho traz referências sobre a evolução do consumo e sua significação em uma nova sociedade hipermoderna, em que os bens consumíveis carregam o intangível e refletem a nostalgia do consumidor. Esta nostalgia é percebida pelo consumo regressivo, no qual marcas e produtos se utilizam do imaginário associado ao produto para vender, focalizando valores e emoções trazidas de outras épocas. O passado se porta como detentor de um significado emocional, já que o antigo ilustra os desejos presentes do consumidor. Assim, parte-se da marca de refrigerante Itubaína objetivando verificar quais são as associações referentes aos desejos e emoções do consumidor, quando este se dispõe a consumir um produto com características retrô. Palavras-chave: Consumo. Significados. Nostalgia. Retrô. CONSUMPTION RETRO: VALUING THE PAST, EVOKING EMOTIONS. Vânia Braz de Oliveira [email protected] Abstract This work provides references on the evolution of consumption and its meaning in a new hypermodern society, in which consumables carry the intangible and reflect nostalgia for the consumer. This nostalgia is perceived by the consumer regressive, in which brands and products make use of imagery associated with the product to sell, focusing on values and emotions brought from other eras. The past is the door as having emotional significance, since the former illustrates the present desires of the consumer. Therefore, we start from the soft drink brand Itubaína order to verify the associations which are related to emotions and desires of the consumer, when it has to consume a product with retro features. Keywords: Consumption. Meanings. Nostalgia. Retro. Introdução O consumo está inserido em nosso dia-a-dia há centenas de anos e diz-se que é uma atividade presente em toda e qualquer sociedade humana, mas que se altera em cada processo histórico. E nesta atividade está presente a figura do consumidor, principal personagem social, que ganha destaque desde o século XVI. O consumidor, em seu início, era visto como fruto de uma automatização do sistema de produção, no qual as mudanças passaram a ser percebidas sobre a cultura material, o que afetava tanto a quantidade quanto a qualidade e modalidade dos itens disponíveis. Depois, surgiram mercadorias trazendo consumo não só por necessidade. Deixou-se o consumo familiar ou de grupo doméstico para um consumo individualista, ou seja, de um lado famílias que produziam para o consumo de suas próprias necessidades física e social e de outro, grupos que faziam suas escolhas (roupas, lazer, alimentos) e definiam o que deveria ser consumido ou proibido por segmentos sociais. Havia certa dependência entre status e estilo de vida. A posição social definia o estilo de vida, independente da renda. Mas essa relação entre status e estilo de vida desaparece na sociedade contemporânea individualista e de mercadoria. Nesta sociedade, há ausência de grupos de referência, trazendo certa liberdade de escolha: o consumo de mercadorias deixa de ser algo fiel às necessidades e passa efetivamente a ter outra dimensão. Finalmente, como não existem grupos de referências nem regras que decidam por e para nós, os grupos sociais são indiferenciados entre si em termos de consumo. Todos somos consumidores. Desde que alguém tenha dinheiro para adquirir o bem desejado não há o que impeça de fazê-lo. (BARBOSA, 2004, p.22) As necessidades passam a ser indicadores de uma individualidade e liberdade de escolha, diferente do consumo determinado pelo grupo de status. Esse direito de escolha possibilitou o espelhamento de uma cultura material por meio do consumo de objetos que refletiam a identidade e o estilo de vida pelo significado atribuído ao objeto consumido. Tem-se, então, o consumo de mercadorias como signos culturais, buscando mais a gratificação pelo significado do objeto do que pela simples satisfação das necessidades. Essa gratificação é evocada pelos estímulos através da imaginação, memória, lembranças agradáveis associadas aos objetos. Esses objetos transportam vivências, fazendo com que a expectativa de ter ou reviver essas lembranças seja materializada. Assim, surge o que pode ser chamado de consumo retrô, ou seja, o consumo de objetos e suas associações, ligando-o a um passado que merece ser revivido, minimizando o objeto em si e valorizando suas associações, tornando-as o diferencial deste produto a ser consumido. Isto é percebido neste artigo pelo objeto da pesquisa realizada com consumidores do refrigerante Itubaína, os quais “devoram” o passado em pequenos goles. O material coletado junto a consumidores do produto durante alguns dias do mês de junho e julho de 2012 permite uma análise do significado simbólico atribuído à marca de refrigerante e ao uso da memória como valor emotivo e mercadológico. De produtores para consumidores de objetos Passou-se de uma sociedade de produtores para uma sociedade de consumo. O consumo é relatado em culturas milenares, ou seja, tem raízes antigas e faz parte de todas as formas de vida, modificando valores e atitudes. Percorreu-se um período baseado na simples troca de bens e mercadorias, que acelerou o surgimento dos mercados locais. Segundo Bauman (2008, p.72-73), em grande parte da história moderna tinha-se o componente masculino como produtor e soldado e o feminino como fornecedor de serviço. O corpo do trabalhador ou soldado era o que contava, já que o espírito devia ser colocado de lado e silenciado, treinado para seu habitat natural, ou seja, o campo de batalha e o chão de fábrica. Muitos dos que foram bem sucedidos na acumulação de talento e força começaram a trocar o que tinham em excesso por outras formas de trabalho. Viu-se, então, o aparecimento de uma classe de proprietário e uma outra de trabalhadores. Neste momento, tem-se ambos os lados: os ricos e os trabalhadores prontos para consumir. O século XIX passa a ser focado na produção e a busca pela melhoria do trabalho. No grupo de novos consumidores depara-se com pessoas possuidoras de um excedente de dinheiro para suprir não somente suas necessidades básicas, mas também seus desejos. Com o trabalho assalariado, o consumo ilimitado que era algo pertencente apenas à classe dominante ou ociosa, começa a desaparecer. Camponeses transformaram-se em trabalhadores assalariados e disponíveis a uma burguesia. Com essa transformação, no início do século XX, surge a necessidade de um verbete curto sobre o termo „consumo‟, colocando-o como „desperdício‟ no sentido físico. Observa-se um consumo ostensivo, focalizado na exibição de riqueza, que demonstrava solidez e durabilidade. Ao acumular riqueza, a classe ociosa desenvolve suas funções e estruturas, surgindo dentro de si um sistema de status. Joias e metais nobres não se destruíam com o tempo, representando a permanência e confiabilidade contínua de sua posição social e poder de consumo. O padrão do gasto aceito pela comunidade ou pela classe a que o indivíduo pertence determina, em grande extensão, o seu padrão de vida. Isso se efetua diretamente pelo apelo ao senso comum quanto ao que é direito e bom, através do seu discernimento e assimilação do esquema de vida a que pertence; mas se efetua também, indiretamente, pela insistência popular em conformidade com a escala de gastos considerada como apropriada, sob pena de desprezo e ostracismo. Aceitar e manter o padrão de vida em voga é tão agradável como prático e, em geral indispensável ao conforto pessoa e ao sucesso da vida. (VEBLEN, 1988, p.53) A riqueza e o status se manifestavam através do consumo e do lazer. O trabalho era marcado como forma de inferioridade, por outro lado, o consumo improdutivo de bens era visto como forma de honra, notado pela vestimenta e pela alimentação. Pode-se dizer que, em seu início, a lógica do consumo estava vinculada à função exercida na comunidade, aos objetos que facilitam seu trabalho e a relação de poder e, posteriormente, ao sentido de aquisição de bens produzidos e apenas consumidos por aqueles que podiam comprá-los. Por muito tempo, produzia-se para que poucos consumissem produtos de boa qualidade e de sofisticada forma de produção. O consumo passa a superar o ócio, os meios de comunicação e a mobilidade da população expõe o indivíduo à observação de muitas pessoas e sua reputação é vista pela exibição dos bens: “O único meio prático de impressionar esses observadores não simpatizantes de nossa vida cotidiana é a demonstração interrupta de nossa capacidade de pagar”. (VEBLEN, 1988, p.42). Era este poder de pagar que mostrava um acúmulo de bens de consumo propício para atestar o gosto e a distinção social. Com a industrialização e a oferta de mais produtos, além de uma população, agora, assalariada, via-se a possibilidade de acesso a estes produtos e a capacidade de poder pagar por eles. A consolidação dessa industrialização proporcionou, no Século XX, uma amplitude de consumo por diversos objetos constituindo o que veio ase chamar “sociedade do consumo”. Começou-se a ver o indivíduo efetivamente consumidor em função da automatização do sistema de produção, em que o consumo, segundo Bauman (2008,p.41) “é basicamente uma característica e uma ocupação dos seres humanos como indivíduos e o consumismo é algo atribuído à sociedade”. E, é nessa sociedade que os objetos passam a ter um simbolismo exacerbado, cujo consumo não é apenas do objeto em si, mas de signos, fazendo com que os objetos deixem de encontrar-se em função das necessidades básicas. Para Baudrillard (1995, p.15) os objetos se mostram através das características de conforto e bem-estar, passando a dominar o homem, retirasse-lhes as questões existenciais para transformá-las em relações associativas e opressivas de signos-objetos, fazendo com que o TER seja mais importante que o SER, além do quê, antes, tinha-se os homens rodeados por outros homens e hoje tem-se os homens cercados por objetos. Afora seu caráter utilitário e valor comercial, estes objetos passam a carregar e comunicar um significado cultural. Significado importante para o indivíduo que se vê, segundo Bauman (2008, p.134), em uma “tirania do momento”, quando o descarte não é apenas do objeto, mas também das relações sociais. Deste modo, o significado se torna argumento comercial e ferramentas mercadológicas para redescobrir sensações felizes experimentadas em um passado mais distante na sociedade hipermoderna, fazendo surgir a cultura de consumo retrô. O simbolismo dos bens consumidos O consumo deve ser visto, então, como algo que está além da esfera econômica, mas que parte para uma significação cultural, uma vez que “as mercadorias adquirem importância como sinais, como símbolos e não tão-somente pela satisfação intrínseca que pode trazer” (CAMPBELL, 2001, 75-76). Produtos e serviços são revestidos de significados culturais relativos ao gosto e ao estilo e a compra e exibição destes objetos ou serviços podem ter origem no desejo de transmitir uma mensagem. Para Baudrillard (1995, p.59), “a lógica não é da apropriação individual do valor do uso dos bens e serviços (...), mas a lógica da produção e da manipulação dos significados sociais”. Para Canclini (2006, p.71), os desejos se tornam demandas e atos regulados pelos significados culturais. Esta lógica de manipulação dos significados se configura em um momento de concentração industrial em que há um aumento de bens e uma eclosão ilimitada de necessidades. Os bens são vistos por McCraken (2003, p.104) como uma oportunidade “para fazer a cultura material (...) e são simultaneamente as criaturas e os criadores do mundo culturalmente constituído”. Já Brandini (2007, p. 156) diz que “o indivíduo não consome a materialidade do produto (...), mas os significados que, por intermédio do produto, geram um conluio social em torno de valores compartilhados pela sociedade capitalista”. Assim, os objetos deixam de ser privilégio de alguns e passam a ser aspirações da maioria. McCraken (2003), diz que da produção até o consumidor final existe um fluxo de significados culturais sendo transferidos constantemente. Figura 1 – Transferência de Significados na Sociedade de Consumo Fonte: McCraken (2003) Os bens de consumo são vistos, então, como trocas simbólicas movimentadas pelos desejos de satisfazer as necessidades e a ânsia do querer. Lipovetsky (2007a, p.174) afirma que o consumo é sempre visto como simbólico, pois para o autor, os bens materiais também são signos. Todo indivíduo é igual perante o objeto que consome em relação ao seu uso, mas diante dos objetos enquanto signos e diferenças encontram-se profundamente hierarquizados. O Objeto, logo que introduzido na sociedade, torna-se um „objeto social‟ mas, deixa de ser um produto em série quando ganha os braços do consumidor e uma nova significação. A mídia tem grande parcela de contribuição na formação desta sociedade que busca o consumo pelos seus significados, fazendo com que novas formas de comportamento e necessidades comecem a surgir, motivados, principalmente, pela publicidade. E para McCracken (2003, p.99), “o significado está interruptamente fluindo das e em direção às suas diversas localizações no mundo social, com a ajuda de esforços individuais e coletivos de designers, produtores, publicitários e consumidores.” Os profissionais de mídia trabalham com produtos que trazem a simbologia afetiva, dado que os “indivíduos procuram redescobrir as impressões de sua infância através da oferta do mercado; eles jogam sem inibição com o passado, surfam nas marcas do passado e de todas as idades da vida”, segundo Lipovetsky (2007a, p.74). O mundo e o bem precisam ser encarados como compartilhando uma harmonia especial. Precisam ser vistos como “fundidos”. Quando esta “igualdade” é vislumbrada, através de uma ou muitas exposições de estímulos, o processo de transferência tomou lugar. O significado transportou-se do mundo culturalmente constituído para o bem de consumo. Este bem agora “figura como” um significado cultural de cuja carga estava previamente imaculado. (McCRACKEN, 2003, p.108). Os publicitários fazem a transferência de significado do mundo cultural e historicamente constituído para os bens de consumo. Por eles, os objetos carregam riqueza, variedade e versatilidade de significado. Para Randazzo (1997, p. 39), é com a publicidade que o consumidor aprende a associar o produto com seus benefícios emocionais. O consumo retro e a afetividade Na sociedade dominada pelas peças publicitárias observa-se o consumo e a abundância seguida do imediatismo, há a multiplicação e a substituição dos objetos, pois “vivemos o tempo dos objetos: quero dizer que existimos segundo seu ritmo e em conformidade com a sua sucessão permanente” (BAUDRILLARD, 1995, p. 15). Ao mesmo tempo em que em buscamos a „criança‟ existente quando o homem se torna responsável pelo mundo onde há a liberdade e a possibilidade do prazer. Mostrando-se pronto para revivenciar o passado. Isto pode ser visto na reportagem da Revista Consumidor, com o título “Modernidade retrô”, na qual se observa a busca pela afetividade instalada no passado. O salão, idealizado pelo gerente Rodrigo Lima e pelo proprietário Rogério Santos, aproveita o conceito “modernoso” da Rua Augusta, sentido centro, para explorar o clima vivido na região. Rogério era cliente de Rodrigo há mais de 15 anos, mas no lado da região Jardins da Rua Augusta, local em que os quatro cabeleireiros do Retro Hair trabalhavam antes. Mas não havia aquela aura dos anos 50 do Baixo Augusta: era um salão como outro qualquer. A decoração do Retrô Hair Concept foi estudada para que o cliente pudesse sentir essa aura no ar. E são os móveis, como a escrivaninha que virou mesa da recepção, o sofá que fica no bar estilizado, que o salão oferece o ambiente de „camarim‟ em que cada cliente é atendido, fazendo com que ele recorde, por exemplo, um móvel que possuía em sua infância ou de algo aconchegante na casa de sua avó. Até a geladeira e a estufa de esterilização são antigas. (http://consumidormoderno.uol.com.br/edic-o-145-marco2010/modernidade-retro) Esta valorização do passado é vista por Lipovetsky (2004, p.88), como um fenômeno hipermoderno, cuja volta ao passado ilustra o advento do consumo-mundo e de um consumidor que busca menos status que os estímulos permanentes, as emoções instantâneas, as atividades recreativas e, se observa ainda, no sucesso de objetos antigos, do retrô, do vintage, dos produtos rotulados com um “legítimo” ou “autêntico”, que despertam a nostalgia. Para Faggiani (2006, p.79) esta busca pelo retrô nada mais é que a atualização e/ou modernização de um estilo, substituindo seus componentes por outros mais recentes e eficazes. O autor conceitua ainda o retrô como sendo algo inspirado nas características formais do estilo do passado, mas com processos de fabricação atuais, indicando nos objetos características do passado. Alguns buscam nestes objetos antigos parecer ser “velhos jovens” que recusam a crescer, vivendo em um prolongamento da infância ou da adolescência. Não se trata apenas de conforto material, mas de uma compra por emoções que evocam o passado, juntando o valor emotivo ligado ao sentimento nostálgico. Pensa-se na cultura material como “um conjunto de produtos produzidos e utilizados por um grupo social préestabelecido” (DENIS apud FAGGIANI, 2006, p.75), de modo que, nestes produtos tem-se a função simbólica e a afetiva. Estes produtos também podem ser vistos como associados a uma experiência pessoal, vivências e memórias, caracterizando a existência do valor simbólico. O passado passa a ser um local bom de ser rememorado, um lugar para visitação, mas não para viver. E o marketing faz uso disto trazendo o passado para a tecnologia do presente. Embora a mania do antigo comporte uma dimensão nostálgica, ela também ilustra a intensificação dos desejos individualistas de qualidade de vida, uma cultura hipermoderna do bem-estar indissociável de critérios mais qualitativos e sensoriais, mais estéticos e culturais. Subjacentes ao gosto pelo passado, avançam as paixões hiperindividualistas de conforto recreativo e conforto existencial (...) (SÈZE apud LIPOVETSKY, 2004, p.91). Já que a vida cotidiana, embora expresse o gosto pelo passado, é, mais do que nunca, regida (no lazer, na higiene, na saúde, no consumo, na educação) pela ordem cambiante do presente. Os produtos comestíveis exibem “autenticidade”, mas são comercializados segundo técnicas comerciais de massa, adaptados aos gostos contemporâneos, fabricados em função de normas atuais de higiene e segurança. Reformam-se os imóveis antigos dos centros das cidades, mas dotando-os de todo o conforto moderno. (LIPOVETSKY, 2004, p.89). Vive-se um passado renovado em um presente que obedece ao gosto, prazeres e emoções de nossa época, sempre apegados a alguma coisa do passado que evoca lembranças. Segundo Norman (2008, p.68), os objetos revelam recordações e associações especiais e, ainda, para o autor o apego não é com o objeto em si, mas com o relacionamento, o significado e o sentimento que o representa. Hoje observa-se várias marcas e produtos que fazem uso desta volta ao passado, tais como Brastemp, Nestlé, Granado, Fiat, Itubaína. Segundo o gerente geral de design e inovação da Whirlpool Latin America, Mário Fioretti1, para a linha dos produtos Brastemp Retrô, foram incluídos detalhes que ativassem a memória do consumidor, mas com toda a tecnologia atual de que precisa para as tarefas diárias e seu conforto. Figura 2 – Geladeira Brastemp em design retrô. Fonte: www.bdxpert.com 1 Entrevista retirada da matéria “Whirlpool lança produtos com design retrô e alta tecnologia”, da BDexpert.com: branding + design, postada em 17 de janeiro de 2011. Figura 3 – Itubaína Retrô Fonte: www.itubainaradioretro.com.br/ Retromania Itubaína O objeto desta pesquisa foi o refrigerante Itubaína, presente na mesa dos brasileiros desde 1954, mas que voltou com uma nova roupagem, inspirada nas características formais do estilo do passado, contando com os processos de fabricação atuais. Figura 4 – Itubaína Retrô Fonte: www.itubainaradioretro.com.br/ A Itubaína vem trabalhando sua imagem inspirada nos anos de 1950 em várias ações, como, por exemplo, a do aniversário da cidade de São Paulo, quando colocou promotoras-retrô no Mercado Municipal de São Paulo, distribuindo cupcakes. A escolha por um refrigerante também foi determinada pelo consumo deste produto pelos brasileiros. Segundo pesquisa realizada em 2001 pela ABIR2, durante os últimos 5 anos as bebidas não alcoólicas ganharam espaço, subindo de 51,6% para 53,2% de participação relativamente a todas as bebidas vendidas no país. Isto equivale a um incremento de 9 bilhões de litros e uma elevação do consumo per capita de 168,4 litros em 2005 para 206,7 litros ao ano, em 2010, sendo „refrigerante‟ a bebida de maior consumo. O interior de São Paulo representa 15,4% do consumo nacional e vem apresentando, também, um crescimento anual e médio nos últimos 5 anos. Conforme a pesquisa, em algumas cidades do interior, o destaque vai para o consumo de refrigerantes carbonatados sabor Tubaínas. Focados, então, no consumo e na vivência de um passado renovado, no saudosismo e na acrescente oferta de produtos retrô, além dos pontos de entretenimento que fazem uso desta volta ao passado, escolheu-se um bar na cidade de São José dos Campos, interior de São Paulo, para fazer parte da pesquisa com os consumidores do refrigerante da marca „Itubaína‟. A escolha do Jukebox, um bar temático com foco no rock'n roll da década de 1950, se deu pela sua ênfase na mídia regional e suas características retrô. As pesquisas com os consumidores foi levada a cabo entre os dias 14 de junho e 6 de julho de 2012, compreendendo as quartas e quintas-feiras, enfocando o público frequentador do bar, com idade entre 18 e 40 anos e consumidor do produto, totalizando 50 pessoas. O objetivo da pesquisa foi verificar quais imagens e sentimentos eram trazidos ao consumir pelo refrigerante Itubaína Retrô, além de verificar qual imagem melhor comunica o sentimento associado ao refrigerante. No primeiro momento, perguntou-se aos frequentadores do bar sobre quais imagens vinham-lhe à mente quando pensava no refrigerante Itubaína. Depois os consumidores eram indagados sobre quais sentimentos eram trazidos pelo refrigerante. Então, recolheu-se as informações e estruturou-se uma grade de emoções. 2 ABIR (Associação Brasileira da Indústria de Refrigerantes e Bebidas não alcoólicas). Com sede em Brasília, Distrito Federal, a entidade reúne várias empresas fabricantes de refrigerantes, sucos, chás e mates, isotônicos, energéticos, águas minerais e água de coco com instalações industriais no Brasil. Juntas, essas empresas representam 75% da produção nacional do setor. Tabela 1 – Associações entre produto e imagens arquetípicas Emoções e Sentimentos Encontro com amigos Cidade natal Tampinhas de lata Natal em família Infância Férias de verão Garrafa de vidro Crescimento Almoço na praia Avós Almoço com macarrão Pão com mortadela Feira Livre Almoço de domingo Carinho Pin up Fonte: Pesquisa realizada no Bar Juckebox Festinha Infantil Cidade do interior Vestido de bolinha Natal Moedas Doces de abóbora em formato de coração Reunião em família Pastel Salsicha enlatada Escola Brincadeiras de rua Bar antigo Emocionante Laranja Alegria Simplicidade Com as informações recolhidas criou-se uma relação de arquétipos emocionais ligados ao produto, agrupando-os por afinidade e identificando-os com cada grupo. Para isto utilizou-se a relação de 360 emoções contidas nos 26 grupos criados por Martins (1999, p.185-195) a fim de melhor classificar os arquetípicos emocionais e o sentimento relativo ao produto. Partiu-se para uma segunda etapa da pesquisa na qual, ao agrupar e identificar os arquétipos emocionais, determinou-se imagens para melhor representá-los. Os arquétipos definidos segundo resposta dos consumidores foram: Lúdico, Raiz, Cenas do cotidiano e Socialização. Tabela 2 – Arquétipos emocionais Lúdico Infância Festinha Infantil Vestido de bolinha Moedas Doces de abóbora em formato de coração Brincadeiras de rua Socialização Encontro com amigos Férias de verão Feira Livre Alegria Natal Raiz Cidade natal Avós Laranja Carinho Cidade do interior Cenas/Cotidiano Natal em família Tampinhas de lata Garrafa de vidro Crescimento Almoço na praia Bar antigo Simplicidade Almoço com macarrão Pastel de feira Almoço de domingo Pin up Pão com mortadela Escola Emocionante Fonte: Dados relativos ao questionário aplicado pelo pesquisador. Assim utilizou-se as seguintes imagens: Figura 3 – Imagem das emoções (lúdico, raiz, socialização e cenas do cotidiano) Depois examinou-se a partir de quais imagens ele consumiria o refrigerante, o que possibilitou a seleção dos arquétipos preferenciais do consumidor. Assim relacionando-os com as imagens escolhidas e sua coerência com a percepção emocional descrita anteriormente por estes mesmos consumidores. Ao analisar as respostas, chegou-se ao grupo das cenas do cotidiano, do lúdico, seguido pelos da socialização e o da raiz. Constata-se que a simbologia atribuída ao produto está associada às emoções relatadas. Há por parte destes consumidores um resgate das lembranças do almoço de domingo e do pão com mortadela, da infância e suas brincadeiras de rua, dos encontros com amigos, do almoço em família, da alegria, enfim da nostalgia. Considerações Finais Estamos na época em que marcas e produtos buscam um diferencial, empresas e produtos estão „falando‟ a língua do saudosismo, pois se comunicam com seus consumidores através do passado, já que este muitas vezes é reconfortante. Marcas carregam o simbolismo para comunicar remetendo-se ao passado. A visão emocional do produto liga-os ao passado de forma renovada através de rótulos, embalagens e peças publicitárias. Hoje para um consumidor repleto de informação e com potencialidade de interação frenética, a temporalização ganha espaço para „arrebanhar‟ os consumidores através do saudosismo seguro. A Itubaína Retrô traz o saudosismo de reviver e “comprar” o passado, de modo que o valor emotivo é visto como ferramenta mercadológica, satisfazendo o cliente hipermoderno, proporcionando a ele emoções autênticas, já que “as brechas emocionais no mercado são as oportunidades mais ricas a serem exploradas” (MARTINS, 1999, p.197), e “procura-se menos celebrar o produto que inovar, comover, rejuvenescer a imagem [...], o objetivo não é mais dirigir mecânica ou psicologicamente um consumidor rebaixado á condição de objeto, mas criar uma proximidade emocional e um laço de cumplicidade” (LIPOVETSKY, 2007b, p.182) Referências Bibliográficas Associação Brasileira da Indústria de refrigerantes e bebidas não alcoólicas. Dados de Mercado 2011 – pesquisas 2011. Disponível em: <http://abir.org.br/tags/pesquisas2011/> Acessado em: 20 de junho de 2012. BARBOSA, Lívia. Sociedade de consumo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004. BAUDRILLARD, Jean. A Sociedade de Consumo. Lisboa: edições 70, 1995. 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