FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS DA UNL MESTRADO EM COMUNICAÇÃO, MEDIA E JUSTIÇA SEMINÁRIO DIREITO DA COMUNICAÇÃO Tema: “A Protecção de dados pessoais em Portugal: a Doutrina da Comissão Nacional de Protecção de Dados” (Amadeu Sousa Cardoso, 1917, Humorismo/Futurismo) “Todos os problemas da nossa época são problemas de ficção científica e conduzem-nos a três constantes: o ser humano, a máquina e as relações entre eles” Ray Bradbury Docente: Prof. Doutora Maria Eduarda Gonçalves Mestrandas: Adelina Barradas de Oliveira e Susana de Carvalho Amador ÍNDICE CAPÍTULO I – Considerações Prévias CAPÍTULO II – O conceito de dado pessoal e o direito à “privacy” §2.1. Breve esboço histórico §2.2. O conceito de dado pessoal §2.3. O Direito à reserva sobre a vida privada CAPÍTULO III – O Quadro Constitucional da Protecção de Dados Pessoais §3.1. O comando constitucional §3.2. Os contornos da revisão Constitucional de 1997 CAPÍTULO IV – O Percurso Nacional: caminho garantístico ou de vanguarda? §4.1. A Lei 67/98 de 26 de Outubro CAPÍTULO V – A Comissão Nacional de Protecção de Dados entre a vanguarda da Protecção dos Direitos Humanos, a Segurança jurídica e a liberdade de circulação §5.1. A CNPD e o seu lugar na Constituição §5.2. Da sua Independência §5.3. Da actividade e desafios futuros VI – O ADN e os Microchips: Ameaças ou Oportunidades? §6.1. ADN: O Eu de cada um §6.2. O Microchip de matricula e o espião “inside” §6.2.1. Enquadramento legal Nacional e Europeu §6.2.2. A Experiência comparada §6.2.3. As posições e visões dos Partidos Políticos VII – Conclusão Bibliografia Anexos 2 I – Considerações Prévias “A computer is not a simply machine in a fixed position in a buiding. It can be that, but it often will be much more. It can also be the heart of a surveillance system”. ARTHUR MILLER Vivemos hoje numa sociedade em que quase como uma fatalidade, a cada nova comodidade, a cada nova liberdade, corresponde um novo ficheiro. Na verdade, a rapidez dos avanços tecnológicos e da globalização vieram alterar de forma indelével o mundo que nos rodeia e são assim novos e imensos os desfechos para a protecção de dados. Os regimes de protecção de dados buscam o necessário equilíbrio entre dois princípios: por um lado a garantia das liberdades e direitos individuais e por outro lado a liberdade de utilização e circulação da informação pessoal. O tema objecto deste relatório incide sobre esse desejável equilíbrio e ponderação de valores, os quais em situação de sobreposição ou colisão deverão ser analisados em função da categoria da informação ou o contexto da sua utilização.1 Como afirma Karl Engish, “os interesses dos homens não se situam isoladamente, uns ao lado dos outros, antes se encontram…podendo conduzir na mesma direcção, mas podendo também colidir entre si”.2 A complexificação e interpenetração desses interesses têm vindo a aumentar porque a sociedade de conhecimento e as novas tecnologias em que estamos todos conectados3, potenciam essas sobreposições e colisões. Com efeito, tal com observa de forma impressiva Maria Eduarda Gonçalves4 “uma das características marcantes da sociedade contemporânea é a penetração das novas tecnologias da informação e da comunicação na vida económica, social e política. Para além dos seus impactes na economia, estas tecnologias vêm afectando profundamente os modos de organização das relações sociais e as condições da realização de valores básicos das sociedades modernas, como a liberdade e a democracia”. 1 Atente-se o disposto por Maria Eduarda Gonçalves a pags 95 e segs do seu livro “Direito da Informação”, onde se refere que o Conselho da Europa tem vindo a densificar esse justo equilíbrio de liberdades através da sua Convenção de 1981 e das suas abundantes recomendações, que se referem a determinados sectores e actividades económicosociais ou categorias de informação. 2 In “Segredo de justiça e controlo de dados pessoais informatizados”, por Agostinho Eiras, Coimbra Editora, 1992. 3 Vd. interessante discurso de Hillary Clinton de Fevereiro de 2011 proferido na Univ. George Washington sobre “Internet rights and wrongs choices and challenges in a networked word” onde Hillary aborda a questão da nova liberdade existente “liberdade para conectar” (freedom to connect). 4 In Direito da Informação “Novos Direitos e formas de regulação na sociedade de informação”, Almedina, Abr 2003, págs. 7 a 16. 3 Para Alvin Toffler5 vivemos efectivamente numa sociedade pós-industrial, onde a convergência tecnológica nos permite aferir que estamos no limiar da “terceira onda, marcada pelas grandes mudanças que proporcionam as comunicações e intensa troca de informações.” Outro autor, Pierre Levy6 defende igualmente que a sociedade passou por três etapas: 1. as sociedades fechadas, voltadas à cultura oral; 2. as sociedades civilizadas, imperialistas, com uso da escrita e por último; 3. a cibercultura, relativa à globalização das sociedades. Para este autor as tecnologias digitais “surgiram como a infra-estrutura do ciberespaço, novo espaço de comunicação, de sociabilidade, de organização e de transacção mas também novo mercado do conhecimento e da informação”. Com efeito, todos os autores referidos7, souberam interpretar o seu tempo e as evoluções em marcha. Ao redor do globo, as pessoas usam poderosas tecnologias e dispositivos para melhorar o seu quotidiano, a sociedade da informação e as mudanças surpreendentes movidas pelo advento das Tecnologias da Informação na Comunicação (TIC’s). As Empresas desenvolvem software, produzem software e fornecem serviços concebidos para melhorar a produtividade individual, comunicação e segurança. A verdade é que nos tornámos dependentes das comunicações móveis, do acesso instantâneo à informação e serviços inteligentes. Apesar de todos os benefícios dessas tecnologias, persistem dúvidas e preocupações sobre o quanto de informação pessoal é coligida, armazenada, utilizada e compartilhada para o fornecimento desses serviços persuasivos e convenientes8. As questões da liberdade, da protecção da vida privada e demais direitos da personalidade são sempre colocados em equação neste campo novo e emergente que é o Direito da Informação. As grandes questões da privacidade são na actualidade fruto do uso generalizado da informática e da internet. São tantas as vantagens da cidadania electrónica que o quotidiano seria inimaginável sem o tratamento informático de dados pessoais. Contudo nos dias de hoje torna-se possível, seguir as pegadas electrónicas do cidadão digital, a seu pedido, ou contra a sua vontade. 5 In “A Terceira Onda”, Rio de Janeiro, Record, 1997. Este autor desenvolveu o conceito de uma sociedade diferente da industrial e agrária ao discutir uma teoria pós-industrial, debatendo as transformações na sociedade traduzidas por ondas. 6 Vd. Cibercultura, São Paulo, Ed. 34, 199. 7 Nas últimas décadas várias correntes de pensamento social têm convergido na noção de que as sociedades entraram numa fase nova do seu desenvolvimento. Vd. a esse propósito a abordagem de Maria Eduarda Gonçalves à teoria social, sociedade pós-industrial e sociedade da informação, na sua obra “Direito da Informação”, a págs 24 e ss, onde a autora observa que todas estas correntes colocam em evidência que a sociedade contemporânea é marcada profundamente pelo progresso e utilização das ciências e das tecnologias, em particular das tecnologias da informação e da comunicação, pela substituição da informação ao capital e ao trabalho como recurso estratégico da economia e pela expansão dos riscos de base industrial e tecnológica. 8 Vd. o ataque de hackers recente efectuado à SONY que conduziu à divulgação de dados pessoais de milhões de utilizadores de um jogo Xbox, in Correio da Manhã de 28/Abril/2011. 4 Como bem observa Catarina Sarmento e Castro9 “a nossa pegada electrónica é enorme e cada vez diz mais de nós. Apesar da ameaça à privacidade que os tratamentos de dados pessoais podem constituir as vantagens da sua utilização são tantas, que provavelmente já não imaginamos o nosso dia-a-dia sem a utilização de tratamento de dados pessoais”. O quadro legal nacional, europeu e internacional tem vindo a regular a matéria da protecção de dados resultando, regra geral, a ideia de que se pretendia com elas conciliar um direito à circulação da informação com um direito sobre a informação, que é o direito à reserva da intimidade da vida privada.10 Temos assim, vindo a edificar em Portugal uma adequada (e até pioneira) protecção Constitucional e legal que vela a garantia desses mesmos direitos, como veremos, ao longo deste relatório. A questão que se coloca é se tal tessitura legal é suficiente e eficaz face a uma sociedade global, submersa nas novas TIC, cujo ritmo é tão freneticamente veloz e voraz11. Está a protecção legal e o tratamento de dados pessoais preparada para essa vertigem? Estarão as entidades independentes, entretanto constituídas, preparadas e apetrechadas para acompanhar essa velocidade ultrasónica e serem o garante efectivo dos direitos e garantias que devem proteger? Será que deverão existir limites à criatividade e ao direito a aspirar a toda a informação? Será que as novas tecnologias ao nível do uso do ADN para fins criminais ou científicos colidem com direitos fundamentais e de tutela constitucional reforçada? Como resolver essa colisão quando estejam em causas valores e dados particularmente sensíveis? Porventura o uso de microchips para efeitos de segurança rodoviária e até de segurança pessoal não potenciarão “littlebrothers” on demand e ataques à nossa privacidade? Será que as janelas que estamos a abrir ao nível do desenvolvimento científico nesta área não implicarão a colocação de cortinas de opacidade e intrusão ao nosso núcleo duro de intimidade? São muitas as questões 9 In “Direito da Informática, privacidade e dados pessoais”, Almedina, Fevereiro 2005. O S.T.A., em Acórdão de 19 de Junho de 1997 sobre o Direito à autodeterminação informativa pronunciou-se em sede de então recurso Constitucional sobre uma decisão da então Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais e Informatizados (CNPDPI). O Tribunal concluiu que “as normas legais respeitantes à protecção de dados pessoais face à informática visam assegurar a reserva da vida privada e a garantia dos Direitos do Homem. Pretendese salvaguardar um direito à privacidade. O artigo 35º da CRP consagra um conjunto de direitos fundamentais em matéria de defesa contra o tratamento informativo de dados pessoais”. 11 A computação em nuvem poderá colocar também desafios à protecção de dados uma vez que poderá implicar que as pessoas percam o controlo sobre informações potencialmente sensíveis que lhe dizem respeito ao procederem ao armazenamento desses dados em programas que se encontram albergados no hardware de outrem. Vd a esse propósito a interessante Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social, Europeu e ao Comité das regiões de 4 de Novembro de 2010 sob a égide “Uma abordagem global da protecção de dados pessoais na EU. É evidente nesse documento que a Comissão reconhece a necessidade de reforçar os direitos das pessoas e de aperfeiçoar os actuais mecanismos que permitem as transferências internacionais de dados pessoais. 10 5 que podemos colocar, mas respostas definitivas não temos, até porque esta travessia é complexa e é composta por muita luz e sombra. 6 II – O conceito de dado pessoal e o direito à “privacy” §2.1. Breve esboço histórico O Direito à privacy foi autonomizado pela primeira vez em 1890, quando dois jovens americanos Samuel Warren e Louis Brandeis, revoltados com os mexericos veiculados pela Imprensa de Boston e que atingiam a vida privada das famílias, publicaram na Harvard Law Review, um artigo sob o título “the right to privacy”. Reclamavam, nessa altura, a protecção do Direito para aspectos da personalidade humana que até aí apenas havia sido jurisprudencialmente protegidos, mediante o recurso à violação do direito de propriedade privada, à violação da confidencialidade, da confiança ou de uma obrigação de tipo contratual. Até então, os Tribunais, tal como a lei, não tinham ainda identificado aquilo a que os dois autores de Boston haveriam de baptizar como o “right to be let alone”, que seria, na sua opinião um “right against the world”, destinado a proteger “da curiosidade popular” variadas dimensões da personalidade. A partir daí passou a fazer caminho o direito à protecção da vida privada, que veio a ser consagrado como direito fundamental em 1948 na Declaração Universal dos Direitos do Homem (DUDH) e dois anos mais tarde na Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH). O Direito à protecção de uma “esfera de reserva e íntima” é, de entre os direitos de personalidade, o de concepção legislativa mais recente. Para, José Augusto Sacadura Marques12 “o direito de reserva sobre a intimidade da vida privada constitui um direito de fundamental e simultaneamente um direito da personalidade ligado de forma estreita, directa e incindível à pessoa”. A intimidade da vida privada só mereceu a atenção do Direito quando nos finais do século passado irrompe, ainda que timidamente, a chamada revolução da informação. A divulgação das técnicas de impressão e fotografia, bem como o aparecimento do telégrafo e do telefone, possibilitaram uma eficaz difusão da informação num espaço cada vez maior. Com efeito, até então, nas sociedades rurais ou nos pequenos aglomerados urbanos, as formas de relacionamento faziam-se na base do conhecimento recíproco e da confiança mútua, assentando em estruturas familiares, de vizinhança ou de grupo. Trazemos aqui à colação (por considerarmos pertinente) a recordação de Milan Kundera13 que nos diz que “na sua infância quando se queria fotografar alguém se tinha que pedir licença”. Esta memória do escritor revela um direito à imagem e à intimidade da vida humana no seu esplendor as quais se encontram hoje delicadamente expostas. 12 In “Estudos Jurídicos e Económicos em Homenagem ao Prof. Dr. António de Sousa Franco”, Vol. II, Coimbra Editora, Dezembro 2006. 13 Autor citado por Manuel da Costa Andrade in “Liberdade de imprensa e inviolabilidade pessoal”, Coimbra Editora, 1996, pág. 132 7 A verdade é que se no séc. XIX, alguém se dirigisse aos tribunais de um qualquer País alegando a invasão da sua vida privada e pedindo a condenação do infractor no pagamento de uma determinada quantia a título de indemnização cível ou a sua condenação penal, não obteria, por certo, sucesso a sua pretensão. É com o nascimento das técnicas de impressão e de fotografia e dos meios de comunicação à distância - o telégrafo e o telefone - que passam a tornar-se reais os perigos de lesão da intimidade em virtude da rapidez, alcance e sensibilização de instrumentos de informação, imagem e opinião. Mas a informática representa porventura, como já se disse a maior revolução da humanidade depois da invenção da roda. Através dela, democratiza-se o conhecimento e aprofunda-se na prática o princípio da igualdade. Com a informática, poupa-se tempo, esforço e talento para tarefas mais nobres, adquirem-se mais sólidas fontes de informação e bases de investigação mais consistentes e profícuas. Daí que importa compatibilizar a evolução técnica indispensável ao progresso, com o respeito essencial pelos direitos, liberdades e garantias, entre os quais se conta o direito à intimidade. No início do século XX, a privacidade era fundamentalmente ameaçada pelo crescimento da imprensa escrita, associada à imagem fotográfica14, mas seria o nascimento a 14 de Fevereiro de 1946 do Electronic Numerical Integrator and Computer (ENIAC) que viria a centrar grande parte das questões em torno da privacidade e na necessidade de protecção de um direito à autodeterminação informativa. O conceito de vida privada apresenta uma certa fluidez e significa o direito à solidão, à intimidade da vida família e privada, ao anonimato e à distância em relação a estranhos. Como se entendeu em Parecer do Concelho Consultivo da PGR “a intimidade da vida privada de cada um, que a lei protege, compreende aqueles actos que não sendo secretos em si mesmos devem subtrair-se à curiosidade pública por naturais razões de resguardado e melindre, como os sentimentos e afectos familiares, os costumes de vida”.15 A propósito da dificuldade de definição do conceito de privacidade pode dizer-se que a mesma seria resultante de três componentes: o segredo (informação conhecida sobre alguém); o anonimato (atenção prestada a alguém) e o isolamento (acesso físico a alguém)16. Segundo a doutrina norte Americana da que William Prosser é destacado expoente, é possível distinguir quatro tipos de casos de violação da privacy: (a) intrusão na esfera particular; (b) revelação 14 Atente-se aos casos mais mediáticos: Paolo Pavesich vs Nem England Mutual Life Insurance Co, 122 Ga., 50 S.E. 68, 69-71 (1905) e Marina Manola vs. Stevens and Myer, descrito no New York Times em Junho de 1890. 15 Vd. Parecer da PGR nº 121/80, de 23 de Julho. 16 Para melhor desenvolvimento atente-se ao exposto por A. G. Lourenço Martins, J. A. Marques e Pedro Simões Dias in “Cyberlaw em Portugal”, Centro Atlântico, 2004. 8 pública de factos privados; (c) informação que coloca a vítima a uma falsa luz os olhos do público (placing a person in a false light); (d) apropriação do nome ou de imagem (a este propósito, fala-se nos EUA num right of publicity, isto é, o direito de explorar economicamente o seu nome e imagem. Ou seja: do “right to be let alone” passou-se à protecção de direito à autodeterminação (direitoliberdade) e deste à protecção do direito à afirmação de individualidade (direito-positivo). É a abordagem e problematização desses direitos que passaremos a abordar nos capítulos subsequentes deste Relatório. §2.2. O conceito de dado pessoal De acordo com a Convenção 108 do Conselho da Europa sobre Protecção de Dados Pessoais de 198117, constitui dado pessoal qualquer informação relativa a uma pessoa física identificada ou identificável (art. 2º); uma pessoa física não é considerada identificável se a sua identificação requer tempo, custos ou actividades exageradas. Sublinhe-se que foi esta Convenção que serviu de motor à adopção de legislações neste campo pelos Países membros da União Europeia (EU), sendo que a filosofia que presidiu a esta Convenção (aliás na senda da CEDH) foi a defesa dos direitos do Homem e das suas liberdades, defesa essa que faz parte intrínseca do ADN histórico filosófico do Conselho da Europa18 . O conceito de dados pessoais é um dos conceitos essenciais da protecção das pessoas singulares previstos nos instrumentos da UE de protecção de dados actualmente em vigor e desencadeia a aplicação das obrigações que incumbem aos responsáveis pelo tratamento dos dados e aos subcontratantes. A definição de “dados pessoais” engloba todas as informações relativas a uma pessoa identificada ou identificável, tanto directa como indirectamente. Para determinar se uma pessoa é identificável importa considerar o conjunto dos mais susceptíveis de serem razoavelmente utilizados, quer pelo responsável pelo tratamento dos dados, quer por qualquer outra pessoa para identificar a referida pessoa”19 17 A Convenção entrou em vigor em 1981 e foi ratificada até este momento por 27 membros entre os quais Portugal. Nessa Convenção estão igualmente espelhados os princípios fundamentais reguladores de toda esta matéria. 18 A Directiva de Protecção de Dados estabelece as normas de protecção de dados a utilizar em todos os actos legislativos da EU, incluindo a Directiva da Privacidade Electrónica (2002/58/CE) alterada pela Directiva 2009/136/CE, JO L 337 de 18.12.2009). A Directiva da privacidade electrónica é aplicável ao tratamento de dados pessoais ligada à prestação de serviços de Comunicações Electrónicas acessíveis ao público em redes públicas de comunicação. Esta Directiva traduziu os princípios estabelecidos na Directiva de Protecção de Dados em normas específicas a aplicar no sector das comunicações electrónicas. 19 Vd. Considerando 26 de Directiva 95/46/CE). Dado estarmos perante uma abordagem muito abrangente e fluida, nem sempre a interpretação é fácil e nem sempre existe clareza e exactidão na aplicação da Directiva. 9 Por seu turno a Directiva 95/46/CE,20 no artigo 2º al. a) define dados pessoais como “qualquer informação relativa a uma pessoa singular ou identificável”. Esta Directiva e o conceito de dado pessoal que mesma incorpora viria a ser objecto de Acórdão do Tribunal de Justiça das Comunidades, que considerou em 6 de Novembro de 2003, que este conceito abrange “seguramente o nome de uma pessoa a par do seu contacto telefónico ou de informação relativas às suas condições de trabalho ou aos seus passatempos”. A lei forneceu-nos uma noção de dados pessoais, entendendo-se como tal qualquer informação, de qualquer natureza e independentemente do respectivo suporte, incluindo som e imagem, relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável. Essa pessoa será o titular dos dados pessoais.21 Esta questão sobre a densificação do conceito de dados pessoais e sobre o que é e não é um dado pessoal, tem gerado efectivamente abundante controvérsia e está igualmente presente na aparente difícil conciliação entre a Lei de dados pessoais (Lei n.º 67/98) e a LADA - Lei de Acesso aos Documentos Administrativos (Lei n.º 65/93, de 26 de Agosto, com as alterações da Lei n.º 8/95, de 29 de Março e Lei nº 94/99, de 16 de Julho). Com efeito, para a LADA o nome e a morada não são dados pessoais, o que bem se compreende dada a filosofia que norteia este diploma22. Esta diferente concepção de dados pessoais é fonte de conflito entre o direito de acesso aos documentos administrativos (art.º 268º da CRP) e os direitos fundamentais à autodeterminação informativa (art. 35º da CRP) e à reserva da intimidade de vida (art.º 26º da CRP), também protegidos pela Lei de Protecção dos Dados Pessoais. Acompanhamos de perto o entendimento de Catarina Sarmento e Castro que face a este conflito e sobreposição de regimes defende que 20 Esta Directiva na sua definição de dados pessoais inclui o nome, a morada, outros dados de identificação coo o número de segurança social, o número de contribuinte, o número do bilhete de identidade, de passaporte, ou até de cliente de estabelecimento comercial, assim como o número de telefone, o e-mail, uma chapa de matrícula, o valor de uma retribuição, o som da voz registada para permitir o acesso a uma conta bancária, desde que, por estarem associados a uma pessoa, estes permitam identificá-la. Inclui também uma impressão digital, uma imagem biométrica do rosto, uma imagem recolhida através do uso de uma câmara, como nos casos de videovigilância, ou de um conjunto de fotografias divulgadas na Internet. Refira-se ainda, que tal como referiu Maria Eduarda Gonçalves no nosso Seminário de 25 de Março, esta Directiva tem uma filosófica diferente da convenção 108, já não é o Homem que está no seu cerne mas o mercado e a liberdade de circulação de informação. Na Comunicação da comissão a que já aludimos refere-se que “Este documento, constitui um marco na história da protecção de dados pessoais na União Europeia, nela se consagrando duas das mais antigas e igualmente importantes ambições do processo de integração europeia: a protecção dos direitos e liberdades fundamentais das pessoas e em especial, do direito fundamental à protecção de dados, por um lado e a realização do mercado interno - neste caso a livre circulação de dados pessoais, por outro”. 21 Sublinhe-se que o ordenamento jurídico europeu e constitucional proíbe o tratamento de dados sensíveis, isto é, dados que revelem a origem racial ou étnica, ou opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas ou filiação sindical, bem como, o tratamento de dados relativos à saúde e à vida sexual havendo um número limitado de excepções com determinadas condições e garantias. 22 A LADA regula o acesso aos documentos administrativos, em nome de princípios como os da transparência, da publicidade, da igualdade, da justiça e da imparcialidade na actuação da Administração. 10 deverá aceitar-se que enquanto não surge uma clarificação legislativa “o regime específico e mais exigente da Lei de Protecção de Dados será o regime aplicável aos documentos da Administração Pública, sendo então competente a CNPD”23. Em reunião efectuada no dia 23 de Março de Março, com o Presidente deste órgão, verificámos que naturalmente também, é esse o seu sentimento. Acresce que, ambos os organismos funcionam no mesmo edifício, obrigando os cidadãos a diferentes respostas, o que é um elemento perturbador a requerer clarificação urgente. A Comissão tem vindo a sugerir a harmonização da legislação e que se possa adoptar a posição de outros países que foi no sentido da mesma entidade interpretar as duas legislações existentes. §2.3. O Direito à reserva sobre a vida privada Dispõe o artigo 1º da CRP que Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária. No douto entendimento de J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira24 a dignidade da pessoa humana fundamenta e confere unidade não apenas aos direitos fundamentais – desde os direitos pessoais (direito à vida, à integridade física e moral, etc), até aos direitos sociais (direito ao trabalho, à saúde, à habitação) passando pelos direitos dos trabalhadores (direito à segurança no emprego, liberdade sindical, etc) – mas também à organização económica (princípio da igualdade da riqueza dos rendimentos, etc). Concebida como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais, o conceito de dignidade da pessoa humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional e não uma qualquer ideia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a no caso dos direitos sociais ou invocá-los para construir uma “teoria do núcleo da personalidade” individual, ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. O artigo 26.º da Constituição da República Portuguesa reconhece a todos os cidadãos um conjunto significativo de direitos distintos a que chama de “outros direitos pessoais” e que estão ao serviço da protecção da esfera nuclear das pessoas, abarcando aquilo a que a literatura juscivilista designa por “direitos da personalidade”. De salientar que por força do IV Processo de Revisão Constitucional (Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de Setembro), foi acrescentado ao catálogo dos direitos pessoais o direito ao desenvolvimento da personalidade, marcando-se por esta via a dignidade da personalidade individual (matéria que é abordada no Tratado de Amesterdão à luz da não23 Ob cit. Pág. 79 e ss. Vd Idem Marques, Garcia/ Martins, Lourenço in Direito de Informática, Almedina Coimbra, 2000, p. 249-50. 24 In “Fundamentos da Constituição” - Coimbra Editora, 1991. 11 discriminação em função da opção sexual) e o direito à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação, solução que, sem embargo da natureza imediatamente preceptiva dos direitos, liberdades e garantias, não deixará de constituir um reforço, em várias vertentes, da sua efectividade.25 Como já vimos anteriormente, intimamente relacionado com a protecção de dados pessoais encontra-se o direito à reserva da intimidade da vida privada que tem consagração constitucional no artigo 26º. Segundo Gomes Canotilho e Vital Moreira, na citada obra, o direito à reserva da intimidade da vida privada e familiar inclui dois direitos menores: a) o direito a impedir o acesso de estranhos a informações sobre a vida privada e familiar e; b) o direito a que ninguém divulgue as informações que tenha sobre a vida privada e familiar de outrem. Por outro lado, o n.º 3 do artigo 26.º, da CRP, prevê expressamente que “a lei garantirá a dignidade pessoal e a identidade genética do ser humano, nomeadamente na criação, desenvolvimento e utilização das tecnologias e na experimentação científica”, alteração esta que surgiu em correspondência directa e sintonia com os contributos do Conselho da Europa, designadamente através da Convenção da Bioética. Trata-se, pois, de um comando constitucional inovador, de inegável valor no quadro do respeito pela dignidade da pessoa humana e que deverá servir para balizar a intervenção do legislador ordinário também no que respeita à biomedicina e nas suas implicações para o ser humano. No entendimento de José Magalhães26, a norma aprovada não consagra um “direito à identidade genética”. Limita-se a dar ao legislador ordinário uma directriz, mandando-o proteger certos valores, sem especificar um “caminho único” para esse objectivo. A explicitação de que não é admissível experimentação violadora da dignidade humana reafirma apenas – num domínio sensível – o princípio basilar decorrente do artigo 1º da Constituição. O Direito à reserva da intimidade da vida privada é um direito especial de personalidade, e não um direito geral de personalidade, como o que está consagrado no Código Civil, e que tem hoje o seu reflexo institucional no direito ao livre desenvolvimento da personalidade, também previsto em segmento do art. 26º, nº1, CRP. Sendo o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada um direito sobre informação, entre nós, a CRP consagrou, para sua garantia um direito à autodeterminação informativa sobre a vida 25 26 Vd. CRP ( 4º revisão) Anotada por Jorge Lacão, Texto Editora, Setembro de 1997. In Dicionário da Revisão Constitucional, por José Magalhães, Notícias Editorial 12 privada27 que tutela, desde logo, o interesse do controlo sobre os dados pessoais, constituindo a proibição de tratamento informático de dados pessoais (art. 35º nº3) uma garantia deste direito. Merece especial atenção esta nossa menção aos dados da vida privada, a qual está ausente no artigo 8º da Directiva 95/45/CE. Tal como observa Luis Lignau Silveira28 este critério tem sido objecto de crítica por vários representantes da Comissão Europeia por considerarem ser taxativo o elenco de dados sensíveis adoptado pela Directiva. Entende, contudo, o autor e presidente da CNPD que “não considero ser esse o critério mais acertado. O elenco da Directiva deve considerar-se como um mínimo, não podendo ser reduzido pelas legislações nacionais, mas nada se opondo a que estas o possam alargar”. Acompanhamos inteiramente esta reflexão dado que em matéria de direitos fundamentais os standards de protecção devem ser sempre elevados. Acresce que a inclusão “vida privada” na categoria de dados que exigem protecção especial decorre de regra constitucional formada deste 1976, sendo assim bem anterior à Directiva 95/46/CE. Com efeito, o direito comunitário deve considerar-se superior à legislação interna mas não às normas constitucionais (artigo 8º da CRP). Este direito encontra-se protegido, igualmente por diplomas internacionais (como é o caso da Declaração Universal dos Direitos do Homem - art. 12º- da Convenção Europeia dos Direitos do Homem - art. 8º- e do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos - art. 17º e do art. 7º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia). Protecção idêntica existe no C.C. (art. 80º) segundo o qual “todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem” sendo a extensão de reserva definida conforme a natureza do caso e a condição das pessoas. No âmbito do direito à reserva de vida privada existe o núcleo do direito à reserva da intimidade da vida privada e será de acordo com estes dois âmbitos que classificaremos os dados como pessoais quando apenas abrangem o domínio da reserva da vida privada, constituindo dados sensíveis os referentes ao domínio da vida privada. 27 Vd. Acórdão do TC nº 355/97, de 7 de Maio, onde o Tribunal teve a ocasião de fazer relevar a ideia de “vida privada” tal como abordado no nº3 do artigo 35º da lei Fundamental. Também neste Acórdão os dados de saúde são entendidos como integrados na noção de vida privada. 28 In “O Direito à protecção de dados pessoais” (Tentativa de caracterização), integrado na edição da APDSI intitulada “Sociedade da informação – O percurso português, Edições Sílabo. 13 III – O Quadro Constitucional da Protecção de Dados Pessoais §3.1. O comando constitucional O corpo final do artigo 35º mostra-se actualmente com esta forma. (Utilização da informática) 1. Todos os cidadãos têm o direito de acesso aos dados informatizados que lhes digam respeito, podendo exigir a sua rectificação e actualização, e o direito de conhecer a finalidade a que se destinam, nos termos da lei. 2. A lei define o conceito de dados pessoais, bem como as condições aplicáveis ao seu tratamento automatizado, conexão, transmissão e utilização, e garante a sua protecção, designadamente através de entidade administrativa independente. 3. A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem étnica, salvo mediante consentimento expresso do titular, autorização prevista por lei com garantias de não discriminação ou para processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis. 4. É proibido o acesso a dados pessoais de terceiros, salvo em casos excepcionais previstos na lei. 5. É proibida a atribuição de um número nacional único aos cidadãos. 6. A todos é garantido livre acesso às redes informáticas de uso público, definindo a lei o regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras e as formas adequadas de protecção de dados pessoais e de outros cuja salvaguarda se justifique por razões de interesse nacional. 7. Os dados pessoais constantes de ficheiros manuais gozam de protecção idêntica à prevista nos números anteriores, nos termos da lei. Portugal o País que já deu novos Mundos ao Mundo, pioneiro na abolição da pena de Morte, não deixou para trás em matéria legislativa relativa à protecção de dados caminhos que só muito depois seriam percorridos pela Europa. A nossa lei fundamental no seu artº 35º e dentro da matéria do nosso trabalho é mais um exemplo disso. Na verdade a protecção de dados assume dignidade de Lei Fundamental que encontra expressão mais tarde na Lei 10/91 de 29 de Abril - Lei de Protecção de Dados pessoais para fins Informáticos) alterada pela Lei 28/94 de 29 Agosto. A lei 10/91 viria a ser substituída pela lei 67/898 de 20.10 que transpôs para a ordem jurídica interna a directiva Europeia relativa á 14 protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento e circulação de dados pessoais. Muito antes das directivas europeias Portugal avança para a questão sem hesitar e sem rede, enriquecido por um passado que o condicionou em matéria de liberdades e direitos pessoais e, após 1976, pelas revisões constitucionais de 1982 e 1989 até 1997, garante a protecção e o empenho do legislador vinculando-o num percurso mais e melhor preparado para protecção de direitos fundamentais num Mundo que tende a evoluir rapidamente globalizando-se, nem que seja apenas através da ciência e da tecnologia. À primeira abordagem o artº 35º que pode parecer absolutamente pacífico e sem questões ou polémicas, a não ser no seu nº 5 quanto ao nº único de cidadão, levanta em cada um dos seus nºs questões que há que ter em conta e, desde logo conflitos entre a livre determinação e o direito à reserva da vida privada e a necessidade de segurança do Estado e dos cidadãos. Demonstra ainda durante este percurso de revisões constitucionais, uma preocupação cada vez maior em proteger mais e melhor os dados pessoais e, em obrigar o legislador a tomar posição em leis externas à Constituição e uma abertura *a tecnologia e à livre de circulação de pessoas. Saídos de um regime em que as informações dos cidadãos recolhidas de forma obscura e desleal, eram reunidas em dossiers poeirentos manuseados por personagens desconhecidas que nos entravam pela porta dentro a qualquer hora do dia e da noite, os cidadãos vêem-se obrigados a garantir firmemente que nunca mais as suas informações pessoais serão manuseadas sem controlo e, tendo em conta a circulação primeiro de natureza mecanográfica e depois de natureza informática de informação, entenderam que havia que acautelar situações semelhantes ou outras nem na altura imaginadas, nem ainda agora acauteladas. Tenta pois o legislador constitucional que a intimidade e reserva da vida privada seja cada vez mais respeitada e intocável evitando-se assim que desapareça, tornando-nos a todos “prisioneiros no nosso futuro através do que nos foi tirado no passado” e ingenuamente fornecemos sem pensar em consequências de utilização que serão feitas em nome de avanços científicos e em nome de seguranças máximas de cada um contra cada um mas, passíveis de ser manuseadas e cruzados sem o nosso conhecimento e sem o controlo devido. A abertura de fronteiras e a livre circulação de pessoas, no espaço Schengen por exemplo, levou a um acesso a dados pessoais, e à possibilidade da sua interconexão e, bem assim, do estabelecimento de fluxos transfronteiriços desses dados, tornou imperiosa a defesa dos direitos fundamentais, como, de resto, o artigo 35º da Constituição da República revela. 15 O caminho foi sendo feito como já se disse e aperfeiçoado pelas necessidades crescentes e circundantes. §3.2 Os contornos das revisões constitucionais Em 1976 o artº 35º aparecia-nos só com 3 números que são hoje o 1 o 3 e o 5. 1. Todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento do que constar de registos mecanográficos a seu respeito e do fim a que se destinam as informações, podendo exigir a rectificação dos dados e a sua actualização. 2. A informática não pode ser usada para tratamento de dados referentes a convicções políticas, fé religiosa ou vida privada, salvo quando se trate do processamento de dados não identificáveis para fins estatísticos. 3. É proibida a atribuição de um número nacional único aos cidadãos. Redacção dada pelo Decreto de 10 de Abril de 1976 A preocupação primeira é a transparência. O poder saber o que há sobre cada um de nós nos ficheiro de dados e poder corrigir alguma informação incorrectamente contida no mesmo, o acesso ao que a administração guarda e sabe sobre mim, é a prova da transparência necessária, quando necessária. Logo na criação da norma constitucional é assegurada a não manipulação ou cruzamento de dados referentes a informações delicadas como as convicções políticas fá religiosa ou vida privada. E a enorme preocupação de não atribuição de um número nacional único que tem vindo a ser uma preocupação constante até hoje apesar de algumas vozes desfavoráveis. Na verdade pretendem até alguns a eliminação completa do número que consagra esta proibição invocando o valor segurança e a necessidade da administração pública necessitar de maior margem de manobra e controlo dado o avanço tecnológico que tudo facilita.29 No entanto este manifesto faz referência a algo importante e que é preciso encarar com firmeza, o reforço das condições de verificação do efectivo cumprimento a aplicabilidade dos restantes números do Art.º 35º, sobre a protecção dos dados pessoais informatizados deve ser na verdade 29 Manifesto pela Revogação do Nº 5 do Artigo 35º da Constituição da República Portuguesa datado de 14.3.2011 16 uma preocupação do legislador que se ficou por penas, a meu ver brandas, quando está em causa a segurança individual de cada um a par da colectiva. Em 82 é substituída expressão “registos mecanográficos” por informáticos surge-nos a proibição de acesso por terceiros e o conceito de dados pessoalíssimos (SENSÍVEIS) completa-se com dados sobre convicções filosóficas filiação partidária e sindical religião ou vida privada. 1. Todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento do que constar de registos informáticos a seu respeito e do fim a que se destinam as informações, podendo exigir a rectificação dos dados e a sua actualização. 2. São proibidos o acesso de terceiros a ficheiros com dados pessoais e a respectiva interconexão, bem como os fluxos de dados transfronteiras, salvo em casos excepcionais previstos na lei. 3. A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa ou vida privada, salvo quando se trate do processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis. 4. A lei define o conceito de dados pessoais para efeitos de registo informático. 5. É proibida a atribuição de um número nacional único aos cidadãos. Redacção dada pela Lei n.º 1/82, de 30 de Setembro Continua a verificar-se a tendência para impedir a existência de um número único de cidadão que possibilita, a ser único, cruzamentos de dados entre as várias instituições. O legislador insiste pela proibição de terceiros quanto ao acesso a dados pessoais e reforça a ideia de dados sensíveis com convicções políticas religiosas, partidárias e sindicais e ainda referentes à vida privada. *** 1. Todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento dos dados constantes de ficheiros ou registos informáticos a seu respeito e do fim a que se destinam, podendo exigir a sua 17 rectificação e actualização, sem prejuízo do disposto na lei sobre segredo de Estado e segredo de justiça. 2. (...) 3. (...) 4. A lei define o conceito de dados pessoais para efeitos de registo informático, bem como de bases e bancos de dados e respectivas condições de acesso, constituição e utilização por entidades públicas e privadas. 5. É proibida a atribuição de um número nacional único aos cidadãos. 6. A lei define o regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras, estabelecendo formas adequadas de protecção de dados pessoais e de outros cuja salvaguarda se justifique por razões de interesse nacional. Redacção dada pela Lei n.º 1/89, de 08 de Julho A revisão de 1989 acrescentou o nº 6 remetendo para a Lei o regime quanto a dados transfronteiras e, o nº 1 passou a admitir restrições impostas pela lei sobre o segredo de Estado e o segredo de Justiça, alargando o nº 4 a remissão para a Lei à definição do conceito de banco de base de dados e respectiva regulação. Conjugando-se a possibilidade de conhecimento de consulta da base de dados pessoais com a o segredo de Estado e o Segredo de Justiça limita-se, a meu ver, essa possibilidade uma vez que ela vogará ao sabor de alterações legislativas que sofrer o regime do segredo de justiça e de interesses políticos, conforme as orientações de Estado dominantes à altura da consulta. Entendo pois esta referência como uma verdadeira limitação à consulta dos dados que administração detém sobre os cidadãos, uma desculpa (diria em termos simplistas) para impossibilitar a consulta dos mesmos. Tanto assim é que o corpo actual do artigo não faz qualquer referência ao segredo de justiça ou ao segredo de Estado. A não ser assim o princípio da transparência ficaria totalmente toldado. É a revisão desta norma em 1997 que completa e reforça o seu carácter inovador que se traduz claramente no seguinte 18 a) a modernização e reforço da protecção dos dados pessoais exigindo um quadro normativo aplicável ao uso da informática; b) garantia de que a protecção de dados pessoais implica a existência de autoridade administrativa independente; c) a reserva informática de dados não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a origem étnica ou outros dados sensíveis; d) excepcionalidade da proibição de tratamento dos dados pessoais previstos no nº 3 mediante consentimento expresso do titular, nas estritas condições da norma constitucional a integrar por lei; e) consagração do direito de acesso dos cidadãos às redes informáticas de uso público; f) extensão das normas de protecção de dados pessoais informatizados aos dados pessoais constantes de ficheiros móveis. Reconhece-se pois o direito de tratamento informático dos dados pessoais tendo em conta três direitos fundamentais: Direito de acesso das pessoas aos ficheiros informáticos (35º, nº 1);30 1. Direito ao sigilo em relação a terceiros dos dados informatizados e da sua inter conexão (35º, nº 2); 2. Direito à proibição de tratamento de certos tipos de dados pessoais deles constantes – dados sensíveis. O controlo da guarda e cruzamento de dados não terá guardião mais eficaz que os meios jurídicos. Regular a forma de guardar de manipular e o tempo que os dados devem manter-se “ em cativeiro” vai ao encontro do direito ao esquecimento que cada cidadão tem – é exemplo disso o facto do certificado de registo criminal ser apagado de 5 em 5 anos. Pelo menos assim deverá ser com algumas categorias de dados. 30 (A Convenção Schengen reconhece o direito a saber se os seus elementos constam do SIS - ficheiro comum a todos os Estados membros do espaço Schengen.) 19 O Direito de Informação ganhou uma autonomia que vinha sendo reclamada e merecida. Em França chamam-lhe Droit de L’informatique e Computer Law, nos países de cultura anglo saxónica, se bem que computer law a traduzir-se, é muito pobre para o o ramo do Direito que pretende regular o mundo cibernáutico . Este Direito abarca a relevância jurídico probatória dos registos em computador; a responsabilidade civil e criminal decorrente das aplicações e utilização da informática; a contratação de material e serviços; a propriedade de programas e protecção de software e as liberdades públicas e privacidade. O que vemos consagrado constitucionalmente exige do legislador uma atenção premente e a criação de um código de conduta ou a reunião simples da variada legislação num manual. E uma atenção crescente a factores que mudam constantemente. A existência da CNPD, consagrada também ela constitucionalmente como entidade administrativa independente e responsável pela emissão de pareceres que, embora passando pela Assembleia da República têm força obrigatória e são passíveis de reclamação e de recurso para o Tribunal Central Administrativo, tem um enorme peso na análise das mais variadas situações colocadas à sua consideração e um imenso cuidado em elaborá-las. Reconhecida constitucionalmente a sua existência, verificamos que temos ao serviço do cidadão uma entidade que controla a circulação de dados entre Países, fora e dentro da EU e no direito interno. Podendo ser apelidada como “Velho do Restelo”, há que reconhecer que toda a sua actividade se pauta pela maior cautela no respeito pelo cidadão e que, por exemplo, relativamente ao número único (não esquecendo talvez o percurso histórico da humanidade e do país que é o nosso), a CNPD no seu PARECER Nº 37/ 2006 – alerta cautelosamente para que ainda não estão pesados todos os prós e contras e recomenda a realização de estudos de risco do sistema, testes de segurança e de fiabilidade e análise de impacto das medidas que pretende adoptar, por entidades independentes e dotadas de meios técnicos, humanos e de capacidades de elevado e indiscutível valor.31 A possibilidade de consulta pelo próprio e as restrições de difusão dos dados por terceiros são, como diz António Barreiros “ mecanismos auto - reguladores da fidedignidade da informação32. A existência de um número único isso irá possibilitar uma enorme circulação e cruzamento de 31 PARECER Nº 37/ 2006 - sobre a Proposta de Lei que cria o cartão do cidadão e rege a sua emissão e utilização. http://www.cnpd.pt/bin/decisoes/2006/htm/par/par037-06.htm 32 Barreiros, José António – Informática, Liberdade e Privacidade – artº 35º pag. 131. 20 dados que não interessam a todas as entidades de igual forma e podem criar estigmatizações ou descriminações o que é o mesmo que dizer inconstitucionalidades. Fale este autor ainda da criação de um sistema de alerta através do qual o cidadão deverá ser notificado de qualquer ficheiro a seu respeito ou de qualquer alteração substantiva no conteúdo desse ficheiro. 33 O Bill inglês por exemplo não prescinde do sistema de informação. Também no Brasil isso acontece de forma grátis. Não tem sido praticado em Portugal mas, como já dissemos anteriormente, qualquer cidadão pode pedir informação correcção e actualização dos seus dados em poder de entidades competentes. Como também diz António Barreiros no seu parecer, “Um tal sistema tem implicações políticas graves tendo uma potencial vocação de carácter persecutório e policial facto que é potenciado entre nós pelas inter - relações entre identificação civil, criminal e policial. O número nacional de identificação é empregado na Finlândia, na Dinamarca, na Suécia, na Baviera. Creio que com o tempo e com mais garantias por parte de quem manipula e detém os dados chegaremos a um número único mas, até lá há que, como diz a CNPD no parecer Nº 37/ 2006 supra citado, ponderar a transparência, a oportunidade, a lealdade, o consentimento, a finalidade e a qualidade a reserva da intimidade e da vida privada, enfim o respeito pelo indivíduo enquanto titular de direitos e obrigações. Enfim, há que ter em conta em toda esta utilização e guarda e ainda mais quanto ao número único que nos parece facilitar a vida e às entidades públicas também os princípios de tratamento de dados, as garantias funcionais exigidas pelo Conselho da Europa e pela CRP. Não consigo deixar de comparar uma possível precipitação na criação deste número único, ao que aconteceu aos Judeus em tempos idos mas ainda vivos. “Todos os judeus foram obrigados a carregar cartões de identificação que indicavam sua herança judaica e, no Outono de 1938, todos os passaportes judeus foram marcados com a letra "J".” “O Estado de Direito (democrático), a democracia ocidental é o regime da História que conferiu aos homens maior grau de liberdade política.34 33 Acrescenta ainda que é o que acontece face ao projecto francês na altura e à lei americana. Maurice Duverger em diálogo com Olaf Palme, “A Crise da Sociedade Contemporânea”, Edições 70, Lisboa, pag. 120. 34 21 A democracia não é apenas um conjunto de garantias institucionais e procedimentais; ela é também “a luta dos «sujeitos» na sua cultura e na sua liberdade, contra a lógica dominadora dos sistemas”. O que é característico da “sociedade moderna é que esta afirmação de liberdade se exprime sobretudo pela «resistência» à autoridade crescente do poder social sobre a personalidade e a cultura”. “O poder do povo significa a capacidade de o maior número viver livremente, quer dizer, de construir a sua vida individual associando aquilo que se é e aquilo que se quer ser, resistindo ao poder em nome, ao mesmo tempo, da liberdade e da fidelidade a uma herança cultural.” “O regime democrático é a forma de vida política que dá maior liberdade ao maior número, que protege e reconhece a maior diversidade possível”35 Na relação da liberdade com a democracia, no contexto do Estado de Direito (democrático e social), foi realçado o perigo de, por cima dos cidadãos absorvidos no seu bem-estar, o Estado Providência assumir a sua veste de Estado-Tutelar, que se encarrega de assegurar a felicidade dos cidadãos e velar pelo seu destino. Um dos mecanismos de salvaguardar a liberdade, quer na perspectiva liberal de não sujeição dos cidadãos a interferências, quer na perspectiva republicana da ausência de “dominação”, consiste, precisa e respectivamente, na protecção da privacidade dos cidadãos e na protecção dos seus dados pessoais. A proibição da atribuição de um número nacional único a cada cidadão tem, dentro da elevada precisão da sua fórmula, dois significados distintos mas complementares. Por um lado, proíbe-se a identificação directa dos cidadãos através de um número único e imutável, proibindo-se, assim, a eliminação da personalidade dos indivíduos e da sua dignidade humana, levando a que “não se pode chapar na testa de um indivíduo que ele é o número 3 milhões”. Por outro lado, proíbe-se a concentração da (tendencial) globalidade da informação relativa a um cidadão com uma única chave de acesso a essa informação, impedindo-se, também, que aquele mesmo resultado de despersonalização seja alcançado através da junção de toda a informação existente nas bases de dados do Estado e da possibilidade de compor uma imagem completa da pessoa36; 37 em seu prejuízo eventualmente. 35 Alain Touraine, “O que é a Democracia?”, Instituto Piaget, Lisboa, 1996, pag. 22 e 23. Jorge Miranda, Rui Medeiros, “Constituição Portuguesa Anotada”, Tomo I, Coimbra Editora, Coimbra, 2005, pag. 53. 37 Junta-se a final parecer da CNPD Nº 37/ 2006. 36 22 Neste domínio, os princípios da prevenção, da precaução e da proporcionalidade estão interligados. A ponderação à luz do princípio da proporcionalidade – ponderação da adequação, necessidade (indispensabilidade) e proibição do excesso – requer a prévia formulação dos princípios da prevenção e da precaução e o levantamento das questões que estes dois princípios suscitam nomeadamente através de exaustivos estudos de risco, por um lado, e de impacto, por outro, relativos à introdução do cartão do cidadão. O conceito surgido em Inglaterra do século XVII, de que man’s house is his castle, foi hoje substituído pelo conceito, atrevo-me a dizer - Man is himself his castle. É esta esfera íntima que deve ser preservada e respeitada porque ela própria é o indivíduo, protegida porque a forma ainda é falível. Por isso, poucos cidadãos que dispõem do cartão de cidadão, activaram já a sua assinatura digital. A era é a do futuro, é a era da terceira vaga, do estar atento, da desmassificação, da informação, é impossível coexistir com ela sem tecnologia da informação (computadores e telecomunicações) comunicação à velocidade da luz.38 Quando Alvin Toffler diz que na China de hoje se comenta que é mais importante esparramar telefones pelo país do que estradas, chega-se facilmente á conclusão de que é verdade. Tudo se resolve via mail, via Net, sem deslocações. A informação circula num mundo que caminha para a globalização, com uma rapidez estonteante. O conhecimento é a base de tudo, o humanismo também. O direito e a política e as mentalidades que os gerem e administram ou acompanham “a vaga” ou, os povos não conseguirão acompanhar a evolução. Ou se preservam acompanhando ou se perdem na individualidade. 38 Toffler, Alvin “A terceira Vaga” – colecção vida e cultura – edição livros do Brasil – Lisboa. 23 IV – O Percurso Nacional: caminho garantístico ou de vanguarda? §4.1. A Lei 67/98 de 26 de Outubro LEI DA PROTECÇÃO DE DADOS PESSOAIS Muito depois de Portugal dar consagração constitucional à protecção de dados, esta lei transpõe para a ordem jurídica portuguesa a Directiva 95/46/CE, do parlamento europeu e do conselho 24 de Outubro de 1995, relativa à protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento dos dados pessoais e à livre circulação desses dados. Tem este diploma como princípio geral o da transparência no estrito respeito pela reserva da vida privada, bem como pelos direitos, liberdades e garantias fundamentais. Chama-se a atenção para os princípios que norteiam a protecção e tratamento de dados pessoais. Os dados pessoais devem, de acordo com a directiva em questão, ser tratados de forma lícita e com respeito pelo princípio da boa fé; recolhidos para finalidades determinadas, explícitas e legítimas, não podendo ser posteriormente tratados de forma incompatível com essas finalidades; adequados, pertinentes e não excessivos relativamente às finalidades para que são recolhidos e posteriormente tratados; exactos e, se necessário, actualizados, devendo ser tomadas as medidas adequadas para assegurar que sejam apagados ou rectificados os dados inexactos ou incompletos, tendo em conta as finalidades para que foram recolhidos ou para que são tratados posteriormente; conservados de forma a permitir a identificação dos seus titulares apenas durante o período necessário para a prossecução das finalidades da recolha ou do tratamento posterior sempre com respeito pela pessoa. Podem no entanto ser conservados dados para fins históricos estatísticos ou científicos por período superior ao referido, mediante requerimento do responsável pelo tratamento, havendo interesse legítimo e autorização da CNPD com a responsabilização sempre do responsável pelo tratamento de dados. A directiva consagra o tratamento de dados sensíveis proibindo, na mesma linha da inconstitucionalidade afirmada em Portugal, o tratamento de dados pessoais referentes a 24 convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem racial ou étnica, bem como o tratamento de dados relativos à saúde e à vida sexual, incluindo os dados genéticos.39 Mas, claudica quando permite que, mediante disposição legal ou autorização da CNPD, possa ser permitido o tratamento dos dados referidos sem consentimento expresso e esclarecido do titular. Parece-me então que este consentimento implícito pelas razões previstas na lei, é na verdade uma forma hipócrita do legislador deixar cair as garantias de acesso aos dados por terceiros.40 Ou seja, “ pode-se duvidar, com efeito que a amplitude das circunstâncias em que se dá um tratamento como legítimo sem o consentimento expresso do sujeito, não prejudique afinal o próprio princípio da lealdade recolha de dados. É que este implica que seja dada oportunidade à pessoa de tomar consciência da utilização que vai ser feita, dos seus dados pessoais.”41 Compensará esta fraqueza uma inovação introduzida pela directiva que consiste no direito de oposição do individuo a que os seus dados sejam objecto de tratamento, salvo disposição em contrário do direito nacional contido no artº 14 a)? Este encontra-se consagrado para os casos de tratamento de dados sem consentimento explícito da forma supra referida. Entende a Professora Maria Eduarda Gonçalves que é esta uma garantia adicional do indivíduo. Pergunto eu, será sem dúvida, mas quantas vezes funcionará?42 No que respeita à transferência de dados pessoais na União Europeia é livre a circulação de dados pessoais entre Estados membros da União Europeia, sem prejuízo do disposto nos actos comunitários de natureza fiscal e aduaneira. Quanto à transferência de dados pessoais para fora da União Europeia só pode realizar-se com o respeito das disposições da presente lei e se o Estado para onde são transferidos assegurar um nível de protecção adequado. (…) Cabe à CNPD decidir se um Estado que não pertença à União Europeia assegura um nível de protecção adequado ou seja definir o conceito de “nível de protecção adequado” que à partida será um nível de protecção semelhante ao do Estado emissor de dados. Muito recentemente vimos serem transferidos dados para os EUA sem o parecer da CNPD estar completo. 39 Quando ainda há bem pouco tempo alguém veio dizer que estava interdito a homossexuais serem dadores de sangue a questão causou polémica e houve quem ironiza-se a questão como cheguei a fazê-lo num artigo escrito no Expresso on line – (http://aeiou.expresso.pt/opiniao-tendencia-sexual-no-cartao-de-cidadao=f526711) . Na verdade não é por se ser homossexual que está interditada ou pode estar interditada a doação de sangue uma vez que os comportamentos promíscuos não são da exclusiva competência de homossexuais mas sim de pessoas. 40 Frayssinet, 2001;-127”L’Union Européene et la protectiondes donnés personelles circulant sur línternet – inBlandin – Obernesser 8 dir) – Editions Apogée pag 123 a 134- citado pela professora Maria Eduarda Gonçalves na página abaixo referida. 41 Gonçalves, Maria Eduarda – Professora do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da empresa – in Direito da Informação – Novos direitos e formas de regulação na sociedade de informação – pag-100- Almedina 42 Gonçalves, Maria Eduarda – Professora do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da empresa – in Direito da Informação. 25 O recurso ao princípio da reciprocidade – artº 25º do diploma em questão – exige que o país que recebe os dados do cidadão nacional e comunitário garantirá um nível de protecção adequado. A entidade competente para avaliar tal situação é a CNDP, ou seja, aguardar-se-á sempre o parecer emitido por esta. Para avaliar da adequação há que ter em conta a natureza dos dados transferidos, a finalidade e duração do tratamento e manuseamento dos dados fornecidos, os países de origem e destino as regras de direito em vigor no país para o qual são transferidos os dados, assegurando assim que um cidadão nacional não tenha um tratamento mais gravoso que aquele que teria no seu país e dentro da EU. Regras que devem ser devidamente observadas sob pena de serem aplicadas as sanções previstas nos artigos Artigo 43.º 1 - É punido com prisão até um ano ou multa até 120 dias quem intencionalmente: d) Promover ou efectuar uma interconexão ilegal de dados pessoais; Artigo 44.º -1 - Quem, sem a devida autorização, por qualquer modo, aceder a dados pessoais cujo acesso lhe está vedado, é punido com prisão até um ano ou multa até 120 dias. 2 - A pena pode ser agravada para o dobro nos casos previstos na Lei e o procedimento criminal depende de queixa. Artigo 45.º -1 - Quem, sem a devida autorização, apagar, destruir, danificar, suprimir ou modificar dados pessoais, tornando-os inutilizáveis ou afectando a sua capacidade de uso, é punido com prisão até dois anos ou multa até 240 dias. Artigo 47.º Violação do dever de sigilo 1 - Quem, obrigado a sigilo profissional, nos termos da lei, sem justa causa e sem o devido consentimento, revelar ou divulgar no todo ou em parte dados pessoais é punido com prisão até dois anos ou multa até 240 dias podendo a pena ser agravada nos termos legais. A negligência e a tentativa são puníveis e existem penas acessórias às penas fixadas sendo a decisão publicitada a custas do condenado aliás como é normal por exemplo nos crimes económicos não sendo este o caso. Passando os olhos pelas medidas abstractas escolhidas, temos a noção de que as medidas concretas serão muito leves face aos bens jurídicos atingidos com as condutas. Se o que está em causa são direitos fundamentais, como é que a violação de normas impostas quanto à guarda, manuseamento, cruzamento e manutenção desses mesmos dados pode ser punida a partir de medidas abstractas tão baixas? 26 Estou em crer que não se perderia nada com penas mais severas abrindo um leque maior em determinados casos tendo em conta por exemplo os dados sensíveis. Não basta a criação de garantias é necessário que as mesmas sejam protegidas ou acompanhadas de punição à sua violação de tal forma, que dissuada o agente de as pôr em causa. 27 V – A Comissão Nacional de Protecção de Dados entre a vanguarda da Protecção dos Direitos Humanos, a Segurança jurídica e a liberdade de circulação §5.1. A CNPD e o seu lugar na Constituição Correspondendo ao teor dos normativos internacionais e comunitários – Convenção 108 do Conselho da Europa e seu Protocolo Adicional e Directiva 95/46/CE, o legislador constitucional endereçou a garantia de protecção dos dados pessoais a uma especial entidade administrativa independente, nos termos do artigo 35º, nº 2, da CRP. Decorre do figurino constitucional que se adopta um ente único para todo o País, afastando-se ab initio (e bem) a pulverização territorial deste tipo de instituições, por todo o Pais. O legislador corporizou, também de forma muito clara no desenho constitucional, a independência deste tipo de órgão. No âmbito do IV Processo de Revisão Constitucional, 43 a Comissão de Dados Pessoais foi determinante. O desencadeamento do processo de revisão constitucional levou a Comissão a manifestar junto da Assembleia da República, a necessidade de equacionar e ponderar as soluções do artigo 35º relativo à utilização da Informática. Os projectos de revisão constitucional apresentados pelo PS44 e PCP45 incluíram algumas alterações ao artigo 35º, o que assegurava uma apreciação pela Comissão Eventual de Revisão Constitucional (CERC), e uma possível modificação pelo Plenário, de acordo com as regras constitucionais de revisão. 43 As alterações introduzidas pela segunda revisão constitucional (LC n 1/89, de 8 de Julho) não foram extensas nem profundas, tendo deixada intacta a compreensão e sistematização do catálogo dos direitos fundamentais. Há a registar entretanto algumas modificações significativas. No respeitante aos direitos contra o tratamento informático de dados pessoais, constitucionalizou-se a protecção do segredo de Estado e do segredo de justiça como limites do acesso aos dados informáticos (art. 36.º-1) e flexibilizou-se o regime dos fluxos de dados transfronteiras (art. 35.º-6). Consideráveis alterações foram as que se verificaram na área da informação e da comunicação social, com reformulação global dos respectivos preceitos (arts. 38.º, 39.º e 40.º). São de destacar, entre outras, as seguintes alterações: a autorização de estações de televisão privadas (art. 38.º-7), a instituição de uma Alta Autoridade para a Comunicação Social, em substituição do antigo Conselho de Comunicação Social, com funções mais alargadas do que as deste e com composição substancialmente diversa (art. 39.º), a restrição dos direitos de antena e de réplica política, que passaram a valer apenas para o serviço público de rádio e de televisão, salvo nos períodos eleitorais (art. 40.º). 44 O PRC do PS para o artigo 35º previa alterações ao nº 3: “A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada ou origem étnica, salvo consentimento pessoal expresso daqueles a quem os dados respeitam e sem prejuízo do nº2, ou quando se trate de processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis” é ainda proposta a criação de um novo nº 7 com a seguinte redacção “As disposições do presente artigo não são aplicáveis, nos termos da lei, aos ficheiros manuais. 45 O PRC do PCP para o artigo 35º incidiu sobre um novo número com a seguinte redacção “os cidadãos têm direito a obter, nos termos da lei, mandado judicial de acesso aos dados informativos nos termos do nº1, no caso de lhes ser recusado esse acesso”e mantinham o resto da numeração do artigo. 28 Por seu lado, o Presidente da Comissão Eventual de Revisão Constitucional (CERC), Prof. Doutor Vital Moreira, entendeu solicitar o Parecer da Comissão relativamente às propostas adiantadas por aqueles dois partidos. A CNPDPI considerou dever propor uma reformulação geral daquele artigo com base nos seguintes princípios: • a indispensabilidade de manter um nível adequado de protecção de dados, em consonância com os outros dispositivos constitucionais, face às novas tecnologias de informação e às amplas possibilidades de relacionamento e fluxo de informação; • a necessidade de que o dispositivo constitucional continue a funcionar como norma garantística dos direitos fundamentais na área informática, sem prejuízo da desejada evolução no tratamento da informação, que facilite o dia-a-dia dos cidadãos; • a harmonização das legislações dos países da União Europeia, com a transposição da Directiva 95/46/CE, relativa à protecção de dados e à livre circulação de dados, de cuja aplicação resultará a extensão do regime de direitos às informações pessoais não automatizadas, desde que estruturadas; • uma melhor articulação constitucional com o regime de acesso à documentação administrativa. Tal como escreve José Magalhães46 no seu Dicionário da Revisão Constitucional verificou-se nesta revisão uma efectiva metamorfose no conceito de informática, evoluindo-se “da computação em máquinas isoladas para o mundo das redes e da telemática”. Este autor sublinha ainda o facto do novo quadro vedar qualquer arbítrio de poder político e da administração pública cerceador do acesso às redes informáticas de uso publico em combinação com o artigo 34º nº4, da CRP. Com efeito, este acesso e uso confere aos cidadãos novos e poderosos meios de expressão e de informação, pelo que a norma assume a natureza de “garantia das garantias”- uma vez que para José Magalhães “o acesso a redes abertas impede o silenciamento de opiniões, remove eventuais bloqueios internos e, em qualquer caso reforça significativamente as condições de exercício de outras liberdades47. 46 Vd pags. 130 e ss deste interessante Dicionário já citado que é uma completa visita guiada à Constitucional de 1997. Editorial Noticias, Fev de 1999. 47 v.g. as previstas nos arts. 37º, 38º, 41º, 42º, 43º, e 48º da CRP. Revisão 29 § 5.2. Da sua Independência A Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais é uma entidade pública independente com poderes de autoridade (art 21º, da lei n.º 67/98, de 26 de Outubro). Essa independência para ser plena tem que reflectir-se na sua dinâmica orgânica e funcional. Esta entidade não pode pois integrar-se em nenhum outro órgão do Estado, daí que se disponha na Lei n.º 67/98 que a Comissão “que funciona junto da Assembleia da República” (art 21, n.º 1). A CNPD tem como atribuição genérica controlar o processamento automatizado de dados pessoais, em rigoroso respeito pelos direitos do Homem e pelas liberdades e garantias consagradas na Constituição e na lei. Essa independência tem assim que se reflectir nos aspectos orgânicos e funcionais. A Comissão é a Autoridade Nacional de Controlo de Dados Pessoais Informatizados e a designação dos seus membros terá de exprimir também essa independência: a maioria deles é constituída por elementos eleitos pela Assembleia da Republica (o presidente e dois vogais); dois são designados pelos Conselhos Superior da Magistratura e do Ministério Público e duas personalidades de reconhecida competência são designados pelo Governo. Refira-se, ainda, que estes vogais são inamovíveis e o seu mandato é de 5 anos, não renovável, duração essa que garante igualmente uma não coincidência com as eleições legislativas, acrescentando por essa via adequado distanciamento político. Sublinhe-se que todos esses membros, num total de sete, e a própria instituição não estão, na sua actuação e nas deliberações que adoptem, sujeitos a ordens ou instruções de qualquer organismo ou entidade externa. É este casulo de independência que garante de forma impoluta o escrupuloso e cabal cumprimento da sua relevante missão. Trata-se de uma entidade com poderes de investigação e inquérito (artº. 22., nº 2, al. a) da Lei nº 67/98, de 26 de Outubro), poderes de autoridade (art. 22º nº2, al. b) da Lei nº 67/98, de 26 de Outubro) e de carácter consultivo (art. 22º nº2, al. c da Lei nº 67/98, de 26 de Outubro) não afastando naturalmente a via judicial. Esta entidade surge assim com uma dimensão complementar da via judicial, podendo agir por iniciativa própria e segundo formalismo menos exigente que o poder judicial. A sua actuação rege-se segundo as regras do procedimento administrativo estando os seus actos e decisões sujeitas ao controlo do contencioso administrativo (art. 23º nº3 da Lei nº 67/98, de 26 de Outubro). As funções de cooperação internacional e as de âmbito pedagógico têm também vindo a ganhar relevo, prestigiando interna e externamente esta entidade. 30 §5.3. Da actividade e desafios futuros O Relatório da CNPD de 2009, revela uma intensa actividade por parte desta entidade (10.418 processos). O Presidente do órgão considera na nota preambular deste documento que se “conseguiu atingir um equilíbrio entre o cumprimento das principais obrigações que recaem sobre a Comissão e o desenvolvimento de várias e diversificadas iniciativas com importância para a afirmação do papel impulsionador da CNPD, como autoridade de protecção de dados, na defesa dos direitos das pessoas tanto no espaço nacional, como no europeu e internacional.” Além da produção de importantes orientações para vários sectores de actividade através de novas deliberações gerais o papel da CNPD tem sido crescente na sensibilização das pessoas, em particular das novas gerações “abrindo as avenidas” de uma efectiva cultura de protecção de dados e da privacidade. O contacto com as Escolas e com os mais jovens nesta área poderá ser a pedra de toque para a mudança que se deseja48. Neste domínio a sensibilização dos pais é igualmente uma tarefa inadiável e premente49. O volume processual50 espelhado nos dados estatísticos de 2009 revelam incrementos no registo de tratamento de dados, na emissão de autorizações, nos processos de contra-ordenações (que são parte significativa do orçamento da CNPD) e nas deliberações relativas aos pedidos de acesso, seja pelo titular dos dados, seja por parte de terceiros. A emissão de pareceres que recaem sobre projectos de diploma em preparação nos órgãos nacionais ou internacionais e sobre Acordos Internacionais em que Portugal é parte sempre que contenham matéria relativa à protecção de dados pessoais é também parte considerável da acção desta entidade e vão formando a sua doutrina sobre a protecção de dados pessoais, uma doutrina intensamente humanista e guardiã dos dados pessoais. Podemos mesmo concluir que a CNPD é a nossa “Provedora dos Dados Pessoais”. A Comissão encara a sua missão desde sempre, colocando a protecção dos dados e da privacidade no centro da sua doutrina, afirmando o actual Presidente que a segurança desses 48 Vd Projecto Dadus nas Escolas Vd. Estudo da FCSH da UNL de Cristina Kárita Francisco e Maria José Brites, sobre as Preocupações Apontadas pelo Eurobarómetro 248 relativas à Internet e às crianças, que integra o Anexo I. Para melhor compreensão insere-se igualmente o sumário/survey do Eurobarómetro 248 de 2008, que serviu de base ao estudo infra. (Anexo II) 50 Os pedidos de autorização subiram de 7837 para 7922, os processos de contra-ordenação também subiram de 670 para 745, e os pareceres registaram igualmente um incremento, de 59 para 86 pedidos. No tocante aos pedidos de autorização, saliente-se que cerca de 82% das notificações dizem respeito a sistema de videovigilância (6.524 pedidos, o triplo do ano anterior, que não incluem pedidos de v.v. na via pública ao abrigo da lei 1/2005). Quanto às queixas remetidas pelos cidadãos, a maioria incide sobre comunicações electrónicas e da internet, marketing não solicitado por telefone, publicação de informação pessoal em rede aberta sem consentimento do próprio. 49 31 dados e a preservação do núcleo duro de intimidade é um valor a preservar sempre. Esta entidade é o garante e a sua intervenção deve ser controladora, pedagógica e preventiva. Luis Silveira afirma mesmo que não existe “um” direito à protecção de dados pessoais mas uma série de faculdades ente si distintas estruturalmente, mas cujo conjunto alcança a protecção de dados pessoais, nas várias facetas para tanto relevantes, as quais integram cabalmente a noção de “direitos, liberdades e garantias”: “ são direitos (a uma prestação de outrem) o direito ao acesso, à veracidade dos dados e ao tratamento destes em conformidade com as finalidades. É liberdade, a faculdade de disposição dos dados com base no consentimento. É garantia, a faculdade de solicitar a intervenção controladora da CNPD.”51 No âmbito do Grupo de trabalho do artigo 29º, a CNPD52 tem vindo a acompanhar a abordagem no tocante aos dados pessoais e na sequência da Comunicação da Comissão a que já nos referimos, no ano em curso será preparada legislação reforçando a protecção de dados pessoais, indo ao encontro do artigo 8º da Carta dos Direitos Fundamentais da União53. Consideramos contudo que Paquete de Oliveira54 tem toda a razão quando afirma que “o drama é que a velocidade de legislar está sempre em deficit com a velocidade do avanço tecnológico”. Com efeito, existe uma necessidade permanente e diária de corresponder à inovação tecnológica com uma evolução jurídico-preventiva que concilie as necessidades de abertura e utilização e que defenda ao mesmo tempo, o núcleo essencial de direitos pessoais. 51 Idem ob cit. Na reunião havida com o Presidente Luís Silveira no âmbito deste relatório, o mesmo referiu que as autoridades de Protecção de Dados têm que ver clarificadas as suas funções e poderes. A CNPD, verificou que os documentos nacionais, internacionais e europeus são omissos em relação à protecção de dados de crianças, protecção essa que requer regras especiais. Propuseram inclusive ao G 29 um texto recomendatório sobre o assunto na área da saúde, internet e marketing, mas sem sucesso. 53 Sublinhe-se que o Tratado de Lisboa veio conferir à EU meios adicionais para uma abordagem global e coerente que garanta o direito fundamental das pessoas singulares à protecção de dados, porquanto o art. 8º reconhece um direito autónomo à protecção de dados com carácter vinculativo. 54 In Colóquio Direito à vida Privada e liberdade”, Auditório da Torre do Tombo, 25 de Novembro de 1997, CNPDPI. 52 32 VI – O ADN e os Microchips: Ameaças ou Oportunidades? §6.1 O ADN como o eu de cada um “Na Natureza nada se repete. Não há duas árvores iguais. Dois pássaros iguais. Duas gotas de chuva iguais. Dois beijos iguais. “ Antonio Tabucchi Todos sabemos dos bancos da escola que o ADN é um composto orgânico cujas moléculas contêm as instruções genéticas que coordenam o desenvolvimento e funcionamento de todos os seres vivos. São o Nosso BI genético, são o nosso EU o nosso registo biológico, algo de único que nos distingue do outro e nos identifica no meio de todos ainda depois da morte. Houve uma altura em que se acreditou que gémeos monozigóticos (MZ) ou idênticos tinham o mesmo DNA. Uma pesquisa liderada pelo cientista americano Jan Dumanski,55 professor em genética molecular publicada em Março no American Journal of Human Genetics, pode derrubar esse paradigma. Há por exemplo diferenças que podem influenciar os pares de cromossomas e são atribuídas apenas ao ambiente uterino e conexão com a placenta. No entanto o ambiente extra-uterino tem uma influência ainda maior, mecanismos epigenéticos activam os nossos genes de forma a desenvolvê-los ou anulá-los e aumentam com a idade podendo um dos gémeos enfrentar uma doença como a diabetes ou o cancro e o outro não. Vemos logo aqui como as bases de dados familiares devem ser tratadas no que diz respeito a doenças e a pedidos de emprego que as mesmas poderiam influenciar. O ADN tão caro à ciência e a artistas como Dali que chegou a afirmar que “o anúncio da descoberta da estrutura do DNA significou a “prova real da existência de Deus!” e o representou em quadros como Galacidalacidesoxiribunucleicacid (1963) e Butterfly Landscape, deve ser tratado com pinças. Ou melhor é “com pinças” que deve ser tratada a base de dados de ADN. A Lei n.º 5/2008 de 12 de Fevereiro - Aprova a criação de uma base de dados de perfis de ADN para fins de identificação civil e criminal e regula a recolha, tratamento e conservação de amostras de células humanas, a respectiva análise e obtenção de perfis de ADN, a metodologia de comparação de perfis de ADN, extraídos das amostras, bem como o tratamento e conservação 55 http://www.biomedexperts.com/Profile.bme/347799/Jan_P_Dumanski 33 da respectiva informação em ficheiro informático e cuja utilização análise e tratamento para fins diferentes dos previstos no diploma que a consagra, é expressamente proibida. Não permite a obtenção de informação de saúde, ou de características hereditárias específicas. E exige que o sistema garanta que os perfis de ADN e os dados pessoais correspondentes sejam armazenados em ficheiros separados lógica e fisicamente, manipulados por utilizadores distintos, mediante acessos restritos, codificados e identificativos dos utilizadores. É vedada a inclusão de qualquer elemento identificativo do titular dos dados no ficheiro de perfis de ADN, bem como qualquer tipo de pesquisa nominal. – artº 15º do referido diploma legal. Os marcadores de ADN a serem feitos, distinguem-se entre os que são de inserção obrigatória e os de inserção complementar para uso de investigação criminal. A questão mais delicada que se levanta é a da natureza do ADN Será um dado sensível? Tendo em conta que o ADN reúne toda a nossa informação genética e portanto é o código pessoal de cada um de nós e, tendo em conta o disposto na directiva 67/98 de 25.10 artº 7.º no artº 35º e no artº 26º da CRP, sabendo que é proibido o tratamento de dados pessoais referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem racial ou étnica, bem como o tratamento de dados relativos à saúde e à vida sexual, incluindo os dados genéticos em respeito pela vida privada, fica-nos ideia, se não a certeza, de que estão a tratar um dado sensível como se não o fosse. Se o meu ADN sou eu como reuni-lo num banco de dados manipulável por estranhos embora em segredo e com a invocação, mas sem garantia, de segurança dos meus dados? É certo que não são recolhidos ou pelo menos não são registados dados relativos a doenças ou tendências sexuais, mas estão lá todos os elementos no perfil de ADN que se encontra registado e que podem ser abertos a qualquer momento. No seu parecer de 18/2007 a CNPD levantou uma serie de questões justas e oportunas que acabou por não afastar na totalidade no parecer seguinte 41/2007 mas não impediu a publicação da Lei. Tem razão a CNPD quando nos diz que os exames ao ADN, mesmo tratando-se de ADN intergénico ou não-codificante, podem fornecer mais indicações de carácter pessoal do que a mera identificação do titular. Tem razão a CNDP quando diz que a rapidez da evolução tecnológica e científica depressa retirará a “cegueira” ao ADN não-codificante, de forma que este revele por exemplo informação fenotípica dos indivíduos. 34 Tem razão quando alerta para que o perfil de ADN nomeadamente na área da investigação criminal, é uma tentação para os poderes públicos utilizarem os dados pessoais genéticos para outros fins, sempre a coberto de finalidades que se apresentam meritórias - O Soberano a invocar o Bem da Nação. Tem razão quando alerta para o facto de a mais importante investigação científica neste domínio da informação genética estar a cargo, não das entidades públicas nem das universidades, mas das empresas privadas, geralmente laboratórios multinacionais que utilizaram os elementos recolhidos para os fins mais lucrativos e mais importantes do seu ponto de vista. Tem razão ainda quando alerta para a realidade da existência de diversos acordos comunitários, europeus e internacionais, bilaterais e/ou multilaterais, nos quais intervêm países que utilizam qualquer tipo de ADN, incluindo o ADN codificante, para efeitos de identificação civil. Como ponderar a forma de tratamento do fornecimento deste tipo de dado? Corre-se o risco de exclusão se a maioria dos Estados entender que os dados devem ser tratados para um determinado fim que não é o permitido pela lei interna. No âmbito destes acordos, verificar-se-à a pressão destes países para que a utilização deste tipo de ADN codificante, para efeitos de mera identificação civil, seja admitida, sob pena de exclusão daqueles países do âmbito desses acordos. E pior que tudo o já referido diz a CNPD que pode haver a tendência ou tentação “para a recolha de amostras de ADN, ou para a agregação de amostras de ADN referentes a grupos ou categorias de cidadãos – por exemplo, cidadãos residentes numa determinada localidade, cidadãos oriundos de uma determinada zona do globo, cidadãos contribuintes numa determinada categoria, cidadãos beneficiários de uma determinada prestação social, cidadãos condenados por infracções de diversa natureza – prática que potencia ou efectiva discriminações inaceitáveis. “ E é evidente que pode haver esse tipo de estudo e que por muito proveitoso que ele seja, para além de pôr em causa a privacidade do individuo, põe em causa eventualmente o direito ao bom nome, o direito à reserva da sua intimidade, o direito quem sabe à inocência. Embora não se ignorando que a base de dados é constituída por dados pessoais genéticos recolhidos com o consentimento livre e esclarecido para além de expresso do dador, sempre ficará no ar a utilização e o desvio ao fim para que são dados. A legitimação do tratamento fica legitimada para um fim, já não para outro fim... e os fins são alguns, tão tentadores. Não nego o interesse da ciência, nem a vantagem de uma base de dados de ADN que devidamente controlada e fiscalizada nos ajude a perceber os porquês de alguns comportamentos desviantes e a debelar tendências genéticas para determinadas doenças para além de outras criações da ciência e da medicina ainda mais fantásticas. 35 Não nos desviamos muito do pensamento de António Damásio56 quando diz que somos o nosso laboratório e que esse laboratório é a causa de determinadas condutas que podem ser contrariadas. Entre o avanço da ciência que não pede licença ao Direito e o Direito que não consegue balizar a ciência, fica-nos o indivíduo que, caso não haja normas garantísticas, pode não servir nem a ciência, nem a sua protecção individual e cair no desgoverno da violação dos direitos fundamentais. E, embora o consentimento possa ser revogado, se os dados já foram fornecidos e trabalhados, o cidadão nada poderá fazer. A base de dados de perfis de ADN contém o perfil de cidadãos nacionais, estrangeiros ou apátridas que se encontrem ou residam em Portugal, sendo preenchida faseada e gradualmente. Não está pois reservada aos cidadãos nacionais. A Lei n.º 5/2008 de 12.2.2008 aprova a criação de uma base de dados de ADN para Investigação Criminal e Identificação civil - artº 4º nº 1. No que respeita à Investigação criminal destina-se a identificar delinquentes e, diz a norma excluir inocentes o que nos leva a perguntar se a recolha para investigar não será feita só em ultimo caso. Na verdade excluir inocentes pode levar a uma recolha precipitada e facilitada com esse argumento. Destina-se também quando tem este fim a interligar diferentes condutas criminosas para prevenção de criminalidade – repare-se que esta base de dados há-de conter e só deve conter, perfis de ADN de pessoas condenadas por crime doloso em pena de prisão igual ou superior a 3 anos. A recolha de elementos deve ser garantida com despacho do juiz devidamente fundamentado57.58.59 determinando aquela inserção embora se possa discutir que atendendo à fase do processo poderá ser o Ministério Público a ordenar a recolha de dados. Esta questão jurisprudencial não se discutirá aqui deixando-se contudo as referências onde a questão pode ser lida. Mas à disposições legais como artigo 18º, 32º e 35º da CRP, artigos 126º, nº 2, alínea c), d) e e) do C. P. P. e artigos 7º, nº 1 e 2 e 8º nº 1 da LPD que não devem ser esquecidas assim como não deve ser ignorada a Lei 45/2004, de 19 de Agosto que estabelece o 56 Damásio, António – O Sentimento de si – O corpo, a Emoção e a Neurobiologia da Consciência Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 03.05.2006-Proc. 0546541 (dgsi.pt) http://www.inverbis.net/tribunais/testes-adn-acordaos-relacao-do-porto.html 58 Acórdão nº 616/98 do Tribunal Constitucional, de 17 de Março de 1999 ( artº172º nº 1CPP/126ºnº1CPP) – http://ruadosbragas223.home.sapo.pt/Acordaos/ACORDAO_N_155-2007_Processo_695-06_A4.pdf 57 59 Comissão Europeia dos Direitos do Homem decisão de 4 de Dezembro de 1978, em Décision e Rapports, 16, 12 1979, págs. 184 36 regime jurídico da realização das perícias médico-legais e forenses, diz no seu artigo 6º, nº 1, que ninguém pode eximir-se a ser submetido a qualquer exame médico-legal desde que este se mostre necessário ao processo e seja ordenado pela autoridade judiciária competente. Ou seja, caso a caso a entidade competente dirá da forma de recolha dos dados essenciais. E a entidade competente é o Juiz ou o MP durante o inquérito, sendo certo que quanto a este ponto não damos por totalmente assente que assim seja uma vez que entendo que, embora o inquérito seja da responsabilidade e direcção do MP, deve, nos casos em que se tocam direitos fundamentais ser, a autorização da recolha sempre garantida por despacho fundamentado do JIC – Juiz de Instrução criminal. Ao ser recolhido deve ter-se em conta que há que obstar a situações de auto-incriminação coerciva, ou seja, o indivíduo deve como qualquer cidadão ser esclarecido quer da finalidade da recolha quer do despacho do Juiz que ordenar a mesma e fundamentará o porquê e a finalidade da recolha. O acórdão do T.C. supra citado em nota de pé de página termina pela seguinte decisão quanto á recolha de dados : i) julgar inconstitucional, por violação do disposto nos artigos nºs 25.º, 26.º e 32.º, nº 4, da Constituição, a norma constante do artigo 172.º, nº 1, do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de possibilitar, sem autorização do juiz, a colheita coactiva de vestígios biológicos de um arguido para determinação do seu perfil genético, quando este último tenha manifestado a sua expressa recusa em colaborar ou permitir tal colheita; ii) consequencialmente, julgar inconstitucional, por violação do disposto no artigo 32.º, nº 4, da Constituição, a norma constante do artigo 126º, nºs 1, 2 alíneas a) e c) e 3, do Código de Processo Penal, quando interpretada em termos de considerar válida e, por conseguinte, susceptível de ulterior utilização e valoração a prova obtida através da colheita realizada nos moldes descritos na alínea anterior. iii) Consequentemente, conceder provimento ao recurso e ordenar a reforma da decisão recorrida em conformidade com o juízo de inconstitucionalidade que agora se formula.60 Esta recolha para fins de investigação criminal deve ser como defende o PARECER Nº 18/ 2007 ADN da CNPD, um meio completar de prova e não um meio decisivo de prova logo que surge uma suspeita ou apenas porque o individuo é useiro e vezeiro em determinado 60 Acórdão nº 616/98 do Tribunal Constitucional, de 17 de Março de 1999 ( artº172º nº 1CPP/126ºnº1CPP) – http://ruadosbragas223.home.sapo.pt/Acordaos/ACORDAO_N_155-2007_Processo_695-06_A4.pdf 37 comportamento de risco sob pena de ser posto em causa um dos princípios basilares da nossa ordem jurídica que é o da presunção de inocência e ainda o princípio do in dúbio pro reo. “É imperioso impedir que as verdades científicas produzam realidades aparentes e estas ditem as verdades judiciárias.” 61 Só em ultimo caso e depois de haver uma necessidade absoluta de fazer a prova da prática dos factos ou a prova da inocência do indivíduo, os elementos devem ser requeridos e o despacho devidamente fundamentado ordenará a dita recolha. No caso da base de dados de identificação civil o fornecimento de informação é voluntário e feito segundo a prestação de consentimento livre esclarecido e expresso, podendo este ser revogável - Artigo 6.º Lei n.º 5/2008 de 12.2.2008 e o nº 3 do artigo 35º da CRP e nº 2 do artigo 7º da LPD). Quando se trate de menores ou incapazes, a recolha é obtida nos termos do disposto no artigo 1889.º do Código Civil. O recurso ao ADN para prova de crimes pode ter consequências ao nível dos princípios da presunção de inocência e “in dúbio pro reo” Art º 32º CRP . Assim e por isso a CNPD avisa que a recolha desta prova deve ser complementar como já atrás foi dito e , portanto, nunca deve ser considerada sendo prova única, não devendo, obrigatoriamente e porque implica a manipulação de um dado a meu ver sensível, ser recolhida a não ser que tal se imponha quer para prova de um crime quer para provar a inocência de alguém. Os métodos de recolha de ADN, devidamente autorizada por consentimento esclarecido e escrito do próprio, estão previstos no artº Artigo 10.º - A Lei n.º 5/2008 de 12.2.2008 tendo sempre em conta o disposto no artº 32º CRP. Através de método não invasivo; Colheita de células da mucosa bucal ou outro equivalente; Que respeite a dignidade humana e a integridade física e moral; Individual ; Em cadáveres e em investigação criminal podem colher-se outro tipo de amostras -problema, nomeadamente, vestígios de sémen, sangue e saliva, cabelos, restos cadavéricos, ossadas, dentes, entre outros materiais biológicos. A recolha de amostras em pessoas é feita em duplicado. Outro ponto que se entende importante focar neste trabalho é o relativo à entidade Entidade responsável pela Base de Dados uma vez que na prática se levantam ainda questões que têm de ser rapidamente resolvidas como entre por exemplo a PJ e o IML. O INML é a entidade responsável pela base de dados de perfis de ADN, pelas operações que lhe sejam aplicáveis cumprindo as normas em matéria de protecção de dados pessoais e direitos fundamentais, no respeito pela dignidade humana. 61 In PARECER Nº 41 / 2007 da CNPD sobre a Lei de banco de dados de ADN 38 Ao Conselho médico-legal do INML compete elaborar o regulamento de funcionamento da base de dados de ADN. A actividade do INML é fiscalizada, para efeitos da presente lei, pelo conselho de fiscalização e só respondem perante a AR.) Há que ter em conta que o papel de fiscalização compete à CNPD. Fiscalizar e controlar não é a mesma coisa. Segundo o PARECER Nº 41 / 2007 da CNPD sobre a Lei de banco de dados de ADN, “a fiscalização efectuada, como em geral pela CNPD, traria a vantagem de apresentar uma nítida separação de poderes e competências, cujo exercício não acarreta a prática de actos e operações materiais de diversa natureza pela mesma entidade, além de que apresentaria uma configuração bem conhecida de todos, com alguma tradição no ordenamento jurídico nacional (Lei 67/98, de 26 de Outubro) e comunitária (Directiva 95/46/CE, do Parlamento e do Conselho, de 24 de Outubro de 1995), dando expressão à segurança jurídica e à harmonização institucional tão caras a matérias tão novas e dinâmicas como esta que aqui se trata. “ Estamos em crer que mais uma vez a CNPD tem razão e pelas razões que aponta – a delicadeza dos dados em questão. A separação de poderes e a entrega da fiscalização a uma entidade independente e vocacionada para esse fim nesta área, traria ao ordenamento jurídico uma maior garantia de segurança na manipulação e tratamento de dados que, repito, no caso do ADN, considero dados sensíveis. Não estamos em 1984, mas a velocidade a que tudo se comunica e a leviandade com que se pode fazê-lo, lembra-nos o livro de George Orwell – 1984 pelo que quanto mais informação, mais segurança deve ser exigida e esta parte de uma educação da sociedade para se guardar a si própria porque nunca sabemos em qual dos papéis podemos estar amanhã. Como relativamente ao filme “O Rapaz do Pijama às Riscas” - The Boy in the Striped Pyjamas o comentário que me assalta é o de que, se não salvarmos os outros, nunca chegaremos a tempo de salvar os nossos. Nenhum de nós se quer ver obrigado na era da tecnologia, da informação, do cruzamento de dados, a comprar um bloco de notas e um lápis clandestinamente como no livro de Orwell 1984 já referido. Temos a informação na ponta dos dedos mas queremos “ser” essa informação? Os sistemas totalitários dependem ou sobrevivem à custa do monopólio da informação e da força. Com a queda do Muro de Berlim e após o lançamento vanguardista do computador doméstico Apple II por Steve Wosniak em 1977 o primeiro IBM chega ao mercado em 1981. Em 1985 – há 26 anos o primeiro programa operativo Windows é lançado. A queda do muro elimina uma barreira física a criação do PC Windows veio eliminar o limite à quantidade de informação. 39 Um dos lemas iniciais de Bill Gates para a Microsoft era a de que se podia dar a cada individuo IAYF – Information at your fingertips - Informação com a ponta dos seus dedos62 . Mas os riscos desse toque de Midas ninguém mediu na altura. 62 Friedman, L Thomas – “ O Mundo é plano – Uma história breve do séc. XXI – 7ª edição – pag 60 40 §6.2. O Microchip de matrícula e o espião “inside” 6.2.1. Enquadramento legal Nacional e Europeu Em Portugal o debate sobre o dispositivo electrónico de matrícula (DEM), vulgo microchip, agitou as águas parlamentares e relançou o debate sobre a protecção de dados. Na sua génese esteve a Lei nº 60/2008, de 16 de Setembro63. Esta legislação, autorizou o Governo a legislar sobre a instalação obrigatória de um dispositivo electrónico de matrícula em todos os veículos automóveis, ligeiros e pesados, seus reboques e motociclos, e todos os ciclomotores. No uso da autorização legislativa concedida pela Lei nº 60/98, o Decreto-Lei nº 112/2009, de 18 de Maio, procedeu à segunda alteração ao Decreto-Lei nº 54/2005, de 3 de Março, que aprovou o Regulamento do número e chapa da matrícula. No uso dessa mesma autorização legislativa, o Decreto-lei nº 113/2009 de 18 de Maio, estabeleceu um regime aplicável às infracções e às normas que constituem a disciplina aplicável à identificação ou detecção electrónica de veículos através do dispositivo electrónico de matrícula, alterando a Lei nº 25/2006 de 30 de Junho. Por seu turno, o Decreto-Lei nº 111/2009, de 18 de Maio veio a permitir a constituição de uma sociedade S.I.E.V. (Sistema de identificação electrónica de veículos, S.A.), atribuindo-lhe o exclusivo de exploração e gestão do SIEV. A constituição desta entidade ocorreu por necessidade de salvaguardar por um lado, o direito à privacidade dos proprietários e utilizadores de veículos automóveis e a questão de tratamento dos respectivos dados pessoais e, por outro lado, a fiabilidade, a continuidade e a globalidade de prestação deste novo serviço público de identificação electrónica de veículos que exigiam que o mesmo fosse prestado com carácter de exclusividade pelo Estado. Esta identificação ou detecção electrónica de veículos através de DEM, visa segundo o artigo 1º da Lei nº 60/2008: a) fiscalizar o cumprimento do Código da Estrada e demais legislação rodoviária; b) identificar veículos para efeitos de reconhecimento de veículos acidentados, abandonados ou desaparecidos; c) cobrar electronicamente portagens em conformidade com o Serviço Europeu de Portagem. 63 Vd Debate da Proposta de Autorização legislativa 213/X (3) que originou esta lei. In DAR I S nº107/V/3 de 17 de Julho de 2008 41 Os dados colhidos com recurso a esta nova tecnologia serão armazenados em bases de dados a constituir e manter ao abrigo da Lei n.º 67/98, de 26 de Outubro. Essa legislação suscitou desde logo sérias reservas dos diversos grupos parlamentares na Assembleia da Republica e da Comissão Nacional de Dados Pessoais que nos seus Pareceres 6/2006, de 7 de Março, 15/2008, de 21 de Abril e 42/2008, de 21 de Novembro64 foram lapidares sobre a matéria controvertida considerando que “a identificação de veículos através de leitura electrónica da sua matrícula, se for entendida de modo a permitir a localização geral e permanente do paradeiro ou percurso do titular de qualquer veículo em circulação, traduz-se numa violação ilegítima e não justificada da reserva da vida privada dos cidadãos”. Acrescenta ainda a CNPD no Parecer 15/2008 que “a localização geral e permanente dos veículos em circulação por meio da leitura electrónica de matrículas, feita com a finalidade especial de identificar veículos furtados, só é admissível quando a solução técnica adoptada para essa identificação ofereça garantias suficientes da não sujeição a vigilância policial, por meio de uma localização geral dos ses veículos, dos cidadãos, não delinquentes. A CNPD considera que a legislação deve permitir que os condutores possam optar, com todas as garantias, entre o pagamento das portagens através de um sistema electrónico de leitura das matrículas e a sua cobrança através de outros meios já existentes. O relator Vasco Almeida, no Parecer 42/2008 da CNPD, considera mesmo que a legislação “cai fora dos fins permitidos pela Lei nº 60/2008, de 16 de Setembro, e contraria o direito à privacidade dos condutores qualquer emprego da identificação e detecção electrónica dos veículos para efectuar uma vigilância em tempo real ou a partir de registos sucessivos dos movimentos do condutor dos veículos, incluindo o caso de recursos à implantação de uma número excessivo de equipamentos de leitura ao longo do trajecto efectuado por um veículo determinado”. Mais uma vez a CNPD revela neste Parecer o seu espírito de guardiã e defensora das liberdades, preocupação que acompanhamos de perto. 64 V.d. Pareceres na íntegra in Anexos III, IV e V, respectivamente. 42 6.2.2. A Experiência comparada65 O Serviço Electrónico de Portagem foi instituído pela Directiva 2004/52/CE do PE e do CE de 29 de Abril de 2004, que estabelece as condições necessárias para assegurar a interoperabilidade do Sistema Electrónico de Portagem de todas os tipos de taxas rodoviárias no conjunto de rede rodoviária comunitária submetida a portagem. Esta Directiva foi transposta para a ordem Jurídica Interna pela Lei 30/2007, de 6 de Agosto66. Se olharmos para a experiencia comparada67 de Bélgica, Espanha, França e Reino Unido verificamos que na legislação sobre matrículas de veículos não existe qualquer norma sobre dispositivos electrónicos de matrícula. O ordenamento jurídico espanhol também não inclui nenhuma norma que regule especificamente a questão do dispositivo electrónico de matrícula. Contudo, o Real Decreto 1428/2003 de 21 de Novembro, pelo qual se aprova o regulamento geral de circulação, menciona no seu artigo 139º, relativo à responsabilidade da sinalização das vias no ponto 2, a possibilidade de ser aplicado controlo telemático e outros elementos tecnológicos na regulação do tráfego e da segurança rodoviária, através de vigilância dos veículos que circulam nas estradas espanholas. É à autoridade autónoma e local que é atribuída a responsabilidade de manter nas melhores condições a segurança da via, podendo para o efeito, utilizar alguns dos dispositivos expostos. Sublinhe-se que a Direcção Geral de Tráfego colocou em funcionamento um sistema para comprovar automaticamente se os veículos, por exemplo, dispõem de seguro obrigatório ou imposto de circulação. Este dispositivo instalado nos veículos da Guarda Civil de Tráfego compõe-se de um sistema de vídeo que permite aos agentes conhecer, em tempo real, se algum dos veículos consultados apresenta algum tipo de 65 Vd. Quadro comparativo – Anexo VI Tendo em conta, o estabelecido nesta Directiva a Decisão da Comissão 2009/50/CE de 6 de Outubro de 2009 procede à definição do Serviço Electrónico Europeu de Portagem (SEEP) e estabelece normas e requisitos técnicos necessários. Em ambos os actos legislativos supramencionados se refere que a introdução do SEEP implica o tratamento de dados pessoais, o qual se deve efectuar no respeito das normas comunitárias aplicáveis á protecção das liberdades e direitos pessoais fundamentais. A CNPD no seu Parecer 6/2006 pronunciou-se sobre o projecto de diploma que transpunha para o ordenamento jurídico nacional a Directiva 2004/52/CE do PE e do Conselho de 29 de Abril de 2004, nessa altura a Comissão suscitou, desde logo, 3 questões prévias relacionadas com o conteúdo da Directiva, por versar matéria de direitos fundamentais (direito de livre circulação e o direito á privacidade) que face ás soluções tecnológicas abordados poderiam sofrer reduções. Alertaram ainda para a natureza da matéria tratada no diploma cuja forma deverá ser a de Lei (166º nº3 da CRP) ou decreto-lei autorizado (art. 161º al. b9 da CRP). A Comissão entendeu ainda que a própria directiva por versar tratamento de dados pessoais deveria ter sido sujeita a parecer do GT instituído pelo artigo 29º da Directiva 95/46/CE. Quanto ao conteúdo sugerem a adopção de solução tecnológica prevista na alínea c) do projecto, uma vez que da utilização do posicionamento por satélite ou de comunicações móveis segundo norma GSM decorre uma restrição excessiva à liberdade de circulação da pessoa e ao seu direito à privacidade e as tecnologias micro ondas 5,8 GHZ são mais adequadas e proporcionais e não excessivas em termos de protecção de dados pessoais. 67 Vd. Relatório da Comissão de Obras Públicas, Transportes e Comunicações, sobre o PJL 15/XI (PSD), PJL 26/XI (BE) e PJL 28/XI (PCP), publicado no DAR II S A nº 52/XI de 22 de Março de 2010. 66 43 irregularidade. Existem já várias empresas que asseguram produto para a gestão e controlo de tráfego na via pública. Na legislação francesa também não foi conhecida nenhuma norma que regule especificamente a questão do dispositivo electrónico de matrícula. Em França, os dispositivos de matrícula são regulados pelo artigo R317 do Código da Estrada (parte não legislativa). Este artigo, o primeiro da secção 2., é regulamentado pelo Arrete de 9 de Fevereiro de 2009, que fixa as características e o modo de colocação das chapas de matrícula dos veículos. Quanto ao Reino Unido, as regras sobre as matrículas são determinadas pelo Statutory Instrument nº 561. Este regulamento não fixa qualquer obrigatoriedade de existência de um chip na matrícula. Igualmente a Alemanha não dispõe de referências a dispositivos desta natureza. Na Noruega existe um número elevado de viaturas que possuem um chip electrónico que pode ser lido remotamente. Até ao momento presente, esse chip é apenas utilizado para o pagamento de Portagens e para coligir dados de tráfego. O único País que foi possível identificar como tendo aprovado um dispositivo electrónico de matrícula foi o Peru (Decreto Supremo 038-2008-MTC de 8 de Novembro de 2008). Neste País, além das 2 matrículas tradicionais que deverão ser colocadas na frente e na traseira do veículo, existe uma terceira placa que será colocada no pára-brisas selada com adesivo e visível desde a parte exterior, onde estará registado o número de matrícula, a marca, o modelo e um chip de rádio frequência que se autodestruirá se se verificar uma tentativa de retirada do mesmo. Esta breve viagem de direito comparado revela ainda poucos desenvolvimentos numa área que estamos certos irá ser objecto de novas soluções, por força de imperativos de segurança rodoviária, fluidez de tráfego, controlo de veículos abandonados ou desaparecidos. 44 6.2.3. As posições e visões dos Partidos Políticos68 O Debate sobre o dispositivo electrónico da matrícula revelou a existência de muitas dúvidas sobre esta matéria e o Parlamento vivenciou vários debates sobre essa matéria, sendo o mais recente o ocorrido em 25 de Junho de 2010. Os diversos grupos Parlamentares do PSD, PCP; BE e CDS-PP apresentaram, respectivamente, os Projectos de Lei 15/XI, 28/XI, 26/XI e 320/XI, que confluíram para a necessidade de revogação do sistema electrónico de veículos e do dispositivo electrónico de matrícula constante do Decreto Lei nº112/2009, de 18 de Maio, originário da autorização legislativa nº 60/2008, de 16 de Setembro. As dúvidas suscitadas pela CNPD e esgrimidas no Parecer 42/2008 serviram de sustentação crítica a estas iniciativas legislativas. Entendem os proponentes destes Projectos de lei que se mantêm as dúvidas e reservas suscitadas aquando dos debates parlamentares sobre a proposta de lei de autorização legislativa. Para o Deputado António Filipe (PCP) o Projecto de Lei que apresentam “tem fundamentalmente em atenção as questões de princípio invocadas no relatório da CNPD sobre esta matéria e que o Governo pura e simplesmente ignorou”. Recordou ainda o parlamentar que o parecer da CNPD chamava precisamente a atenção para a violação dos direitos fundamentais que constituía a obrigatoriedade de imposição dos chips nas matrículas porque, segundo considerava a CNPD “uma coisa era voluntariamente haver cidadãos que aceitavam vincular-se a um mecanismo dessa natureza por sua conveniência, outra coisa era a violência que consistia em obrigar todos os cidadãos a submeterem-se a isso”. Aludiu ainda à duvidosa obrigatoriedade de débito automático na conta de depósito e de cartões de crédito ou de débito que coarctam a liberdade de circulação e a liberdade económica. Por seu turno, o PSD, através do Deputado Miguel Macedo expressou a sua oposição à instituição das SCUTS no País e aos chips, daí que tenham votado sempre contra a autorização legislativa: “ não queremos que os cidadãos automobilistas sejam obrigados a andar com o Estado no banco de trás dos seus automóveis. Não aceitamos a obrigatoriedade da instituição do chip nos automóveis.”. O Bloco de Esquerda, nesse mesmo debate, afirmou a necessidade de revogação do pacote legislativo dos chamados dispositivos electrónicos porque o Governo não foi capaz de responder às dúvidas e às questões colocadas sobre “ Quem está autorizado e a quê dessas bases de dados? E “como é que tudo isso de compagina com a protecção e o respeito dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos?” Alertou ainda o Deputado Heitor Sousa (BE) que existem riscos de uma 68 Vd Debate Parlamentar in DAR I S nº 72, de 25 de Junho – Anexo VII. Votação generalidade in DAR, I S nº 72/XI/I; texto final e relatório de votações na especialidade in DAR II S A nº 120/XI/ de 16 de Julho de 2010 e votação final global DAR I S nº 79/XI/I de 16 de Julho de 2010. O decreto da AR foi o 35/XI e foi publicado in DAR II S A nº 130/XI/I de 2 de Agosto de 2010, que originou a lei nº 46/2010, publicada no DR I S nº 174/XI/ de 7 de Setembro de 2010. 45 vigilância omnipresente sobre os veículos e condutores através da “implantação de um número excessivo de equipamentos de leitura electrónica de matrículas ao longo da vida”. Observa anda o Deputado que “a verdade é que a obrigatoriedade do uso de dispositivos ao impossibilitar os pagamentos por meios alternativos, vai criar um novo big brother que nos acompanha estrada fora”. O CDS nesse debate apresentou-se também contra o uso dos chips que considerou um “processo intricado” e intrusivo”. Os verdes (PEV) criticaram o Governo que baseou toda a sua argumentação na segurança rodoviária mas afirmando que existiriam outras intenções ocultas. Para o PEV “a implementação de um sistema de portagens que obriga os condutores a darem uma boleia permanente a passageiros do tipo big brother, através de um dispositivo de vigilância e controlo sobre os cidadãos, é inaceitável. E é-o tanto mais que o Governo se prepara para construir uma base de dados que pode até ser facultada também às concessionárias e subconcessionárias da rede rodoviária nacional”. Criticaram ainda o facto do Governo ter contrariado o parecer da CNPD que aponta para a necessidade de compatibilizar esta obrigatoriedade com a liberdade dos condutores de escolherem entre o pagamento através do sistema de leitura do dispositivo de matricula por radiofrequência e a cobrança por outros meios já existentes. Disseram que o Governo pretendia obrigar os actuais utilizadores de via verde a proceder à instalação de dispositivos electrónicos de matrículas, tornando aquele sistema insuficiente com meios de pagamento, ao contrário do que hoje sucede. O PS neste debate, ainda que isolado, tentou clarificar algumas das questões controversas referindo que o DEM “é um instrumento como o que serve para a leitura na via verde. Não é mais do que isto que está a ver na mão (afirmou o deputado Horácio Antunes exibindo um dispositivo para todo o hemiciclo). Acrescentou ainda que não se coloca na matrícula do carro, coloca-se no pára-brisas. O líder parlamentar do PS, Francisco Assis reiterou, contudo, que o processo não terminava neste debate e que seria possível encontrar uma solução consensual “porque a vida política portuguesa não pode ser uma sucessão de pequenos dramas”. Na Comissão competente e em sede de especialidade, encontrou-se entretanto uma solução de consenso que se encontra espelhada na Lei n.º 46/2010, tendo o PS cedido na questão da obrigatoriedade, nas formas de pagamento (pré-pagamento) e estando acauteladas assim todas as reservas da CNPD. Portugal e o Parlamento revelaram assim, neste processo, a importância conferida à CNPD e à protecção dos direitos e liberdades dos cidadãos, o que é revelador de uma cultura de standards 46 elevados nesse domínio. Noutros países, designadamente no México69, os chips já são objecto de discussões num campo ainda mais sensível, designadamente, com a autorização de implantes via venosa para protecção preventiva de sequestros. Neste caso, existe mesmo um espião “inside”, adesão essa crescente (mais de 2 mil pessoas) que revela uma cedência em toda a linha de segurança pessoal em detrimento da liberdade e privacidade individual. Nesta procura de conciliação entre os valores da segurança e da liberdade, importa ter presentes, por um lado, o princípio da necessidade ou da proibição do excesso, e por outro, os procedimentos representantes à harmonização prática dos direitos fundamentais em conflito ou em colisão. A ordem jurídica não é uma estrutura estática e definitiva mas uma ordem evolutiva, uma resposta diferente a cada nova situação social. O jurista tem de ser o agente desta incessante actuação da ordem jurídica, sabendo distinguir o que deve fazer-se e o que tem de morrer, porque contrário à ordem social da sociedade. No justo entendimento do Prof. Oliveira Ascensão70 “a liberdade de repudiar equilíbrios actuais em nome de uma ordem mais alta é característica última do verdadeiro jurista e missão indeclinável que lhe caberá desempenhar em todas as épocas históricas”. Todo este debate que abrange este capítulo em particular é revelador das tensões existentes no campo jurídico, económico e científico71 nesta matéria. Apesar de estarmos conscientes das ameaças à privacidade, as quais são potenciadas cada vez mais pela revolução provocada pelas possibilidades abertas do tratamento dos dados pessoais que permite que sejamos perseguidos durante o nosso quotidiano, a verdade é que parece não estarmos dispostos a operar alguma mudança neste trajecto. Será que a “pessoa electrónica” se imporá à “pessoa, sujeito de direitos” que não abdica da reserva da intimidade da vida privada”? Parecem assim, cada vez mais próximas - embora com as devidas distâncias dado que vivemos num estado de Direito Democrático, ancorado numa Constituição de vanguarda, onde os Direitos fundamentais se consolidam todos os dias - as palavras ficcionadas de George Orwell72: “O telecrã captava e emitia ao mesmo tempo. Qualquer som que Winston fizesse acima do nível de um tenuíssimo sussurro, seria por ele registado; além disso, enquanto alguém permanecesse no campo de visão dominado pela placa metálica, podia ser não apenas ouvido mas também visto. Não havia, é claro, maneira de as pessoas saberem se estavam a ser observadas em dado momento…” 69 Vd notícias nesse sentido in http://novaordemmundial.net e http://vigiai.combr Vd. “O direito. Introdução e Teoria Geral”, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 3º edição. 71 Ainda a propósito dos microchips veja-se o Programa da Novartis que apresenta a nova pílula espião (comprimido com microchip) que visa avaliar a rejeição de órgãos em pacientes transplantados. V.d. htpp://real-agenda.com. 72 In Mil Novecentos e Oitenta e Quatro, Edições Antígona, 4ª edição, 2002. 70 47 VII – Conclusão Se o quadro escolhido para finalizar com as conclusões foi o nascimento do homem novo “Criança geopolítica assistindo ao nascimento do Homem Novo” de DALI, foi-o não só porque ao artista era tão cara a sua descoberta mas também porque, na verdade, estamos de novo na era de um homem novo, uma viragem de crenças, costumes e princípios. Um homem novo mais enriquecido e maturo mas mais frágil porque mais exposto e, em que o Mundo que o protege também o pode fragilizar. Tal qual como o ovo de que nasce o homem de Dali.... O ovo é o próprio mundo, com uma casca mole, onde os continentes são moles e estão a derreter misteriosamente, a África ocidental deixou cair uma lágrima representada pela gota de sangue extremamente espesso a sair de um ovo que é duro, mas ao mesmo tempo mole. Esta, transmite a mensagem de que o novo homem poderá cometer mais erros que o primeiro, que será ainda mais errante que o primeiro homem mas, tenhamos em conta a mulher grávida ao fundo e à esquerda, um sinal de Vida que pode ser uma vida plena de tudo o que quisermos fazer dela. Estamos na época do Genoma Humano, na era da informação à velocidade da luz em que não devemos permitir que nos tornem no futuro prisioneiros do que nos tiraram no passado. O Direito à Informação e ao Ciberespaço não deve conflituar com o Direito ao Espaço pessoal e único de cada cidadão. A segurança não deve violar o direito à privacidade. Este deve ter uma esfera tão segura que será impenetrável. No caminho para um Mundo Globalizado o Ser Humano não deve ser despersonalizado. Há que criar um quadro normativo que resista à passagem do tempo e que uma vez desrespeitado incluirá sérias punições tendo em conta os Valores em causa. ( Dali – 1943 Criança geopolítica observando o nascimento do homem novo ) 48 BIBLIOGRAFIA (consultada por Adelina Barradas de Oliveira) Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 03.05.2006-Proc. 0546541 (dgsi.pt) http://www.inverbis.net/tribunais/testes-adn-acordaos-relacao-do-porto.html (consultado em 29 Março de 2011) Acórdão nº 616/98 do Tribunal Constitucional, de 17 de Março de 1999 (artº172º1CPP/126ºnº1CPP). http://ruadosbragas223.home.sapo.pt/Acordaos/ACORDAO_N_155-2007_Processo_69506_A4.pdf - (consultado em 25 Março de 2011). TOURAINE, Alain. “O que é a Democracia?”, Instituto Piaget, Lisboa, 1996, pag. 22 e 23. BARREIROS, José António – “Informática, Liberdade e Privacidade” – artº 35º pag 131. COMISSÃO EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM – Decisão de 4 de Dezembro de 1978, em Décision e Rapports, 16, 12 1979, págs. DAMÁSIO, António – “O Sentimento de si – O corpo, a Emoção e a Neurobiologia da Consciência”. DESCHARNES, Robert – Néret Gilles- DALI. 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