http://dx.doi.org/10.5540/DINCON.2011.001.1.0037
144
ANÁLISE PRELIMINAR DE UM NOVO ATRATOR
Gustavo Henrique Oliveira Salgado1 and Luis Antonio Aguirre2
1
2
Universidade Federal de Itajubá - Campus Itabira, Itabira, Brasil, [email protected]
Programa de Pós Graduação em Engenharia Elétrica, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil,
[email protected]
Resumo: O trabalho descreve a análise de um sistema no R
que produz um atrator estranho denominado “atrator corda”.
Algumas das características desse atrator é a falta de simetria
e o fato de ter duas variáveis a partir das quais o sistema é
muito pouco observável. Apresenta-se a caracterização do
único ponto f xo do sistema, discutem-se questões referentes
à reconstrução do espaço de fases e são mostrados mapas de
primeiro retorno a duas seções de Poincaré.
Palavras-chave: Dinâmica não linear, atrator estranho,
seção de Poincaré.
1. INTRODUÇÃO
Diversos trabalhos em sistemas dinâmicos não-lineares
iniciam com a reconstrução do espaço de fases. Nos casos
em que somente uma variável é registrada, o espaço reconstruído depende de alguns fatores conhecidos, dentre eles: i) a
observabilidade do sistema a partir da variável registrada, e
ii) as propriedades de simetria do sistema [1]. Sistemas com
simetria apresentam particularidades na reconstrução do espaço de fases e, portanto, é bastante conveniente ter sistemas
de teste que não sejam simétricos e que apresentem desaf os
em tal reconstrução a partir de uma variável. Um sistema
com essas características é o conhecido conjunto de equações
de Rössler, para o qual a reconstrução a partir da variável z é
bastante mais difícil do que o é utilizando as variáveis x e y.
Em artigo recente [2] o sistema

ẋ = −(y + z) + a(F − x)



ẏ = xy − bxz − y + G
(1)



ż = bxy + xz − z
foi proposto para estudar questões relacionadas à observabilidade e reconstrução de sistemas dinâmicos não lineares.
Assim como o sistema de Rössler o novo sistema não tem
simetria, mas ao contrário do sistema de Rössler, ele têm
duas variáveis a partir das quais a reconstrução é muito difícil.
O objetivo desse artigo é apresentar uma análise preliminar do sistema (1) para os seguintes valores dos parâmetros
a = 0,25; b = 4,03; F = 8,00 e G = 1,00. Nessa condição
o sistema possui apenas um ponto f xo e um atrator estranho.
Na seção 2 será visto que os pontos f xos de (1) são determinados, em geral, por interseções de hipérboles associadas às
equações de ẏ e ż e a dinâmica local em torno do ponto f xo
será estudada. Alguns aspectos gerais do atrator serão mencionados na Seção 3 e na Seção 4 serão fornecidos parâmetros para fazer a imersão do atrator a partir de observações da
variável x. A partir dessas reconstruções, serão obtidos mapas de primeiro retorno para f uxo que permitirá melhor compreender a organização do assim chamado “atrator corda”.
2. PONTOS FIXOS E ESTABILIDADE LOCAL
A partir dos pontos f xos do sitema (1) será determinado
o comportamento dinâmico local em torno dos pontos f xos.
Os pontos f xos são obtidos pela resolução do sistema ẋ =
ẏ = ż = 0. Isolando a variável x a partir da equação ẋ = 0
obtem-se, para a 6= 0
x=F −
y+z
.
a
(2)
Substituindo (2) nas equações ẏ = 0 e ż = 0 obtem-se as
seguintes equações:
y 2 − (b − 1)yz − bz 2 − a(F − 1)y + abF z = aG,
(3)
by 2 + (b + 1)yz + z 2 − abF y − a(F − 1)z = 0.
(4)
As equações (3) e (4) são hipérboles no plano yz para b 6= −1
e b 6= 1, respectivamente. Se b ∈ {−1, + 1} estas equações
retratam uma hipébole e uma parábola. Assim, os pontos f xos do sistema (1) são determinados pelas interseções
dessas curvas. A Figura 1 exibe essas interseções para os
valores dos parâmetros a = 0,25, b = 4,03; F = 8,00 e
G = 1,00. Nesse caso as equações (3) e (4) têm apenas um
ponto em comum. Portanto, o sistema (1) possui apenas um
ponto f xo.
145
3. O ATRATOR ESTRANHO
Dada uma condição inicial (x0 , y0 , z0 ) é possível observar numericamente que as órbitas convergem para uma
região do espaço formando o atrator estranho. A Figura 2 foi
gerada a partir da condição inicial (0,0,0) e exibe como essa
órbita se comporta em torno do atrator.
Figura 1 – A hipérbole desenhada com tranço ponto representa
a hipérbole da equação (3) enquanto que a linha contínua representa a hipérbole da equação (4). Os valores dos parâmtros escolhidos foram a = 0,25; b = 4,03; F = 8,00; G = 1,00.
Isolando uma das variáveis da equação (4) e substituindo
a expressão obtida na equação (3) obtem-se uma equação envolvendo uma única variável. Utilizando um algorítimo para
soluções de equações algébricas e realizando substituições
retroativas foram encontrados os seguintes valores numéricos aproximados para o ponto f xo


7,9060810618004233755744
X ∗ ≈  −0,0064977032489081417283  .
(5)
0,0299774377988022978347
O comportamento dinâmico local em torno dos pontos
f xos de um sistema de equações diferenciais pode ser estudado a partir linearização do sistema no caso do ponto f xo
ser hiperbóbico1 [3, 4]. A lineariação do sistema (1) no
ponto f xo X ∗ é dada por


−0,2500 −1,000
−1,000




DF |X ∗ ≈  −0,1273 6,9056 −31,6225  . (6)


0,0285 31,6225
6,9056
Figura 2 – Órbita para condição inicial (0, 0, 0) com N = 105
pontos e passo de integração δt = 10−3 . O transiente não é
mostrado na figura.
Para entender certos aspectos desse atrator é necessário
compreender como suas óbritas são organizadas. Uma
maneira de realizar essa análise é utilizar seções de Poincaré
e reduzir o estudo aos mapas de primeiro retorno [3, 4].
Um aspecto curioso do atrator mostrado na Figura 2 é a
formação de uma “corda” na qual trechos da trajetória do
sistema são espremidos em uma pequena região do espaço.
Além disso, a referida “corda” é praticamente paralela à coordenada x e, portanto, ortogonal ao plano yz. Como consequência, as variáveis y e z praticamente não possuem informação sobre a “corda”. A Figura 3 ilustra que a projeção
sobre o plano yz das órbitas do atrator esconde a geometria
em formato de “corda” que o atrator possui em seu interior.
Os autovalores de (6) são
=
−0,2469113497
λ2,3
=
6,9045367366 ± j31,8592215425.
20
(7)
Portanto, existe uma variedade estável W s de dimensão
um associada ao autovalor λ1 e uma variedade instável W u
de dimensão dois associada ao par de autovalores complexos
conjugados λ2 e λ3 .
Contudo, o comportamento dinâmico em torno do ponto
f xo determinado pelo espaço estável E s e pelo espaço instável E u não é observado em todo o espaço. Em sua estrutura
dinâmica, o problema apresenta um atrator estranho. Esse
atrator retrata a dinâmica global do estado estacionário do
sistema.
1 Um
ponto f xo é dito hiperbólico se os autovalores da linearização do
sistema de Eq. diferenciais possuem parte real não nula.
10
z
λ1
30
0
−10
−20
x
−10
0
10
20
y
Figura 3 – Projeção do atrator sobre o plano yz. Certas características do atrator não são observadas pelas variáveis y e z.
A pobre observabilidade do sistema (1) a partir das variáveis y e z, comparado à variável x foi recentemente quantif cada. Coef cientes de observabilidade que requerem o conhe-
146
cimento das equações do sistema podem ser utilizadas para
quantif car a facilidade de obter uma imersão a partir de uma
variável [6]. Para o sistema (1) os seguintes valores foram
obtidos δx = 0,0104, δy = δz = 0,0005 [2]. Essa mesma
ordem de observabilidade foi conf rmada por um método
que procura, indiretamente, quantif car a observabilidade somente a partir de dados [2]. Os valores dos coef cientes
foram Sx = 0,35 ± 0,029, Sy = Sz = 0,04 ± 0,002 para
dados sem ruído, e Sx = 0,31 ± 0,028, Sy = 0,04 ± 0,002 e
Sz = 0,03±0,001 para 10% de ruído nos dados [2]. Um procedimento baseado em dados, como o mencionado, requer
a imersão da série temporal. Esse assunto será brevemente
mencionado na próxima seção.
reconstruído utilizando (8) com τ = 15 que corresponde a
uma perna de tempo t = 15 × 10−3, em que 10−3 foi o passo
utilizado na integração do sistema (1). Como pode ser visto
(compare com a Figura 2), a estrutura fundamental do atrator
foi preservada.
4. IMERSÃO DA SÉRIE TEMPORAL
Como a variável x é a que tem o maior coef ciente de
observabilidade, a imersão será realizada a partir do registro
de x(t) obtido por meio de integração numérica para reconstrução do atrator [5]. A Figura 4 exibe uma janela da série
temporal de x(t). O objetivo é encontrar seções de Poincaré
que permitam obter inforfações a organização do atrator a
partir dessas reconstruções. Dois conjuntos de coordenadas
serão utilizados na presente investigação: coordenadas de
atraso e coordenadas diferenciais.
6
4
x(t)
2
0
−2
Apesar da reconstrução do atrator mostrada naFigura 5
apresentar as principais características originais do sistema,
não se conseguiu encontrar uma seção de Poincaré conveniente para construir um mapa de primeiro retorno. Isso não
é necessariamente uma falha do procedimento de imersão,
mas deve-se à estrutura peculiar do atrator corda. Um novo
conjunto de coordenadas de imersão foi usado para contornar
essa dif culdade.
4.2. Imersão por coordenadas diferenciais
−4
−6
Figura 5 – Imersão por tempo de atraso: τ = 15.
0
0.5
1
1.5
2
t
Uma outra maneira de realizar a reconstrução do atrator
é usar um conjunto de coordenadas diferenciais, no qual os
vetores são da forma [x(t), ẋ(t), ẍ(t)]T . Como x(t) só é
registrada em tempos discretos, as derivadas foram estimadas
numericamente como
2.5
4
x 10
Figura 4 – Série temporal x(t).
4.1. Imersão por coordenadas de atraso
Para a imersão por coordenadas de atraso da série temporal foi utilizado a aplicação de imersão
[X(i), Y (i), Z(i)] = [x(i), x(i + τ ), x(i + 2τ )],
(8)
em que i = 1, · · · ,N ; N é o número de dados da série temporal discretizada e o parâmetro τ é o tempo de atraso associado. Para uma série temporal contínua, τ corresponde a um
intervalo de tempo que determina o tempo de atraso entre as
coordenadas.
Foram realizadas imersões da série temporal x(i) utilizando (8) para diferentes valores de τ . Valores pequenos de
τ resultam na concentração da trajetória ao longo da diagonal
principal do espaço reconstruído. Por outro lado, tempos de
atraso excessivamente elevados fazem com que o atrator reconstruído perca sua estrutura original, pois nesses casos as
componentes dos vetores reconstruídos perdem a correlação
temporal mútua [7]. A Figura 5 mostra o espaço de fases
ẋ(i) ∼
ẍ(i) ∼
x(i + 1) − x(i − 1)
x(i + 1) − 2x(i) + x(i − 1).
(9)
Assim, foi construída a seguinte aplicação de imersão por
coordenadas diferenciais


x(i)




x(i + 1) − x(i − 1)


10
(10)


−3
10




x(i + 1) − 2x(i) + x(i − 1)
102
10−6
em que os fatores de potências de 10 nas segunda e terceira
coordenadas representam mudanças de escalas nos eixos
ẋ(t) e ẍ(t) para melhorar a visualização na reconstrução.
A reconstrução do atrator a partir da aplicação (10) está
exibida nas Figuras 6 e 7.
A partir da Figura 7 é possível detectar um espaço sem
preenchimentos de trajetórias para valores da coordenada ẍ
147
5.6
5.5
5.4
x(k+1)
5.3
5.2
5.1
5
4.9
4.9
5
5.1
5.2
x
5.3
5.4
5.5
5.6
k
Figura 9 – Mapa de Primeiro Retorno F (xk ) = xk+1 .
Figura 6 – Imersão por coordenadas diferenciais.
5. CONCLUSÃO
Figura 7 – Imersão por coordenadas diferenciais - Projeção sobre o plano ẋ × ẍ.
O trabalho descreve alguns passos iniciais na análise de
um sistema que apresenta um atrator estranho no R3 . Para o
conjunto de parâmetros estudados, o sistema apresenta apenas um ponto f xo com variedade estável em R e variedade
instável em R2 . Estudos de estabilidade anteriores indicam
que a reconstrução a partir apenas das variáveis y ou z é
muito difícil, uma vez que a “corda” f ca praticamente imperceptível. Essa observação foi conf rmada pelos estudos de
imersão discutidos no presente artigo. Tomando por base as
imersões estudadas, foram propostas duas seções de Poincaré
para o f uxo e os correspondentes mapas de primeiro retorno.
A análise do sistema em estudo, reconhecidamente, está no
início. Um alvo de médio prazo é poder investigar características do sistema que resultam na formação da “corda”.
AGRADECIMENTOS
entre o nível da “corda” e ẍ = −3 no atrator. A partir dessa
região é possível def nir seções de Poincaré convenientes
para construirmos o mapa de Poincaré associado. Para construção da seção exibida na Figura 08 foi escolhido o plano
ẋ = −2 com valores de ẍ ≤ −3.
−4
−5
−5.5
2
Referências
[1]PUB C. Letellier; L.A. Aguirre, “Investigating nonlinear
dynamics from time serires: the inf uence of symmetry
and the choice of observables”, CHAOS, Vol 12, pp.
549-558, 2002.
[2] L.A. Aguirre and C. Letellier, “Investigating observability properties from data in nonlinear dynamics”,
Physical Review E, (to appear), 2011.
−4.5
−6
[3] N. Fielder-Ferrara e C.P.C. do Prado, “Caos: uma Introdução,” São Paulo: Editora Edgar Blucher, 1994.
2
d x/dt
Os autores agradecem f nanciamento do CNPq.
−6.5
−7
[4] L.H.A. Monteiro, “Sistemas Dinâmicos,” 2a edição,
São Paulo: Editora Livraria da Física, 2006.
−7.5
−8
−8.5
4.9
5
5.1
5.2
x
5.3
5.4
5.5
5.6
Figura 8 – Seção de Poincaré ẋ = −2 para ẍ ≤ −3.
A partir das coordadas x da seção descrita na Figura 8
obteve-se o mapa de primeiro retorno F (xk ) = xk+1 exibido na Figura 9. Tal mapa conf rma o caráter dissipativo da
dinâmica e por apresentar um máximo diferenciável aponta
para o fato de que esse sistema deve apresentar uma cascata
de duplicação de período como rota para o caos.
[5]DOI G.B. Mindlin; R. Gilmore,“Topological analysis and synthesis of chaotic time series ,” Physica D:
Nonlinear Phenomena Vol 58, No. 1-4, pp. 229-242,
February 1992.
[6] C. Letellier, L.A. Aguirre and Maquet, J., “Relation
between observability and differential embeddings for
nonlinear dynamics”, Physical Review E, Vol 71, paper 066213, 2005.
[7] M.A. Savi. “Dinâmica Não-linear e Caos”. Rio de
Janeiro: E-papers, 2006.
Download

ANÁLISE PRELIMINAR DE UM NOVO ATRATOR