Capítulo 3 Ludwing Boltzmann 3.1 3.2 3.3 Modelo Molecular de um Gás Ideal Capacidade Calorífica Molar de um Gás Ideal Processos Adiabáticos para um Gás Ideal (1844-1906) 1 3.1 Modelo Molecular de um Gás Ideal Dum ponto de vista macroscópico, a representação matemática do modelo do gás ideal é a lei do gás ideal: PV nRT As propriedades macroscópicas podem ser compreendidas com base no que está acontecendo na escala atómica Examinaremos também a lei do gás ideal em termos do comportamento das moléculas individuais que formam o gás Modelo estrutural de um gás mantido num recipiente • O número de moléculas no gás é muito grande e a separação média entre as moléculas é grande quando comparada com suas dimensões • As moléculas obedecem às leis do movimento de Newton, mas como um todo movem-se aleatoriamente • As moléculas interagem somente por meio de forças de curto alcance durante colisões elásticas • As moléculas colidem elasticamente com as paredes do recipiente • O gás é puro, o que significa que todas as suas partículas são idênticas 2 Interpretação Molecular da Pressão de um Gás Ideal Uma das moléculas de um gás ideal, de massa m move-se numa caixa cúbica de lado d, com uma velocidade vxi na direção do eixo x (i referese a partícula i) A componente pxi do momento linear da molécula antes da colisão é mvxi , e depois da colisão é – mvxi A variação no momento linear da molécula na direção x é pxi pdepois da colisão pantesda colisão pxi mvxi (mvxi ) 2mvxi O intervalo de tempo entre duas colisões com a mesma parede 2d t v xi 3 Sabemos que o impulso é igual a variação do momento linear momento linear: I i pxi Fi tcolisão pxi 2mvxi tcolisão t onde Fi é a força da parede sobre a molécula 2mvxi 2mvxi mvxi2 Fi t 2d / vxi d Pela terceira lei de Newton a componente da força que a molécula exerce sobre a parede é m vxi2 m vxi2 Fi, sobre a parede Fi d d 4 Considerando as N moléculas do gás ideal no recipiente de volume V: A força média total exercida pelo gás sobre a parede do recipiente m vxi2 m N 2 F vxi d d i 1 i 1 N A força constante, sobre a parede devido às colisões moleculares tem o valor F F m N 2 F v xi d i 1 N v 2 x 2 v xi i 1 N m F N v x2 d Pelo teorema de Pitágoras: vi2 vxi2 vyi2 vzi2 v2 v 3 2 x e v 2 3vx2 5 A força total sobre a parede é m v 2 F N d 3 N mv 2 3 d Obtemos a pressão exercida sobre a parede, dividindo F pela área da parede (A=d2) . No denominador ficamos com d3=V 2 N 1 2 P m v 3 V 2 1N P mv 2 3V A pressão é proporcional ao número de moléculas por unidade de volume e à energia cinética translacional média das moléculas 1 2 mv 2 6 Interpretação Molecular da Temperatura de um Gás Ideal N PV nRT RT NA PV NkBT kB Substituindo P onde R 1.38 1023 J/K NA obtemos N A 6.0221023 Número de Avogadro Constante de Boltzmann 2 N 1 2 mv V NkBT 3 V 2 2 1 2 T mv 3kB 2 A temperatura de um gás é uma medida direta da energia cinética translacional média das moléculas 7 Reescrevendo a equação anterior de outra forma. Assim: T obtemos 3 k BT 2 como 2 1 2 mv 3kB 2 1 3 2 mv k BT 2 2 é a energia translacional média por molécula 1 2 v v 3 2 x 1 1 2 mv x k BT 2 2 8 Teorema de equipartição de energia A energia de um sistema em equilíbrio térmico está igualmente dividida entre todos os graus de liberdade “Graus de liberdade” refere-se ao número de maneiras independentes pelas quais uma molécula pode ter energia. No caso do gás ideal cada molécula têm 3 graus de liberdade uma vez que se movimentam na direção dos eixos x,y e z A energia cinética translacional total de N moléculas de gás é simplesmente N vezes a energia translacional média por molécula 1 K translacional total N mv 2 2 K translacional 3 N BT total 2 K translacional total 3 nRT U 2 ou ou interna de um gás monoatómico 9 Podemos encontrar a velocidade média quadrática de cada molécula pela equação 1 2 3 mv k BT 2 2 3 BT 3RT v m M 2 onde M é a massa molecular em kg por mol. Essa expressão mostra que, numa determinada temperatura, em média moléculas mais leves se deslocam mais rapidamente, do que moléculas mais pesadas. -3 Exemplo. O hidrogénio, com uma massa molecular de 210 kg/mol, move-se quatro vezes mais rapidamente que o oxigénio, cuja massa molecular é 1610-3 kg/mol. Se calcularmos a velocidade média quadrática do hidrogénio à temperatura ambiente (~300 K), encontraremos vmq (H2 ) 3RT 38.31J/mol K 300 K 1.9 103 m/s 1.9 km/s -3 M 2.010 kg/mol v mq (O2 ) 483 m/s este valor representa aproximadamente 17% da velocidade de escape da Terra, que é de 11.2 km/s. Como essa é uma velocidade média, um grande número de moléculas que têm velocidades mais altas podem escapar da atmosfera terrestre. É por isso que a atmosfera da Terra atualmente não contém hidrogénio – todo ele foi para o espaço. 10 3.2 Capacidade Calorífica Molar de um Gás Ideal A quantidade de gás ideal é medida pelo número de moles n, em vez da massa m O gás é submetido a diversos processos i f i f' i f '' com a mesma variação de temperatura T T f Ti mesmo (lembrar que U Pelo primeiro princípio da termodinâmica W para cada trajetória é diferente U 3 nRT ) 2 U Q W ou Q U W Q diferente para cada trajetória (área sob a curva diferente) a energia necessária para produzir cada variação de temperatura não tem um valor único 11 Essa dificuldade é resolvida definindo-se as capacidades caloríficas para dois processos que ocorrem com mais frequência: o processo isocórico e o processo isobárico Modificamos a equação Q m cT e escrevemos em moles: Volume constante Processo isocórico i f Q nCV T CV é a capacidade calorífica molar (ou calor específico molar) a volume constante 12 Pressão constante Processo isobárico i f Q nCP T CP é a capacidade calorífica molar (ou calor específico molar) a pressão constante 13 No processo isocórico V = constante: W PdV 0 Do primeiro princípio da termodinâmica U Q W Q 0 Q 3 Q U nRT 2 3 nCV T nRT 2 3 CV R 12.5 J/mol K 2 para todos os gases monoatómicos 14 U nCV T (1) Como a energia interna é uma função de estado, a variação de energia interna não depende da trajetória seguida entre os estados inicial e final. Logo a equação (1): • fornece a variação na energia interna de um gás ideal para qualquer processo no qual há variação de temperatura (T) e não apenas para um processo isocórico • Além disso é verdade também para gases monoatómicos e poliatómicos Para variações infinitesimais 1 dU CV n dT 15 No processo isobárico P = constante: PV nRT U nCV T CV CP R U Q W nCP T PV nCV T nCP T nRT esta expressão se aplica a qualquer gás ideal 5 C P R 20.8 J/mol K 2 CP 52 R 5 3 CV 2 R 3 CP CV 1.67 grandeza sem dimensão para um gás monoatómico 16 3.3 Processos Adiabáticos para um Gás Ideal Em três processos, uma variável de estado é mantida constante P = constante para um processo isobárico V = constante para um processo isocórico T = constante para um processo isotérmico Um quarto processo processo adiabático especial é o Há algo constante nesse processo? Veremos que a combinação de algumas variáveis permanece constante ! PV constante TV 1 constante 17 Imagine um gás se expandindo adiabaticamente num cilindro isolado termicamente, de modo que Q=0 Supomos • uma variação infinitesimal do volume dV • uma variação infinitesimal da temperatura dT O trabalho realizado pelo gás é PdV A variação da energia interna é dada pela equação dU nCV dT a primeira lei da termodinâmica será dU dQ dW Assim: Derivando PV nRT ndT ou nCV dT 0 PdV PdV CV obtemos Substituindo o valor de PdV VdP nRdT ndT obtemos 18 R PdV VdP PdV CV Dividimos a equação acima por PV e substituímos dV dP CV CP dV V P CV V dV dP dV dV 0 V P V V Integrando, obtemos R CP CV dV dP dV 1 0 V P V dP dV 0 P V ln P ln V constante que podemos escrever como PV constante utilizando a lei do gás ideal TV 1 constante 19 A figura ao lado mostra o diagrama PV para uma expansão adiabática PV constante Como > 1, a curva PV é mais íngreme do que a inclinação de uma expansão isotérmica, em que PV = constante Da equação dU dW vemos que: durante uma expansão adiabática, negativo dT dU é também é negativo o gás arrefece durante uma expansão adiabática Inversamente, a temperatura aumenta se o gás for comprimido adiabaticamente Para os estados inicial (i) e final (f): e utilizando a lei do gás ideal PiVi Pf V f TiVi 1 Tf Vf 1 20 Resumo dos quatro processos termodinâmicos para o gás ideal 21 U , CV e CP para um gás poliatómico Movimentos em moléculas mais complexas • Translacional • Rotacional • Vibratórios (a) A energia interna tem contribuições dos movimentos rotacional e vibratórios Estes movimentos são ativados pelas colisões, e estão acoplados ao movimento translacional das moléculas Caso de uma molécula diatómica: (a) movimento translacional do centro de massa (b) movimento rotacional (c) movimento vibratório ao longo do eixo da molécula 22 Supomos duas situações: 1ª - a molécula tem 5 graus de liberdade: três associados ao movimento translacional (a) e dois associados ao movimento rotacional (b) Energia interna 1 2 N 1 k T 5 Nk T U 3N kBT B B 2 2 2 ou 5 U nRT 2 Capacidade calorífica 1 dU 1 d 5 5 CV nRT R 20.8 J/mol K n dT n dT 2 2 e 7 CP CV R R 2 7 R CP 2 7 1.40 5 CV R 5 2 23 2ª - a molécula tem 7 graus de liberdade: três associados ao movimento translacional (a), dois associados ao movimento rotacional (b) e dois associados ao movimento vibratório (c) Energia interna 1 1 1 7 U 3N kBT 2 N kBT 2 N kBT Nk BT 2 2 2 2 ou 7 U nRT 2 Capacidade calorífica 1 dU 1 d 7 7 CV nRT R 29.1 J/mol K n dT n dT 2 2 e 9 R CP 2 9 1.29 CV 7 R 7 2 9 CP CV R R 2 24 Capacidade calorífica molar do hidrogénio como função da temperatura (A escala horizontal é logarítmica) 25 Para moléculas com mais de dois átomos, o número de graus de liberdade é ainda maior e as vibrações são mais complexas do que para moléculas diatómicas Isso resulta numa capacidade calorífica molar prevista ainda maior, o que está qualitativamente de acordo com o experimento 26 Uma alusão à quantização de energia O modelo de capacidade calorífica molar tratado até agora foi baseado em noções puramente clássicas, que não é suficiente para explicar o resultado de várias capacidades caloríficas molares é preciso a mecânica quântica. A física quântica nos diz que para uma molécula todas as energias de vibração e rotação são quantizadas A Figura mostra um diagrama do nível de energia para os estados quânticos vibratório e rotatório de uma molécula diatómica. Observe que os estados vibratórios estão separados por intervalos de energia maiores do que os estados rotatórios. T 1000 K - 10 000 K Para baixas temperaturas a única contribuição para a energia média da molécula vem da translação. 27