B R I D G E S N E T W O R K PO N T ES B O L E T I M D I Á R I O Notícias diárias sobre as negociações da IX Conferência Ministerial da OMC EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 Guia sobre as negociações para Bali FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO AGRICULTURA TRATAMENTO ESPECIAL E DIFERENCIADO TEMAS RELATIVOS A PMDRs PO N T ES B O L E T I M D I Á R I O EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO 4 Reduzindo ineficiências de fronteira AGRICULTURA 7 Pequenos passos à frente no comércio agrícola? TRATAMENTO ESPECIAL E DIFERENCIADO 10 Garantindo flexibilidades para países em desenvolvimento TEMAS RELATIVOS A PMDRs 12 PMDRs buscam progresso Conferência Ministerial da OMC: Pacote de Bali em Jogo Os ministros do comércio participarão, de 3 a 6 de dezembro, da 9ª Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Bali (Indonésia). A reunião constitui um momento decisivo – para melhor ou pior – para a Organização. Mesmo às vésperas da Conferência, o que realmente será debatido em Bali não está claro. Em Genebra, os negociadores passaram grande parte dos últimos meses empenhados em concluir um pequeno pacote de concessões para Bali. Segundo especialistas, um acordo em Bali impulsionaria a credibilidade da OMC, em um momento considerado crítico por muitos. No entanto, dias antes da Conferência Ministerial, o diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, confirmou que, mesmo após um “esforço tremendo” e alguns avanços significativos, ainda não havia consenso sobre uma proposta de texto para apresentar aos ministros – deixando o destino da Conferência de Bali em jogo. em Bali “Ainda não podemos dizer ao mundo que conseguimos”, declarou Azevêdo aos membros durante o encontro do Conselho Geral, em 26 de novembro. “E eu informarei aos ministros que nós falhamos em alcançar a convergência. Direi a eles que nós chegamos muito perto de um resultado bem sucedido, mas que, mais uma vez, a reta final nos iludiu”. Devido ao impasse em Genebra, os textos atuais de Bali serão apresentados aos ministros como estão: textos que, embora consolidados, ainda não foram acordados. O que acontecerá com eles – e os próximos passos para a OMC como fórum de negociação – ficará a critério dos ministros. O que estava sobre a mesa Nos meses anteriores à Conferência de Bali, os membros da OMC definiram como meta a finalização de um pacote de entregas em três frentes. O centro do plano tem sido um acordo de facilitação do comércio, que visa a aliviar os procedimentos alfandengários para permitir o fluxo comercial. Os membros também buscaram adotar um conjunto de propostas em agricultura e de medidas voltadas às necessidades dos países de menor desenvolvimento relativo (PMDRs). Embora a agenda de Doha tenha dominado as preparações para Bali, outras iniciativas – como a atualização da lista de produtos cobertos pelo Acordo sobre Tecnologia da Informação (ITA, em inglês) da OMC – também têm ganhado terreno, com vistas a um avanço no encontro ministerial. No entanto, menos de duas semanas antes do encontro, o grupo que negociava a expansão do ITA suspendeu esse processo devido a discordâncias internas e, até o momento de redação deste texto, não anunciou datas para a continuação dos debates. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 3 Doze anos de Doha A história de Doha começou em 2001, quando os membros da OMC – à época, 142 membros, em contraste com os atuais 159 membros –, reunidos na 4ª Conferência Ministerial da OMC, realizada na capital do Qatar, colocaram o tema do desenvolvimento no centro da agenda da rodada seguinte. Quando os ministros começaram as negociações de Doha, a expectativa era concluí-las em quatro anos. Dois anos e muitos contratempos depois, o processo de Doha não tem um fim claro à vista. Mesmo se os ministros conseguirem fechar um acordo em Bali, ainda não se sabe o que acontecerá com o resto da agenda da Rodada Doha – além dos muitos outros “novos tópicos” que surgiram nas últimas duas décadas. O conjunto seguinte de briefings tem a intenção de fornecer uma visão geral dos diferentes elementos de Doha que dominaram as discussões comerciais em Genebra nos meses anteriores ao encontro de Bali: facilitação do comércio, agricultura e desenvolvimento. Os textos destacam a história dessas áreas de negociação, seus respectivos mandatos e o estado da arte pouco antes da Ministerial de Bali. Equipe de Reportagem Bridges PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 4 FACILITAÇÃO DO COMÉRCIO Reduzindo ineficiências de fronteira Peça central do pacote proposto para Bali busca acabar com “linha vermelha” na fronteira A s discussões sobre facilitação do comércio visam a simplificar as regras alfandegárias e reduzir a ineficiência de longos períodos de espera nos fluxos de comércio internacional. O tópico cresceu em importância recentemente devido à crescente integração das cadeias logísticas globais e à necessidade de uma maior eficiência nessas cadeias. Segundo estimativas recentes – como uma análise feita pelo Instituto Peterson de Economia Internacional para a Câmara de Comércio Internacional –, um acordo de facilitação do comércio poderia adicionar cerca de US$1 trilhão à economia global. Desde que a facilitação do comércio foi oficialmente incorporada à agenda de Doha da OMC, no começo dos anos 2000, os debates têm avançado em ritmo surpreendente. Naquela época, o tema fazia parte do single undertaking – ou seja, nada está acordado até que tudo esteja acordado. Contudo, na 8ª Conferência Ministerial, realizada em dezembro de 2011, as negociações de Doha foram declaradas oficialmente como em situação de “impasse”, e a facilitação do comércio adquiriu destaque como tema que poderia compor uma “entrega antecipada”. No entanto, nos últimos anos, as lacunas se tornaram maiores dentro das negociações de facilitação do comércio, com problemas de ordem técnica e política. Nas semanas anteriores à Ministerial de Bali, as negociações de Genebra avançaram em um ritmo frenético, com grandes chances de um acordo em Bali. Com algumas lacunas persistentes, o diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, declarou que o processo chegou a um “impasse” dias antes da 9ª Conferência Ministerial. Para Azevêdo, a vontade política dos ministros será a última esperança para um sucesso em Bali. Temas de Cingapura As negociações de facilitação comercial iniciaram oficialmente em 2004, após anos de discussões em grupos de trabalho lançados na 1ª Conferência Ministerial da OMC, em Cingapura. Além da facilitação do comércio, os membros da OMC examinaram a possibilidade de incorporar uma série de tópicos – comércio e concorrência; investimentos; e transparência nas compras governamentais – à agenda da Rodada de Doha. Os quatro tópicos ficaram conhecidos como os “Temas de Cingapura”, e muitos esperavam sua incorporação à agenda de Doha. Em 2003, os PMDRs, com o apoio de mais de uma dúzia de outros países em desenvolvimento (incluindo China e Índia), propuseram cortar três dos temas da agenda de negociações – exceto facilitação do comércio. Em abril do ano seguinte, um grupo de países em desenvolvimento e PMDRs declararam que estavam prontos para debater facilitação do comércio, mas somente para esclarecer modalidades importantes para as negociações. Em julho de 2004, os países em desenvolvimento aceitaram as negociações sobre facilitação do comércio como parte de um conjunto mais amplo chamado “Pacote de Julho” – um acordo de base, cujo foco era manter vivos os debates de Doha mesmo após o colapso da Ministerial de 2003, em Cancún (México). De acordo com o mandato de facilitação do comércio, as negociações buscam esclarecer e melhorar três artigos do Acordo Geral sobre Tarifas Aduaneiras e Comércio (GATT, sigla em inglês): Artigo V, sobre liberdade de trânsito; Artigo VIII, que trata das limitações às tarifas aduaneiras e formalidades; e o Artigo X, sobre publicação e administração das regulamentações. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 Linha do tempo Dezembro de 1996 Durante a Conferência Ministerial de Cingapura, os ministros concordam em lançar grupos de trabalho sobre facilitação comercial; comércio e concorrência; investimento; e transparência nas compras governamentais – conhecidos como os “Temas de Cingapura”. Novembro de 2001 Os ministros do comércio lançam a “Rodada de Doha” da OMC no Qatar. Setembro de 2003 A Conferência Ministerial da OMC em Cancún entra em colapso. Os membros ficam profundamente divididos quanto aos Temas de Cingapura. Julho de 2004 Os membros assinam um “pacote-base”, focado em salvar a Rodada de Doha. A facilitação do comércio é adicionada à agenda, e os outros três temas de Cingapura são abandonados. 2004-2009 Os membros circulam e refinam propostas para textos potenciais em um acordo de facilitação do comércio. 2008 O “mini-encontro ministerial” de Genebra busca concluir a Rodada; os debates colapsam. Dezembro de 2009 É publicado o primeiro texto de rascunho consolidado de um acordo sobre facilitação do comércio. Abril de 2011 O chefe dos debates de facilitação do comércio envia um texto de rascunho atualizado; é o único chefe de grupo negociação a fazê-lo. Dezembro de 2011 A Rodada Doha é oficialmente declarada como em impasse durante o encontro ministerial em Genebra; os ministros pedem que os membros explorem novos métodos de negociação. 5 O texto está dividido em duas partes: a primeira, envolvendo compromissos específicos que os países deverão assumir para melhorar seus procedimentos de alfândega (Seção I); o segundo envolve tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento ou PMDRs (Seção II). Nos anos que deram sequência à decisão de julho de 2004, os membros apresentaram uma série de propostas em diversos tópicos, as quais foram refinadas para que se consolidasse um texto de negociação – publicado em dezembro de 2009. Dois anos depois, quando o então diretor-geral, Pascal Lamy, pediu que os presidentes dos grupos de negociação enviassem rascunhos com o status nas diferentes áreas da Rodada, Eduardo Ernesto Sperisen-Yurt, embaixador da Guatemala e atual chefe de negociações em facilitação do comércio, foi o único a enviar um texto de rascunho atualizado. Compromissos específicos A primeira seção do texto de facilitação do comércio trata de uma série de compromissos que – se acordados – deverão acelerar os fluxos de comércio. Esses compromissos envolvem áreas como melhorar a transparência, padronizar a documentação necessária e tarifas relacionadas e simplificar procedimentos aduaneiros existentes para eliminar ineficiências e trabalho duplicado. Os 14 artigos no texto atual tratam de tópicos como a extensão do direito de entrar com recurso contra decisões de alfândega/fronteira para qualquer pessoa ou companhia; a eliminação do uso de despachantes alfandegários; a possibilidade de contratação de companhias privadas no território de outros membros para verificar detalhes de bens destinados à importação; e a emissão de decisões vinculantes – também conhecidas como decisões prévias – por autoridades de alfândega antes da exportação ou importação de bens, dentro de certas condições. Alguns desses compromissos, como o uso de despachantes alfandegários, permanecem em suspenso, de acordo com o texto consolidado, ao qual o Bridges teve acesso. Entregas expressas – exportações que envolvem tecnologias de segurança, logística e acompanhamento para rastrear e controlar o envio em cada ponto do transporte – constituem outra área que se mostrou difícil de resolver. Outra área particularmente controversa na Seção I envolve “trânsito”, área de especial interesse para países que não possuem acesso ao mar. Durante os debates, alguns países apresentaram propostas voltadas a permitir que comerciantes de outros países escolhessem suas rotas de trânsito. Uma das principais dificuldades com relação a esse ponto diz respeito a como lidar com bens transportados por meio de “infraestruturas fixas” – em especial produtos de energia como óleo e gás, transportados por oleodutos ou gasodutos. Áreas como liberação em balcão único estão, até o momento, livres de restrições. Os balcões únicos aceleram a passagem de bens pelas alfândegas, na medida em que consolidam toda a documentação comercial necessária em apenas uma agência responsável pela liberação alfandegária. Até recentemente, a cooperação de alfândegas era uma das partes mais controversas da Seção I. Esse tópico envolve formas de troca de informações entre as autoridades de exportação e importação dos países membros, com o objetivo de resolver casos de fraude. A cooperação das alfândegas tem sido difícil por conta de preocupações como a maneira correta de lidar com o crescente volume de pedidos por esse tipo de informação, assim como a questão das informações confidenciais. Os membros lograram um avanço sem precedentes nessa área no começo de novembro. De acordo com uma cópia do texto disponibilizada ao Bridges, o artigo que trata da cooperação de alfândegas atualmente inclui uma série de provisões relativas a confidencialidade, maneiras de levar em conta as obrigações administrativas, detalhes na maneira que essa informação será fornecida e os termos desses pedidos. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 2012-2013 Começam a surgir convergências sobre a negociação de uma “colheita antecipada” para facilitação do comércio e outros tópicos da agenda de Doha. As negociações são aceleradas, com vistas a um resultado em Bali. Novembro de 2013 As preparações iniciadas em Genebra para a Conferência Ministerial de Bali são declaradas em impasse pelo diretor-geral da OMC. 6 Implementação: vinculante ou compromisso moral? O texto sobre facilitação do comércio também inclui disposições segundo as quais os países em desenvolvimento não precisarão implementar os compromissos que assumem na Seção I do acordo, a menos que recebam assistência técnica para assumir tais compromissos. Com efeito, um dos mais duradouros obstáculos às negociações é chegar a um equilíbrio entre estabelecer compromissos firmes na Seção I, as necessidades de assistência técnica dos países em desenvolvimento e a capacitação para implementar essas mudanças. Os compromissos para países em desenvolvimento e PMDRs em facilitação do comércio caem em três categorias: A, que inclui provisões que serão implementadas imediatamente após o acordo entrar em vigor; B, que contempla os compromissos que exigirão um período de transição; e a categoria C, que envolve compromissos que exigirão um período de transição e assistência técnica. Os países em desenvolvimento há tempos afirmam que precisam de garantias claras de que receberão o apoio necessário para implementar os compromissos da Seção I. Segundo eles, na ausência de tais garantias, muitos desses compromissos deverão ser feitos sob uma base de “compromisso moral” – o que, para muitos países desenvolvidos, anularia grande parte dos benefícios do acordo, uma vez que o resultado de “compromissos morais” costuma ser a não implementação. O mandato de facilitação do comércio, como definido no Anexo D do Pacote de julho de 2004, observa que os membros deverão trabalhar para “identificar suas necessidades e prioridades de facilitação do comércio” – em especial aquelas dos países em desenvolvimento – e também “responder às preocupações” desses membros em relação aos custos das medidas feitas sob um tratado de facilitação comercial. O mandato também especifica que os países em desenvolvimento devem assumir um compromisso de “garantir adequadamente esse apoio e assistência” durante os debates, e que, juntamente com os PMDRs, deverão receber apoio – em áreas como infraestrutura – para implementar as novas medidas de facilitação do comércio. Muito da Seção II – a mais difícil de negociar – foi solucionado nos dias anteriores ao encontro do Conselho Geral, em 26 de novembro. As diferenças que ainda persistem estão principalmente na Seção I do texto de rascunho. Segundo fontes consultadas pelo ICTSD, ainda restam ressalvas quanto a 50 itens – uma redução significativa em relação às centenas que estavam nessa situação há alguns meses. O impasse de Genebra deixa incerto o resultado de Bali Uma semana antes da Conferência Ministerial em Bali, o diretor-geral da OMC, Roberto Azevêdo, confirmou que o processo de negociação em Genebra não foi capaz de garantir um acordo em Bali. O anúncio feito em 26 de novembro surpreendeu a comunidade de comércio internacional e deixou expectativas incertas para a Conferência. Nas semanas anteriores ao encontro de ministros, os negociadores chegaram perto de um acordo, com os textos relativamente completos nas partes de agricultura e desenvolvimento do pacote de Bali. No entanto, as longas sessões de negociação em facilitação do comércio terminaram sem uma resolução final no dia 24 de novembro. Os próximos passos para o acordo de facilitação comercial continuam incertos. Segundo fontes consultadas pelo ICTSD, as dificuldades para a Seção I são tanto técnicas quanto políticas, fazendo com que seja difícil prever se um acordo será possível em Bali, ou mesmo nas semanas seguintes. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 7 AGRICULTURA Pequenos passos à frente no comércio agrícola? Um pacote de medidas comerciais agrícolas de “baixa-ambição” ainda está aquecendo a OMC. A pesar da falta de concordância entre os negociadores sobre o “pequeno pacote” de medidas para a 9ª Conferência Ministerial da OMC em Bali, os textos de rascunho sobre comércio agrícola estão sendo enviados para os ministros. O diretor-geral Roberto Azevêdo, no entanto, esclareceu que essas medidas não seriam apresentadas como “concordadas”. Para os países em desenvolvimento, o pacote de agricultura é considerado um componente obrigatório de qualquer “entrega antecipada” dos resultados de Doha. O G-20, que pressiona por reformas nas políticas de comércio agrícola dos países desenvolvidos, apresentou propostas sobre subsídios de exportação e medidas similares, e na facilitação dos processos administrativos que afetam suas exportações agrícolas. Ao mesmo tempo, a coalizão G-33 de países em desenvolvimento – muitos dos quais possuem uma parcela significativa de pequenos agricultores – acatou uma proposta da Índia sobre esquemas de estocagem pública de alimentos. Uma proposta sobre algodão, apresentada pelos países da África Ocidental, também está sobre a mesa. Pano de fundo Os debates agrícolas sob a Rodada de Doha deveriam, de acordo com compromisso assumido, visar a um “sistema de comércio agrícola justo e orientado para os mercados”. O objetivo geral das negociações era alcançar reduções significativas em medidas que afetem o comércio no apoio doméstico a bens agrícolas, melhorias substantivas no acesso a mercado e redução e progressiva eliminação completa dos subsídios à exportação. Os ministros do comércio também concordaram que tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento deveria constituir parte integral de todos os elementos das negociações. Apesar de não terem atingido o prazo original de 2005 para continuar os debates, os negociadores avançaram nas tratativas de um esboço de um possível acordo. Quando os debates entraram em colapso na chamada Mini-Ministerial, em 2008, o ritmo das negociações agrícolas era lento e, em 2011, os ministros reconheceram que a Rodada estava sob um impasse. Desde então, questões de comércio agrícola têm estado à frente dos esforços para um acordo mais substantivo, rumo à Conferência Ministerial de Bali. O que os países querem do comércio agrícola? Os países exportadores agrícolas eficientes têm tradicionalmente buscado uma liberalização do comércio nesse setor, com o Grupo Cairns unindo países desenvolvidos como a Austrália a países em desenvolvimento, como Brasil e Argentina. Em contraste a esse movimento, países com setores primários altamente protegidos têm sido contra grandes cortes de subsídios e tarifas: um exemplo é o G-10, que reúne países desenvolvidos como Japão e Suíça e países em desenvolvimento, como a Coreia do Sul. Os Estados Unidos e a União Europeia (UE) – ambos grandes potências de comércio agrícola – têm buscado a abertura dos mercados para bens agrícolas, ao mesmo tempo em que defendem seus tetos atuais de subsídios à produção. O G-20 tem buscado a reforma de políticas de distorção comercial na agricultura dos países desenvolvidos desde 2003, quando China e Índia se juntaram com países com agricultura de exportação, como o Brasil. Por fim, destaca-se o G-33 de países em desenvolvimento, que tem pedido tratamento especial para seus pequenos produtores. Essa coalizão junta países grandes como China e Índia com países menores, como Barbados e Santa Lúcia. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 Linha do tempo: 1994 A Rodada Uruguai do GATT estabelece a OMC, conclui o Acordo sobre Agricultura, incluindo o Art. XX sobre reforma contínua. 1999 A Conferência Ministerial de Seattle fracassa; não há nenhum acordo para o início de uma nova Rodada. 2001 Os ministros lançam a Rodada de Doha e incluem debates sobre comércio agrícola. 2003 Primeiros textos de rascunho. É formado o G-20 de países em desenvolvimento. O encontro ministerial da OMC em Cancún fracassa. 2005 O encontro ministerial de Hong Kong concorda em terminar com os subsídios de exportação agrícola. 2006-2007 Sucessão de textos de rascunho refinam as bases para um acordo de Doha. 2008 Divergências sobre salvaguarda de bens industriais e agrícolas leva ao colapso da MiniMinisterial de Genebra. 2011 O encontro ministerial de Genebra declara que a Rodada Doha se encontra em um “impasse”. 2013 A Ministerial de Bali busca um acordo sobre o “pacotinho”. 8 “Cláusula de paz” no armazenamento de comida? A Índia esteve à frente da pressão feita pelo G-33 para a atualização das regras da OMC, buscando garantir aos países em desenvolvimento maior flexibilidade para a aquisição de comida quando o objetivo dessa compra é criar estoques públicos de alimentos por razões de segurança alimentar. Sob as regras atuais, as compras feitas a preços de mercado podem ser incluídas sem nenhuma restrição sob a “caixa verde” da OMC, para subsídios agrícolas que causam apenas uma distorção comercial mínima. No entanto, o grupo defende que a inflação dos preços tem erodido o escopo de compra dos países a preços definidos pelo governo, uma vez que os membros da OMC concordaram antes com uma metodologia para calcular subsídios agrícolas – reduzindo o escopo indiano para implementar um novo e ambicioso esquema de segurança alimentar sem ser desafiado por disputas do órgão de comércio global. Os países desenvolvidos e também alguns países em desenvolvimento argumentam que permitir níveis ilimitados de apoio ao preço de mercado a serem incluídos na caixa verde pode distorcer o comércio e mesmo pôr em xeque a segurança alimentar de outros lugares. Como um compromisso possível, os países negociaram os esboços de uma possível “cláusula de paz”, que determinaria que os países não iniciassem ações legais contra esaes esquemas sob o acordo agrícola da OMC, em troca de maior informação e transparência sobre suas operações. Espera-se que os países concordem em trabalhar em conjunto em direção a uma solução permanente sobre essa questão. Facilitação das cotas de importação agrícola O G-20 argumentou que os países desenvolvidos deveriam facilitar o acesso dos exportadores agrícolas a seus mercados em casos onde as cotas de importação não foram atingidas. Os Estados Unidos, em particular, insistiram que grandes países em desenvolvimento como a China deveriam aceitar compromissos semelhantes – o que Pequim há muito tempo como improvável. Os países parecem mais próximos de concordar em uma solução de consenso, que deixaria os Estados Unidos isolados entre os países desenvolvidos, isento das regras pós-2019 em acesso a mercado nessa área. Recentemente, o Japão, que também declarou que não aceitaria condições similares, indicou que não se juntaria aos Estados Unidos em uma lista de países que planejam não colaborar com termos futuros. O país asiático afirmou, entretanto, que manteria sua posição sob a condição de que os países concordassem com resultados ambiciosos em outras áreas de Bali. Os membros do G-20 receberam bem esse movimento, assim como indícios similares vindos de UE, Noruega e Suíça. Término dos subsídios de exportação e medidas similares Os países do G-20 também pedem que os membros da OMC reconheçam que os ministros concordaram, há oito anos, sobre o término de todos os subsídios de exportação e medidas similares em 2013. Mesmo que Estados Unidos e UE tenham insistido que esse acordo era condicionado ao progresso do pacote de Doha como um todo, o G-20 ainda argumenta que passos concretos são necessários para mostrar que os membros da OMC ainda encaram com seriedade o desafio de alcançar esse objetivo, mesmo que a meta específica não seja alcançada. Um texto de rascunho sobre o assunto – que os negociadores esperavam que tomasse a forma de um esboço de declaração – representaria um compromisso em progredir em direção à eliminação de subsídios de exportação e outras medidas com efeitos equivalentes, e a mantê-los em um nível “significativamente mais baixo” do que o acordado atualmente. Todavia, países exportadores agrícolas, como a Argentina, ainda estão desapontados que o acordo proposto seja muito mais fraco do que esperavam. A exceção do G-33 Entre os muitos elementos trazidos à tona para um acordo em Bali, um dos menos polêmicos foi a proposta do G-33 para que os membros da OMC reconheçam que um conjunto de esquemas de subsídios agrícolas seja isento dos limites definidos pela OMC, por causarem muito pouca distorção comercial. Entre esses, estão incluídos diversos PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 9 programas de “serviços gerais” relacionados à reforma agrária e à segurança dos campos, como aqueles destinados à reabilitação de terras, conservação do solo, gestão de secas e enchentes, emprego rural, emissão de títulos de propriedades e assentamentos de produtores. Agenda pós-Bali Ainda por ser resolvida, está a questão controversa da agenda pós-Bali, em particular o papel das negociações de Doha como uma parte disso. Embora os Estados Unidos estejam relutantes em reconhecer o progresso da agenda de Doha até o momento como uma base útil para um acordo final, outros membros da OMC – em especial os países em desenvolvimento – têm sido a favor de um avanço rápido, para concluir a Rodada o mais rápido possível. Os negociadores têm hesitado quanto a entrar em discussões longas sobre a agenda pósBali até que o resultado da Conferência de Bali esteja mais claro. Espera-se que o diretorgeral da OMC, Roberto Azevêdo, envie propostas aos governos sobre esse tema, ainda que não esteja claro como ele fará isso e que formato essas propostas terão. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 10 TRATAMENTO ESPECIAL E DIFERENCIADO Garantindo flexibilidades para países em desenvolvimento Um passo à frente em direção ao Mecanismo de Monitoramento O Tratamento Especial e Diferenciado (S&DT, sigla em inglês) há tempos é considerado uma parte crucial do componente de desenvolvimento que marca a Rodada de Doha. Originalmente criado como um mecanismo abrangente para dar tratamento preferencial a países em desenvolvimento e PMDRs, a medida tinha como objetivo ajudar esses países a se integrarem mais facilmente no sistema multilateral de comércio. Para esse propósito, o parágrafo 44 da Declaração Ministerial de Doha garantiu um mandato para revisar todas as provisões de S&DT, com vistas a torná-las mais fortes, precisas, efetivas e operacionais. Na Conferência Ministerial de Genebra de 2011, os ministros concordaram em acelerar o trabalho em direção à finalização de um “Mecanismo de Monitoramento” para fornecer revisões regulares de provisões existentes de S&DT. Propostas de Cancún Em 2003, os membros lograram um acordo em torno de 28 propostas de S&DT para a Conferência Ministerial de Cancún. No entanto, quando os ministros falharam em chegar a um acordo sobre o pacote, as 28 propostas foram rebaixadas à “sala de espera”. Os negociadores voltaram ao assunto das S&DT dois anos depois em Hong Kong, mas, de novo, não conseguiram aprovar as 28 propostas de Cancun. As mesmas propostas ressurgiram na Conferência Ministerial de Genebra de 2011, quando os ministros solicitaram a uma Sessão Especial do Comitê de Comércio e Desenvolvimento (CTD-SS, sigla em inglês) que avaliasse o pacote “adormecido” e buscasse sua adoção formal. Apesar de ter sido considerado uma entrega possível para Bali, as propostas foram removidas do “pacote” proposto na primavera deste ano, sob o argumento de que surgiram muitas complexidades com a revisitação das propostas da década passada. Mecanismo de Monitoramento Um tema em que foram observados muitos avanços antes de Bali é o Mecanismo de Monitoramento, cujo objetivo é revisar o funcionamento das provisões em regras de comércio multilateral de S&DT para países em desenvolvimento. As negociações sobre o mecanismo existem desde uma decisão emitida em julho de 2002 pelo Conselho Geral, que apoiava uma proposta do Grupo Africano para o tema, que também direcionava a CTD-SS a estabelecer os termos para seu funcionamento. Posteriormente, os debates definharam por anos, uma vez que o Mecanismo foi ligado por alguns países desenvolvidos a pedidos de “diferenciação” entre países em desenvolvimento não-PMDR – um tema controverso nas políticas da OMC. Nos meses anteriores à Conferência Ministerial de Bali deste ano, os membros estavam divididos sobre qual seria a melhor forma de equilibrar o objetivo dos países desenvolvidos de evitar a criação de um fórum de negociação permanente com o desejo dos países em desenvolvimento de obter algo além de um exercício de transparência. No entanto, os membros conseguiram alcançar uma resolução preliminar em novembro: a versão atual do rascunho indica que o Mecanismo servirá como um ponto focal dentro da OMC para analisar e revisar todos os aspectos da implementação de provisões de S&DT. Nos casos em que a revisão identifique um problema, o Mecanismo poderá fazer recomendações para o órgão responsável da OMC, incluindo, se necessário, o lançamento de negociações. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 11 De acordo com o rascunho, as recomendações que surgissem do Mecanismo informariam o trabalho do órgão responsável, mas não definiriam ou limitariam sua determinação final. Se aprovado, o Mecanismo operaria em sessões dedicadas do CTD e se encontraria duas vezes por ano, com a possibilidade de que encontros adicionais sejam arranjados caso necessário. O status das recomendações emitidas pelo Mecanismo seria, então, incluído no relatório anual do CTD para o Conselho Geral. De acordo com o texto, o Mecanismo seria revisado três anos após a primeira reunião oficial. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 12 TEMAS RELATIVOS A PMDRs PMDRs buscam progresso em Bali Membros buscam “adiantamento” de Doha para atender às necessidades dos PMDRs M elhorar as perspectivas comerciais dos países em desenvolvimento era o principal objetivo da Rodada Doha quando as negociações começaram, em 2001. Antes do lançamento da Rodada, a Organização havia sido alvo de críticas por refletir demasiado os interesses dos países desenvolvidos. A tarefa monumental de atualizar estas regras, entretanto, encontrou diversos contratempos – os quais a Rodada ainda precisa resolver. Por um curto período, durante a 8ª Conferência Ministerial da OMC, em Genebra, uma “colheita antecipada” para algumas questões relativas aos PMDRs pareceram possíveis. Esse quadro foi, contudo, posto por terra semanas antes do encontro de 2011. Neste ano, o processo de Bali tem buscado retomar alguns desses temas, na expectativa de atingir entregas palpáveis para os membros mais pobres da Organização. Avanços desde 2011 Apesar da declaração formal, em 2011, de que os debates de Doha estavam sob um impasse, os ministros concordaram em conferir tratamento preferencial aos serviços e prestadores de serviço dos PMDRs. Nos dois anos seguintes, duas das decisões que surgiram na Conferência de 2011 – mais especificamente, a adesão dos PMDRs à OMC e a implementação de regras de propriedade intelectual por esses países – também mostraram avanços nas negociações. Em 2011, os membros da OMC assumiram o compromisso de revisar as diretrizes de adesão para os PMDRs, concordando em fortalecer, simplificar e operacionalizar um conjunto anterior que havia sido estabelecido em 2002. Essas diretrizes revisadas foram aprovadas pelo Conselho Geral em julho de 2012, muito próximo ao prazo final exigido. As novas diretrizes estabelecem uma série de marcos, especialmente no que diz respeito ao acesso ao mercado de bens, assim como aos elementos de S&DT, períodos de transição, transparência e assistência técnica. Agora, espera-se que os ministros em Bali assinem formalmente a adesão do Iêmen – o 7º PMDR a ingressar na OMC desde 1995. O Iêmen terá até junho de 2014 para ratificar o pacote de adesão. Em junho de 2013 os membros da OMC concordaram em estender, até julho de 2021, o “período de transição” para que os PMDRs implementem as regras da OMC sobre direitos de propriedade intelectual. O período de transição original estava para expirar em julho passado. Questões prioritárias Em maio de 2013, o Grupo de PMDRs enviou um documento com as questões prioritárias que gostariam de submeter à consideração dos demais membros para uma “entrega antecipada” de Bali. Desde então, as consultas têm se concentrado no desenvolvimento de rascunhos sobre regras de origem, operacionalização da renúncia de serviços, acesso a mercados isentos do pagamento de direitos e cotas (DFQF, sigla em inglês) e algodão. Originalmente, tais questões foram designadas como decisões preliminares sobre as quais os ministros, em Bali, deveriam concordar. No entanto, o impasse anunciado em 26 de novembro pelo diretor-geral Roberto Azevêdo transformou – da mesma forma que ocorreu com o restante do pacote de Bali – o futuro desses textos em uma incógnita. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 Linha do tempo: 2002 Os membros adotam diretrizes para ajudar a facilitar as negociações da OMC para a adesão de PMDRs. 2005 Os ministros adotam, em Hong Kong, o objetivo de fornecer acesso a mercado DFQF em caráter permanente para todos os produtos originários dos PMDRs. Os membros também concordam em eliminar os subsídios de exportação de algodão e incluem um dispositivo segundo o qual os países desenvolvidos deveriam permitir que o algodão dos PMDRs chegasse a seus mercados sem obrigações e sem cotas. Dezembro de 2011 O Conselho TRIPS é instruído a considerar os pedidos dos LDCs para estender o período de transição de direitos de propriedade intelectual relacionados ao comércio. Os ministros da OMC adotam renúncia que permitiria aos membros auferir tratamento preferencial aos serviços e prestadores de serviços dos PMDRs. Julho de 2012 O Conselho Geral da OMC assina oficialmente as diretrizes revisadas de adesão de PMDRs, objetivando fortalecer, simplificar e operacionalizar ainda mais a versão de 2002. Maio de 2013 O Grupo de PMDRs lista seus temas prioritários para a Conferência Ministerial de Bali. Junho de 2013 Os membros da OMC concordam em estender o período de transição de direitos de propriedade intelectual para os PMDRs até julho de 2021. Outubro de 2013 Convergência definida como “próxima” para algumas decisões preliminares sobre os PMDRs, a serem adotadas na Conferência Ministerial de Bali. O subsequente impasse no processo de Genebra põe todo o pacote de Bali em xeque. 13 Regras de Origem As Regras de Origem (RoO, sigla em inglês) conferem uma nacionalidade econômica para os produtos comercializados internacionalmente, definindo a parcela de processamento que deve acontecer localmente antes que os bens possam ser considerados produtos originários do país exportador. No caso dos PMDRs, as RoO preferenciais são normalmente consideradas restritivas e inflexíveis, fazendo com que seja difícil para esses países obtenham qualquer vantagem com a preferência pretendida. Além disso, tais regras são normalmente definidas de maneira unilateral, sem qualquer padrão harmônico. Existem diversas metodologias para definir transformações substanciais – planejadas para avaliar a extensão da produção local significativa. Parte da complexidade dessa tarefa, segundo os analistas, diz respeito à inexistência de um método que se destaque como o mais apropriado para designar origem em todas as categorias de produtos. Os negociadores tentaram resolver essa questão no contexto da iniciativa de DFQF, introduzida na 1ª Conferência Ministerial da OMC em Cingapura, em 1996. Pouco progresso foi feito na década seguinte, embora a Declaração Ministerial de Hong Kong (2005) faça uma breve referência à necessidade de simplificação dos processos de RoO preferenciais e de que sejam mais transparentes. Esse texto constituiu a base para as propostas mais detalhadas de reforma das RoO feitas pelo Grupo de PMDRs. Em junho de 2006, o Grupo de PMDRs apresentou uma proposta que buscava promover um debate com foco nas RoO e nos PMDRs. No entanto, essa proposta não recebeu muito apoio dos países que concedem as preferências. Enfatizando que as respostas à proposta de 2006 “não foram encorajadoras”, o Grupo de PMDRs ressaltou vários movimentos bilaterais como um indício da necessidade da reforma em sua proposta de 2013. Alguns exemplos incluem a decisão de 2011 da UE que reconhecia as necessidades específicas dos PMDRs nas RoO ao diferenciá-los de outras economias em desenvolvimento. Em um documento de outubro de 2013, o Grupo dos PMDRs definiu os aspectos técnicos das regras de origem preferenciais e discutiu diferentes metodologias para determinar quando acontece uma transformação substancial ou suficiente. A decisão preliminar também detalha as provisões relativas a transparência e acumulação – esta última permite que duas ou mais Partes se juntem em um esquema preferencial para cumprir em conjunto os requerimentos relevantes de processamento local. Atualmente, essa decisão preliminar está sob a forma de diretriz não vinculante, ou seja, os países desenvolvidos podem decidir ou não sobre a adoção de tais diretrizes. O documento afirma que “os membros deverão buscar desenvolver ou criar os seus próprios arranjos de RoO aplicáveis às importações de LDCs em concordância com as seguintes diretrizes”. A elegibilidade de um produto para quaisquer preferências oferecidas em um acordo comercial depende do nível de transformação. A publicação propõe então que sejam determinados os níveis de transformação substantivos ou suficientes a partir de um critério de porcentagens baseado no valor do materiais envolvidos. Considerando a sua capacidade produtiva limitada, os LDCs desejam manter o nível máximo de agregação de valor no mais baixo possível e permitir que as contribuições de países terceiros ao produto cheguem a até 75% do valor do produto para que possam ser elegíveis para tratamento preferencial. No entanto, eles observam que a escolha de uma única regra não deveria impedir a preferência por regras específicas para o produto quando este é do interesse dos PMDRs – como acontece no setor têxtil, por exemplo. Renúncia de serviços Embora a concessão para o setor de serviços aprovada em 2011 tenha representado um passo significativo para os PMDRs, os analistas avisam que essa decisão somente resultará em benefícios econômicos se operacionalizada de uma maneira que faça sentido PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 14 comercialmente. Até agora, não houve nenhum pedido de uso desse benefício por parte dos PMDRs, e nenhuma preferência foi dada a eles por seus parceiros comerciais. A renúncia de serviços tem origem nas provisões de desenvolvimento do Acordo Geral sobre Comércio de Serviços (GATS, sigla em inglês) da OMC, cujo Artigo IV pede que os membros facilitem uma maior participação dos países em desenvolvimento no comércio de serviços através de “compromissos específicos negociados”. O texto também afirma que os PMDRs devem ter “prioridade especial” e pede aos membros da Organização que busquem um acordo sobre diretrizes para que os PMDRs atendam com precisão às exigências para a concessão. Em 2005, a Declaração Ministerial de Hong Kong afirmou a necessidade de desenvolver “mecanismos apropriados para auferir a prioridade especial” e, em 2008, foi decidido que esse mecanismo seria uma renúncia. A decisão de 2011 utiliza um método de duas frentes. Por um lado, as preferências de acesso a mercado do tipo citado no Artigo XVI da GATS seriam automaticamente cobertas pela renúncia. Por outro, medidas de acesso não mercadológicas não são automáticas, mas podem ser autorizadas pelo Conselho do Comércio de Serviços (CTS, sigla em inglês) da OMC. Estes podem incluir, por exemplo, preferências regulatórias, tratamento nacional preferencial e isenção de cotas ou impostos. Quaisquer preferências auferidas serão aplicadas imediata e incondicionalmente a todos os serviços e prestadores de serviços dos PMDRs e serão anexadas à renúncia. Para liberar o benefício econômico da renúncia, a decisão preliminar que foi negociada para o encontro de Bali seria, se e quando concordado, a de instruir o CTS a iniciar um processo focado na promoção de uma “operacionalização acelerada e efetiva” da renúncia, incluindo uma revisão periódica. Um encontro de alto nível do Comitê ocorreria seis meses depois que os PMDRs enviassem um pedido coletivo para identificar os setores e modos de prestação de interesse particular. Países desenvolvidos e em desenvolvimento “em posição de fazê-lo” deveriam então indicar em que pontos poderiam dar tratamento preferencial aos serviços e prestadores de serviço dos PMDRs. O Grupo de PMDRs também ressaltou a necessidade de uma maior assistência técnica e capacitação, como no caso da iniciativa Ajuda para o Comércio (AfT, sigla em inglês), para que possam superar suas restrições de fornecimento no comércio de serviços. O processo de identificação de preferências de serviço para os PMDRs já começou, e os esforços estão sendo feitos no sentido de definir os interesses dos PMDRs – setor por setor, mercado por mercado de exportação. A volta do algodão O controverso tema do algodão ressurgiu apenas algumas semanas antes do encontro ministerial de Bali, depois que Benin, Burkina Faso, Chade e Mali – um grupo de produtores de algodão da África Ocidental conhecido como C-4 – apresentou uma proposta sobre o tema, no final de outubro. A proposta desses países é o resultado de quase uma década de negociações, que tiveram início com um pedido para que os ministros que estavam em Hong Kong, em 2005, tratassem desse tópico de maneira “ambiciosa, acelerada e específica”. Os produtores da África Ocidental pressionam há tempos por uma mudança nas regras da OMC sobre algodão, sob o argumento de que os esquemas de subsídio dos países desenvolvidos mantiveram os preços globais da commodity em um nível artificialmente baixo, o que afetou negativamente suas economias, dependentes do algodão. A proposta de outubro pedia que as importações de algodão dos PMDRs garantissem o acesso a mercados isentos do pagamento de direitos e cotas a partir de 1º de janeiro de 2015, e pedia que fossem eliminados os subsídios de exportação de algodão. O texto de rascunho atual, entretanto, não contém mais esses pedidos específicos. PONTES BOLETIM DIÁRIO | EDIÇÃO ESPECIAL BALI - DEZEMBRO 2013 15 Ao contrário, ele sugere que os membros organizem discussões dedicadas ao tema duas vezes ao ano, dentro do contexto mais amplo dos debates agrícolas de Doha sobre medidas comerciais para a concorrência de exportações, apoio doméstico e medidas tarifárias e não-tarifárias relativas ao comércio de algodão. Com relação ao futuro, espera-se que os membros continuem trabalhando nos objetivos acordados em 2005, utilizando como referência o rascunho das modalidades agrícolas revisado em 2008. Acesso a mercados isentos do pagamento de direitos e cotas A Ministerial de Cingapura (1996) deu início às discussões sobre uma iniciativa focada no fornecimento de acesso a mercado DFQF para os bens de PMDRs. Cinco anos depois, em Doha, os ministros se comprometeram em fornecer acesso nesses termos. Em 2005, os ministros em Hong Kong chegaram a um avanço significativo nesta área, ao incluírem um anexo à declaração final em que se afirmava que os membros em posição de fazê-lo deveriam implementar acesso de mercado DFQF para todos os produtos originários de PMDRs. O prazo final foi definido para 2008 ou, no máximo, até o começo do período de implementação. Os membros que tivessem dificuldade em atender a esse requerimento tinham a opção de dar acesso DFQF a 97% dos produtos de PMDRs e deveriam, paralelamente, trabalhar para alcançar a adequação completa. No entanto, as negociações sobre DFQF pouco progrediram desde então: o debate concentrou-se em como poderiam ser obtidos os benefícios sob um esquema de 97% de DFQF, em detrimento de uma cobertura completa, e também em regras de origem relacionadas. Os membros têm enfrentado vários obstáculos para conseguir alcançar um resultado concreto nessa área. Esse assunto também mostrou-se um eixo de discórdia dentro do próprio Grupo dos PMDRs, uma vez que alguns membros temem a possibilidade de “erosão de preferência”. O rascunho enviado aos ministros em Bali, se concordado, encorajaria ainda mais os países desenvolvidos a melhorar sua cobertura em DFQF para produtos de PMDRs. Os membros seriam instruídos a notificar as DFQF para os PMDRs ao Mecanismo de Transparência dos acordos preferenciais de comércio. Também, o CTD realizaria revisões anuais nos esforços feitos para fornecer acesso de mercado DFQF aos PMDRs e apresentaria relatórios ao Conselho Geral para ações apropriadas. EXPLORE o mundo do comércio e do desenvolvimento sustentável por meio da rede Bridges do ICTSD PU E N T ES Informações e análises sobre comércio e desenvolvimento sustentável Enfoque na América Latina e no Caribe - Publicação em espanhol www.ictsd.org/news/puentes B I O RES Informações e análises sobre comércio e meio ambiente Enfoque internacional - Publicação em inglês www.ictsd.org/news/biores International Centre for Trade and Sustainable Development Chemin de Balexert 7-9 1219 Geneva, Switzerland +41-22-917-8492 www.ictsd.org A produção de PONTES tem sido possível graças ao apoio generoso da: SDC - Agência Suíça para o Desenvolvimento e a Cooperação B RI DG ES O PONTES também beneficia de contribuições de especialistas na área de comércio e desenvolvimento sustentável na forma de artigos. 桥 Informações e análises sobre comércio e desenvolvimento sustentável O PONTES recebe propostas de publicidade ou de patrocínio que contribuam para a redução de seus custos de publicação e que ampliem o acesso aos seus leitores. A aceitação de tais propostas fica a critério dos editores. Informações sobre comércio sob a perspectiva do desenvolvimento sustentável Enfoque internacional - Publicação em inglês www.ictsd.org/news/bridges Enfoque internacional - Publicação em chinês www.ictsd.org/news/qiao Мос т ы Informações e análises sobre comércio e desenvolvimento sustentável Enfoque nos países da CEI - Publicação em russo www.ictsd.org/news/bridgesrussian B RI DG ES A FRI C A Informações e análises sobre comércio e desenvolvimento sustentável Enfoque na África - Publicação em inglês www.ictsd.org/news/bridges-africa PA SS E RE L L ES Informações e análises sobre comércio e desenvolvimento sustentável Enfoque nos países francófonos da África - Publicação em francês www.ictsd.org/news/passerelles As opiniões expressadas nos artigos publicados no PONTES são exclusivamente dos autores e não refletem necessariamente as opiniões do ICTSD. 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