ANÁLISE ECONÔMICA APLICADA AO DIREITO DAS SUCESSÕES.
Silvana Fortes da Silveira1
RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo traçar, em linhas gerais, o estudo sobre
a análise econômica do direito sucessório que sob vários aspectos promove injustiças
tanto ao regular direitos diferentes para membros de famílias ditas protegidas pelo
Estado.
PALAVRAS-CHAVE: constitucionalidade, direito sucessório, casamento, união estável,
união homoafetiva.
1. Introdução: Origem do direito das sucessões
Os registros mais antigos, pertinentes ao instituto da sucessão, mostram que
sua existência decorria da prática religiosa: a sucessão implicava na transferência das
responsabilidades do de cujus no que concerne a condução do culto doméstico, como
retratado por Fustel de Coulanges:
Só o pai, único intérprete e único pontífice da sua religião, é que tinha o poder
de ensiná-la, e somente a seu filho, e ninguém mais podia ser instruído nas
regras da sua religião caseira. Os ritos, as palavras próprias da oração, os
cantos, tudo isso preenchendo a parte essencial dessa religião doméstica, era
patrimônio, propriedade sagrada que a família com ninguém partilhava, sendo
2
até mesmo proibido revelá-los a estranhos. (COULANGES, p. 41)
O administrador do acervo familiar era considerado pelos antigos como uma
autoridade e era o responsável pela condução do culto aos antepassados, da vida
religiosa e doméstica, responsabilidade esta exclusiva do primogênito varão, pois a filha
1
Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Gama Filho. Mestre em Direito, área de
concentração Direito Privado, pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerias. Advogada.
2
Título original: La Cité Antique.
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era
afastada
pelo
casamento,
quando
passava
a
integrar
a
família
do
marido.(COULANGES, p. 79).
Todavia, quando se fala no período inicial da socialização dos indivíduos, em
que não havia propriedade individual, o conteúdo do direito sucessório era encerrado
sempre que a morte de alguém não alterava a situação jurídica daquele patrimônio
partilhado. Apesar de se ter como conceito do direito sucessório a “transmissão da
titularidade de direito e obrigações que compunham o acervo do ser humano que
falece”. (HIRONAKA, 2002, p. 17). Tal idéia decorre de séculos de evolução deste
instituto.
Na verdade, na antiguidade, todo o patrimônio existente pertencia aos
antepassados, e cabia a quem os administrasse a sua manutenção, ainda que tal
administrador ou algum membro da família se tornasse devedor, pois era impensável o
cumprimento forçado de obrigações inadimplidas por meio do patrimônio da família. O
pagamento seria por meio do corpo do devedor, seja como escravo, seja pela punição
com a morte, conforme previa a Lei das XII Tábuas, elaborada a partir de uma
comissão de magistrados encarregados da criação de um Código escrito de leis
romanas a partir do estudo das leis de Sólon, na Magna Grécia.3
Com a Lex Poetelia Papiria, em 428 a.c., foi abolida a execução sobre a
pessoa do devedor, restringindo a responsabilidade do devedor sobre seus bens.
Foi a individualização do patrimônio ou da propriedade um marco para que
se passasse a dar importância aos fundamentos que justificam a sucessão patrimonial
pelos descendentes.
Somente séculos mais tarde a propriedade passou a ser particular, o que
justificou a modificação do fundamento da sucessão: esta perdeu seu caráter religioso e
assumiu o caráter social, dando sentido à continuidade patrimonial através da idéia da
permanência do patrimônio auferido dentro de mesmo grupo familiar, ou seja, tal
patrimônio era transferido integralmente para o primogênito, impedindo que fosse
3
Cf. GRASSI Fiorindo David. Direito romano hoje: síntese da história e da filosofia do direito romanista.
Frederico Westphalen – RS: URJ, 1996, P. 33.
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pulverizado com a divisão entre vários filhos, por exemplo, o que diminuiria não apenas
o poder econômico daquela família, como também o poder político, haja vista que o
princípio medieval da primogenitura era associado ao feudalismo. (
LE
ROY
LADURIE, p. 188)
O rompimento ou abolição do princípio da primogenitura, consequente
privilégio decorrente do feudalismo, foi uma das consequências da Revolução
Francesa: somente com o Código de Napoleão foi rompido tal conceito, pois foi
permitido ao burguês libertar-se da subserviência ao feudalismo, além de protegê-lo do
Estado.
A partir de então o cidadão passou a ser considerado indivíduo, e lhe foi
permitido manter seus bens, com a consequente extinção da sociedade feudal
consubstanciada na relação do vassalo com o suserano e do servo com o senhor,
sendo garantido aos herdeiros legítimos, aos herdeiros naturais e ao cônjuge
sobrevivente o direito ao recebimento dos bens, direitos e ações do defunto, com a
obrigação de cumprir os encargos decorrentes da sucessão, conforme previsto no
artigo 724 do Código Civil francês. (VELOSO, p. 1597)
Mesmo com a queda de Napoleão, os países europeus por ele dominados
continuaram a usar o Código Civil, mas deixaram de se referir a ele como Código de
Napoleão. O nascimento da sociedade moderna propiciou o desenvolvimento do direito
sucessório.
Mais tarde, tentaram, em vão, os socialistas, negar a legitimidade do direito
sucessório, entendendo que todos os bens pertenciam ao Estado, pelo que seu retorno
a ele implica em benefícios para toda a coletividade. (HIRONAKA, p. 20)
Assim, em 27 de abril de 1918, foi abolido na Rússia o direito sucessório,
com a suspensão dos direitos hereditários e a consequente transmissão ao Estado do
patrimônio do de cujus.
Todavia, tal decreto não prevaleceu por muito tempo, pois o Código Civil
Russo restaurou os direitos sucessórios, permitindo em seu art. 416 a transmissão dos
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bens do falecido até um determinado montante, mas, com o passar dos anos, foi
assemelhando-se cada vez ao direito ocidental em tal questão. (GONÇALVES, p. 28)
O retrocesso dos países socialistas quanto ao direito sucessório é
compreensível, pois, retirado do indivíduo a possibilidade de dispor de seu patrimônio,
tanto em vida quanto após a sua morte, implica, diretamente, em desestímulo da busca
de riquezas, busca esta que decorre do trabalho.
A justificação da transmissão hereditária do patrimônio amealhado foi
claramente apresentada por Silvio Rodrigues:
Não admitida a transmissão hereditária, falta ao indivíduo incentivo para
amealhar e conservar a riqueza, sendo provável que consagre os últimos anos
de sua vida a esbanjar um patrimônio que pode deixar aos seus entes queridos.
Tal comportamento representa prejuízo para a sociedade. Ademais, raramente
a lei deixaria de ser burlada, pois, através de doações, ou de liberalidade
simuladas em negócios onerosos, o titular tentaria transmitir seu patrimônio a
seus herdeiros. (RODRIGUES, 1997, p. 6).
A busca por riqueza e a transmissão de forma livre do patrimônio auferido é
nítido incentivo ao trabalho, fato que pode ser verificado empiricamente partindo da
experiência ocorrida na Rússia, pois já em 1919 constatou-se queda vertiginosa da
produção ante o desestímulo que se abateu sobre a classe trabalhadora.
A doutrina francesa, através de Michel Grimaldi, apresenta o fundamento
econômico, revestido de interesse social, dissociado da mera natureza patrimonial do
direito das sucessões, haja vista que a sucessão privada incentiva o espírito
empreendedor com o consequente progresso da economia de um país.
No Brasil, nos dias atuais, além do aspecto econômico que reveste o direito
das sucessões, há uma forte tendência à constitucionalização do direito sucessório,
tendo em vista proteção auferida pelo art. 5º inciso XXX da Constituição Federal de
1988.
Indiscutível, portanto, não se poder falar hoje em sucessão sem considerar
tanto a ordem social como a ordem econômica, até porque, conforme ressalta
Francisco Cahali (2003, p. 27), “a análise do direito sucessório deve ser feita de acordo
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com a política legislativa de uma Nação, considerada a posição socioeconômica
estabelecida pelo Estado”.
No direito sucessório, entende-se a sucessão de forma exclusiva, a sucessão
causa mortis ou hereditária, em que a transmissão dos bens se dá ante o falecimento
de seu titular.
Pode-se definir sucessão como a transferência de um direito de uma pessoa,
seja física ou jurídica, para outra pessoa. Há a transferência de bens e há a
transferência de direitos de titulares.
Tais transferências podem ser totais ou parciais: pode haver a sucessão
total, considerada a título universal, e a sucessão a título singular, quando há
transferência de direitos decorrentes de uma relação jurídica transmitida, como
ressaltam Cahali e Hironaka (2003).
Clóvis Beviláqua (1945, p. 44) definiu o direito de sucessões como “o
complexo dos princípios segundo os quais se realiza a transmissão do patrimônio de
alguém que deixa de existir”.
Ainda sobre o tema, Carlos Maximiliano (1942, p. 2) declarou que “direito das
Sucessões, em sentido objetivo, é o conjunto das normas reguladoras da transmissão
dos bens e obrigações de um indivíduo em consequência da sua morte. No sentido
subjetivo, mais propriamente se diria – direito de suceder, isto é, de receber o acervo
hereditário de um defunto”.
O direito sucessório está intimamente ligado ao direito de propriedade, pois,
em regra, apenas se transmitem as relações patrimoniais, enquanto a transmissão de
direitos autorais, único direito de personalidade que se transmite, é tratado em sistema
próprio4.
2. O direito sucessório no Brasil e as divergências criadas pela lei
4
Lei nº 9.610 de 19/02/1998.
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No Código Civil de 1916, o direito sucessório encontrava-se previsto no Livro
IV, sendo tratado do art. 1.572 ao art. 1.805, e não há qualquer previsão concernente
ao direito de sucessão dos companheiros.
Somente com a Constituição Federal de 1988 foi alçada à condição de
entidade familiar, para fins de proteção do Estado, a União estável entre homem e
mulher, mas somente em 1994, com a Lei 8.971, é que foi regulamentado o direito
daqueles companheiros a alimentos e à sucessão.
Em 1996, com a Lei 9.278, que regulou o parágrafo 3º do art. 226 da CF,
perdeu o legislador, novamente, a oportunidade de legislar a união homoafetiva,
restringindo a aplicação da presente lei a regulamentar a meação do patrimônio
adquirido a título oneroso durante a união estável entre homem e mulher, concedendo
direito real de moradia ao companheiro sobrevivente quando da dissolução da união
estável por morte de um dos conviventes; todavia, o direito real de moradia estaria
limitado à constituição de nova união ou casamento.
Não obstante o avanço da legislação que regulamentou o direito sucessório
dos conviventes de união estável, percebe-se um descompasso com os direitos
sucessórios dos cônjuges, sendo a legislação, em alguns pontos, mais benéfica para os
conviventes do que para os cônjuges.
Tal descompasso tampouco foi sanado pelo Código Civil de 2002, que tratou
do direito sucessório no Livro V, do art. 1.783 ao art. 2.027. Contrariamente,
apareceram mais problemas.
Em determinados casos, o cônjuge está em posição mais vantajosa que o
companheiro e vice-versa, como por exemplo na previsão contida no art. 1.790 que
confere ao companheiro o direito de participar da sucessão do outro quanto aos bens
adquiridos onerosamente na vigência da união estável.
Todavia, tal participação é delimitada pelos incisos do dispositivo em
questão, ficando condicionada à concorrência com filhos comuns, com filhos exclusivos
do de cujus com outros parentes, ou no caso de inexistência de parentes sucessíveis.
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Também é garantido ao convivente de união estável todos os direitos
aplicáveis às relações patrimoniais cabíveis no regime da comunhão parcial de bens,
conforme apregoado pelo art. 1.725 do Código Civil.
Desta forma, garante nosso ordenamento civil ao companheiro, em caso de
rompimento da união estável por morte, a meação do patrimônio adquirido a título
oneroso, e este ainda concorre na sucessão com os herdeiros legítimos quanto à outra
metade.
Ao cônjuge sobrevivente, por sua vez, somente caberá figurar como
herdeiro, em caso de casamento com comunhão parcial de bens, quanto aos bens
particulares, já que na qualidade de meeiro dos bens adquiridos onerosamente na
constância do casamento receberá 50% dos bens ante a dissolução do casamento pela
morte, e no caso do casamento com comunhão universal de bens, o cônjuge
sobrevivente será apenas meeiro.
Percebe-se que dependendo do caso são beneficiados os conviventes de
união estável quando o patrimônio a ser inventariado foi adquirido na vigência da união,
haja vista que o companheiro sobrevivente será meeiro e também participará da
sucessão, enquanto em situação patrimonial idêntica, em casamento com comunhão
parcial de bens, o cônjuge sobrevivente somente terá direito à meação dos bens, mas
não concorrerá na sucessão.
De outra maneira, deve-se ressaltar, entretanto, que, se todo o patrimônio a
ser inventariado foi adquirido pelo de cujus antes da união, o companheiro sobrevivente
não terá qualquer direito ao mesmo, à exceção do direito real de moradia, previsto no
art. 7º, parágrafo único da Lei 9.278/96, já que não há previsão para tanto no Código
Civil atual.
Já o cônjuge sobrevivente, nesta última hipótese, figurará como herdeiro
necessário, podendo se valer da prerrogativa do direito real de moradia, conforme
previsto no art. 1831 do Código Civil atual, sem prejuízo de sua participação na
herança, desde que seja o único imóvel a inventariar de natureza residencial e que
fosse residência do casal, não havendo qualquer limitação temporal para tal: ainda que
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o cônjuge sobrevivente venha a se casar novamente, não perderá tal direito que só
extinguirá com a morte deste.
Tais discrepâncias infringem diretamente o texto constitucional, partindo do
pressuposto de que o art. 226 da Constituição Federal concedeu à família, que é a base
da sociedade, especial proteção do Estado. Tal proteção, conforme hipótese relatada,
não se apresenta de forma diferenciada para as famílias formadas a partir do
casamento ou de uniões estáveis.
Diante da diferenciação de tratamento no que diz respeito aos direitos
sucessórios do cônjuge sobrevivente, surge mais um ponto de estudo sob o prisma da
análise econômica do direito, análise esta que não se confunde com mera verificação
de caso a caso ou com mera verificação de comodidade de algumas pessoas quanto à
escolha do regime de casamento ou escolha pela união estável, mas sim a repercussão
em toda uma sociedade dos efeitos decorrentes de tais escolhas. Cabível aqui,
portanto, a crítica quanto à ausência de regulamentação no que se refere aos direito
sucessórios para os companheiros sobreviventes em caso de uniões homoafetivas.
Apesar do art. 226 da Constituição Federal negar às uniões homoafetivas o
status de união estável ou de família, certo é que tais relações são compostas ante a
vontade de pessoas que não merecem tratamento distinto daquele dispensado aos
relacionamentos constituídos por pessoas de sexos distintos, ou heterossexuais.
3. Análise econômica aplicada ao direito das sucessões.
Muitos estudiosos do direito ainda hoje vêem com muita reserva a aplicação
da Análise Econômica do Direito para todas as áreas, considerando-a aplicável tão
somente às áreas que sofrem influência econômica, como os ramos de nítido caráter
econômico, como o direito tributário, o direito de concorrência, o direito econômico,
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matérias que envolvem propriedade, contratos, responsabilidade civil etc., sendo,
portanto, restrita a áreas pertinentes do direito de família e de sucessões.
Ainda assim, há que se considerar que a Análise Econômica do Direito não
se resume a simples hábito dos economistas de converterem a utilidade em algo
comercializável, e tampouco pode ser considerada de forma simplista ante a verificação
das consequências advindas de uma sentença proferida a um determinado
caso
concreto. A importância da AED decorre do fato de que o direito não pode ser
considerado como mera norma posta, e tampouco se origina com a promulgação da lei.
Pontes de Miranda já afirmava que:
Diante da ciência que tanto nos mostra e comprova explicação extrínseca dos
fatos (isto é, dos fatos sociais por fatos sociais obviamente), o que não se pode
pretender é reduzir o direito a simples produto do Estado. O direito é produto
dos círculos sociais, é fórmula de coexistência dentro deles. Qualquer círculo, e
não só os políticos, no sentido estrito em o direito que lhe corresponde.
(MIRANDA, 1955, p. 170).
O ensinamento de Pontes de Miranda bem ilustra que a falta de dispositivo
legal sobre uma matéria implica na necessária atuação do operador do direito, além de
postular que a fria interpretação da lei não pode ser definida como aplicação do Direito,
pois este deve ser identificado como fator social e resultado da interação dos fatores
sociais, dedução esta que não se dissocia dos conceitos da Análise Econômica do
Direito.
Tampouco pode se dissociar os fatores sociais dos fatores econômicos, pois
uma simples decisão judicial pode afetar a economia ou um seguimento de
determinado lugar, como uma sentença judicial, por exemplo, que deixa de ordenar o
despejo por falta de pagamento de alugueis sob o argumento de que o locador seria
pessoa idosa e desprovida de meios de subsistência. Tal decisão ensejaria temor aos
proprietários daquele lugar, que resistiriam em alugar imóveis para pessoas com idade
avançada.
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Entretanto, conforme dessume-se dos conceitos estudados, não se resume a
AED em mera verificação da solução economicamente mais vantajosa.
Na verdade, o processo de decodificação de AED objetiva demonstrar qual o
modo e em que proporção os valores inicialmente considerados para a produção de
uma norma devem ser analisados em cada situação.
Assim, o estudo de decodificação dos elementos que integram a norma é
melhor definido como uma análise do direito ao invés de mera interpretação deste;
contudo, tal entendimento não é pacífico, mesmo porque o enfoque para cada um é
distinto.
Em suma, a AED e a Escola Crítica do Direito apregoaram a necessidade de
autonomia do Direito em relação às outras ciências sociais, e consequentemente em
relação às realidades sociais, bem como a necessidade de conjugar métodos da
economia e política, justificando a interdisciplinaridade para analisar a realidade
jurídica, rejeitando a idéia do raciocínio abstrato e a hostilidade às ciências exatas.
Para a Escola Crítica do Direito, o direito é uma instituição social e não um
conjunto normativo, razão porque seu estudo implica argumentos procedentes da
filosofia social e política. (PACHECO, 1994).
No que tange as diferenças destas concepções, pode-se destacar que para a
AED o comportamento humano maximiza seus interesses em todos os âmbitos, pelo
que sob o prisma econômico o direito resume-se num conjunto de incentivos que
favorece os atos e as condutas eficientes, punindo a ineficiência, enquanto que para a
Escola Crítica do Direito o comportamento econômico racional decorre de uma
ideologia pré-estabelecida que justifique e explique as vantagens e desvantagens
existentes numa escolha pessoal.
Assim, sustenta a Escola Crítica do Direito que o pensamento tradicional
legitima desigualdades sociais e econômicas que são determinadas pelas decisões
judiciais, enquanto a AED, apesar de reconhecer as falhas do pensamento jurídico
tradicional, defende que a análise econômica pode enriquecer as justificações
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doutrinárias, tornando mais precisas as decisões. De tal forma, o princípio da
maximização da riqueza, se usado pelos juízes, poderá ensejar uma decisão mais justa.
Nesta esteira, a fixação de prioridade da teoria econômica, aplicada ao
direito, implicará num conjunto de incentivos que guiarão a conduta dos indivíduos na
consecução da eficiência econômica que deve buscar o direito. (PACHECO, 1994).
A análise econômica do direito permite não apenas a identificação dos
valores que a norma objetiva proteger, mas também identificar as finalidades e as
consequências desta norma, correspondendo, pois, a uma atividade intelectual que
busca nos elementos de natureza econômica a influencia da instrução que serviu de
orientação da norma.
Já a “interpretação econômica do Direito” corresponde à fase que se segue à
análise, e cuida de identificar os efeitos de natureza econômica que uma norma
concebe à sociedade.
Desnecessária a discussão relativa às afirmações de que a Economia
deveria formatar o Direito a partir de novos valores, tais como “eficiência” e
“racionalidade”, os quais são determinantes dos modelos de economia de mercado.
Desnecessário ainda discutir que o Direito é que delimita as garantias e os limites para
aplicação dos princípios da economia, pois para a harmonia de um sistema econômico
é imprescindível a observância de regras ditadas pelo Direito que possibilitem uma boa
aplicação dos fatores de produção, dos produtos ou mesmo dos serviços.
É recíproca a influência da economia no mundo jurídico, bem como nítidas e
esperadas as influências de outros fatores sociais, pois a lei não pode encontrar-se
dissociada das relações sociais, inclusive no que se refere à formação da família e dos
direitos sucessórios decorrentes de tal formação, casos que se relacionam diretamente
com o direito e a economia.
Por isso que uma legislação que exclui formas atuais de família gera
problemas de ordem econômica em detrimento da própria sociedade, ante o tratamento
desigual dispensado aos núcleos familiares.
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Posner, em sua obra Economic analysis of Law, tratou de temas
relacionados ao direito de família e ao direito sexual, discutindo aspectos econômicos
presentes no Direito de família, pois este direito seria uma sequência natural do direito
do contrato.
Assim, o casamento, segundo Posner (2000), seria o agente catalizador da
atividade sexual que é a atividade procriadora, o que levaria à análise econômica da
regulação da atividade sexual a uma natural extensão da análise econômica do direito
de família.
Para Posner (1998), a análise econômica da família baseia-se na percepção
de que o grupo familiar não é mero consumidor, mas sim uma unidade de produção na
sociedade: todas as mercadorias adquiridas pelo grupo familiar, como mobiliários,
roupas, alimentos, remédios etc., são os insumos utilizados na produção de alimentos e
de outros bens, além dos filhos - bens tangíveis e intangíveis que compõem um lar.
A divisão das tarefas entre marido e mulher, relacionadas à maximização da
renda monetária da família pelo marido, ao comprar as mercadorias necessárias
enquanto a esposa especializa-se na produção doméstica, maximizando seu tempo,
como insumo final do grupo familiar formado, permite que marido e mulher
especializem-se em atividades complementares: este é o princípio em que uma pessoa
tende a fazer melhor aquilo em que se especializou, ao contrário de tentar ela mesma
fazer coisas para as quais não foi preparada adequadamente, como no exemplo de
uma pessoa que trabalha meio expediente como médico e no outro como advogado.
Com tais considerações, Posner (1998) aborda a proposta relacionada aos
filhos, cujos ganhos de especialização se realizam no mercado.
Muito embora muitos casamentos sejam sem filhos, proporcionalmente são
poucos os que não têm filhos por opção, sendo difícil creditar ao casamento o status de
instituição comum se mais pessoas não desejassem ter filhos. Tais ponderações são
perfeitamente aplicáveis para todos os núcleos familiares, outrossim, a justificativa para
a abordagem através da Análise Econômica do Direito de família, e por que não dizer
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do Direito sucessório, justifica-se ante o conteúdo econômico que envolvem tais
matérias.
No Brasil, a Análise Econômica do Direito começou a ser aventada a partir
da década de 80 e atualmente tem como grande expoente o professor Bruno Salama,
que assim a define:
Pode-se conceituar a disciplina de Direito e Economia como um corpo teórico
fundado na aplicação da Economia às normas e instituições jurídico-políticas.
Na síntese de Richard Posner, o Direito e Economia compreende ‘a aplicação
das teorias e métodos empíricos da economia para as instituições centrais do
sistema jurídico’. Para Nicholas Mercuro e Steven Mederna, trata-se da
‘aplicação da teoria econômica (principalmente microeconomia e conceitos
básicos da economia do bem-estar) para examinar a formação, estrutura,
processos e impacto econômico da legislação e dos institutos legais’. (SALAMA,
2008. p. 51).
Leonardo Barreto Moreira Alves (2009, p. 75), em seu artigo Casamento e
União Estável à Luz da Análise Econômica do Direito, ao tratar da aplicação da Análise
Econômica do Direito ao Direito de Família, afirma que de forma alguma tal aplicação
implica na patrimonialização desta seara jurídica, não podendo, portanto, ser
considerado como uma proposição retrógrada.
Assim, tomando por base os ensinamentos de Alexandre Moraes da Rosa e
de José Manoel Aroso Linhares declara que:
Isso fica ainda mais claro quando se verifica que a Análise Econômica do
Direito, ao contrário do que sustenta parcela da doutrina, não se restringe ao
estudo da eficiência das normas jurídicas, estando muito mais preocupada com
as conseqüências de certas normas ou de determinadas condutas, quer seja
em relações patrimoniais ou extrapatrimoniais. Em verdade, a disciplina em
comento procura fundamentalmente indicar, de modo puramente
descritivo/explicativo, os problemas jurídicos, quais são as repercussões das
diversas possíveis escolhas feitas pelas normas ou pelos indivíduos e como tais
escolhas podem facilitar ou prejudicar a concretização dos interesses desses
últimos. (ALVES, 2009, p.75).
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Torna-se perfeitamente cabível a análise econômica do direito no que
concernes às questões pertinentes à dissolução de casamento, de uniões estáveis e de
uniões homoafetiovas, mesmo que pela morte.
Posner (2005) ainda afirma que a consideração da família como instituição
social implica que tal instituição precisa ter fortes propriedades economizadoras.
Certamente, não se pode comprovar a aplicabilidade da Análise Econômica
do Direito ao estudo em questão tão somente com a argumentação de Posner,
Calabresi, dentre outros, e tampouco podemos negá-la diante dos argumentos
apresentados por Alvares (2006) pertinentes à Casamiglia e à Dworkin.
A apresentação dos argumentos favoráveis e contrários à análise econômica
do direito fez-se necessária para um confronto com a questão ora apresentada, posto
terem embasado a proposição deste trabalho de que não apenas é viável a análise
econômica do direito como também é ela um dos instrumentos que podem ser
utilizados na solução dos conflitos decorrentes dos efeitos patrimoniais no Direito
sucessório haja vista os conflitos decorrentes da previsão legal para o assunto.
De fato, seria por demais simplista analisar somente a ausência de
regulamentação para sucessão de bens deixados por companheiro de uma união
homoafetiva, ou mesmo os critérios distintos previstos pelo atual Código Civil para a
sucessão no casamento e na união estável.
A aplicação da Análise Econômica do Direito evita que a escolha do princípio
ou da norma que determinará a solução do conflito decorra tão somente de critérios
subjetivos do julgador, pois as ferramentas disponibilizadas pela AED servem de
subsídios para o julgador, possibilitando maior objetividade e eficiência à decisão a ser
proferida.
Observa-se, portanto, que a Análise Econômica do Direito não torna mais
frias as relações jurídicas: contrariamente, ela permite maior contato do direito com as
demais ciências sociais.
Assim, a Análise Econômica do Direito faz-se importante ao trazer outros
conceitos e argumentos que se somam às questões constitucionais que amparam a
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necessária supressão de lacuna legal quanto aos direitos sucessórios, lacuna esta
suprida recentemente com a decisão proferida pelo STF na Adi 4277, até porque a
objetividade da análise econômica justifica a sua aplicação no direito como uma
importante contribuição para a solução de conflitos ante as ferramentas possibilitadas
pela Análise Econômica do Direito relativas à fixação de critérios objetivos que
possibilitam escolhas mais acertadas, posto que baseadas em critérios de eficiência.
4. Conclusões.
O direito e a atividade judicial não podem ser vistos como meros formalismos
que obstam o dinamismo da vida social ao buscar a solução de problemas decorrentes
da vida social de forma ultrapassada e morosa.
A questão a ser analisada ou quantificada na aplicação da Análise
Econômica do Direito ao Direito das Sucessões, não significa fundamentar em meros
argumentos baseados na economia, mas sim conjugar tais conceitos à normatização
pertinente ao Direito das Sucessões, somados a uma análise positivista sobre a
efetividade da justiça.
Outrossim, ressalta Leonardo Barreto Moreira Alves (2009, p.75) ao citar
Alexandre Moraes da Rosa e José Manoel Aroso Linhares: “a Análise Econômica do
Direito, ao contrário do que sustenta parcela da doutrina, não se restringe ao estudo da
eficiência das normas jurídicas, estando muito mais preocupada com as consequências
de certas normas ou de determinadas condutas, quer sejam patrimoniais ou
extrapatrimoniais”.
Diante disso há razões mais que suficientes para se examinar o direito
sucessório sob o prisma da análise econômica do direito, tanto no que concerne às
injustiças cometidas pelo legislador no que tange às diferenças aos direitos sucessórios
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do cônjuge sobrevivente e do convivente sobrevivente, divergências estas que em
determinadas situações prejudicam ou beneficiam tanto um quanto outro.
A AED é um dos instrumentos que torna possível a harmonização do conflito
entre o pragmatismo da Economia e a cautela do juiz ao aplicar o texto frio da lei, até
porque, como aponta Cristiano de Carvalho (2008, p. 4), “a justiça deve decorrer da
decisão após a avaliação dos custos frente à eficiência na destinação dos recursos que
ensejaram a lide”.
Cabe, portanto, ao operador do direito atentar-se às transformações sociais a
fim de cumprir seu múnus, sendo instrumento de transformação social e não apenas um
técnico que se atém em aplicar ao caso concreto o texto frio da lei.
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