A RELAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS INTRODUÇÃO "Nunca um acontecimento, um fato, um feito, um gesto de raiva ou de amor, um poema, uma tela, uma canção, um livro têm por trás de si uma única razão. (...) se acham sempre envolvidos em densas tramas, tocados por múltiplas razões de ser de que algumas estão mais próximas do ocorrido ou do criado, de que outras são mais visíveis enquanto razão de ser" (FREIRE, 1992, p.18). Vivemos neste início de século, momentos de incerteza. Nenhum de nós sabe muito bem para onde caminha a humanidade, nem muito menos o sujeito da alfabetização, e nenhum de nós sabe analisar e dizer, de uma maneira crítica e clara, quais são efetivamente os novos paradigmas, os novos parâmetros que devem reger nossas ações. Contudo para analisar o panorama da relação pedagógica na EJA, vamos nos deparar com uma diversidade contextual, que surge e povoa o espaço das ações educativas do sujeito protagonista da alfabetização e se constitui como um desafio às políticas educativas para promover um direito humano fundamental ao desenvolvimento de outras habilidades básicas da vida no seu dia a dia. O relatório Delors diz que a educação do século XXI deve ser continuada e tem que estar baseada em quatro novos pilares, aprender a aprender, aprender a ser, aprender a fazer, aprender a viver juntos. Observamos que, em alguns momentos a relação do sujeito da educação continuada associa-se à própria característica distintiva dos seres humanos, o homem como um ser inconcluso, consciente de sua inconclusão, (Freire, 2000, p.72) Partindo dessas observações, questionamos: o que será que jovens e adultos (não letrados) que passam a ser atores em relação aos fatores históricos, culturais e sociais que acontecem ao longo da vida podem, pensar e agir, numa sala de aula? Como se relacionam às necessidades do sujeito e sua relação pedagógica? Essa relação se constitui experiência sobre o homem com a linguagem, na sociedade e na história? Em que o efeito da aprendizagem à aquisição subjetiva dos conhecimentos pedagógicos, se apóia para designar o lugar de pessoas jovens e adultas, para o desenvolvimento humano atual? 1 Estes e outros questionamentos nos conduzem em direção aos nossos objetivos, que procura focalizar os efeitos do texto construído em situação pedagógica e diz respeito à natureza do fenômeno do diálogo que se efetiva no interior da sala de aula. Para as implicações de natureza pedagógica em direção ao desenvolvimento da pessoa humana, buscamos apoio nos trabalhos de (Freire, 1996), passando pelos saberes necessários à educação do futuro de (Morin, 2001), da pedagogia diferenciada que defende (Perrenoud, 2002); dentre outros, que se voltam para a reflexão sobre a Educação do século XXI. Acontece que, na própria produção do diálogo, há a inscrição do outro, é com palavras e atos que nos inserimos no mundo humano. Na visão de Arendt, o discurso corresponde ao fato da distinção e, é a efetivação da condição humana e da pluralidade, enquanto ser distinto e singular entre iguais. Da pluralidade de formações dialógicas existentes em nossa formação social resulta uma variedade de sujeitos sociais, daí decorrendo a diversidade de textos possíveis. E dentro desses parâmetros, interessa-nos examinar a questão do diálogo numa relação pedagógica. A RELAÇÃO PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS Talvez uma das características que conforme a Educação de Jovens e Adultos como modalidade diferente do ensino regular seja a diversidade de contextos em que ela se desenvolve e a pluralidade de seus sujeitos. Com suas histórias de vida, que reúnem marcas identitárias semelhantes e ao mesmo tempo singulares, é como se esses sujeitos educandos e educadores compartilhassem, na relação pedagógica, o encontro de diversas experiências: o encontro da desigualdade de oportunidades; da negação do direito à educação e à formação; o encontro das jornadas duplas ou triplas de trabalho; o encontro do desemprego ou do subemprego; das lutas na cidade e no campo por uma educação de qualidade; e, conseqüentemente, o encontro da luta pela afirmação do direito na busca de construção de um projeto apropriado aos diferentes segmentos marginalizados a quem a EJA se destina. A relação pedagógica é contato pessoal que se gera entre os envolvidos numa situação pedagógica e o resultado desses contatos. A relação pedagógica funda-se na relação humana. Por conseqüência, sem o estabelecimento de relação humana com qualidade, sem o estabelecimento de vínculos entre os envolvidos, certamente a produção de ação formativa não ocorrerá. Dizendo de outro modo: “a qualidade do 2 resultado da ação educativa é diretamente proporcional à qualidade das relações humanas estabelecidas” (ESTRELA, 1998, p.36). ‘Num sentido lato, a relação pedagógica abrange todos os envolvidos direta e indiretamente no processo pedagógico: aluno-professor, professor-professor, alunosfuncionários, professor-pais... Num sentido restrito, abrange a relação professor-aluno e aluno-aluno dentro de situações pedagógicas. Por uma questão metodológica, tomaremos o conceito no seu sentido restrito. A relação pedagógica inscreve-se num quadro complexo de relações mediatizadas pelo saber e pelas condições institucionais criadas para sua transmissão e apropriação (a da instituição escola, por excelência). “O saber é, portanto, o primeiro condicionante da relação pedagógica. Pela mediação do saber estabelece-se o contato entre aquele que o ‘detém’ e recebeu a delegação social para transmiti-lo e aquele que deve adquiri-lo” (ESTRELA, 1998, p.36-37). Daí precisarmos falar do papel do professor nesta relação. Mais de uma vez dissemos que educação é o processo de aprendizagem do humano. E esse processo acontece principalmente em encontros educativos, onde a sala de aula é o lugar formal por excelência. Nessa concepção, quão importante é o papel do professor! Na relação professor-aluno, ele não é detentor de todo o saber - de toda a instrução. Mas o que ele sabe, deve colocar a serviço da busca de novos conhecimentos. Segundo Libâneo (1998), o mundo globalizado em que vivemos exige dos alunos uma preparação para ler criticamente as transformações que nele ocorrem. Há a necessidade de se pensar cientificamente os problemas humanos. Diante de uma crise de valores e princípios é preciso que a escola contribua para uma nova postura éticovalorativa de recolocar valores humanos fundamentais como a justiça, a solidariedade, a honestidade, o reconhecimento da diversidade e da diferença, o respeito à vida e aos direitos humanos básicos. Dessa forma, exige-se do professor competência profissional e uma base ética que lhe permita ajudar na formação de verdadeiros homens e mulheres que terão a consciência de que o fundamental não é saber tudo, mas é ser humano. Maturana (1999) vem reforçar essa idéia ao dizer que nosso educar deve acontecer de maneira que o educando aprenda a aceitar-se e a respeitar-se, porque assim aprenderá a aceitar e a respeitar os outros. Aquele que não se aceita e se respeita, também não consegue aceitar e respeitar o outro. Assim, é fundamental que a relação pedagógica entre professor e aluno e deste com os demais, seja fundada num verdadeiro 3 esforço de convivência, ou seja “com-viver”, viver juntos, sabendo respeitar a riqueza que está dentro de cada um, expressa nas diferenças e particularidades. O professor Augusto Novaski diz que educar é, fundamentalmente, estar com os outros (apud MORAIS, 1984). Todo encontro com o outro é uma possibilidade de educação. Um encontro é educativo quando possibilita a aprendizagem do que é fundamental: a aprendizagem do humano. A tarefa da educação é tornar a pessoa cada vez mais humana. Edgar Morin diz que a educação “deve contribuir para a autoformação da pessoa (ensinar a assumir a condição humana, ensinar a viver)” (MORIN, 2001, p.65). ). À medida que o encontro dá condições para que os envolvidos aprendam a serem humanos, ele é educativo. Todos os espaços e os momentos podem ser educativos. Humberto Maturana afirma que (...) o educar se constitui no processo em que a criança ou o adulto convive com o outro e, ao conviver com o outro, se transforma espontaneamente, de maneira que seu modo de viver se faz progressivamente mais congruente com o do outro no espaço da convivência. O educar ocorre, portanto, todo o tempo e de maneira recíproca (MATURANA, 1999, p.29). FREIRE: (1996, p.67) “É necessário a dialogicidade verdadeira, em que os sujeitos dialógicos aprendem e crescem na diferença”. Neste contexto, é essencial frisar que quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. E essa interação entre professor-aluno que torna a prática pedagógica um desafio maior criando uma ligação de respeito favorável ao processo ensino-aprendizagem. Ensinar exige do professor, acima de tudo comprometimento. O comprometimento, neste caso é saber que o professor deve respeito à identidade do educando, e ser coerente com este saber na prática. FREIRE (1996 cap.2, item: 2.3, p.66) “O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceder uns aos outros”. Partindo desses pressupostos, são adotados como instrumento metodológicos a análise documental e bibliográfica com a finalidade de analisar o objeto de pesquisa a partir de diferentes dimensões e atender aos objetivos propostos. Abordando o respeito mútuo, a reciprocidade das trocas sociais, de experiências, de informação e da livre expressão. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS É clara a importância da sala de aula como espaço formalizado para a educação. Uma escola precisa planejar toda a sua política educacional para influir positivamente na sala de aula. Se a sala de aula não vai bem, ou em outras palavras, se ela não está possibilitando encontros educativos, alguma coisa precisa ser feita urgentemente. A sala de aula não pode ter somente professores, mas também verdadeiros educadores que, com a consciência de sua missão, fruto de uma reflexão filosófico/pedagógica atenta, sejam capazes de ajudar o educando a ultrapassar os conteúdos formais e embrenhar-se na construção de sua própria humanidade. E essa construção é uma aventura instigante que, quando falamos educacionalmente, precisa ser feita a dois (ou mais), numa relação de respeito e de valorização, sempre encontrando no outro os motivos para se ensinar e aprender. REFERÊNCIAS DELORES, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. 6.ed. SP: Cortez; Brasília, DF:MEC:UNESCO, 2001. ESTRELA, M. T. Relação pedagógica, disciplina e indisciplina na aula. 3.ed. Porto: Porto Editora, 1998. FREIRE, Madalena; Tarefa e a construção do conhecimento. São Paulo: Espaço Pedagógico, 1992. FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996. FREIRE, Madalena; org. - Rotina: construção do tempo na relação pedagógica. Cadernos de Reflexão Espaço Pedagógico. São Paulo, 1998. LIBÂNEO, José Carlos. Adeus professor, adeus professora? São Paulo: Cortez, 1998. MATURANA, Humberto. Emoções e linguagem na educação e na política. Belo Horizonte: UFMG, 1999. MORAIS, Regis. O que é ensinar. 2.ed. São Paulo: Ed. Pedagógica e Universitária, 1986. MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita. 4.ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. PERRENOUD, Philippe, et.al. As Competências para Ensinar no Século XXI: A formação dos professores e os desafios da avaliação. Porto Alegre: Artmed, 2002: 12. 5