XV CONIC
XV Congresso de Iniciação Científica da UFPE
29 a 31 de outubro de 2007
60119 - FISCALIZAÇÃO TRIBUTÁRIA E INTERNET: LIMITES,
DESAFIOS E POSSIBILIDADES DE CONTROLE FISCAL SOBRE
OPERAÇÕES E SERVIÇOS REALIZADOS ATRAVÉS DA REDE
MUNDIAL DE COMPUTADORES.
Matheus Carneiro Assunção¹; Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti²
¹Estudante do Curso de Direito – CCJ – UFPE; E-mail: [email protected], ²Docente/pesquisador do
Departamento de Direito Público Especializado – CCJ – UFPE; E-mail: [email protected].
Resumo: Em um contexto mundial de crescimento prodigioso dos negócios eletrônicos, com
repercussões econômicas substanciais, alguns questionamentos jurídicos importantes impendem
ser feitos à luz da Ciência do Direito, notadamente no que diz respeito aos limites, desafios e
possibilidades de fiscalização tributária sobre operações e serviços realizados através da rede
mundial de computadores. O presente estudo se presta, nessa medida, a dissecar a problemática
da fiscalização tributária na Internet, visando em último plano propor conceitos para futuros
debates e reflexões críticas acerca do tema em referência. Busca-se assim firmar um instrumental
teórico sobre o tema em sua especificidade, mediante o conhecimento e análise crítica dos
posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais relacionados à fiscalização tributária,
identificando eventuais obstáculos ao controle fiscal no ciberespaço. Nesse mister, foram
utilizados os métodos hipotético-dedutivo e comparativo, com base em uma perspectiva teórica
eminentemente dogmática, partindo-se das técnicas de pesquisa bibliográfica e documental. As
informações coletadas foram analisadas com vistas à sistematização de uma obra de revisão da
matéria, contendo a formulação de juízos críticos sobre o tema enfocado. A pesquisa levou à
conclusão fundamental de que, a par dos desafios impostos pela tecnologia, existem limites
jurídicos à fiscalização tributária das operações e serviços desenvolvidos através da Internet, os
quais necessariamente precisam ser seguidos pelo Estado, sob pena de violação frontal à
Constituição Federal.
Palavras-chave: fiscalização tributária; internet; negócios eletrônicos
INTRODUÇÃO
Os avanços tecnológicos vivenciados a partir das últimas décadas do século XX, com o
desenvolvimento vertiginoso da informática e das telecomunicações, ocasionaram mudanças
profundas nas relações sociais. Em meio a fios, antenas e monitores, exsurge uma sociedade
dinâmica, marcada pela nota da multiplicidade e do relativismo, na qual as relações de produção
passam a se fundamentar na oferta e circulação de bens intangíveis, através de uma rede mundial
sem fronteiras – a Internet.
Diante dessa nova realidade, a Ciência do Direito começa a se defrontar com diversos
questionamentos, para os quais respostas categóricas tendem a se revelar precipitadas. No escopo
de analisar alguns desses questionamentos, especificamente aqueles relativos aos limites,
desafios e possibilidades de controle fiscal sobre as transações comerciais realizadas através da
Internet, é que desponta a presente pesquisa.
Sabe-se que a Internet se tornou um ambiente extremamente favorável para a prestação de
serviços e a comercialização de produtos no mercado global – sejam eles tangíveis
(equipamentos eletrônicos, livros, cosméticos, artigos esportivos, etc.) ou intangíveis (softwares,
livros digitais, músicas, vídeos, etc.) – a partir de uma forma inovadora de contratação que,
direta ou indiretamente, interfere no âmbito de aplicação do Direito Tributário.
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De fato, o volume dos negócios eletrônicos não pára de crescer. Tratando-se do comércio
eletrônico envolvendo bens tangíveis, corpóreos, o problema da fiscalização tributária tende a ser
resolvido de modo mais simples, vez que ocorre factualmente um desdobramento físico da
operação. Todavia, a situação muda de figura quando se pensa no comércio eletrônico de bens
digitais, incorpóreos, ou na prestação de serviços on-line. Nestes casos, fica extremamente difícil
verificar a ocorrência de fatos geradores de obrigações tributárias, tanto pelas limitações
tecnológicas quanto pelas restrições normativas à atuação do Fisco, que deve guardar
consonância com o elenco de direitos individuais assegurados pela Constituição Federal.
Deveras, é preciso adotar uma postura científica na busca de soluções para os problemas da
fiscalização das operações e serviços empreendidos em ambiente virtual, temática que guia o
presente estudo.
MATERIAIS E MÉTODOS
A pesquisa empreendida se valeu dos métodos hipotético-dedutivo e comparativo, com base em
uma perspectiva teórica eminentemente dogmática. Nesse diapasão, foram utilizadas as seguintes
técnicas:
a) Pesquisa Bibliográfica – levantamento e fichamento de livros, artigos, trabalhos acadêmicos,
teses de mestrado e doutorado, estudos e demais subsídios bibliográficos (em meios físicos e
digitais) que abordam direta ou indiretamente o tema proposto;
b) Pesquisa Documental – busca e estudo de decisões judiciais, relatórios de pesquisas, relatórios
de órgãos governamentais e organizações internacionais, leis e projetos de leis nacionais e
estrangeiras acerca do tema abordado;
Concluída a pesquisa bibliográfica e documental, as informações coletadas foram analisadas
buscando-se a sistematização de uma obra de revisão da matéria, com a formulação de juízos
críticos do pesquisador, os quais foram reunidos em forma de relatório final.
RESULTADOS
A nova economia que desponta no século XXI substitui os tradicionais meios de pagamento
físico empregados desde as feiras medievais por conteúdos digitais: o dinheiro e os cheques dão
lugar ao cartão de crédito e ao depósito eletrônico. O papel, que exerceu importância crucial no
desenvolvimento da humanidade, registrando conquistas e sendo responsável pela difusão do
saber, é hoje substituído por mecanismos eletrônicos de armazenagem e troca de informações.
Bens tangíveis, como discos de música, livros e fitas de vídeo perdem dia-a-dia espaço para seus
similares intangíveis, como as músicas em formato MP3, os livros eletrônicos (e-books), e
vídeos digitais, reproduzidos em pequenos aparelhos portáteis. Serviços usualmente prestados na
forma presencial, a exemplo de cursos de educação, consultorias, e mesmo certos tipos de
trabalho, cedem lugar a congêneres virtuais, que utilizam a Internet como interface permanente.
Nesta admirável realidade de trocas comerciais, a empresa virtual não pode ser situada
precisamente: “seus elementos são nômades, dispersos, e a pertinência de sua posição geográfica
decresceu muito” (LÉVY, 1996, p. 19). Para a sociedade erguida sobre essa economia
informacional, redes de computadores constituem sua morfologia social, e a difusão da lógica
dessas redes “modifica de forma substancial a operação e os resultados dos processos produtivos
e de experiência, poder e cultura” (CASTELLS, 2006, p. 565).
Surge conseqüentemente o impasse: de um lado, a potencialidade econômica incontestável dos
negócios eletrônicos, tendendo a gerar implicações tributárias mediante a criação de regras
específicas; de outro, as dificuldades de tributação inerentes à arquitetura da Internet e a
necessidade de haver mecanismos eficientes de fiscalização, capazes de identificar a ocorrência
de fatos geradores tempestivamente, sem violar os direitos e garantias fundamentais do
contribuinte, consagrados na Constituição Federal. Na busca de possíveis soluções, deve-se ter
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em mente não apenas a legislação aplicável em matéria de fiscalização tributária, mas também o
entendimento da jurisprudência pátria no que tange à inviolabilidade do sigilo de dados e
comunicações.
DISCUSSÃO
A virtualidade dos canais de distribuição de bens na Internet, desmaterializando fronteiras
territoriais, torna extremamente difícil a fiscalização de transações econômicas passíveis de
tributação, mas que não se manifestam externamente.
Sabe-se que a fiscalização tributária permite ao Fisco identificar, nos limites da lei, o patrimônio,
rendimentos e atividades econômicas do contribuinte, consoante prevê o art. 145, §1º, da
Constituição Federal. Todavia, o exercício desse poder-dever, orientado pela isonomia, deve
necessariamente se compatibilizar com determinados preceitos constitucionais que protegem a
intimidade, a vida privada e o sigilo de comunicações (art. 5º, incisos X e XII da Lei Maior).
Nessa perspectiva, o art. 197 do Código Tributário Nacional, que estabelece a obrigação de
determinadas pessoas, inclusive instituições financeiras, fornecerem ao Fisco, quando
requisitadas, informações de que disponham sobre bens, negócios ou atividades de contribuintes,
bem como o art. 6º da Lei Complementar nº. 105/2001, que também prevê a possibilidade de
acesso a dados sigilosos em poder de instituições financeiras, precisam ser interpretados
sistematicamente com os enunciados constitucionais anteriormente aludidos.
Consoante já decidiu o Supremo Tribunal Federal, a administração tributária, em tema de
fiscalização, embora possa muito, não pode tudo, encontrando seus poderes limitações no
complexo de direitos e prerrogativas que assistem, constitucionalmente, aos contribuintes e aos
cidadãos em geral (HC. 82.788). No caso de sigilo de telecomunicações, no qual se inserem os
dados armazenados em servidores de acesso à Internet, inexiste previsão legal que permita ao
Fisco investigar sinais de capacidade contributiva a partir da requisição de informações de
particulares sem prévia autorização judicial. Ainda que venha a prevalecer o entendimento
manifestado pelo Superior Tribunal de Justiça, no sentido da constitucionalidade do art. 6º da LC
105/2001, permitindo a quebra do sigilo bancário e o cruzamento dos dados obtidos por simples
requisição a instituições financeiras para fins de constituição de créditos relativos a outros
tributos (REsp. 792.812), não podem as autoridades administrativas violar o sigilo de
comunicações, por ausência de supedâneo legal. Com efeito, além dos entraves tecnológicos para
a criação de mecanismos de controle fiscal das operações e serviços realizados através da rede
mundial de computadores, há limitações normativas claras à atuação do Fisco no ciberespaço.
CONCLUSÕES
Em caráter derradeiro, pode-se concluir que os poderes de fiscalização tributária do Estado
encontram, nos direitos e garantias individuais, limites intransponíveis, cujo desrespeito pode
caracterizar violação frontal à Constituição Federal. Em fato, as informações relativas a
operações ou serviços realizados através da Internet, armazenadas em servidores, não podem ser
violadas sem prévia autorização judicial, para fins de investigação criminal ou instrução
processual penal. Destarte, as autoridades fiscais não podem requisitar, por parte dos servidores,
dados de acesso à Internet de contribuintes para verificar a ocorrência de eventuais fatos
geradores de obrigações tributárias, pois tais informações estão protegidas pelo sigilo das
comunicações (CF, art. 5º, XII) e pela garantia de proteção à intimidade (CF, art. 5º, X).
Documentos obtidos pelo Fisco em desrespeito a tais garantias constituem prova ilícita, e não se
prestam a legitimar a cobrança de créditos tributários ou a imposição de penalidades pela
Fazenda Pública.
Para que se cogite da tributação de negócios eletrônicos no Brasil, e da criação de mecanismos
de controle fiscal para tais operações, é necessário que o sistema tributário se ajuste aos
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princípios da eficiência, certeza, simplicidade, efetividade e flexibilidade que vêm sendo
preconizados por diferentes organismos internacionais. Mas sem olvidar os limites impostos pelo
núcleo rígido da Constituição Federal, os quais protegem o contribuinte do cometimento de
abusos pelo Estado.
AGRADECIMENTOS
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e à Universidade Federal
de Pernambuco, pelo incentivo financeiro à atividade da pesquisa científica, através do PIBIC.
Aos meus pais, pelo incondicional apoio em toda minha vida. E ao Professor Francisco Queiroz,
pela disponibilidade na orientação dos estudos que resultaram neste trabalho.
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