Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências ANÁLISE DA PROPOSTA PARA FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL E AGENDA 21 ESCOLAR NA REDE ESTADUAL DE ENSINO DO RIO DE JANEIRO JACQUELINE BENTO MARQUES PEREIRA Orientador: Profa. Dra. Flávia Monteiro Barros Araújo NILÓPOLIS 2010 ii Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências ANÁLISE DA PROPOSTA PARA FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL E AGENDA 21 ESCOLAR NA REDE ESTADUAL DE ENSINO DO RIO DE JANEIRO JACQUELINE BENTO MARQUES PEREIRA Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências. Orientador: Profa. Dra. Flávia Monteiro Barros Araújo NILÓPOLIS 2010 iii <=================================> PEREIRA, JACQUELINE BENTO MARQUES Análise da proposta para formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar na Rede Estadual de Ensino do Rio de Janeiro [Rio de Janeiro] 2010 168 p. (Mestrado Profissional em Ensino de Ciências/IFRJ, M.Sc., Ensino, 2010) Dissertação – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, PROPEC 1. Ensino 2. Ensino de Ciências I. PROPEC/IFRJ II. Título (série) iv Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências ANÁLISE DA PROPOSTA PARA FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL E AGENDA 21 ESCOLAR NA REDE ESTADUAL DE ENSINO DO RIO DE JANEIRO JACQUELINE BENTO MARQUES PEREIRA Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação Stricto Sensu em Ensino de Ciências do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências. Tendo sido aprovada em 09 de junho de 2010. Banca Examinadora Dra. Flávia Monteiro de Barros Araújo – Presidente da Banca Universidade Federal Fluminense Dr. Alexandre Maia do Bonfim – Membro interno Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro Dr. Mauro Guimarães – Membro externo Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro NILÓPOLIS 2010 v DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a Deus. Toda honra e glória ao Senhor Jesus por me fortalecer e sustentar durante todo o processo de construção desta pesquisa. Enfrentei muitos desafios e turbulências durante o mestrado, mas Jesus Cristo esteve presente o tempo todo em minha vida, não permitindo que eu viesse a desistir. “Direi do Senhor: Ele é o meu Deus, o meu refúgio, a minha fortaleza, e nele confiarei (Salmo 91:2)”. Agradeço o grande amor e misericórdia de Deus. Sou grata pela sabedoria, pela inspiração, pela paciência, pela oportunidade de aprendizagem e pelas pessoas que amavelmente compartilharam desta construção. Sem o auxílio do Senhor, eu não seria capaz de finalizar mais esta etapa de minha vida. A Deus dedico os frutos deste trabalho, reconheço minhas limitações e minha dependência ao Senhor, a concretização deste sonho só foi possível porque Ele me ajudou. vi AGRADECIMENTOS Agradeço em primeiro lugar a Deus pela oportunidade de crescimento e aprendizagem. Agradeço minha querida orientadora, professora Flávia Monteiro de Barros Araújo, por conduzir a pesquisa com muita maestria, competência, inteligência, paciência e amabilidade. Meu coração será eternamente grato por seu apoio e dedicação. Agradeço minha família pela compreensão e suporte fornecido durante todo o processo. Minha mãe Helenita Bento Marques Pereira e meus filhos, Luíza e Lúcio Bento Silvino Pereira, também fizeram o mestrado juntos comigo. Quantas vezes precisei ausentar-me da vida familiar para me dedicar aos estudos e a pesquisa, mas eles estiveram sempre ali, pacientes e prontos em aguardar o meu retorno ... por amor. Agradeço aos professores das escolas da Coordenadoria Metropolitana I que fizeram parte da construção da pesquisa. Minha gratidão é estendida a comunidade escolar participante do Curso de form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. Sou grata a professora Marilene de Sá Cadei, Coordenadora Pedagógica do Curso na UERJ. Meu carinho e admiração por esta profissional é muito grande – seu caráter, ética e princípios de vida a tornam uma pessoa muito especial. Agradeço a contribuição intelectual e técnica, além da dedicação de Ricardo de Moraes, aluno de graduação do Curso de Produção Cultural do IFRJ/Nilópolis, por ter auxiliado a construção do produto final do mestrado. Sou grata a equipe da TV CEFETRJ/Maracanã pelo apoio técnico para editar o DVD em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. Minha gratidão é para todos aqueles que de alguma forma contribuíram para a concretização deste trabalho. vii “E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus” (Romanos 12:2). viii RESUMO A Educação Ambiental é uma dimensão da Educação, e suas ações devem se respaldar em um ensino mais crítico, onde professores precisam se envolver com a questão socioambiental a ponto de envolverem também seus alunos nas discussões dos problemas que lhes são mais próximos. Contudo, antes de formar educadores ambientais é preciso que estes sejam educados ambientalmente, como previsto na Política Nacional e Estadual, que vincula a capacitação de recursos humanos como uma das atividades a serem desenvolvidas na educação. A preocupação com a formação dos professores tem ocupado um espaço estratégico nas políticas públicas que objetivam disseminar a Educação Ambiental. Nesta direção, setores do Governo do Estado do Rio de Janeiro organizaram nos últimos anos diferentes ações voltadas para a atualização de professores, entre elas, destaca-se a o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. Este curso constituiu uma importante ação dentro das políticas públicas voltada para a formação continuada de docentes em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. O objetivo geral da pesquisa foi analisar a proposta para formação continuada de professores, formulada para disseminação dos princípios da Educação Ambiental, em especial as ações desenvolvidas no âmbito do Programa Estadual de Educação Ambiental do Rio de Janeiro, com enfoque no Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. E ainda, apresentou como um dos resultados dessa investigação a elaboração de um DVD como produto final, um alvitre para auxiliar o professor no campo da formação continuada. Palavras-chave: Agenda 21 Escolar, Educação Ambiental, formação continuada de professores, políticas públicas. ix ABSTRACT Environmental education is a dimension of education, and their actions must back up in a more critical education, where teachers need to engage with the socio-environmental issue as to also engage their students in discussions of issues that are closest to them. However, before forming environmental educators need them to be environmentally educated, as described in the National and State, linking the training of human resources as one of the activities to be developed in education. Concern for the training of teachers has occupied a strategic public policies that aim to spread environmental education. In this direction, sectors of the state government of Rio de Janeiro organized in recent years different actions for the upgrade of teachers, among which stands out in the Course of Action on FormEnvironmental Education and School Agenda 21: Links to Citizenship. This course was an important action in public policy toward the continuing education of teachers in Environmental Education and School Agenda 21. The purpose of this study was to analyze the proposal for continuing education for teachers, designed to spread the principles of environmental education, particularly the actions undertaken under the State Program of Environmental Education of Rio de Janeiro, with a focus on action-Course Form Environmental Education and School Agenda 21: Links to Citizenship. And yet, presented as one of the research results to draw up a DVD as a final product, a suggestion to help the teacher in the field of continuing education. Keywords: School Agenda 21, environmental education, teacher continuing education, public policy. x LISTA DE SIGLAS CEDERJ/ CECIERJ – Centro de Educação à Distância do Estado do Rio de Janeiro/ Fundação Centro de Ciências e Educação Superior à Distância do Estado do Rio de Janeiro CJMA – Coletivo Jovem de Meio Ambiente CNIJMA – Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente EA – Educação Ambiental FAETEC - Fundação de Apoio à Escola Técnica GIEA – Grupo Interdisciplinar de Educação Ambiental IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis MMA – Ministério do Meio Ambiente MEC – Ministério da Educação ONU – Organização das Nações Unidas PCN – Parâmetros Curriculares Nacionais PEA/PDBG – Projeto de Educação Ambiental/ Programa de Despoluição da Baía de Guanabara PNUMA – Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente SEA – Secretaria de Estado do Ambiente SEAM – Superintendência de Educação Ambiental SEEDUC – Secretaria de Estado de Educação SECT – Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia SEMA – Secretaria Especial de Meio Ambiente UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura xi SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 13 CAPÍTULO 1 - Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar na Agenda da Política Pública do Rio de Janeiro ................................................................................................................ 20 1.1 - Desenvolvimento histórico da Educação Ambiental e a criação da Agenda 21 Escolar ................................................................................................................21 1.2 – Políticas Públicas para formação continuada de professores em Educação Ambiental no estado do Rio de Janeiro.................................................................. 41 CAPÍTULO 2 - Formação Continuada de Professores em Educação Ambiental: Considerações Teóricas ..................................................................................................... 52 2.1 – Reflexões acerca do conceito de política pública..................................................................................................................... 53 2.2 – Formação continuada de professores: fundamentos teóricos para análise......................................................................................................................58 2.3 – Formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar......................................................................................................................67 CAPÍTULO 3 - A contribuição do Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania para a formação continuada de professores............................................................................................................................80 3.1 . “Pensar global, agir local.” .............................................................................81 CAPÍTULO 4 - PERCURSO METODOLÓGICO............................................................. 98 CAPÍTULO 5 - RESULTADOS E DISCUSSÃO DOS DADOS ................................... 104 xii 5.1 Concepções prévias (e em construção) dos professores sobre Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar ............................................................................................................104 5.2. Contribuições da formação continuada em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: dificuldades e potencialidades enfrentadas pelos professores ..........................................123 5.3. O vídeo como produto final: “Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: construindo o espaço da cidadania” ............................................................................................................................................140 CAPÍTULO 6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................149 CAPÍTULO 7- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .....................................................155 Anexo 1 - Questionário aplicado aos cursistas no primeiro dia do curso na etapa teórica (2007) ................................................................................................................................164 Anexo 2 - Modelo de relatório de atividades mensais dos cursistas (2008) .....................166 Anexo 3 – Roteiro de entrevista semi-estrutura aplicada após o encerramento do curso (2009).................................................................................................................................168 13 INTRODUÇÃO A literatura sobre meio ambiente ressalta, na atualidade, a importância da Educação Ambiental na promoção de valores sociais, de conhecimentos, mudança de atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente, bem comum a todos os seres vivos. Nesta direção, Penteado (1994) afirma que a escola é o espaço ideal capaz de promover a não só a compreensão das questões ambientais, leiam-se questões sóciopolíticas, como a formação de uma consciência ambiental. Para tanto, é necessário, entretanto, o desenvolvimento de um ensino ativo e participativo, responsável por superar as insatisfações vividas pela escola do século XXI, ainda alicerçada em pressupostos da pedagogia tradicional. Como observa a autora: O professor vem atestando o desinteresse, o enfado, a desatenção de crianças e adolescentes quando colocados diante das exigências do estudo calcado apenas no ensino livresco; as respostas decoradas que daí resultam para as provas e para agradar o professor, encerrando na própria escola o ato de aprender. Pouco se leva da escola para a vida. E assim a vida vai se repetindo, se conservando. Perpetuando e multiplicando seus problemas (PENTEADO, 1994 p. 55). A implementação de outras práticas pedagógicas que transformem o cenário educacional, descrito por Penteado, envolve a preparação do professor, tendo em vista a relevância deste ator. E, nada mais significativo, do que trabalhar com as questões socioambientais concretas no contexto escolar e de seu entorno. Mas, antes de qualquer ação que leve a transformação, é preciso mudar a nossa visão de mundo através da reflexão. O professor ou educador ambiental também precisa ser educado, previamente, para o trabalho proposto pela Educação Ambiental dentro das escolas. Ou seja, é preciso investir na formação do professor. 14 A preocupação com a formação dos professores ocupa espaço estratégico nas pesquisas e nas políticas públicas que objetivam enraizar a Educação Ambiental. Nesta direção, setores do Governo do Estado do Rio de Janeiro organizaram nos últimos anos diferentes ações voltadas para a atualização de professores. Entre elas, destaca-se a o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. Este curso constitui uma importante ação no conjunto das políticas públicas voltadas para a formação continuada de docentes em Educação Ambiental. Desde os anos de 1990, com a execução do PEA/PDBG, o Estado do Rio de Janeiro não implementava uma ação tão abrangente voltada para a qualificação de professores. A meta do Curso era atingir um público de 300 profissionais da educação e de 300 estudantes do Ensino Fundamental e Médio do Sistema Público Estadual de Ensino, pertencentes à região metropolitana do Rio de Janeiro. O objetivo era promover o protagonismo ambiental dos atores que integram a comunidade escolar (professores, estudantes, direção escolar, funcionários, responsáveis por alunos e pessoas da comunidade escolar), incentivando-os a participação cidadã na vida pública e no enfrentamento dos problemas socioambientais locais (RIO DE JANEIRO, 2007). O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania envolveu volumosos investimentos públicos do orçamento do governo estadual que, pela primeira vez1 foram direcionadas para a formação continuada de professores. A proposta diferencia-se de ações anteriores, pois buscou contemplar estudantes, principalmente, do Ensino Médio, propondo também, a descentralização das ações do poder público. Além disso, procurou empoderar a comunidade, ressaltando a importância da participação e do diálogo entre os diversos atores, tendo em vista a implementação de 1 Assinala-se que o PEA/PDBG foi financiado também com recursos de órgãos internacionais. 15 projetos interdisciplinares e a mudança nas condições ambientais do entorno escolar. A escola, nessa perspectiva, constituiria um pólo de transformação da realidade socioambiental de uma dada comunidade escolar (RIO DE JANEIRO, 2007). A viabilidade dessa ação deveria ser instrumentalizada por meio da elaboração de uma Agenda 21 Escolar, responsável por disseminar uma nova cultura escolar, respaldada pelo diálogo entre os saberes escolares e os saberes do senso comum, provenientes de comunidade onde a escola está inserida. A Agenda 21 Escolar, nesse sentido, sistematizaria o novo saber construído aliado à ação política e a participação da comunidade, revitalizando a vida na escola, trazendo de volta o prazer e o sentido de experimentá-la (RIO DE JANEIRO, 2007). Os objetivos relacionados no programa eram extensos. A idéia era preparar os docentes para uma ação transformadora, fornecendo um suporte teórico-metodológico comprometido com a perspectiva de uma Educação Ambiental crítica. Esperava-se que, como resultado, os professores fossem capazes de desenvolver um trabalho que, com a participação da comunidade escolar, enfrentasse os problemas socioambientais locais. Além do enfrentamento, deveria ser fomentada a transformação da realidade local (RIO DE JANEIRO, 2007). Nesta direção, ao examinar programas para formação continuada de docentes no Brasil, nas últimas décadas, Gatti (2009) constata a frustração destes programas e o distanciamento que existe entre as metas traçadas e a pífia transformação da escola. Nóvoa (1995), por sua vez, questiona a intencionalidade destes programas que, embora relacionem objetivos transformadores, estariam mais voltados para regulação das práticas pedagógicas. Já Candau (1996) observa a existência de um modelo clássico de formação continuada que informa um número expressivo de programas organizados pelas 16 universidades e que não privilegiam a escola como lócus formativo e a criam de condições para reflexão sobre a prática. O contato com a literatura do campo da formação de professores suscitou questionamentos: qual a contribuição do Curso para construção de novas práticas pedagógicas na rede pública que favoreçam a transformação da realidade socioambiental da comunidade escolar? A formação teórica metodológica debatida ao longo do Curso foi capaz de instrumentalizar os docentes para as pretendidas mudanças? E, ainda, de disseminar entre os professores uma concepção crítica de EA? Os projetos de intervenção elaborados pelos docentes refletem a adoção de concepções calcadas num referencial crítico preconizadas no Programa? A reflexão em torno destas questões motivou a realização da investigação. O foco do estudo recaiu sobre o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, uma das ações integrantes do Programa Estadual de Educação Ambiental do Rio de Janeiro. A proposta deste trabalho visou contribuir para melhor compreensão do processo de formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, e apresenta, como um dos resultados dessa pesquisa, a elaboração de um produto destacável em multimídia (recurso didático: um vídeo) que venha auxiliar o professor neste processo. A investigação foi realizada com professores das Coordenadorias Metropolitanas2 que participaram do curso, de 2007 a 2008, em especial, com os docentes da Coordenadoria Metropolitana I, região onde a pesquisadora atuou como tutora. 2 Coordenadoria Regional de Educação é um órgão do governo, entendido como uma extensão da Secretaria Estadual de Educação, cuja finalidade é descentralizar as decisões da Secretaria, sendo responsável por determinado conjunto de escola numa dada região geográfica. 17 O objetivo geral da pesquisa foi analisar a proposta para formação continuada de professores, desenvolvida no âmbito do Programa Estadual de Educação Ambiental do Rio de Janeiro, em especial, no Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, investigando-se a contribuição desta ação para disseminação dos princípios da Educação Ambiental fundamentada em pressupostos críticos. Os objetivos específicos são: - Analisar, na perspectiva dos professores cursistas, a contribuição da formação continuada para elaboração e implantação dos projetos de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar; - Identificar as concepções prévias dos cursistas quanto à Educação Ambiental e à Agenda 21 Escolar no início da etapa teórica do curso; - Destacar as potencialidades e as dificuldades enfrentadas pelos docentes na implementação dos projetos, descritas nos relatórios mensais dos professores cursistas da Coordenadoria Metropolitana I; - Elaborar um recurso didático destacável (um vídeo) que venha contribuir na formação continuada dos professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. A dissertação foi estruturada em sete partes. O capítulo 1 - Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar na Agenda da Política Pública do Rio de Janeiro – procura-se rastrear as ações do Programa Estadual de Educação Ambiental, desde a criação da Lei n° 3.325/99, identificando-se as diferentes políticas públicas propostas para o meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro. Busca-se compreender as políticas delineadas, em nível estadual, no contexto de debates travados em torno da temática em diferentes fóruns nacionais e internacionais. Para tanto, recupera- 18 se, de forma breve, a história da EA, assinalando-se os diferentes eventos que constituíram marcos na constituição deste campo. Busca-se, rastrear as diferentes concepções de Educação Ambiental, elaboradas ao longo das últimas décadas, nos debates internacionais e nacionais. Na primeira seção, levantou-se os principais congressos e reuniões no âmbito internacional e nacional. Na segunda seção, recuperaram-se as ações do Programa Estadual de Educação Ambiental, desde a criação da Lei n° 3.325/99, de maneira a compreender as propostas veiculadas nas políticas públicas para o meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro. O capítulo 2- Formação Continuada de Professores em Educação Ambiental: Considerações Teóricas – procura construir uma reflexão acerca do conceito de política pública e de formação continuada de professores, relacionando-os com a Educação Ambiental. Na primeira seção, discorre-se sobre o conceito de políticas públicas, compreendendo-o como o “Estado em ação”. Na segunda, focalizam-se diversas concepções de formação continuada. Para tanto, resgata-se a história da profissão docente, ressaltando-se o papel político do professor no processo de transformação social. Na terceira seção, discutem-se os eixos para a formação continuada de professores em Educação Ambiental. O capítulo 3- A Contribuição do Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania para a formação continuada de professores discute-se a proposta do Programa Estadual de Educação Ambiental que faz integra a política de meio ambiente no Estado. No quarto capítulo, debate-se o percurso teórico-metodológico, responsável por iluminar o objeto da pesquisa. O trabalho foi desenvolvido em três momentos, 19 considerando-se a reflexão teórica que orientou a construção do objeto. Destaca-se ainda relevância do estudo, que constitui um tema atual no campo da formação de professores, e a sua inserção social, tendo em vista a realização da pesquisa em escolas do entorno do IFRJ/Campus Nilópolis. Neste capítulo são comentados, também, os passos para a construção do produto final da dissertação, entendido como fruto do trabalho de investigação no tema. No quinto capítulo, são apresentam-se os Resultados e Discussão dos Dados. Na primeira seção, são analisadas as concepções prévias e em construção dos professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, com base em dados coletados nos anos de 2007, 2008 e 2009. Na segunda seção, debatem-se as dificuldades e potencialidades enfrentadas pelos professores em suas escolas ao executarem as ações descritas no projeto de intervenção em Educação Ambiental, baseando-se em dados coletados nos anos de 2008 e 2009. Na última seção, comenta-se a relevância do vídeo como um recurso didático destacável para o processo de ensino-aprendizagem. Além de apresentar a construção do produto final como fruto da reflexão propiciado pela pesquisa. No sexto capítulo, são elaboradas as Considerações Finais do trabalho, destacando-se algumas conclusões da investigação e possíveis desdobramentos da pesquisa, tendo em vista a provisoriedade que caracteriza o processo de construção do conhecimento. 20 CAPÍTULO 1 – EDUCAÇÃO AMBIENTAL E AGENDA 21 ESCOLAR NA AGENDA DA POLÍTICA PÚBLICA DO RIO DE JANEIRO A Educação Ambiental (EA) foi construída historicamente no campo educativo e hoje se encontra enraizada na maior parte das escolas brasileiras. Guimarães (2007) afirma que a institucionalização da EA reflete os anseios e necessidades da sociedade, na qual a escola acabou absorvendo-a como componente curricular. Segundo o autor, “ a EA já é uma realidade para os professores e estes estão fazendo, ou se sentem compelidos a se debruçar sobre essa nova dimensão educativa (GUIMARÃES, 2007, p. 119). Entretanto, a formação inicial dos professores que atuam principalmente na Educação Básica ainda não abraçou plenamente a Educação Ambiental, apesar de diversos documentos oficiais recomendarem a sua inserção em todos os níveis de ensino. A fundamentação teórica e metodológica em EA tem sido debatida com os docentes, predominantemente, em cursos e outras estratégias de formação continuada. Neste capítulo procura-se resgatar as políticas propostas para formação continuada de professores em Educação Ambiental, pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, em especial o Programa formulado no âmbito da Agenda 21 Escolar. Para tanto, recupera-se a de forma breve a história da Educação Ambiental, destacando-se os diferentes eventos internacionais e nacionais que constituíram marcos na constituição deste campo. Ao se examinar a trajetória histórica da Educação Ambiental, busca-se identificar diferentes concepções de EA formuladas ao longo das últimas décadas. As políticas elaboradas pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro trazem as marcas deste contexto mais amplo de debates que produziu concepções e eixos que informaram as propostas para EA. 21 1.1 - Desenvolvimento histórico da Educação Ambiental e a criação da Agenda 21 Escolar. A consolidação histórica do movimento ambiental, responsável por propor a Educação Ambiental (EA), tem reflexos tardios no Brasil em relação ao movimento ambientalista promovido nas décadas de 1960 e 1970, no cenário mundial. Dias (2003) afirma que tal fato ocorreu também em muitos países em sua maioria periféricos. Devido ao contexto político em que o país vivia nesta época com o regime militar, a Educação Ambiental foi compreendida como uma educação de natureza revolucionária e subversiva que poderia levar as pessoas a uma visão crítica de mundo. Desta forma, ela foi pouco incentivada. De forma geral, as instituições educacionais se mantiveram pouco sensíveis frente às transformações socioambientais ocorridas no planeta, engessadas pela pedagogia tradicional de ensino. Dessa maneira, foi necessário criar um adjetivo para a educação capaz de contemplar a sua dimensão ambiental, responsável por atender a demanda por uma formação calcada na reflexão e ação humana para conservação do meio ambiente. Surge então, a Educação Ambiental. O pioneirismo na promoção deste tema recaiu sobre a responsabilidade dos órgãos ambientais (DIAS, 2003). A percepção acerca das dificuldades do processo de construção da Educação Ambiental no Brasil pode ser notada, segundo Dias (2003), pela dificuldade existente em se encontrar informações de qualquer natureza, livros, revistas especializadas ou oportunidades de capacitação nessa área sobre a EA, nas décadas anteriores. Além do enorme equívoco em confundir Educação Ambiental com Ecologia. Esta última trata-se de uma ciência e não um processo educacional. 22 De acordo com Loureiro (2006), a primeira vez que o termo Educação Ambiental (Environmental Education) foi adotado ocorreu em 1965, em evento de educação promovido pela Universidade de Keele na Grã-Bretanha. O termo Educação Ambiental ganhou notoriedade somente na década de 1970, em eventos internacionais. O conceito de Educação Ambiental foi sendo construído, influenciado por tendências ideológicas distintas. No século XIX, duas visões acerca da conservação do “mundo natural”: conservacionismo e preservacionismo dos recursos naturais surgiram nos Estados Unidos e exerceram influência em todo o mundo. Gifford Pinchot, engenheiro florestal treinado na Alemanha, criou o movimento de conservação dos recursos, apregoando, o se uso racional. Na verdade, Pinchot agia dentro de um contexto de transformação da natureza em mercadoria. Na sua concepção, a natureza é freqüentemente lenta e os processos de manejo podem torná-la eficiente, acreditava que a conservação deveria basear-se em três princípios: o uso dos recursos naturais pela geração presente; a prevenção de desperdício; e o uso dos recursos naturais para beneficiamento da maioria dos cidadãos (DIEGUES, 2000, p. 29). Em oposição às idéias de Pinchot, John Muir sintetizou as idéias preservacionistas, “descrita como a reverência à natureza no sentido da apreciação estética e espiritual da vida selvagem” (DIEGUES, 2000, p. 30). Segundo Diegues (2000), o preservacionismo possui uma essência antagônica ao desenvolvimento moderno, industrial e urbano defendido pela sociedade industrial e pelos conservacionistas. Todavia, foram as idéias conservacionistas que exerceram influência mais contundente nos principais eventos internacionais sobre Meio Ambiente e Educação Ambiental. O marco histórico-político internacional para as questões ambientais foi a Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) para o Ambiente Humano ou Conferência de Estocolmo, realizada na Suécia em 1972. Este evento reuniu representantes 23 de 113 países e objetivou estabelecer uma perspectiva global e princípios comuns que orientassem à humanidade na preservação e melhoria do ambiente humano (DIAS, 2003). Este evento se constituiu em avanço para a questão ambiental, fornecendo diretrizes aos demais eventos consecutivos. Como saldo positivo da Conferência de Estocolmo, destaca-se a elaboração da “Declaração da ONU sobre o Meio Ambiente Humano”, do “Plano de Ação Mundial” e da Recomendação n° 96 que indicou a criação de um Programa Internacional de Educação Ambiental, entendendo o “desenvolvimento da Educação Ambiental como o elemento crítico para o combate à crise ambiental” (DIAS, 2003, p.79). Na Declaração da ONU, a Educação Ambiental foi citada nas entrelinhas. Na verdade, o documento não fez uma distinção entre educação e EA, por compreender que as questões ambientais devem (riam) estar contempladas dentro da dimensão ambiental na educação. Não houve a formulação de um conceito para Educação Ambiental, e sim de orientações gerais de como deveria ser o trabalho em educação, conforme o princípio 19 da Declaração da ONU (DIAS, 2003). Segundo o texto do documento: É indispensável um trabalho de educação em questões ambientais, visando tanto as gerações jovens como os adultos, dispensando a devida atenção ao setor das populações menos privilegiadas, para assentar as bases de uma opinião pública bem-informada e de conduta responsável dos indivíduos, das empresas e das comunidades, inspiradas no sentido de sua responsabilidade, relativamente à proteção e melhoramento do meio ambiente, em toda a sua dimensão humana (DIAS, 2003, p.72). Na Conferência de Estocolmo, o pensamento conservacionista norteou a formulação do conceito de EA, defendendo pressupostos biológicos associados à divulgação de conhecimentos científicos sobre a proteção das espécies e dos recursos nãorenováveis. Esta proteção poderia vir a ocorrer por meio da sensibilização das pessoas e por meio da aplicação de tecnologias e de gestão ambiental (DIAS, 2003; DIEGUES, 24 2000). Na contramão da história, “a delegação brasileira afirmou que o Brasil não se importaria em pagar o preço da degradação ambiental, desde que o resultado fosse o aumento do seu produto interno bruto” (DIAS, 2003, p. 79). Este grupo defendia uma visão de desenvolvimento associado ao maciço processo de industrialização. Como desdobramento da Conferência de Estocolmo e da pressão internacional do Banco Mundial, a Presidência da República criou a Secretaria Especial de Meio Ambiente (SEMA), com apenas três funcionários e que mais tarde deu origem ao hoje Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (DIAS, 2003). Outro destaque mundial foi o I Seminário Internacional de Educação Ambiental, em Belgrado, na Iugoslávia, em 1975, que contou com a participação de 65 países e procurou seguir algumas recomendações da Conferência de Estocolmo. Fruto deste encontro, a Carta de Belgrado merece especial atenção por pregar uma nova ética global, capaz de erradicar a pobreza, a fome, o analfabetismo, a poluição e a dominação e exploração humana. Os princípios e orientações contidos na Carta de Belgrado nortearam o lançamento de um programa mundial de Educação Ambiental. A diretriz em EA apontou para a continuidade e multidisciplinaridade como componentes essenciais ao trabalho educacional, levando em consideração as diferenças regionais e voltadas aos interesses nacionais (DIAS, 2003). A Carta de Belgrado afirmou que o modelo educacional deveria ser colocado em questão. O texto destacou que, para que a educação fosse capaz de contemplar a dimensão ambiental, seria preciso reformular os seus processos e sistemas, defendendo novos relacionamentos entre professores e estudantes, escola e comunidade, sistema educacional e sociedade. Ainda assim, mesmo preconizando uma mudança na estrutura educacional, a 25 Carta de Belgrado propôs a criação da Educação Ambiental e definiu indiretamente o seu conceito. É dentro desse contexto que devem ser lançadas as fundações para um programa mundial de EA, que possa tornar possível o desenvolvimento de novos conhecimentos e habilidades, valores e atitudes, visando à melhoria da qualidade ambiental e, efetivamente, à elevação da qualidade de vida para as gerações presentes e futuras. (UNESCO, 1975 apud DIAS, 2003, p.103) O encontro em Belgrado operou uma revisão no conceito de Educação Ambiental. O pensamento ambiental latente possui elo com os movimentos sociais das décadas de 1960 e 1970 que lutaram por uma ruptura com a ordem dominante. Na América Latina foi realizado em Chosica, no Peru, em 1976, um dos primeiros eventos regionais em Educação Ambiental e pouco divulgado no Brasil. O encontro Taller Subregional de Educación Ambiental para Educación Secundaria estabeleceu a metodologia da Educação Ambiental a ser ministrada no espaço formal de educação. Esta precisaria ter um caráter participativo, permanente, interdisciplinar e contextualizada a realidade cotidiana (LOUREIRO, 2006). A consagração política em Educação Ambiental veio ocorrer em 1977, em Tbilisi, na Geórgia, com a Primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, promovida pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em cooperação com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Fruto desta conferência foi publicado o documento La Educación Ambiental: las Grandes Orientaciones de La Conferencia de Tbilisi (1980). Esta Declaração influenciou a elaboração das políticas públicas em Educação Ambiental até os dias atuais (PEREIRA, 2008). Este evento reuniu especialistas de todo mundo, formulando princípios, objetivos e características da Educação Ambiental, além de recomendações e estratégias 26 para sua implementação em planos regionais, nacionais e internacionais (DIAS, 2003). Loureiro (2006) aponta como um dos aspectos relevantes da Conferência Intergovernamental o cuidado em não transferir total e exclusiva responsabilidade para a Educação Ambiental na resolução dos problemas da crise civilizatória. A visão romantizada sobre uma Educação Ambiental asséptica e acrítica ofusca o real conflito político, que é descortinado pela ação de um processo educacional emancipatório. A grande contribuição da Conferência de Tbilisi foi a sistematização das diretrizes, conceitos e procedimentos para a Educação Ambiental em escala mundial. Em Tbilisi, definiu-se a Educação Ambiental como: (...) o resultado de uma reorientação e articulação de diversas disciplinas e experiências educativas que facilitam a percepção integrada do meio ambiente, tornando possível uma ação mais racional e capaz de responder às necessidades sociais (UNESCO, 1977 apud DIAS, 2003, p.107). O objetivo fundamental da Educação Ambiental, de acordo com o documento seria: (...) lograr que os indivíduos e a coletividade compreendam a natureza complexa do meio ambiente natural e do meio criado pelo homem, resultante da integração de seus aspectos biológicos, físicos, sociais, econômicos e culturais, e adquiram os conhecimentos, os valores, os comportamentos e as habilidades práticas para participar responsável e eficazmente da prevenção e solução dos problemas ambientais, e da gestão da questão da qualidade do meio ambiente. (UNESCO, 1977 apud DIAS, 2003, p. 107) Cabe ressaltar o propósito fundamental da Educação Ambiental em Tbilisi: (...) é também mostrar, com toda clareza, as interdependências econômicas, políticas e ecológicas do mundo moderno, no qual as decisões e comportamento dos diversos países podem ter conseqüências de alcance internacional. Nesse sentido, a educação ambiental deveria contribuir para o desenvolvimento de um espírito de responsabilidade e de solidariedade entre os países e as regiões, como fundamento de uma nova ordem mundial internacional que garanta a conservação e a melhoria do meio ambiente (UNESCO, 1977 apud DIAS, 2003, p. 107). 27 Em 1979, foi promovido outro evento na América Latina, o Seminário Educação Ambiental para a América Latina, desta vez na Costa Rica. Segundo Loureiro (2006) o evento reforçou a importância de se preservar o patrimônio histórico-cultural, ressaltando o papel estratégico da mulher na promoção do desenvolvimento local e das culturas ecológicas. Na década de 1980, foram realizados eventos de menor impacto3, porém importantes na construção do diálogo entre a sociedade civil. Como importante marco legal na definição de políticas no Brasil, em 1981 foi sancionada a Lei n° 6.938 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente. No texto da lei, a Educação Ambiental é citada com um instrumento para atingir o objetivo maior de preservar, melhorar e recuperar a qualidade de vida. Todavia, o marco políticohistórico para a Educação Ambiental ocorreu com a promulgação da Constituição Federal Brasil em 1988, que estabelece: Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo para as presentes e futuras gerações. §1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente; (BRASIL, 1988). 3 Entre estes citamos a I Jornada de Educação Ambiental de âmbito estatal, em Sitges, Barcelona, em 1983; Congresso Internacional sobre educação e formação relativas ao meio ambiente, em Moscou, em 1987; II Jornada de Educação Ambiental de caráter estatal, em Valsaín, Segovia, em 1987; Criação da Resolução sobre educação em matéria de meio ambiente pela União Européia, em 1988; Seminário para uma Estratégia de Introdução da Educação Ambiental no Sistema Educativo, Navas del Marqués, Segóvia, em 1988 (DÍAZ, 2002). 28 Loureiro (2006) aponta para o caráter técnico adquirido pela Educação Ambiental na década de 1980, destacando que existiu uma forte tendência em tratar as questões ambientais sem uma perspectiva crítica e social, associando-as meramente a conservação do patrimônio natural e a resolução de problemas. Alguns órgãos ambientais governamentais no Rio de Janeiro e em São Paulo inocularam a perspectiva crítica da Educação Ambiental, através da realização de importantes cursos e produção de textos e guias didáticos. No Brasil os eventos eminentes para Educação Ambiental foram os Encontros: Encontro Nacional de Políticas e Metodologias para a EA (MEC/SEMAM), em Brasília, em 1991; e os Encontros Técnicos de Educação Ambiental, promovidos pela Assessoria/ GT de EA do MEC e SEMAM/IBAMA (DIAS, 2003). Os Encontros Técnicos contaram com a participação das secretarias estaduais de educação, órgãos de meio ambiente e das universidades federais. Foram realizados nas cinco regiões geopolíticas do território brasileiro (Norte, Nordeste, Sul, Sudeste e CentroOeste), nos anos de 1991 e 1992, com reuniões concentradas em Brasília/DF. Na década de 1990, ocorreu o segundo evento de grande impacto no âmbito ambiental, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, organizada pela ONU no Rio de Janeiro e conhecida como Rio-92 (popularmente chamada de ECO-92). Dentre as diversas contribuições desta conferência, pode-se destacar a enorme repercussão na mídia global e a popularização de termos aplicados na área ambiental. 29 Como resultado desta conferência, foi elaborado um plano de ação global chamado de Agenda 214. Assinado por 170 países, este documento definiu os compromissos assumidos pelos países em prol da construção de um novo modelo de desenvolvimento que resulte em melhor qualidade de vida para a humanidade e que seja econômica social e ambientalmente sustentável5 (PEREIRA, 2008). Nesta conferência foi proposta também a elaboração da Carta da Terra, discutida mundialmente por órgãos não governamentais e governos. Este documento contou com a participação de 46 países e mais de 100.000 pessoas, dentre elas importantes ícones da história em todo o mundo (Carta da Terra, 2000). No Brasil podem ser destacados os nomes de Paulo Freire, educador, e Leonardo Boff, teólogo. No capítulo 36 é destinado um espaço para a promoção do ensino, da conscientização e do treinamento. Nele pode ser encontrada uma referência sobre a Declaração e as Recomendações da Conferência Intergovernamental de Tbilisi sobre Educação Ambiental, celebrada em 1977, mencionando que os princípios deste evento ofereceram subsídios para as propostas desse documento (BRASIL, 1996). 4 A Agenda 21 pode ser caracterizada como um documento composto por quatro seções, quarenta capítulos e 585 páginas. Nas seções são abordadas temáticas diversas quanto às dimensões sociais e econômicas, conservação e gerenciamento dos recursos para desenvolvimento, fortalecimento do papel dos grupos sociais e meio de implementação (PEREIRA, 2008). 5 O termo desenvolvimento sustentável foi amplamente utilizado pela Rio-92. O conceito de desenvolvimento sustentável foi cunhado a partir do Relatório intitulado “Nosso Futuro Comum”, elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (criada em Assembléia Geral da ONU em 1983), presidida por Gro Harlem Brundtland. O conceito defendido por este relatório tira o foco ideológico e histórico da questão ambiental, passando a idéia de que o planeta é único e comum a todos, fato que independe dos principais agentes causadores da crise ambiental, a responsabilidade é de todos. A pobreza é culpabilizada como uma das principais causas pela degradação ambiental. Endossa-se então a continuidade do crescimento econômico ilimitado, que promete fornecer melhores condições de vida para toda a população e desenvolver novas tecnologias que potencializem o rendimento energético. No entanto, se reconhece que a pobreza é inevitável e a riqueza do Primeiro Mundo não é responsabilizada. O cerne da crise socioambiental (divisão de classe e o abismo entre burguesia e proletário) não é atingido, sustenta-se a neutralidade do discurso de desenvolvimento (in)sustentável dentro do atual modelo econômico, marcado por profundas desigualdades sociais, pelo consumismo, pelo desperdício e pelo desequilíbrio (LAYRARGUES, 1997). 30 A Agenda 21 Global compreende o documento compromisso assinado pelos países participantes da Conferência do Rio de Janeiro. Outras dimensões da Agenda 21 dizem respeito ao âmbito nacional (Agenda 21 Nacional) e local (Agenda 21 Local). A Agenda 21 Local trata-se de um documento compromisso, na qual os atores envolvidos assumem metas para o século XXI, almejando a sustentabilidade ambiental e a promoção da justiça social dentro do âmbito de uma escola, de uma empresa, de um bairro, de um município e outros. No âmbito escolar, a Agenda 21 Escolar constitui uma agenda de compromissos que a escola assume para agir na comunidade da própria escola e na região do seu entorno, de acordo com as necessidades socioambientais do século XXI, pondo em prática a Educação Ambiental. Esta agenda tem sua origem na Agenda 21, documento apresentado pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), em 1992 (PEREIRA, 2008). Na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento a Educação Ambiental recebeu um enfoque interdisciplinar e foram priorizadas as seguintes áreas de programas: reorientar a educação para o desenvolvimento sustentável; aumentar os esforços para proporcionar informações sobre o meio ambiente, que possam promover a conscientização popular; promover treinamento (DIAS, 2003). Muito de que se discutiu na Rio-92 constituíram-se afirmações do que outrora havia sido discutido em Tbilisi, em 1977. O pensamento ambiental presente na Rio-92 e que influenciou a formulação do conceito de Educação Ambiental possui um viés sócio-interpretativo. A corrente sóciointerpretativa estabelece como meta o desenvolvimento de uma sociedade, na qual os 31 cidadãos integram de forma subjetiva e multidisciplinar os conhecimentos adquiridos, discutindo-os e criticando-os. (DIAS, 2003) A participação dos movimentos sociais, das instituições acadêmicas, governamentais, de representantes das minorias e da sociedade em geral, foi muito expressiva, dando um caráter peculiar a Conferência do Rio de Janeiro. Ainda no ano de 1992, o Ministério da Educação (MEC) organizou em Foz do Iguaçu o I Encontro Nacional dos Centros de Educação Ambiental. Foram reunidos coordenadores pedagógicos, técnicos dos Centros de Educação Ambiental e dos departamentos do MEC nos estados, técnicos das secretarias de educação (estaduais e municipais) e das universidades (federais e municipais), para discutir as propostas pedagógicas, metodologias para a capacitação e para as atividades a serem desenvolvidas nos centros (DIAS, 2003). A avaliação feita pós Rio-92, durante o Primeiro Seminário da Agenda 21 no Brasil indicou a existência de diversas dificuldades para a implementação da Agenda 21 global no País que foram apresentados à Comissão da ONU de Desenvolvimento Sustentável (CAMARGO, CAPOBIANCO & OLIVEIRA, 2002). O Ministério da Educação (MEC) e o Ministério do Meio Ambiente (MMA) elaboraram importantes documentos e ações em Educação Ambiental, posteriormente a Conferência Rio-92. Dentre os documentos de grande relevância destaca-se o Programa Nacional em Educação Ambiental (ProNEA), criado em 1994, que definiu sete principais linhas de ação6. 6 1- Educação Ambiental no ensino formal; 2- Educação no processo de gestão ambiental; 3- Realização de campanhas específicas de Educação Ambiental para usuários de recursos naturais; 4- Cooperação com os que atuam nos meios de comunicação e com os comunicadores sociais; 5- Articulação e integração das comunidades em favor da Educação Ambiental; 7- Criação de uma rede de centros especializados em 32 Em 1997, foi organizada a I Conferência Nacional de Educação Ambiental (CNEA), em Brasília, na qual foi aprovada a Declaração de Brasília para a Educação Ambiental. Esta declaração apresentou um diagnóstico acerca da situação da Educação Ambiental no Brasil, emitindo recomendações que visavam à melhoria do seu processo de desenvolvimento (PEREIRA, 2008). No mesmo ano o governo federal lançou oficialmente o documento Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) que definiu sete temas transversais7, dentre eles, Meio Ambiente que dever ser trabalhado de maneira interdisciplinar. Segundo Loureiro: Apesar das críticas que recebeu pelo modo como pensou a transversalidade em educação (mantendo como eixos principais as disciplinas de conteúdos formais – português, matemática, ciências e história e geografia) e pela baixa operacionalização da proposta, teve o mérito de inserir a temática ambiental não como disciplina e de abordá-la articulada às diversas áreas do conhecimento (2006. p. 83). Em 1999, foi sancionada a Lei nº 9.795/99 que dispõe sobre a Educação Ambiental e institui a Política Nacional de Educação Ambiental. Destaca-se que o Brasil é o único país da América Latina que tem uma política nacional específica para a Educação Ambiental (DIAS, 2003). Esta lei definiu um conceito de Educação Ambiental que informou diversos documentos oficiais no âmbito nacional, estadual e municipal até o presente momento. De acordo como este documento, entende-se por Educação Ambiental: “(...) os processos por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores Educação Ambiental, integrando universidades, escolas profissionais, centros de documentação, em todos os Estados e da federação (ProNEA, 1994). 7 Ética, Saúde, Orientação Sexual, Pluralidade Cultural, Trabalho, Consumo ... e Meio Ambiente foram os temas transversais selecionados pelo MEC para fazer parte de nossa formação. Foi a partir da elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais no governo de Fernando Henrique Cardoso, que a temática Meio Ambiente foi oficializada como componente do currículo escolar a ser trabalhada nas áreas já existentes, e deve ser incorporado ao trabalho educativo da escola, segundo documento oficial. 33 sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente e sua sustentabilidade” (BRASIL, 1999). Loureiro (2006) formulou críticas às limitações que a lei possui que define de forma imprecisa a relação entre governo e sociedade civil, e como estes poderão tornar transversal a Educação Ambiental, uma vez que ainda nos deparamos com uma estrutura social desigual e fragmentada. No mesmo ano foi aprovada no estado do Rio de Janeiro a Lei n° 3.325/99 que dispõe sobre a Educação Ambiental, institui a Política Estadual de Educação Ambiental, cria o Programa Estadual de Educação Ambiental no âmbito do Estado do Rio de Janeiro. Esta lei vem respaldar ações em Educação Ambiental no âmbito escolar, ao estabelecer que: Art. 18 - As escolas da rede pública estadual de ensino deverão priorizar em suas atividades pedagógicas práticas e teóricas: I - a adoção do meio ambiente local, incorporando a participação da comunidade na identificação dos problemas e busca de soluções; II - realização de ações de monitoramento e participação em campanhas de defesa do meio ambiente como reflorestamento ecológico, coleta seletiva de lixo e de pilhas e baterias celulares; III – As escolas situadas na área de entorno da Baía de Guanabara deverão incorporar, nos seus programas de educação ambiental, o conhecimento e acompanhamento do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara PDBG; IV - As escolas situadas nas demais baías do Estado, como Ilha Grande e Sepetiba, assim como as próximas dos rios, lagoas e lagunas fluminenses deverão adotar em seus trabalhos pedagógicos a proteção, defesa e recuperação destes corpos hídricos (RIO DE JANEIRO, 1999). No final da década de 1990 foi promovida a Conferência de Thessaloniki, na Grécia. Como fruto desta conferência foi elaborado o documento “Educação para um futuro sustentável”. 34 Na primeira década do século XXI o cenário mundial e nacional foi pouco alterado em relação aos compromissos assumidos pelo documento da Agenda 21. O caráter de carta compromisso e a não obrigatoriedade legal da Agenda 21 no Brasil permitiu aos governos federal, estadual e municipal adotarem distintas posturas em relação à questão ambiental. Em 2001 foi sancionada a Lei no 10.172, que aprova o Plano Nacional da Educação. Mais uma vez a Educação Ambiental foi tratada como tema transversal, devendo ser desenvolvida como uma prática educativa integrada, contínua e permanente, corroborando os princípios contidos na Lei 9.795/99. Em 2002 foi promovida a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável em Joanesburgo (África do Sul), chamada de Rio +10. Esta reunião produziu dois documentos oficiais, adotados pelos representantes dos 191 países presentes, a Declaração Política e Plano de Implementação. O conteúdo desses documentos refletiu as limitações do processo decisório vigente. Diferente da Conferência Rio-92, a expectativa gerada para este evento foi marcada pelo ceticismo e pela falta de credibilidade, pois passados dez anos da Conferência no Rio de Janeiro o cenário mundial pouco foi alterado para as questões ambientais (PEREIRA, 2008). A versão final da Agenda 21 Brasileira ficou pronta em 2002 e foi apresentada pela Comissão de Política de Desenvolvimento Sustentável e Agenda 21 Brasileira (CPDS), contando com a colaboração de vários setores da sociedade civil. Foram organizados seis grandes temas que procuraram englobar todas as discussões de âmbito social, ambiental, econômico, ético, político, são eles: Agricultura sustentável, Cidades sustentáveis, Infraestrutura, Redução das desigualdades, Ciências e tecnologia e Gestão dos recursos 35 naturais. Ela também foi levada à condição de Programa do Plano Plurianual 2004-2007, segundo informações fornecidas pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA, 2008). Na Agenda 21 Brasileira foram agrupados vinte e uma ações com objetivos estratégicos para discussão no debate público de conceitos, princípios e de possibilidades da sustentabilidade. Dentre elas podem-se destacar dois em especial: “promover a Agenda 21 local com instrumento de descentralização, gestão e planejamento participativo do desenvolvimento integrado e sustentável, local e regional.” e “ampliar o protagonismo ambiental como prioridade da política externa, com base na consciência das ações internas e participação da sociedade” (CAMARGO, CAPOBIANCO & OLIVEIRA, 2002). Em vários estados brasileiros ocorreram diversas iniciativas para promover a Agenda 21 Local e estimular o protagonismo ambiental nos diferentes espaços formais e não-formais de ensino. Após a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, realizada em 1992, houve um avanço tímido nas políticas públicas, no que tange a Educação Ambiental em todo o território nacional. O Estado do Rio de Janeiro, em particular, vem caminhando gradativamente na consolidação das políticas públicas em Educação Ambiental por meio de ações que servem de espelho para outros locais do país e do mundo. A formação continuada de professores tem ocupado posição central, na última década, em termos de investimentos públicos, pelos órgãos de fomento em parceria com a universidade e a sociedade civil. Todavia, o desafio continua e a caminhada para esse processo é longa. Em 2003, o Ministério do Meio Ambiente, em parceria com o Ministério da Educação, promoveu a I Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente (CNIJMA), em Brasília. Uma das propostas deste evento foi a criação da Comissão de 36 Meio Ambiente e Qualidade de Vida na Escola – COM.VIDA, além da Agenda 21 Escolar. O preâmbulo desta Conferência surgiu a partir de uma consulta do MMA e MEC sobre “O que querem os jovens para o meio ambiente no Brasil?” Comissões organizadoras foram estruturadas em diversos estados e no Distrito Federal com a preocupação de dialogar com diferentes segmentos da sociedade. A consulta culminou na Conferência Nacional do Meio Ambiente. Ela ocorreu em duas versões, uma voltada para o público adulto e outra para o público jovem, com representação de delegados em todos os estados brasileiros. A Conferência Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente contou com a participação8 de 15.148 escolas9. Aproximadamente seis milhões de pessoas debateram propostas de políticas públicas de meio ambiente (BRASIL, 2004). A Carta Jovens Cuidando do Brasil sistematizou as deliberações da Conferência Infanto-Juvenil. Cabe ressaltar, como um dos apontamentos feito pelos jovens, a necessidade de se fortalecer o conceito de EA. “A carta sugere que se formem conselhos jovens nas escolas e em outros espaços da sociedade e cita a importância da Agenda 21 Escolar (BRASIL, 2004 p. 7).” Fruto deste evento nasceu uma ampla rede de comunicação da juventude disposta a discutir as questões ambientais, 8 Este evento contou com a presença escolas indígenas, quilombolas, ribeirinhas, caiçaras, de assentamento, de pescadores e de portadores de necessidades especiais, entre outras, somando cerca de 300 unidades. A Conferência de /Brasília contou, ainda com a participação de cerca de 400 delegados de todo o país (BRASIL, 2004). 9 A síntese das propostas das escolas que participaram da I CNIJMA está disponível em http://www.propostasdasescolas.com.br/mec/relatorio. 37 chamada Conselho Jovem – posteriormente vindo a se tornar Coletivo Jovem de Meio Ambiente (CJ)10. Como política pública do governo federal foi criado o Programa Vamos Cuidar do Brasil com as Escolas11, a partir da conferência de Brasília – dando continuidade ao processo de construção social em Educação Ambiental. A promoção da Conferência Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente na esfera estadual e municipal também foi estimulada. Em 2005 foi promovida a II Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente em Brasília, intitulada: Vivendo a Diversidade na Escola. A II CNIJMA12 contou com a participação das escolas brasileiras do segundo segmento do Ensino Fundamental, convocando adolescentes de 11 a 14 anos do presente para participar e discutir a construção de um futuro sustentável. Ela ocorreu em dois momentos distintos: na escola (ou na comunidade) e na conferência nacional. A Conferência na Escola é um momento muito rico para a comunidade escolar (estudantes de todos os turnos, professores, professoras, funcionários, funcionárias e a população em torno da escola) e para as comunidades indígenas, quilombolas, assentamentos rurais e meninos e meninas em situação de rua, onde também serão realizadas Conferências. Essa ação permite conhecer, debater e tomar atitudes para garantir um 10 De acordo com os documentos oficiais: “A idéia desses Coletivos Jovens (CJs) foi se configurando num interessante processo de estímulo ao envolvimento e à organização de jovens num processo de engajamento e atuação junto às questões socioambientais. Além de envolver os que já atuavam na área ambiental, os Coletivos Jovens podem favorecer à “chegada” de outros jovens nesse processo, aqueles que já ouviram falar sobre meio ambiente, mas que ainda não se sentiram vontade de envolver-se com esse assunto. Os dois princípios que orientam a criação dos CJs são: Jovem Educa Jovem e Jovem Escolhe Jovem, estabelecendo o diálogo a partir de Uma Geração Aprende com a Outra (BRASIL, 2005, pg. 10). 11 A Coordenação-Geral de Educação Ambiental (COEA), vinculada ao MEC traçou quatro dimensões dentro do programa, a fim de construir um processo de EA permanente na escola, são eles: 1- Formação de Educadores Ambientais; 2- Conselhos de Meio Ambiente e Qualidade de vida nas escolas; 3- Inclusão digital com Ciência de Pés no Chão; 4- Educação de Chico Mendes (BRASIL, 2004). 12 A II Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente tratou quatro temas a partir de Acordos Internacionais: 1- Mudanças Climáticas (protocolo de Quioto); 2- Biodiversidade (Convenção sobre Diversidade Biológica); 3- Segurança Alimentar e Nutricional (Declaração de /Roma sobre a Segurança Alimentar Mundial); 4- Diversidade Ético-racial (Declaração de Durban contra o racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata (BRASIL, 2005). 38 planeta mais sustentável, eqüitativo e justo. Isso contribui para mudar nosso lugar, nosso país e também o mundo (BRASIL, 2005, p.5). Após a promoção da conferência nas escolas, 700 delegados e delegadas que debateram os temas socioambientais no âmbito escolar e da comunidade elaboraram coletivamente uma Carta de Responsabilidades durante a conferência nacional, encaminhando-a ao Presidente da República. Outro instrumento utilizado pela CNIJMA foi o processo de educomunicação13, além da aplicação da metodologia de Oficinas do Futuro. O evento estimulou também a criação e disseminação das COM.VIDAS e Agenda 21 Escolares, a fim de concretizar a proposta de Cuidar do Brasil. O conceito de EA disseminado pelas CNIJMA corroborou com o conceito subtendido na Política Nacional de Educação Ambiental (Lei n° 9.795/99). A linguagem adotada pela Conferência teve a preocupação em adaptar-se ao público infanto-juvenil, estimulando a transformação de valores e mudanças de atitudes em relação ao entorno socioambiental destes jovens. De acordo com o documento: Educação Ambiental - É a educação que tem em mente o nosso pequeno planeta azul. Ela é realmente transformadora ao trazer novas maneiras de ver e conviver com o mundo em sua totalidade e complexidade, respeitando as diversas formas de vida e cultivando novos valores (BRASIL, 2005, p. 48). Em 2009 foi promovida a III Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente, em Brasília, intitulada como: Mudanças Ambientais Globais. A proposta da III CNIJMA foi fortalecer a cidadania ambiental nas escolas e comunidades a partir de uma educação crítica, participativa, democrática e transformadora. Ela foi caracterizada como 13 “Educomunicação – É uma maneira de unir Educação com Comunicação, que defende o direito que as pessoas têm de produzir informação e comunicação. A gente não só lê o jornal, ouve o rádio e vê a televisão – mas também FAZ jornal, rádio e televisão (BRASIL, 2005, p. 6).” 39 um processo dinâmico de encontros e diálogos, para discorrer temas propostos, deliberando coletivamente importantes decisões, por meio de delegados eleitos que levaram as idéias representativas da escola ou comunidade (BRASIL, 2008). A III CNIJMA ampliou as etapas sucessivas de construção do diálogo sobre EA na sociedade, estabelecendo três momentos: a conferência na escola, a conferência estadual (opcional aos estados brasileiros) e a conferência nacional. Participaram deste evento as escolas (públicas/privadas e urbanas/rurais) cadastradas no Censo Escolar de 2006 – INEP que abrangem as séries/anos finais do Ensino Fundamental. A participação do primeiro segmento do Ensino Fundamental (EF) contemplou as comunidades indígenas, quilombolas, assentamentos rurais sem escolas com séries/anos finais do EF. Os adolescentes foram os protagonistas da Conferência, contando também com a participação de adultos. O evento contabilizou a presença de 690 delegados e delegadas (BRASIL, 2008). Finalizando a primeira década do século XXI, chamou a atenção dentro do cenário mundial a Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, realizada em dezembro de 2009, em Copenhague (Dinamarca). As alterações climáticas tem sido alvo de maior atenção tanto da comunidade científica, quanto da sociedade civil organizada, por causa das nefastas conseqüências socioambientais do aquecimento global. O evento reuniu 192 países signatários da Convenção do Clima, a fim de negociar um acordo global para o clima. Paralelamente, foi promovida também a 5° Reunião das Partes do Protocolo de Quioto. Até 2012 os países signatários do Protocolo assumiram o compromisso em reduzir as emissões de CO2 em 5,2%. A atmosfera constitui a parte mais 40 frágil de nosso planeta, a qual tem apresentado os sinais mais impactantes da relação conflituosa do homem com a natureza. Pouco avanço se conquistou em Copenhague, a fim de garantir um futuro sustentável. Evento marcado por grandes conflitos políticos e econômicos, a Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima ilustra o campo minado das disputas ideológicas dentro da área ambiental. A promoção da Educação Ambiental neste contexto precisa romper com o modelo educacional conservador e descortinar os conflitos políticos, superando a visão romantizada, neutra e apolítica do processo educacional tecnicista e comportamentalista. A Educação Ambiental sozinha não é capaz de modificar a conjuntura políticoeconômica estadual, nacional ou mundial, todavia ela ainda se apresenta como um valioso instrumento da sociedade civil na construção das políticas públicas voltadas para o meio ambiente. A escola e seus atores sociais (professores, estudantes, direção escolar, funcionários, responsáveis por alunos, comunidade escolar) precisam ser estimulados ao protagonismo ambiental, posicionando-se politicamente frente às decisões do presente com repercussões no futuro. O Rio de Janeiro, local do segundo evento de maior importância para o meio ambiente dentro do cenário mundial, tem implantado ações em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar no âmbito da esfera pública e privada, no espaço de educação formal e não-formal, destacando-se dentro do cenário nacional. Tais ações estão interligadas com o processo histórico e social, anteriormente resgatado. Na próxima seção compreenderemos o desenvolvimento das políticas públicas para formação continuada de professores em Educação Ambiental na agenda do Rio de Janeiro. 41 1.2 – Políticas Públicas para formação continuada de professores em Educação Ambiental no Estado do Rio de Janeiro. A criação da Lei Estadual de Educação Ambiental e do Programa Estadual de Educação Ambiental (Lei n° 3.325/1999) no Estado do Rio de Janeiro representou um marco regulatório para as políticas públicas em Educação Ambiental, oficializando sua obrigatoriedade no ensino formal. A matriz teórica da Lei n° 3.325/99 foi respaldada na Política Nacional de Educação Ambiental (Lei federal n° 9.795/99). Nos bastidores do cenário político carioca da época, muitas resistências e disputas econômicas se apresentaram a fim de neutralizar o eminente processo. Foram realizadas treze audiências públicas, 50 ementas apresentadas e criados três decretos estaduais até a consolidação da lei. No entanto, a prática da Educação Ambiental nas instâncias do sistema educacional do Rio de Janeiro veio a ocorrer de maneira tímida e isolada por iniciativa de poucos educadores ambientais. Fato possivelmente atribuído também a grande lacuna existente na formação de professores. Praticamente, inexistem na literatura informações sistematizadas sobre a formação continuada de professores em Educação Ambiental no Rio de Janeiro. A história do desenvolvimento das políticas educacionais em EA dentro dos órgãos educacionais e ambientais é contada por relato vivo de atores sociais que participaram da construção dessa política, e também por fragmentos de documentos oficiais soltos dentre as secretarias14. As ações dentro das políticas públicas em Educação Ambiental no Estado do Rio de Janeiro do século XX, pós Rio-92 ocorreram no âmbito dos diferentes órgãos 14 Ao pesquisar documentos oficiais dentro da Secretaria de Educação no Governo de Estado do Rio de Janeiro em 2009, foi detectada uma grande lacuna na sistematização das informações sobre os programas para formação continuada de professores em Educação Ambiental no âmbito do estado. De acordo com o relato de pessoas que participaram do processo, parte dos documentos oficiais sobre os programas estaduais em EA, simplesmente foram jogados no lixo. 42 ambientais (FEEMA, SERLA e IEF)15 e da Secretaria Estadual de Educação de maneira isolada. Distribuir folhetos orientando a população a não jogar lixo nas margens de rios, instituir o dia da limpeza na praia, promover caminhadas pela Floresta da Tijuca etc, foram ações concebidas como trabalho em Educação Ambiental. Em 2000 foi criado o Grupo Interdisciplinar de Educação Ambiental do Estado do Rio de Janeiro (GIEA)16, por meio do Decreto n° 27.559. O GIEA possui diversas atribuições, dentre elas: definir as diretrizes, acompanhar e avaliar a Política Estadual de Educação Ambiental; dimensionar os recursos necessários aos programas e projetos em Educação Ambiental; fomentar parcerias entre instituições educacionais, empresas públicas e privadas, entidades de classe, lideranças comunitárias e demais entidades de classe com interesse em EA; promover o debate sobre EA em diferentes espaços sociais e comunitários (RIO DE JANEIRO, 2010). Este grupo exerceu importante influência na formulação das políticas públicas em Educação Ambiental no estado. De acordo com Luz (2008), o GIEA foi responsável pelo primeiro grande levantamento sobre a situação da Educação Ambiental nas unidades escolares do Rio de Janeiro. Em 2001, o grupo elaborou um livreto intitulado “Educar para preservar o meio ambiente”, material de divulgação das leis de âmbito nacional e estadual sobre a Política de Educação Ambiental, contendo um questionário em anexo. O objetivo do GIEA era obter informações sobre a realidade das escolas federais, estaduais e municipais cadastradas no Censo em 2000, em 92 municípios e 29 Coordenadorias Regionais de 15 FEEMA – Fundação Estadual de Engenharia de Meio Ambiente; SERLA – Secretaria Estadual de Rios e Lagoas; IEF – Instituto Federal de Florestas. Hoje, os três órgãos se fundiram a uma única sigla INEA – Instituto Estadual do Ambiente, criado em 2007 através da Lei n° 5.101, contudo instalado em 2009. 16 Constituem atualmente como membros efetivos do GIEA: I- Secretaria de Estado do Ambiente – SEA; II- Secretaria de Estado de Educação – SEEDUC;III- Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia – SECT;IV- Secretaria de Estado de Cultura – SEC;V- União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME) e Associação Nacional de Órgãos Municipais de Meio Ambiente (ANAMMA), em sistema de revezamento anual;VI- Instituto Jardim Botânico do Rio de Janeiro e Fundação Oswaldo Cruz, em sistema de revezamento anual (RIO DE JANEIRO, 2010). 43 Educação. Dos 11.478 questionários enviados pelo GIEA, entretanto, apenas 2.253 retornaram preenchidos (LUZ, 2008). A partir das informações coletadas e mediante conhecimento de cada região, seria executado um planejamento a fim de aplicar recursos financeiros na formação continuada de professores (LUZ, 2008). As conclusões do levantamento apontam para o baixíssimo percentual de professores capacitados sobre a questão. E ainda, ressaltam que pouco trabalho promovido em EA pelas escolas fica engessado por datas comemorativas, tirando o seu caráter interdisciplinar e contínuo (LUZ, 2008). A formação continuada de professores em Educação Ambiental como política pública no âmbito do governo do Estado do Rio de Janeiro, foi iniciada com o Projeto de Educação Ambiental do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PEA/PDBG). Este projeto foi financiado com recursos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Lançado em 1994 pelo governo estadual, o PDBG foi executado em etapas e priorizou o Saneamento Básico17, enfatizando a necessidade de investimentos em obras de engenharia. O PEA/PDBG capacitou 1.117 profissionais como agentes ambientais no período de 1998/2001 (RIO DE JANEIRO, 2001). Dentre os novos agentes ambientais, destacaram-se educadores da rede pública de ensino, servidores municipais e lideranças comunitárias. O PEA/PDBG representou um avanço da política pública para formação continuada de professores em EA no Rio de Janeiro, inovando não apenas ao integrar distintas entidades18 em prol de um objetivo comum, mas ao adotar uma metodologia 17 Dentre os componentes para melhoria do Saneamento Básico no estado, os recursos destinaram-se a: a) obras de engenharia (macrodrenagem, resíduos sólidos urbanos, etc); b) informação (dados, mapeamento digitalizado, levantamentos etc) e educação (atividades de educação ambiental) (RIO DE JANEIRO, 2002). 18 As entidades conveniadas ao Projeto de Educação Ambiental do PDBG foram a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMADS), a FEEMA, a SEE, a UERJ e o Centro de Produção da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (CEPUERJ). A SEMADS juntamente com a UERJ constituiu as entidades executoras, e contou com o apoio técnico da Agência Executora do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (ADEG) e a Fundação Centro de Informações e Dados do Estado (CIDE). 44 calcada no diálogo entre a academia e a sociedade e ao incentivar o protagonismo ambiental dentro das comunidades. O PEA/PDBG ofereceu Curso de Especialização e Capacitação em Educação Ambiental para Gestão Ambiental, ministrado pela Faculdade de Educação da UERJ, despertando a atenção de centenas de docentes da época, principalmente dos municípios do entorno da Baía da Guanabara. A concepção de Educação Ambiental adotada pelo PEA/PDBG fundamenta-se nas idéias de José da Silva Quintas e Maria José Gualda, educadores da Divisão de Educação Ambiental do IBAMA, e foi compreendida “como um processo instituinte de novas relações entre si e deles com a natureza”(RIO DE JANEIRO, 2002, p. 169). A EA trata-se de uma “abordagem de conteúdos que levem a caminhos políticos de superação dos conflitos socioambientais.” E ainda, “tornar-se necessário conhecer os interesses dos diferentes sujeitos e das instituições, os impasses para a negociação, o conflito que impede o diálogo e demais aspectos que contribuem para reflexão das alternativas políticas” (RIO DE JANEIRO, 2002, p. 169). O principal objetivo desta formação continuada de professores foi instrumentalizar os profissionais envolvidos mediante seminários, disciplinas curriculares e oficinas para a elaboração de plano de ação que viesse a intervir na realidade escolar e do entorno. O desenvolvimento deste plano de ação teve o intuito em nortear soluções e práticas transformadoras quanto à realidade socioambiental próxima e dos problemas a ela relacionado. A primeira fase do projeto ocorreu no período de 1998 a 2000, resultando na publicação 107 projetos (RIO DE JANEIRO, 2001). Na segunda fase do projeto ocorreu no período de 2000 a 2001, resultando na publicação de 73 planos de ação (RIO DE JANEIRO, 2002). Em 2003 o estado do Rio de Janeiro participou em Brasília-DF do Programa Vamos Cuidar do Brasil, através da I Conferência Nacional Infanto-Juvenil pelo Meio 45 Ambiente, promovida pelo MMA e MEC. Coube a Comissão Organizadora Estadual (COE-RJ) divulgar, debater e organizar as delegações que representaram a unidade federativa. Neste mesmo ano, foi criado o Coletivo Jovem de Meio Ambiente no Rio de Janeiro. Nas CNIJMA posteriores, o estado do Rio de Janeiro também se fez presente. A COE-RJ organizou um encontro em Mendes/RJ para a II Conferência Infanto-Juvenil promovida em 2005. O encontro contou com a presença de representantes das Secretarias Municipais de Educação e das Coordenadorias Regionais, para a formação de COM.VIDAS e Agenda 21 Escolar. Neste processo, uma das diretrizes estabelecidas pelo governo federal foi desenvolver linhas de ações que atendessem a formação de educadores ambientais (Programa Formadores I, II e III), em parceria com os governos estaduais e municipais. Ações pontuais com foco na formação continuada de professores foram também promovidas por instituições acadêmicas, como o Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ). O JBRJ fornece curso de dois dias para professores da Educação Básica que desejam levar seus alunos para conhecer o seu espaço. Atualmente, a instituição tem promovido Curso de Especialização em Educação Ambiental, através do Núcleo de Educação Ambiental (NEA) em parceria com a SEA, cujo principal público alvo é o professor. Outra instituição acadêmica que merece destaque na construção da história da política em EA voltada para a formação de professores é a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). A UERJ foi uma das primeiras no estado a promover diversos cursos e ações em Educação Ambiental, principalmente através do Instituto de Biologia Roberto Alcântara Gomes (IBRAG). Além, também, de participar da formulação das políticas no âmbito do Programa Estadual em Educação Ambiental. Atuações solitárias também ocorreram no seio das universidades federais do Rio de Janeiro. 46 Em 2007, foi criada a Superintendência de Educação Ambiental (SEAM), vinculada a SEA. A SEAM-SEA que rearticulou os atores sociais que fazem parte do processo de Educação Ambiental. Através de recursos financeiros do Fundo Estadual de Conservação Ambiental (FECAM)19, programas/projetos poderão incluir investimentos em ações de EA de até 5% (cinco por cento) do total de recursos aprovados (RIO DE JANEIRO, 2004). A SEAM-SEA se organizou em três eixos temáticos: Formal; Socioambiental20 e Educomunicação. Contemplando o eixo formal, em 2007, foi lançado o Curso de Formação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania por meio de parcerias com Secretaria de Estado de Educação, Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia no Governo de Estado do Rio de Janeiro, UERJ e Coletivo Jovem de Meio Ambiente do Rio de Janeiro. O Curso de Formação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania constituiu-se como uma importante ação dentro das políticas públicas, voltada para a formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. 19 “O Fundo Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano (FECAM) foi criado pela Lei 1060, de 10 de novembro de 1986 – mais tarde alterado pelas leis 2.575, de 19 de junho de 1996; 3.520, de 27 de dezembro de 2000; e 4.143, de 28 de agosto de 2003 –, com o objetivo de atender às necessidades financeiras de projetos e programas ambientais e de desenvolvimento urbano em consonância com o disposto no parágrafo 3º do artigo 263 da Constituição Estadual. Os recursos do FECAM são oriundos, dentre outros, de 5% dos royalties do petróleo, atribuídos ao Estado do Rio de Janeiro, bem como do resultado de multas administrativas aplicadas e condenações judiciais por irregularidade constatadas pelos órgãos fiscalizadores do meio ambiente (RIO DE JANEIRO, 2010).” 20 “Socioambiental: capacita membros da sociedade civil (movimentos sociais, grupos e comunidades), com o objetivo de qualificá-los para participação nas instâncias decisórias sobre acesso e uso dos recursos naturais, como os comitês de bacia e conselhos gestores de unidades de conservação da natureza (reservas, parques etc). Também investe no fortalecimento dos governos locais, através de programas voltados para a formação de gestores ambientais, servidores públicos e conselhos municipais de meio ambiente. Sensibilizar, mobilizar e formar cidadãos críticos, cientes da importância do seu envolvimento na vida pública e da prática da cidadania faz parte da agenda deste eixo para garantir a melhoria da qualidade de vida e fortalecer o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA) (RIO DE JANEIRO, 2010)” 47 Desde o PEA/PDBG, o estado do Rio de Janeiro não executava uma ação tão integrada e abrangente voltada para a formação continuada de professor. O curso contou com financiamento do FECAM e com a coordenação pedagógica da UERJ. O curso teve como meta atingir um público de 300 professores e profissionais da educação e 300 estudantes do Ensino Fundamental e Médio da rede estadual de ensino e da Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC), pertencentes à região metropolitana do Rio de Janeiro. A concepção de Educação Ambiental que orienta as ações do curso está em consonância com o conceito encontrado nas Políticas de EA de âmbito nacional e estadual. O conceito de Agenda 21 Escolar utilizado também se ampara em documento oficial, produzido pela Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em 1992 no Rio de Janeiro. A principal meta do curso foi promover o protagonismo ambiental dos atores que fazem parte da comunidade escolar (professores, estudantes, direção escolar, funcionários, responsáveis por alunos e pessoas da comunidade escolar), incentivando-os a participação cidadã na vida pública e ao enfrentamento dos problemas socioambientais locais. Esta formação foi ministrada no período de outubro de 2007 a outubro de 2008. Organizou-se em duas propostas de educação presencial: uma para profissionais da educação com 90h/aula e outra para estudantes com 60h/aula. Além da etapa teórica presencial, ocorreu outra etapa semipresencial de maior duração, na qual se efetivaram as ações do projeto de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar em cada unidade escolar. Em 2008 foi criado, no âmbito da Secretaria de Educação do Estado, a Coordenação de Educação Ambiental21. Em 2009, o Estado do Rio de Janeiro promoveu a 21 Informações obtidas no site www.seeduc.rj.gov.br. 48 I Conferência Estadual Infanto-Juvenil pelo Meio Ambiente, levando propostas para a III CNIJMA, realizada em Brasília neste mesmo ano. Grande parte das propostas para a formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar no âmbito da SEEDUC estão associadas a outras secretarias e instituições do governo estadual, ou vinculadas à política nacional através do MEC. Em 2009, o Curso de Formação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania sofreu uma grande reestruturação. O modelo de educação à distância adotado fez uso de uma plataforma desenvolvida pelo CEDERJ/CECIERJ e contou com menor quantidade de encontros presenciais. O público alvo foram os profissionais da educação e estudantes da rede estadual de ensino pertencente ao Ensino Médio ou Educação de Jovens e Adultos (EJA) e das FAETEC. Intitulado Curso de Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Formando Elos de Cidadania à Distância, a nova meta foi atingir cerca de 2000 escolas, 500 profissionais da educação e 500 estudantes em diversas regiões do estado, principalmente no interior. Com metodologia de trabalho similar ao curso anterior, a proposta de intervenção local a realidade escolar foi a criação de Agenda 21 Escolar e projetos de Educação Ambiental contextualizados (RIO DE JANEIRO, 2008). Ainda neste mesmo ano, foi aprovado o Projeto Formação Continuada em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, financiado com recursos do FECAM e gerenciado pela SEA/UERJ. Este projeto pretendeu contemplar profissionais da educação, estudantes e pessoas da comunidade escolar envolvidas nos processos de construção das Agendas 21 Escolares e dos projetos de intervenção em EA – atores sociais que participaram da formação continuada nos períodos de 2007/2008 (1° fase do curso) e 2009 (2° fase do curso). Através de um acompanhamento à distância (pela plataforma do 49 CEDERJ) e presencial por ciclos de palestras, oficinas e debates, o projeto almeja fortalecer o enraizamento da EA e aprofundar o embasamento teórico das escolas (RIO DE JANEIRO, 2008). Para o ano de 2010, projeta-se uma nova reestruturação do curso no que diz respeito ao público de abrangência. Os municípios foram incentivados a participar desta formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. As escolas estaduais e as FAETEC permanecem no Curso de Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Formando Elos de Cidadania à Distância II (terceira etapa). O modelo de educação à distância não foi alterado, mantendo-se também alguns encontros presenciais. Profissionais da educação e estudantes do Ensino Fundamental e Médio voltarão a fazer parte deste processo. A metodologia de trabalho também é similar aos cursos anteriores, ao incentivar o protagonismo ambiental dos atores sociais que fazem parte da comunidade escolar, capacitando-os na construção de Agenda 21 Escolar e de projeto de intervenção em Educação Ambiental. Outra ação no âmbito do Programa Estadual de Educação Ambiental que tem convergido interesses ao Curso de Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar é o programa da SEAM-SEA Nas Ondas do Ambiente, contemplado pelo eixo de Educomunicação Socioambiental. O lançamento do programa como projeto piloto Rá[email protected], ocorreu paralelamente ao Agenda 21 Escolar, em 2007. Na primeira fase do projeto, 183 escolas da rede pública estadual foram contempladas com equipamentos de rádio do MEC, por meio do Programa do Ensino Médio (PROMED). No período de 2007 a 2008, o programa atingiu 48 unidades escolares e envolveu 360 professores, estudantes e comunicadores comunitários (RIO DE JANEIRO, 2010). 50 O principal objetivo do Programa Nas Ondas do Ambiente é “dar oportunidade a mais pessoas a terem acesso democrático à produção e difusão de informações, utilizando de forma criativa os meios de comunicação (RIO DE JANEIRO, 2010).” Assim como o Curso de Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, o programa Nas Ondas do Ambiente é financiado com recursos do FECAM, e possui a parceria da SEEDUC, UERJ e Fundação Viva Rio. Em 2009, o programa foi desmembrado em três projetos: Animação de Rede (escolas e comunidades vinculadas ao projeto Rá[email protected]) Nas Ondas da Mata Atlântica (Serra da Bocaina – Paraty e Angra dos Reis) e Rádio Quintal: Comunicação Limpa e Despertar Ecológico (escolas e comunidades). Algumas escolas que fazem parte do Curso de Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar também foram integrantes ao projeto de educomunicação. Ambas as propostas para formação continuada de professores tem procurado estabelecer uma sintonia dentro da política pública do estado, enriquecendo a vivência de docentes e discentes junto à comunidade na qual estão inseridos. A projeção do Programa Nas Ondas do Ambiente feita para o ano de 2010 é atingir através do projeto Rá[email protected] 136 escolas distribuídas em diversos pontos do estado do Rio de Janeiro, capacitando professores e estudantes do Ensino Médio e comunicadores comunitários, além das lideranças locais. O potencial deste veículo de comunicação tem um imensurável poder de transmissão de informações, podendo atingir a marca de milhões de pessoas por meio deste projeto (RIO DE JANEIRO, 2010). Três outros projetos que merecem destaque no âmbito do Programa Estadual em Educação Ambiental em andamento no período de 2007 a 2009 são: 1- Agenda Água na Escola – mobilização social e Educação Ambiental voltada para a gestão integrada dos 51 recursos hídricos do estado do Rio de Janeiro (abrangência: Angra dos Reis, Paraty, Itaguaí, Miguel Pereira, Seropédica, Resende, Barra do Piraí, Petrópolis, Teresópolis, Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Maricá, Nova Friburgo, Cabo Frio, Silva Jardim, Cordeiro, Rio das Ostras, Macaé, Itaperuna, Campos dos Goytacazes, Bom Jesus Itabapoana); 2Implantação e Reestruturação das Agências Regionais do INEA; 3- Projeto Básico para Saneamento da Região do Alto Rio Preto BA Bacia do Rio Paraíba do Sul (abrangência: Resende e Itatiaia). A maioria dos projetos desenvolvidos pelo Programa Estadual de Educação Ambiental sinaliza a preocupação em aplicar recursos financeiros para a formação continuada de professores em EA, englobando a Agenda 21 e o processo social da educomunicação. Segundo Gatti (2009), grande parte da formação continuada oferecida no país acontece por meio de cursos presenciais, apesar de haver um crescimento na oferta de cursos na modalidade de educação semipresencial e educação à distância, com suporte de material impresso associados às novas tecnologias da informação. O interesse pelo tema da Formação Continuada difundiu-se nos últimos anos, envolvendo políticos da área de educação, pesquisadores, acadêmicos, educadores e associações profissionais. Há uma grande mobilização em torno do assunto, a produção teórica é crescente, eventos oficiais e não oficiais propiciam debates e razoável circulação de análises e propostas e os sistemas de educação investem cada vez com maior frequência no ensaio de alternativas de formação continuada de professores. Apesar disto, os resultados obtidos com os alunos, do ponto de vista de seu desempenho em conhecimentos escolares, não têm ainda se mostrado satisfatórios, fato que tem posto, no Brasil, os processos de educação continuada em questão (GATTI, 2009, p. 199). Compreender o conceito e as modalidades da formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, assim como essa tem sido traduzida em políticas públicas para por em prática o Programa Estadual de Educação Ambiental no Rio de Janeiro ocupará centralidade na discussão do capítulo seguinte. 52 CAPÍTULO 2 – FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL: CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS O campo da formação de professores suscita discursos apaixonados e idealistas que depositam na educação a esperança de que a mudança socioambiental é possível e no professor, o seu agente transformador. O fato é que tanto conservadores, quanto progressistas destacam a educação como o caminho para a transformação ou manutenção dos valores culturais, sociais, econômicos, políticos, éticos e ambientais de uma sociedade. Nesta direção, Chassot (2000) convida-nos a refletir (neste sentido) ao indagar “como, com a Ciência que ensinamos, vamos ajudar a curar e a preservar o Planeta e mesmo o Universo” (p. 144). Conhecimento que é capaz de libertar não apenas nossa espécie, mas a vida em sua plenitude no planeta. Conhecimento agregado a reflexão, que pode levar a ação política. Conhecimento-ação que conduza a transformação socioambiental no mundo. A libertação educacional defendida por Freire (1987) passa antes de tudo, pela formação docente. A formação continuada de professores ocupa um lugar de destaque nas políticas públicas que objetivam desenvolver a educação ambiental. Estas estratégias são organizadas ancoradas em pressupostos teóricos diversos e defendem a formação continuada como estratégia importante para consecução das políticas pretendidas. Fundamentando estes programas, há uma concepção de professor, de processo formativo, assim como de formação continuada. Nesta direção questiona-se, o que vem a ser formação continuada? Da mesma forma, o que são as políticas públicas? Tendo em vista a centralidade destas concepções para esta investigação, neste capítulo, organizou-se uma breve revisão da literatura, recuperando-se alguns dos principais eixos do debate sobre 53 estas temáticas. O objetivo é delimitar as concepções de políticas públicas e de formação continuada de professores que orientam esta investigação. 2.1 – Reflexões em torno do conceito de política pública O resgate histórico do Programa Estadual de Educação Ambiental no Rio de Janeiro, realizado no capítulo anterior, evidencia que o poder público é o autor e executor das propostas para a formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar. As ações, cursos, projetos e programas promovidos pelo Estado, focalizados nesta pesquisa, integram as políticas públicas formuladas para área ambiental pelo estado. Mas o que são as políticas públicas? A revisão da literatura aponta para a existência de diversos significados, provenientes de universos teóricos distintos. Nesta direção, Araujo (2006) assinala ter encontrado mais de 40 definições. A autora destaca a polissemia que caracteriza a expressão políticas públicas: Em francês, politique comporta duplo sentido, significando, por um lado, assuntos relativos ao governo de um Estado e por outro, programa de uma organização ou indivíduo. A língua inglesa apresenta vantagens, possuindo vocábulos diferentes para designar a atividade política (politics), caracterizada pela competição por cargos e as diversas formas de mobilização, a esfera da política (polity), ou seja, a distinção, aliás, sempre fluida, entre o mundo da política e a sociedade civil e a ação pública (policies), processos de elaboração e implementação de programas de ação pública. Em português, a expressão políticas públicas torna-se uma tautologia, pois em termos semânticos, o vocábulo política refere-se a negócios da polis, já comportando uma dimensão pública (p. 67). De acordo com Araújo, analisar política pública é tratar da ação governamental, dos programas de ação próprios a uma autoridade pública ou governamental. Muller (2002), por sua vez, assinala que as políticas públicas constituem o estado em ação. Teixeira (2009) define política pública como: 54 (...) conjunto de ações coletivas, voltadas para a garantia dos direitos sociais, configurando um compromisso público que visa dar conta de determinada demanda, em diversas áreas. Expressa a transformação daquilo que é do âmbito privado em ações coletivas no espaço público (TEIXEIRA, 2009, p. 28 apud GUARESCHI et al, 2004, p, 180) Nesta perspectiva, as políticas públicas devem visar o bem público e zelar pelos interesses coletivos. Dessa forma, investir na formação continuada de professores, a fim de melhorar a qualidade da formação docente, e conseqüentemente o desempenho escolar nas escolas públicas, passa a ser um dever e não um favor político apresentado pela plataforma de cada governo. Teixeira (2009) afirma que nem sempre as políticas públicas são formuladas por determinado grupo político empoderado e expressam os interesses da comunidade ou do bem comum. Todavia, “(...) as políticas públicas não são formuladas unicamente na defesa dos interesses específicos da classe dominante. Seria reduzir por demais a força política dos segmentos sociais não pertencentes aos grupos e classes dominantes (TEIXEIRA, 2009, p. 32).” Com o objetivo de compreender os processos de formulação e implementação de políticas, Araújo (2006) defende a análise e a reflexão mais consolidada da pesquisa sobre o Estado, suas instituições e seu papel, uma vez que este exerce seu poder regulando e intervindo na ordem social. Um dos instrumentos de regulação estatal que merece destaque é o sistema jurídico. Embora, o sistema jurídico tente moldar a conduta social dos indivíduos e as próprias ações do Estado, o processo de formulação das políticas públicas não é influenciada unicamente pelas Leis. Segundo Araújo (2006, p. 62), as políticas públicas são “geradas pelo contexto histórico e marcadas pelas disputas entre grupos que buscam afirmar seus projetos setoriais como importantes e válidos para a sociedade. 55 A reflexão em torno das políticas públicas constitui um exercício não apenas para o pesquisador, mas principalmente, para quem é objeto-sujeito do fazer política. Nesta direção, assinala-se a importância do processo de formulação de propostas para a formação continuada de professores, conhecimento acerca dos marcos teóricos e/ou ideológicos que fundamentam estas propostas. Tal conhecimento pode contribuir para minimizar os freqüentes equívocos cometidos nessas propostas, desenvolvidas pelos órgãos que compõem os governos (TEIXEIRA, 2009). Osga (2000) destaca que a política é materializada em textos. Estes constituem importantes recursos de análise, em termos das mensagens que transmitem ou que objetivam transmitir, veiculando narrativas sobre o que é possível ou desejável conseguir através das políticas educativas. Os textos formulados para implantação de políticas expressam intenções, concepções, categorias e modelos que orientam a política educativa. Segundo Lopes (2004), os textos oficiais, freqüentemente, sofrem recontextualizações. Neste processo, eles são simplificados, condensados e reelaborados, adquirindo novos contornos. De acordo com a autora, os textos são “deslocados das questões que levaram à sua produção e relocalizados em novas questões, novas finalidades educacionais” (2004, p. 389). Observa-se, em especial, na formulação das políticas para formação de professores em EA, a associação de fragmentos de textos oficiais a outros fragmentos capazes de ressignificá-los e refocalizá-los. Tal efeito é caracterizado por Lopes (2004) como bricolagem22, ou seja, existe uma associação de concepções distintas que acabam por perder sua referência teórica original. Lopes (2004) adverte que a recontextualização, neste 22 Bricolagem, em antropologia, significa a união de vários elementos para a formação de um único e individualizado. 56 sentido, produz discursos pedagógicos híbridos23. A autora observa que estes processos de produção de discursos híbridos, estão relacionados também, ao contínuo movimento de transferência de políticas entre os países, que por sua vez se apropriam das políticas de agências internacionais (BID, FMI, UNESCO, PNUMA e outros), que por capilaridade transferem poder ao tecido social dentro dos estados e municípios, até chegar à escola. As políticas públicas são fruto de um complexo e extenso processo, que envolve interesses múltiplos, confrontos e negociações emersas numa teia de poder, onde estão várias instâncias instituídas e diversos atores. No processo de produção de políticas, de acordo com as relações de poder existentes, algumas questões tendem a ser priorizadas, em detrimento de outras, convenientes a determinado interesse político e econômico (TEIXEIRA, 2009). Constata-se que a formação continuada vem ocupando espaço importante nas políticas de Educação Ambiental. Descortinar, entretanto, as intencionalidades nas políticas públicas não é tarefa fácil, até porque este processo é ideológico e definido por um jogo político com múltiplas variáveis. Um fator que tem influenciado a formulação das políticas públicas para formação continuada de professores são as reformas educacionais ocorridas na América Latina, a partir da década de 1990 que sofreram a influência das diretrizes de organismos internacionais. Segundo Teixeira (2009): No Brasil, as políticas públicas têm tido, por muitas vezes, o objetivo de atender às demandas de organismos internacionais. Recorrem, por exemplo, à melhoria de índices estatísticos em determinadas áreas para a promoção da imagem do país no exterior. Com isso, visam à captação de recursos internacionais ( p. 33). 23 O conceito biológico encontrado para hibrido, diz respeito à qualidade de tudo o que resulta de elementos de natureza distinta. Ou ainda, animal ou vegetal procriado por duas espécies distintas. 57 Estas reformas tiveram entre seu marco central, a ênfase na relação entre educação e conhecimento como eixo para o desenvolvimento econômico. Como assinala Cassassus (2001): A teoria que sustentava esse objetivo fundamentava-se, por um lado, no fato que as exigências de crescimento econômico na década de 90 demandavam uma vez mais investimentos em educação. Por outro lado, o desenvolvimento sustentável requeria sociedades sustentáveis e era a educação que poderia contribuir para esse propósito. Dessa maneira, a educação emergia como a única política pública capaz de responder às necessidades de desenvolvimento expressa no crescimento econômico e na integração social (p. 12). Ao mesmo tempo, o projeto capitalista mundial, chamado de neoliberalismo, se fortaleceu e se tornou agressivo em suas estratégias de expansão econômica, buscando a abertura de novos mercados consumidores e de trabalho qualificado, atuando como determinante de políticas públicas (TEIXEIRA, 2009). Araújo (2006) afirma que as reformas educacionais no Brasil avançaram sobre várias esferas da vida social, modificando o rumo das políticas públicas, principalmente quanto à profissão docente. Nesta perspectiva, a formação (inicial e continuada) de professores foi considerada inadequada e insatisfatória para atender as novas demandas sociais e econômicas. Para enfrentamento destas questões foram propostas mudanças na preparação dos docentes que atingiram o campo curricular e institucional (ARAÚJO, 2006). Nesse contexto de reformas educacionais, em 1996, foram aprovados no Brasil novos arcabouços legais, entre eles, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF). Além disso, também foram propostos novos referenciais curriculares, entre eles, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Estes documentos inseriram a Educação Ambiental como um tema transversal - meio ambiente – que deveria 58 ser abordado em todas as disciplinas da matriz curricular. Segundo os PCN, seria preciso educar os brasileiros para: (...) que ajam de modo responsável e com sensibilidade, conservando o ambiente saudável no presente e para o futuro; saibam exigir e respeitar os direitos próprios e os de toda a comunidade, tanto local como internacional; e se modifiquem tanto interiormente, como pessoas, quanto nas suas relações com o ambiente (BRASIL, 1998, p. 181). A inserção desta temática no currículo colocou novas demandas para os professores que deveriam contemplar em suas práticas pedagógicas a questão ambiental. Frente às reformas educacionais moldadas em diferentes contextos históricos, o professor ocupou posição de destaque nas decisões políticas públicas. Que interesses o Estado nutre pela profissão docente? Quais as concepções de formação que norteiam as políticas de educação ambiental? Na próxima seção, procura-se focalizar a profissão docente, seu papel social, destacando a formação continuada como atual eixo das políticas públicas na Educação Ambiental. 2.2 – Formação continuada de professores: fundamentos teóricos para análise Nesta seção pretende-se discutir a trajetória da profissão docente, além da conceituação e dos modelos teóricos que fundamentam a formação continuada de professores. Nóvoa (1995) afirma que a função do professor surgiu de maneira secundária e não especializada ao longo dos séculos XVII e XVIII, papel outrora exercido pelos religiosos ou leigos das mais diversas origens. Algumas congregações religiosas acabaram por constituir com o passar do tempo congregações docentes, existentes e respeitadas até os dias atuais. A influência religiosa não desapareceu com o processo de profissionalização 59 docente, mas a missão de educar deu lugar à prática de um ofício e a vocação cede lugar à profissão. Os valores morais e éticos permaneceram impregnados nesse novo ofício chamado professor, ao ponto de até os dias atuais muitos docentes encararem o magistério como um sacerdócio e suportarem todos os fardos da profissão sem um posicionamento mais crítico e político. Nóvoa (1995) justifica esta situação pelo fato de ter sido sempre imposta pelo exterior (Igreja e Estado) as regras deontológicas à profissão, não oportunizando o próprio professor decodificar as regras. Foi a partir do processo de estatização do ensino que gradativamente ocorreu à substituição do corpo docente religioso (controlado pela Igreja) por um corpo docente laico (controlado pelo Estado). Enguita (1989) defende que a transferência do poder sobre a educação das mãos da Igreja para as mãos do Estado ocorreu com o surgimento da sociedade industrial, onde a demanda pela formação do indivíduo capacitado para o mundo do trabalho e moldado para o ambiente fabril atendeu uma exigência econômica. A escola deveria ser capaz de intervir na organização impessoal da sociedade industrial, exercendo uma autoridade burocrática similar ao da exigida pelo ambiente do trabalho. A autoridade paternalista exercida pela família e a autoridade religiosa exercida pela Igreja já não eram mais suficientes na formatação do novo homem da Idade Moderna, logo a escola foi criada com este fim. Uma das características fundamentais da educação na escola é a sua dimensão onipresente de educação para a docilidade (ENGUITA, 1989) Ainda segundo este autor, o papel do professor seria representado pela autoridade que lhe conferisse a competência em: Ter capacidade de controle da classe; Manter a ordem e impor a disciplina; Ensinar um comportamento da forma que corresponda a um coletivo em que foram incluídos; Rejeitar a individualidade; Premiar a correta conduta estabelecida; O professor deve reduzir centenas de crianças tanto quanto seja possível a uma unidade. (ENGUITA, 1989 apud TYACK, 1974:54) 60 Nóvoa (1995) reconhece o papel interventor do Estado na profissionalização do professor, responsável por homogeneizar e hierarquizar a escala nacional todos os grupos. O professor do século XVIII deveria atender aos desígnios políticos e sociais do Estado, e somente teriam uma licença ou autorização mediante ao preenchimento de determinados requisitos (habilitações, idade, comportamento moral, etc.). De acordo com este autor (1995): Os professores são funcionários, mas de um tipo particular, pois a sua acção está impregnada de uma forte intencionalidade política, devido aos projectos e às finalidades sociais de que são portadores. No momento em que a escola se impõe como instrumento privilegiado da estratificação social, os professores passam a ocupar um lugar-charneira nos percursos de ascensão social, personificando as esperanças de mobilidade de diversas camadas da população: agentes culturais, os professores são também, inevitavelmente, agentes políticos (NÓVOA, p. 17). No século XIX, com o aumento da demanda para atender uma crescente população não escolarizada, os professores sistematicamente defendiam o caráter especializado de sua profissão e sua grande relevância social. Foram então, pela justaposição de interesses docente e estatal, criadas as instituições de formação. Como assinala Nóvoa (1995): As escolas normais representam uma conquista importante do professorado, que não mais deixará de se bater pela dignificação e prestígio destes estabelecimentos: maiores exigências de entrada, prolongamento do currículo e melhoria do nível acadêmico são algumas das reivindicações inscritas nas lutas associativas dos séculos XIX e XX. As escolas normais estão na origem de uma verdadeira mutação sociológica do corpo docente: o “velho” mestre-escola é definitivamente substituído pelo “novo” professor de instrução primária ( p. 18). No Brasil a formação de professores tomou fôlego no final do século XIX, com a criação das Escolas Normais destinadas a formar profissionais que ensinassem “as primeiras letras”. Entretanto, mesmo com a criação destas instituições, e com a introdução no mercado de trabalho de uma mão-de-obra especializada para atender a demanda da 61 sociedade, a oferta de escolarização da população ainda era escassa e destinada a poucos privilegiados (GATTI, 2009). No início do século XX, a escola passou a ser vista como propulsora do progresso de uma nação e seus professores como peças fundamentais que auxiliariam os indivíduos a ascenderem socialmente. Foi os anos dourados da profissão docente, de acordo com Nóvoa (1995). Gatti (2009) afirma que, no início deste século, o Brasil voltou as suas atenções para a formação de professores para o ensino secundário. Criaram-se, então, cursos dentro das Universidades com este perfil. Este nicho de mercado de trabalho era ocupado anteriormente por profissionais liberais e autodidatas. De acordo com a autora: Então, nos anos 1930, a partir da formação de bacharéis, acrescenta-se um ano com disciplinas da área de educação para a obtenção da licenciatura, esta dirigida à formação de docentes para o ensino secundário (formação que veio a denominar-se 3 + 1). Esse modelo vai se aplicar também ao curso de Pedagogia, regulamentado em 1939, destinado a formar bacharéis especialistas em educação e, complementarmente, formar professores para as Escolas Normais, os quais tinham também, por extensão e portaria ministerial, a possibilidade de lecionar algumas disciplinas no ensino secundário (GATTI, 2009, p. 37). A partir das décadas de 1960 e 1970, com o regime militar no Brasil, ocorreu um intenso processo de desvalorização do professor e desmantelamento da escola pública que ainda repercute na atualidade. Com a Lei n° 5.692/71, responsável por reformular a educação básica no Brasil, a formação de professores foi transformada em habilitação para o magistério, o que significou um golpe nas Escolas Normais. As antigas escolas perderam a sua especificidade e identidade. Gatti (2009) levanta uma importante polêmica acerca da formação no Brasil, assinalando que as Licenciaturas no período de 1960 até o final da década de 1980 62 denunciam uma grande imprecisão quanto ao perfil do profissional formado: dividido entre uma área específica ou professor. “Matemático ou professor de Matemática? Geógrafo ou professor de geografia? Físico ou professor de física?” (p. 71). Esta questão até hoje em pauta, quando se estudam essas formações (GATTI, 2009). Vale ressaltar que, neste período, o país foi silenciado pelo Regime Militar. Neste contexto, enfatizou-se a dimensão técnica da preparação do professor, minimizando o seu caráter crítico e reflexivo. A formação de professores foi compreendida como mera qualificação de recursos humanos para a educação (FREITAS, 2002). Freitas (2002) afirma que a ruptura com a tendência tecnicista, responsável por orientar as políticas públicas para a formação de professores no Brasil, ocorreu na década de 1980 com o fim da Ditadura Militar no país. Decretada a anistia para os exilados políticos, o país tornou-se território fecundo para as idéias importadas de diversos países, principalmente do continente europeu. O efervescente movimento social, aliado ao processo de resgate da democracia, contribuiu para o avanço na concepção de formação de educador com caráter social-histórico. A sociedade passou a exigir “um profissional de caráter amplo, com pleno domínio e compreensão da realidade de seu tempo, com desenvolvimento da consciência crítica que lhe permita interferir e transformar as condições da escola, da educação e da sociedade (FREITAS, 2002, p. 4). As modificações curriculares para a formação do professor foram bastante significativas para os profissionais que atuam no I segmento do Ensino Fundamental, principalmente para aqueles cuja formação inicial está calcada no curso de Pedagogia. Entretanto, a formação dos professores, do segundo segmento do Ensino Fundamental e Ensino Médio, pouco foi modificada nos cursos de Licenciatura (FREITAS, 2002). Na década de 1990, o pensamento tecnicista novamente retoma espaço, com nova roupagem, nas políticas educacionais. As concepções neoliberais defendidas pelo governo 63 de Fernando Henrique Cardoso (FHC) representaram um retrocesso na formulação de propostas para a formação de professores, que recuperava a construção do professor como sujeito histórico e protagonista de sua prática (FREITAS, 2002). Segundo Freitas (2002), nesta década, a educação e a formação de professores ganharam importância estratégica no âmbito das grandes reformas educacionais, principalmente, a partir de 1995. No período, o governo defendeu a bandeira da qualificação da educação e a capacitação dos recursos humanos como instrumentos necessários para fazer frente à grande competitividade imposta pelo processo de globalização. Seguindo as diretrizes do Banco Mundial, o governo de FHC investiu na expansão dos Institutos Superiores de Educação (ISEs) e cursos normais superiores, buscando atender a Educação Básica. O caráter da formação de professores promovida pelos ISEs enfatizou o aspecto técnico e instrumental, a partir dos quais os professores deveriam estar aptos para solucionarem problemas da prática cotidiana no ambiente escolar (FREITAS, 2002). O ensino superior e suas problemáticas não tiveram relevância no governo de FHC por considerar: (...) inviável para o poder público financiar a preços das universidades 'nobres' a formação de seus professores de educação básica que se contam em mais de milhão. Com um volume de recursos muito menor, um sistema misto de custo baixos, tanto públicos quanto privados, configura um ponto estratégico de intervenção para promover melhorias sustentáveis a longo prazo na escolaridade básica (FREITAS, 2002, p. 7 apud MELLO, 1999). Observa-se neste período um significativo aumento de cursos e instituições de ensino superior para a formação de professores, que segundo Freitas (2002) possuía baixo custo e caráter técnico-profissional. E, ainda, oferecia “uma qualificação mais ágil, flexível, adequada aos princípios da produtividade e eficiência e com adequação às demandas do mercado competitivo e globalizado” (FREITAS, 2002, p. 8). 64 De acordo com Gatti (2008), o crescente investimento das políticas públicas na formação continuada como aprimoramento profissional foi uma medida compensatória para suprir as lacunas da formação inicial docente. A certificação e habilitação dos profissionais docentes em exercício, chamada de “formação em serviço”, cresceu em todo o país paralelamente a formação inicial. Freitas (2002) também assinala que o “aligeiramento” da formação inicial procurou ser compensado pela formação continuada de professores. Ainda segundo a autora, a concepção pragmática e conteudista foram reforçadas neste modelo de profissionalização docente. Para Nóvoa (1995), o intenso investimento na formação continuada de professores foi o caminho encontrado na década de 1990, considerando-se os problemas estruturais da formação inicial. Entretanto, alerta o autor, a formação continuada de professores: (...) não se constrói por acumulação (de cursos, de conhecimentos ou de técnicas), mas sim através de um trabalho de reflexividade crítica sobre as práticas e de (re) construção permanente de uma identidade pessoal. Por isso é tão importante investir a pessoa e dar um estatuto ao saber da experiência (NÓVOA, 1995, p. 25). O saber docente, segundo Tardif (2000), é fruto da história pessoal e profissional de cada pessoa, fortemente influenciado pela experiência de vida do professor. O saber docente, de acordo com o autor, reúne competências, habilidades (aptidões) e atitudes, chamado de “saber-fazer” e “saber-ser”. A construção destes saberes não se limita, entretanto, a formação inicial do professor, existe um continuum em sua formação. Segundo Tardif (2000): Nesta concepção de formação como um contínuo ao largo da vida profissional, o conceito subjacente é o de desenvolvimento profissional. O processo de formação é definido como um movimento orientado a responder aos diversos desafios que se sucedem no que se poderia identificar como diferentes fases da vida profissional: o início da carreira, o processo de desenvolvimento e os tempos mais avançados em que o professor consolida sua experiência profissional (GATTI, 2009, p.203). 65 Nascimento (1996) amplia o conceito de formação continuada para toda e qualquer atividade de formação do professor que exerce sua função no âmbito escolar, posterior a sua formação inicial, através de cursos de especialização e extensão promovidos pelas instituições de nível superior, incluindo também todas as atividades propostas pelas instituições de ensino que corroboram com esta finalidade. Destaca-se, dentro desta amplitude, o conceito de formação em serviço que se processa no próprio local de trabalho dos professores, contemplando as atividades inseridas no espaço de trabalho, promovidas por instâncias superiores de ensino. Diversos processos de formação continuada de professores foram propostos no âmbito de políticas públicas educacionais. A literatura, entretanto, aponta para os resultados escassos dessas iniciativas que não alavancam, em sua maioria, as mudanças esperadas nas escolas. Gatti (2009) procura elencar algumas das razões que explicariam estes parcos resultados: “dificuldade da formação em massa; brevidade dos cursos realizados nos limites dos recursos financeiros destinados; (...) ou ainda pelo nível de preparação das instituições formadoras, os instrumentos e o apoio necessários para a realização das mudanças esperadas” (GATTI, 2009, p. 201). Para Nóvoa (1995), a formação promovida pelas políticas públicas deveria ser capaz de estimular uma perspectiva crítico-reflexiva, fornecendo aos professores um pensamento autônomo e que venha facilitar as dinâmicas de autoformação participativa. Ampliando o debate acerca da formação continuada de professores, Demailly (1995) apresenta quatro modalidades de formação: Forma universitária: É um modelo no qual a relação simbólica formador-formando tem semelhança com a que as profissões liberais mantêm com os seus clientes. O que caracteriza esta forma é a personalização vincada da relação pedagógica, não no sentido do carácter afectivo ou da individualização das aprendizagens, mas no sentido da valorização do caráter pessoal (original) do ensino ministrado, ou no 66 caso da formação contínua, das competências, do prestígio e das tomadas de posição pessoais do formador. Forma escolar: Na forma escolar, o ensino é organizado por um poder legítimo exterior aos professores: Igreja, Estado ou Nação... Os professores (ou os formadores) têm de ensinar saberes que são definidos exteriormente num programa oficial, o lugar depositário da definição e da legitimidade dos programas, que pode ser o Estado ou os seus representantes hierárquicos (a autarquia, o estabelecimento de ensino, ou qualquer instância legítima), mas em nenhum caso o professor ou os professores. Forma contratual: O modelo contratual caracteriza-se por uma negociação sob modalidades diversas), entre diferentes parceiros ligados por uma relação contratual, do programa pretendido e das modalidades materiais e pedagógicas da aprendizagem. Forma interactiva-reflexiva: O último modelo de formação identificado é a forma interactiva-reflexiva, que abrange as iniciativas de formação ligadas à resolução de problemas reais, com a ajuda mútua de formadores e uma ligação à situação de trabalho. (DEMAILLY, 1995, p.142-143) As formas descritas acima são modelos ideais. Na realidade, não encontramos um modelo puro, comumente eles se apresentam mesclados. Nóvoa (1995) classifica os modelos de formação continuada de professores em dois tipos: estruturante e construtivista. No modelo estruturante segundo o autor, o caráter científico e técnico da formação de professores possibilita a sua aplicação a diversos grupos de indivíduos, logo, sua eficiência em curto prazo tem maiores resultados. O modelo estruturante contempla as formas universitárias e escolares. No modelo construtivista, de acordo com Nóvoa (1995), o caráter reflexivo e contextualizado na formação de professores, regulam as práticas e processos do trabalho escolar, repensando a profissão docente e a estrutura educacional. Este modelo apresenta resultados a médio e longo prazo, todavia, é capaz de mudar os rumos da prática escolar e de seus atores sociais. O modelo construtivista contempla as formas contratual e interativo-reflexivo de Demailly (1995). O pressuposto teórico adotado neste trabalho defende a perspectiva críticoreflexiva e o modelo construtivista na formação continuada de professores. Além de um processo multidimensional e uma visão holística da formação docente. 67 A formação continuada de professores em Educação Ambiental é um campo relativamente novo. As diretrizes educacionais que norteiam este processo estão intimamente atreladas ao próprio modelo educacional, adotado pela secretarias de educação e pelas instituições privadas. As propostas para tal formação, geralmente, não conseguem avançar o processo de enraizamento da Educação Ambiental, aprofundando um debate mais político. Na próxima seção apresentaremos um caminho teórico e metodológico para uma formação continuada de professores comprometida com a perspectiva crítico-reflexiva em Educação Ambiental e o modelo construtivista na educação. 2.3 – Formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar A proposta para a formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar defendida por esta pesquisa aponta para a construção de outro modelo societário diferente do que está posto pela atual conjuntura. Vários autores críticos denominam o processo educativo capaz de gerar profundas mudanças socioambientais, como Educação Ambiental crítica, transformadora, emancipatória ou popular. Capaz de provocar mudança da nossa visão de mundo, a fim de construir uma consciência ambiental individual e planetária. E, que leve a reflexão sobre o papel de cada sujeito e sua ação política local e global. Segundo Loureiro (2006): Entendemos que falar em Educação Ambiental transformadora é afirmar a educação enquanto práxis social que contribui para o processo de construção de uma sociedade pautada por novos patamares civilizatórios e societários distintos dos atuais, na qual a sustentabilidade da vida, a atuação política consciente e a construção de uma ética que se afirme como ecológica sejam seu cerne ( p. 90). 68 O sujeito-objeto desse trabalho é o professor, especificamente no processo de formação continuada em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. Que diretrizes educacionais podem nortear este processo rumo à mudança almejada? Guimarães (2007) defende uma proposta de formação de educadores ambientais capaz de romper com o paradigma hegemônico presente em grande parte dos cursos e ações, que refletem de alguma maneira as políticas públicas disseminadas, cujo alvo é capacitar multiplicadores e disseminadores da lógica capitalista. A orientação das ações no âmbito das políticas públicas para a formação continuada de professores enfatiza a difusão de informações e técnicas, que são recebidas pelos professores através de cursos. Espera-se então, que estes sejam capazes de produzir a mudança na vida das escolas. Expectativa frustrada na maioria das experiências, de acordo com a literatura (GATTI, 2009). Pensando em novas orientações que sejam capazes de promover uma formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, na qual os professores estejam aptos a participar da construção de ambientes educativos dentro de uma perspectiva crítica, Guimarães (2007) traz importantes reflexões. Estas reflexões têm o objetivo de iluminar o campo teórico para a formação continuada de professores em EA, por meio de eixos formativos. O primeiro eixo formativo, de acordo com o autor, consiste no exercício de romper com a “armadilha paradigmática”. Grün (2000) detecta a forte influência do modelo cartesiano-newtoniano na estrutura curricular e no âmbito escolar, através do pensamento antropocêntrico reproduzido nos livros-textos e nos comportamentos culturais conflitantes com a natureza. O “eu” é quase sempre visto como um usuário de tecnologias e os “recursos naturais” são vistos como aquele capaz de dar sustentação a esta tecnológica. Os recursos naturais são o carvão, o óleo, etc. Neste 69 nível, podemos constatar que o que determina se um hábitat tem valor ou não é a tecnologia (GRÜN, 2000, p. 47). A dirupção, o fragmentalismo e o individualismo independente dos ecossistemas são pontos importantes da orientação cartesiana do currículo. Mas não são os únicos. O cartesianismo manifestou-se também na que não é dito. Naquilo que o cartesianismo não deixou que viesse à tona. São áreas do silêncio do currículo na educação moderna (GRÜN, 2000, p. 48). Grün (2000) afirma que são raras as preocupações a respeito das bases conceituais e epistemológicas sobre a Educação Ambiental, apesar de esta estar em crescente ascensão no debate promovido pela sociedade. Romper com a aparente naturalização de tudo é o primeiro desafio para não cair na limitação compreensiva do cartesianismo para a “crise ecológica” vivida atualmente. Para Freire (2002), além da ruptura, é preciso outro elemento chamado superação, a priori, da ingenuidade associada ao saber senso comum, por meio da criticidade. A crítica fruto da curiosidade em não aceitar docilmente e satisfatoriamente toda e qualquer explicação a respeito dos fenômenos naturais e sociais. A curiosidade como inquietação indagadora, como inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, como sinal de atenção que sugere alerta faz parte integrante do fenômeno vital. Não haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que nos põe pacientemente impacientes diante do mundo que não fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos (FREIRE, 2002, p.15). A crítica também precisa ser autocrítica. Freire (2002) diz que para ensinar é preciso respeitar os saberes dos educandos. A auto-avaliação não é apenas do professor, mas principalmente da escola. Os saberes escolares que são perpetuados e sacramentados devem ser questionados qual a sua finalidade e objetividade. Por que não contextualizar os conteúdos abordados a vivência real dos educandos que habitam regiões destituídas e desamparadas pelo poder público? Freire (2002) indaga o porquê da existência de lixões 70 em bairros pobres e não em bairros ricos. É preciso estabelecer uma “intimidade” entre os saberes curriculares fundamental ao desenvolvimento dos alunos, com suas experiências sociais enquanto indivíduos. E, que possuem saberes oriundos da construção social decorrentes de suas histórias de vidas. Conhecer a realidade e os saberes dos educandos, assim como o entorno escolar na qual vivem requer pesquisa. Para Freire (2002) o ensino não pode ser divorciado da pesquisa. Na formação de educadores ambientais faz se necessário resgatar o professorpesquisador. Suas indagações e curiosidade crítica o conduzirão a realizar intervenções no processo ensino-aprendizagem, cujo aprendiz também será o professor, a cerca da realidade socioambiental com que trabalha. (...) nas condições de verdadeira aprendizagem os educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo. Só assim podemos falar realmente de saber ensinado, em que o objeto ensinado é apreendido na sua razão de ser e, portanto, aprendido pelos educandos (FREIRE, 2002, p 13). Guimarães (2007) diz que a intervenção processual24 numa data realidade socioambiental é capaz de provocar a sinergia25, ou seja, um movimento coletivo conjunto de resistência que almeja a construção de uma nova sociedade. Este se constitui o segundo eixo formativo defendido pelo autor. 24 A intervenção pontual parte do pressuposto que a mudança individual é capaz de transformar a realidade de cada indivíduo. Todavia, ela não é capaz de provocar a intervenção processual, uma vez que não consegue contemplar a totalidade dos atores sociais envolvidos (GUIMARÃES, 2007). 25 Guimarães (2007) diz que a definição para a palavra sinergia encontrada no Dicionário Brasileiro de Ciências Ambientais, compreende um “fenômeno que ocorre quando a interação de duas causas provoca um efeito total maior do que a soma dos efeitos das duas, agindo separadamente. Por extensão, qualidade de qualquer fenômeno no qual um todo é mais ativo, eficiente e produtivo do que a soma de suas partes.” 71 A educação em uma perspectiva crítica se propõe a formar dinamizadores de ambientes educativos26 (e não multiplicadores), que, ao compreenderem a complexidade dos processos (movimentos) sociais, motivados pela reflexão crítica, mobilizem (mobilização = ação em movimento – práxis), com sinergia, processos de intervenção sobre as dinâmicas constituídas e constituintes da realidade socioambiental. Portanto, reciprocamente, esses movimentos são ambientes educativos e ambientes educativos são movimentos e os dinamizadores (educadores ambientais) os alimentam. A percepção e a fomentação do ambiente educativo como movimento, acredito ser o terceiro eixo formativo para o trabalho de formação do educador ambiental (GUIMARÃES, 2007, p. 135). Lançar um olhar para o interior da escola e romper com um modelo conservador e comprometido com o pensamento hegemônico da classe burguesa requer coragem. Instalar uma intervenção processual requer a quebra da estrutura engessada, dentro da qual foi moldada a escola. A fragmentação do espaço e tempo escolar em disciplinas e horários diversos precisa ser reformulada por uma proposta pedagógica capaz de possibilitar a integração daquele que trabalha, estuda e vive a escola. Tal proposta está diretamente ligada ao pensamento e perfil da liderança escolar. Freire (2002) diz que o ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação. O quarto eixo formativo defendido por Guimarães (2007) capaz de contribuir na formação do educador ambiental crítico é investir na liderança escolar. “É fundamental trabalhar o educador ambiental como uma liderança que dinamize esse movimento coletivo conjunto de resistência (GUIMARÃES, 2007, p. 26).” Assumir o papel político na história a favor dos excluídos, é antes de tudo, um compromisso com a ética em defesa da vida. O educador ambiental crítico enquanto liderança escolar precisa rejeitar a “educação bancária”, definida por Freire (2002), como a qual transfere, deposita, oferece, doa ao outro conhecimento, numa atitude em que o considera um paciente de seu pensar. 26 “O ambiente educativo não é um espaço físico escolar. O ambiente educativo se constitui nas relações que se estabelecem no cotidiano escolar entre a escola e determinada comunidade, entre comunidade e sociedade, entre seus atores, nos embates ideológicos por hegemonia; portanto, é movimento complexo das relações” (GUIMARÃES, 2004, p. 142). 72 “Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção (FREIRE, 2002, p. 21).” Por isso, o educador ambiental como liderança, um “sujeito ecológico”, percebe a dinâmica da sociedade constituída por relações de poder que geram um movimento dominante (caminho único/correnteza do rio). Concretiza sua liderança, exercendo sua cidadania e estimulando outros num movimento de resistência para criar opções, diferentes caminhos; ocupando espaços, por reconhecer as brechas em suas limitações e possibilidades; tornando-se ele próprio e outros, atores individuais e simultaneamente coletivos em um movimento conjunto. Sujeitos, por interferirem no processo histórico de constituição da realidade social, pela transposição dos referenciais paradigmáticos (epistemológicos) da disjunção para os da complexidade, baseados em novas perspectivas ético-políticas que contemplem as aspirações de justiça socioambiental e de transformação das condições materiais na estruturação de uma nova realidade socioambiental (GUIMARÃES, 2007, p. 26). O trabalho escolar precisa ser reorientado por uma lógica ambiental, que supere a escola informativa para a escola formativa apresentada por Penteado (1994). É preciso propiciar um espaço para a formação de seres humanos capazes de criar e ampliar a sua participação na tomada de decisões políticas quanto aos problemas socioambientais (PENTADO, 1994). Superar o modelo de “educação bancária” descrita por Freire (2002) e escapar das armadilhas paradigmáticas, no dizer de Guimarães (2007). Entretanto, a grande maioria dos professores em exercício no magistério encontrase engessados por este modelo educacional conservador. Produto de sua história individual e profissional, emersa numa cultura educacional tradicionalista. Não são apenas os professores que refletem tal modelo, mas toda a estrutura escolar: matriz curricular, organização do espaço-temporal do ambiente escolar, gestão na escola, orientação das políticas públicas no âmbito das Secretarias Municipais e Estaduais de Educação, cultura escolar dos responsáveis por alunos e os próprios educandos já formatados ao modelo hegemônico. Contudo, o quinto eixo formativo indispensável ao processo de formação de 73 educadores ambientais críticos, reside no enfrentamento a esse modelo educacional. É preciso que a perspectiva construtivista da educação seja inserida ao processo de formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. Freire (2002) menciona que a acomodação ao sistema é uma forma de inserção nele. “Ninguém pode estar no mundo, com o mundo e com os outros de forma neutra (FREIRE, 2002, p. 30)”. O posicionamento do professor diante do modelo educacional hegemônico passa por um ato político, seja ele divergente ou convergente ao sistema. Que proposta é apresentada para resolver tal impasse? Guimarães (2007) sinaliza o sexto eixo formativo (estimular a percepção que o processo educativo se faz aderido ao movimento da realidade social) para a formação de educadores ambientais como elemento a ser trabalhado dentro do real processo social da escola, e não fora dela. Ele usa a metáfora do rio para exemplificar a inserção deste eixo, que diz: “Não adianta criarmos uma correnteza fora do rio, pois não conseguiremos mudar seu curso (GUIMARÃES, 2007, p.138).” A mudança no mundo é possível, ensinar para Freire (2002) reforça a convicção nesta afirmação. Somos sujeitos da História e não mero objeto dela. O mundo está sendo construído por seus atores sociais do presente, que redesenham o esboço do futuro por meio de sua intervenção na História. É a partir deste saber fundamental: mudar é difícil mas é possível, que vamos programar nossa ação político-pedagógica, não importa se o projeto com o qual nos comprometemos é de alfabetização de adultos ou de crianças, se de ação sanitária, se de evangelização, se de formação de mão-de-obra técnica (FREIRE, 2002, p.31). É preciso porém que tenhamos na resistência que nos preserva vivos, na compreensão do futuro como problema e na vocação para o ser mais como expressão da natureza humana em processo de estar sendo, fundamentos para a nossa rebeldia e não para a nossa resignação em face 74 das ofensas que nos destroem o ser. Não é na resignação mas na rebeldia em face das injustiças que nos afirmamos (FREIRE, 2002, p.31). Loureiro (2002) afirma que o processo educativo é resultado da construção social repleta de subjetividade, de escolhas valorativas e de vontades políticas, capacitando-o a ser um poderoso aliado na reprodução do sistema. “O educador ambiental que supera essa proposição busca, na compreensão da realidade socioambiental, na percepção do que movimenta a comunidade/sociedade, encontrar caminho de intervir (GUIMARÃES, 2007, p. 139).” Nesse sentido, a educação pode servir como um meio de renovação cultural, política e ética na sociedade, potencializando o desenvolvimento de indivíduos emancipados (LOUREIRO, 2002). O educador ambiental precisa ter consciência de sua existência e de seu papel social frente aos desafios do mundo. Freire (2002) destaque que a segurança em si mesmo constitui uma das qualidades essenciais desse personagem, e deve fazer parte da autoridade docente democrática. A segurança do educador ambiental no seu fazer pedagógico, ao posicionar-se com firmeza naquilo que acredita e sonha está atrelada a sua auto-estima. Guimarães (2007) defende como sétimo eixo formativo para a formação de educadores ambientais o trabalho com a auto-estima do professor, assim como a valorização de sua função social. O educador ambiental precisa crer e confiar em seu potencial transformador por meio da ação pedagógica articulada a um movimento em conjunto no cerne escolar. Embora as políticas públicas apontem para a desvalorização da profissão docente nas últimas décadas, cerceando sua capacidade produtiva e reflexiva dentro da escola, o professor precisa reagir e se articular neste contexto configurado também pela crise nas relações de trabalho. Freire (2002) alerta para a ponderação que deve estar presente neste movimento de resgate a auto-estima docente. A arrogância acadêmica pode ofuscar o 75 movimento, dentro do qual o professor precisa se olhar, reconhecendo suas limitações e potencialidades. A construção deste eixo na formação continuada de professores em EA precisa estar pautada em relações de respeito, alinhavado à ética e a valores morais entre todos os atores sociais que fazem parte do ambiente escolar. A arrogância farisaica, malvada, com que julga os outros e a indulgência macia com que se julga ou com que julga os seus. A arrogância que nega a generosidade nega também a humildade, que não é virtude dos que ofendem nem tampouco dos que se regozijam com sua humilhação. O clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, humildes, generosas, em que a autoridade docente e as liberdades dos alunos se assumem eticamente, autentica o caráter formador do espaço pedagógico (FREIRE, 2002, p.36). O fortalecimento das relações sociais no âmbito escolar, através do desenvolvimento de projetos de intervenção em Educação Ambiental e criação de Agenda 21 Escolar, poderão servir como um fio condutor que conduzirá a uma discussão mais ampla sobre a própria condição de trabalho e pertencimento de classe a que o professor faz parte. Dentro desta perspectiva crítica da formação de educadores ambientais em seu ambiente escolar, há a possibilidade de se descortinar a realidade, estabelecendo, segundo Guimarães (2007) relações entre o micro e o macro, entre o local e o global. Neste processo educativo, na qual se constroem relações pautadas no diálogo e na formação de uma consciência individual e coletiva, a formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar aponta para o oitavo eixo formativo. “Trabalhar com a percepção de que o processo educativo não se restringe ao aprendizado individualizado dos conteúdos escolares, mas se dá na relação de um indivíduo com o outro, de um indivíduo com o mundo (GUIMARÃES, 2007, p. 143).” 76 As relações construídas no ambiente escolar devem superar a limitação do saber escolar calcado na mera transmissão de conhecimentos, negando a produção destes. Chassot (2000) afirma que o saber escolar é antes de tudo um saber político, e este precisa ganhar novos significados a realidade vivenciada por docentes e discentes. Usualmente a Escola costuma transmitir um saber que ela não produziu (e, às vezes, nem entende), mas o corteja, principalmente, porque traz o rótulo da validação acadêmica. Por outro lado, também não entende – não sabe explicar – os saberes que são próprios da comunidade onde está inserida e por isso os rejeita, até porque estes não são reconhecidos pela Academia, pois esta, em muitas situações, também não os sabe explicar (CHASSOT, 2000, p. 204-205). Logo, a transformação socioambiental que se espera que aconteça no ambiente escolar e de seu entorno precisarão valorizar e respeitar a cultura local e os saberes populares de uma determinada comunidade. “Assim a Escola, muito mais que ser vista como reprodutora do conhecimento, deve ser pensada nas suas amplas possibilidades de fazer uma Educação crítica” (CHASSOT, 2000, p. 206). Este é um compromisso e uma importante postura a ser assumida por docentes. Postura que precisa ser defendida também, juntamente às propostas para a formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar. Quanto às mudanças socioambientais no âmbito educacional, Loureiro (2002) sinaliza que as propostas metodológicas e práticas precisam estar bem alicerçadas e devidamente orientadas política e teoricamente, a fim de alcançar a transformação almejada. Orientações que abandonem de acordo com Grün (2000), um modelo ou matriz normativa reducionista, fragmentário, sem vida e mecânico, todavia seja complexo, holístico, vivo e orgânico. Diante disso, a formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar poderá contribuir para a “(...) sensibilização do educador ambiental para uma permanente autoformação eclética (...) (GUIMARÃES, 2007, p. 145).” Ou seja, 77 o professor irá deparar-se com um novo paradigma de sua formação, na qual o permitirá “(...) transitar das ciências naturais às ciências humanas e sociais, da filosofia à religião, da arte ao saber popular, para que possa atuar como um interlocutor na articulação dos diferentes saberes (GUIMARÃES, 2007, p. 145).” Para Guimarães (2004) este aspecto da formação se constitui o nono eixo formativo, que vem ao encontro do próprio caráter da EA, exigindo a ação pedagógica interdisciplinar. A práxis interdisciplinar que se pretenda realizar no cotidiano escolar enfrenta as resistências de práticas fragmentárias cristalizadas nesse cotidiano. No entanto, o início (saída da inércia) de um movimento interdisciplinar na escola depende incisivamente da vontade de fazer diferente. Esse é o primeiro passo. A interdisciplinaridade se constrói vivência do processo, motivando até mesmo que outros se juntem. E para que haja movimento, é preciso que exista uma “atitude interdisciplinar”, conforme nos apresenta Ivani Fazenda, uma predisposição a estar aberto ao outro, ao diálogo – característica geradora de sinergia, que compõe de fato o processo em movimento e que não depende de intervenções de secretarias estaduais ou municipais ou de direção de escolas. Depende da intenção do educador (GUIMARÃES, 2007, p. 145). Entretanto, a ruptura com o modelo educacional conservador não ocorre de forma homogênea no tempo e no espaço para todos no ambiente escolar. A divergência ideológica e de concepções de mundo entre os educadores ambientais deve ser enfrentada com sabedoria e moderação. É preciso ter cautela e uma generosa dosagem de paciência por parte daqueles educadores ambientais comprometidos com a educação crítica, quanto aos seus pares que ainda não ousaram defender essa bandeira. Todavia, o ambiente escolar tenderá a se tornar um campo bélico, comprometendo o ideal mais nobre: transformar a realidade socioambiental de uma dada comunidade escolar. Guimarães (2007) aponta para o exercício da emoção como décimo eixo formativo, a fim de driblar o possível mal-estar gerado no cerne escolar. O que vem a ser o exercício da emoção? Pode-se compreender “(...) como forma de desconstrução de uma cultura individualista extremamente calcada na 78 razão. E da construção do sentimento de pertencimento ao coletivo, ao conjunto, ao todo, representado pela comunidade e pela natureza (GUIMARÃES, 2007, p. 147)”. Morin (2001) examina a influência das emoções como elemento essencial ao comportamento humano, e indispensável ao processo educacional. A compreensão e empatia com o próximo tende a minimizar a influência do individualismo propagado pela sociedade capitalista. O exercício de colocar-se no lugar do outro, respeitando seus saberes e sua vivência – além de fortalecer as relações humanas, é salutar ao processo de ensino e aprendizagem. Assim, aprendemos com o outro. Freire (1987) reafirma esta proposição ao dizer que “Ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão (FREIRE, 1987 p. 29).” Somente quando os oprimidos descobrem, nitidamente, o opressor, e se engajam na luta organizada por sua libertação, começam a crer em si mesmos, superando, assim, sua “conivência” com o regime opressor. Se esta descoberta não pode ser feita em nível puramente intelectual, mas da ação, o que nos parece fundamental, é que esta não se cinja a mero ativismo, mas esteja associada a sério empenho de reflexão, para que seja práxis (FREIRE, 1987, p. 29). A comunhão é fonte de renovação, esperança e perseverança dentro do processo de construção de uma Educação Ambiental crítica. Compartilhar frustrações, sonhos, erros e acertos ao longo do percurso mantém acesa a convicção dentro de cada indivíduo de que a transformação social é possível. É para a vida e pela vida da presente e futura geração de toda e qualquer espécie no planeta, que lutamos! O décimo eixo formativo e último apontado por Guimarães (2007) para a formação continuada de professores em EA faz uma síntese de toda retórica construída até aqui. “A perplexidade, o estranhamento, o polêmico, a problematização, a relativização, a complexificação, o envolvimento emocional (2007, p. 37)” constituem um mosaico para o trabalho na formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar. 79 Completando o sentido em “trabalhar a coragem da renúncia ao que está estabelecido, ao que nos dá segurança, e a ousadia para inovar (2007, p. 37).” A problematização do ensino é um dos primeiros passos para este trabalho, de acordo com Guimarães (2007). A construção de conceitos fundamentais em EA, por meio de “temas introdutórios” precisa deixar claros os referenciais teóricos-metodológicos que o alicerçam, traçando o esboço para onde queremos ir (LOUREIRO, 2006). Definir o caminho para aonde se quer chegar é fundamental, no que diz respeito à formulação das políticas públicas para o campo da formação de professores. O estado do Rio de Janeiro tem redesenhado o seu papel político, através da promoção de ações no âmbito do Programa Estadual de Educação Ambiental. Dentre essas ações, ressalta-se o intenso investimento com recursos do FECAM à formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, desde 2007. Em toda a história da Educação Ambiental no estado do Rio de Janeiro, nunca se descolou tantos recursos financeiros para esta questão em especial. No próximo capítulo, descreve-se o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: elos de cidadania criado em 2007, pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em parceria com a Secretaria de Estado do Ambiente, Secretaria de Estado de Educação, Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e Coletivo Jovem de Meio Ambiente do Rio de Janeiro. Essa se configurou como uma das ações dentro das políticas públicas de grande relevância dentro do Programa Estadual de Educação Ambiental, registrando um novo tempo para o campo da formação de professores. 80 CAPÍTULO 3- A CONTRIBUIÇÃO DO CURSO AGENDA 21 ESCOLAR: ELOS DE DE FORM-AÇÃO EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL E CIDADANIA PARA A FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES O Curso de Formação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania27 foi lançado em 2007, com o objetivo de promover a formação continuada de professores da Rede Pública em EA. Este curso foi criado para oportunizar o fortalecimento das Agendas 21 Escolares iniciadas e em fase de andamento, atribuídas as ações do “Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) nas escolas”, do “Programa Vamos Cuidar do Brasil com as Escolas” (COM-VIDAS/MEC), do CJMA-RJ e dos “Comitês de Bacias Hidrográficas” no âmbito do Estado do Rio de Janeiro. Que intencionalidades podem ser descortinadas por essa ação do Programa Estadual de Educação Ambiental? Controle estatal ou libertação pedagógica? Este capítulo busca descrever e analisar o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, como proposta das políticas públicas no campo da formação continuada. 27 O curso foi promovido pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em parceria com a Secretaria de Estado do Ambiente (SEA), Secretaria de Estado de Educação (SEEDUC), Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia (SECT) através da Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro (FAETEC), e Coletivo Jovem de Meio Ambiente do Rio de Janeiro (CJMA-RJ). 81 3.1 . “Pensar global, agir local.” Nos capítulos anteriores, foi possível resgatar um pouco da história da Educação Ambiental pensando-a globalmente nos cenários mundial e nacional. Observa-se que a formulação das políticas públicas para o campo da formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro é o resultado não só das relações de forças presentes na máquina governamental, como também do contexto externo, tendo em vista os debates e eixos colocados nos fóruns internacionais. Em 2007 a Secretaria de Estado do Ambiente (SEA) do Rio de Janeiro criou a Superintendência da Agenda 21 Estadual para efetivar as ações da Agenda 21, fixando 21 metas a serem desenvolvidas em seis momentos28. Em parceria com outras secretarias do governo estadual (SEEDUC e SECT), além da UERJ e o CJMA do Rio de Janeiro, estes órgãos pensaram coletivamente em promover o debate sobre Agenda 21, visando à implementação de Agendas 21 Escolares, em diversas comunidades do Estado. Por meio de um planejamento participativo, a escola precisaria definir metas, recursos e responsabilidades para pôr em prática um trabalho pedagógico, que levasse a sua comunidade escolar rumo à sustentabilidade. A escola, enquanto instituição social deveria assumir uma carta de princípios e compromissos com a sociedade, não interpretando a proposta como mais uma determinação legal a ser cumprida (SANTIAGO, 2007). 28 Os seis momentos propostos: “Comunicação e mobilização (abril a dezembro de 2007); estruturação/fortalecimento de fóruns regionais e locais (janeiro a julho de 2008); realização dos diagnósticos participativos (julho de 2008 a julho de 2009); estruturação dos planos locais de desenvolvimento sustentável e dos sistemas de informações regionais e municipais nas escalas de sub-bacias (julho a dezembro de 2009); implementação de programas e projetos (janeiro e julho de 2010); e ações de monitoramento e reforço (julho a dezembro de 2010) (SANTIAGO, 2007, p.6).” 82 Situado num contexto de descentralização da gestão ambiental do Estado do Rio de Janeiro, foi lançado em abril de 2007 o Curso29 de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, que visou atender duas importantes demandas (CADEI, 2009): 1. desenvolvimento de uma política de formação continuada do professor, 2a demanda nacional da categoria; 2. qualificação das comunidades locais para a participação na gestão ambiental e para o exercício do controle social, de modo a atender o disposto no Art. 225 da Constituição Federal, nas Leis Federal 9.795/99 e Estadual 3.225/99, que estabelecem respectivamente as Políticas federal e estadual de educação ambiental (CADEI, 2009, p. 5). Pode-se afirmar que esta foi a segunda maior ação do Programa Estadual de Educação Ambiental no campo da formação de professores, após o PDBG/PEA lançado em 2001. A Baía de Guanabara novamente ocupava centralidade na agenda pública, uma vez que a região metropolitana foi convidada a participar dessa formação continuada em EA e Agenda 21 Escolar. Destaca-se que os municípios que integraram o projeto em sua maioria estão situados ao redor da Bacia Hidrográfica da Baía da Guanabara, ou de alguma maneira têm relação com a história da degradação ambiental desse patrimônio natural. A Baía de Sepetiba também recebeu atenção, motivada talvez, por fatores econômicos, sem contar, aliás, o fator ambiental. Participaram, então, desse processo os municípios: Rio de Janeiro, Duque de Caxias, São João de Meriti, Nova Iguaçu, Nilópolis, Niterói, São Gonçalo, 29 O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, projeto classificado por atender a EA e o fortalecimento institucional, recebeu financiamento no valor de RS 604.701,00, aprovado pelo Fundo Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano (SEA, 2007). 83 Queimados, Japeri, Mesquita, Paracambi, Seropédica, Itaboraí, Cachoeira de Macacu e Tanguá. Os quinze municípios envolvidos, inicialmente, fazem parte da região metropolitana do Estado do Rio de Janeiro. Neste universo, foi planejado atender 300 (trezentos) profissionais da educação (em sua maioria professores) e 300 (trezentos) estudantes do II segmento do Ensino Fundamental e Ensino Médio da Rede Estadual de Ensino e da Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro (FAETEC). O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania pretendeu atingir 150 (cento e cinqüenta) escolas30. Portanto, gerar também 150 Agendas 21 Escolares e 150 projetos de intervenção em Educação Ambiental nas diferentes localidades. As escolas foram organizadas em pólos baseados no critério da SEEDUC de classificar as Unidades Escolares em Coordenadorias Regionais de Educação31, respeitando o seu espaço geográfico. Foram estruturados 11 (onze) pólos para a formação continuada, compreendendo as Coordenadorias Metropolitanas I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, X e XI32. A formação dos profissionais da educação amparou-se na Lei Estadual de Educação Ambiental n° 3.325/99 que estabeleceu que: 30 A direção de cada escola integrada ao curso indicou dois professores cursistas e dois estudantes cursistas, provenientes das diversificadas áreas disciplinares e dos diferentes segmentos de ensino contemplados pela formação continuada (PEREIRA, 2008). 31 As Coordenadorias Regionais de Educação foram responsáveis pela seleção das escolas participantes e dos locais aonde foi promovida a etapa teórica do curso. E ainda, se responsabilizaram por repassar as informações à coordenação geral do curso. A SECT também assumiu o mesmo compromisso em relação às escolas da FAETEC (PEREIRA, 2008). 32 As Coordenadorias Metropolitanas e suas respectivas áreas de abrangência são: I – Nova Iguaçu, Nilópolis, Mesquita, Queimados, Japeri; II – São Gonçalo; III e IV- Rio de Janeiro; V – Duque de Caxias; VI – Itaguaí, Paracambi, Seropédica; VII – Belford Roxo; VIII – Niterói; IX – Itaboraí, Cachoeira de Macacu, Tanguá; X – Rio de Janeiro; XI – São João de Meriti (PEREIRA, 2008). 84 Art. 12 - Os professores e animadores culturais, em atividade na rede pública de ensino, devem receber formação complementar em suas áreas de atuação, com o propósito de atender adequadamente ao cumprimento dos objetivos e princípios da Política Estadual de Educação Ambiental (RIO DE JANEIRO, 1999). Nesse sentido, o principal objetivo do curso foi: Oportunizar aos professores, profissionais da educação e estudantes de diferentes localidades do Estado do Rio de Janeiro uma formação em Educação Ambiental que propicie a elaboração e implantação de Agendas 21 Escolares contextualizadas, ou seja, que atendam às especificidades de cada unidade escolar envolvida e do seu entorno (RIO DE JANEIRO, 2007). E ainda, destaca-se como objetivos específicos: propiciar a formação de profissionais da educação e de professores que atuam na Educação Básica da rede estadual de ensino; incentivar o protagonismo juvenil; promover o enraizamento da Educação Ambiental; estimular a participação dos diferentes atores comunitários na construção de soluções coletivas para as questões sócio-ambientais cotidianas (RIO DE JANEIRO, 2007). Nóvoa (1995) defende o protagonismo docente nas diversas fases do processo de formação, desde a concepção de novos conhecimentos até a sua avaliação. Segundo o autor, a “ formação implica a mudança dos professores e das escolas, o que não é possível sem um investimento positivo das experiências inovadoras que já estão no terreno (NÓVOA, 1995, p. 30).” Os resultados esperados de uma formação continuada que não leve em consideração o saber-fazer docente e a participação da escola, é a resistência pessoal e institucional frente às políticas públicas. O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania ocorreu no período de outubro de 2007 a outubro de 2008. Ele foi caracterizado como um curso de extensão composto por duas propostas distintas e ao mesmo tempo interligadas: uma para os profissionais da educação (professores cursistas) e outra para os estudantes (estudantes cursistas). Em um ano, os profissionais da educação e estudantes 85 receberam uma formação teórica presencial nos dois primeiros meses do curso, e foram acompanhados por Tutores33, na modalidade de educação semipresencial na maior parte do processo. Na tentativa de pôr em prática uma formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, capaz de estimular a reflexão e crítica, foi destinada para a etapa presencial uma carga horária de 90h de formação e informação aos professores cursistas. Sete módulos foram estruturados para o aprofundamento teóricometodológico, distribuídos em nove encontros. Aos estudantes cursistas, foram destinadas 24h de aprofundamento teórico-metodológico, organizado em três módulos e cinco encontros, ministrado por um representante do Coletivo Jovem de Meio Ambiente do Rio de Janeiro. A metodologia adotada pelo Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania teve caráter participativo e crítico, incentivando a formação de grupos locais de estudo e intervenção. Foram aplicadas diferentes técnicas de ensino como: leitura e discussão de aportes teóricos; dinâmicas de grupo; jogos pedagógicos; atividades práticas; exibição de vídeos; debates em listas de discussão etc (SEA, 2007). Ao final de cada módulo34, os professores cursistas e estudantes cursistas 33 O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania contratou dez profissionais da educação com formação acadêmica e experiência em Educação Ambiental, chamados de Tutores. Eles foram distribuídos nos onze pólos da formação continuada. As competências de cada tutor consistiam em: - acompanhar os professores cursistas na etapa teórica; - administrar a logística do curso em seu pólo; - prestar assistência aos professores cursistas e estudantes cursistas, e aos professores responsáveis por ministrar os módulos durante a etapa teórica; - realizar plantão na UERJ (Maracanã) semanalmente para esclarecer dúvidas e orientar os professores cursistas e estudantes cursistas, através do telefone do curso e pela internet; - acompanhar as atividades dos professores cursistas por e-mail; - visitar mensalmente algumas escolas de seu pólo, a fim de orientar o trabalho pedagógico de discussão, criação e implantação da Agenda 21 Escolar e do projeto de intervenção em Educação Ambiental; - avaliar o desenvolvimento do curso em seu pólo periodicamente. 34 O material de cada aula foi organizado pela coordenação geral do curso em parceria com os coordenadores de módulos, a fim de serem ministrados os mesmos conteúdos e as mesmas seqüências de atividades em todos os pólos simultaneamente. Com isso, buscou-se padronizar o curso e melhorar a qualidade oferecida a todas as localidades (PEREIRA, 2008). 86 receberam atividades prático-teóricas realizadas em grupos, desenvolvidas em suas escolas nos intervalos entre os encontros e entregues, posteriormente, a coordenação do curso. Estas atividades foram nomeadas de ATIV-AÇÃO, cuja proposta inicial consistiu em promover uma formação continuada capaz de superar o modelo educacional tradicional, baseado na mera transmissão de informações. Os professores e estudantes em form-ação foram estimulados a repensarem o conhecimento teórico, pondo-o em ação no ambiente escolar. A proposta curricular (tabela 1) para a formação continuada de professores em EA e Agenda 21 Escolar tinha como referencial teórico autores como Edgar Morin, Milton Santos, Felix Guattari, Michel de Certeau, Isabel de Carvalho, Boaventura de Souza Santos, dentre outros, que serviram de base para a discussão dos caminhos que explicitam o contexto societário contemporâneo (SILVA, 2007). Matriz curricular do Curso para a formação continuada de professores MÓDULOS PROGRAMA 1 - Sociedade Atual e o -Contexto sócio-ambiental contemporâneo; Desafio da Sustentabilidade -Concepções de ambiente e os movimentos ambientalistas; -Educação Ambiental: Concepções e Histórico; - Perspectivas para o futuro: a sustentabilidade como meta. 2- O Ambiente e a Educação Ambiental em Documentos -Convenções Internacionais sobre Segurança Alimentar, Biodiversidade, Mudanças Climáticas e Conservação dos Recursos Hídricos; - Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global (Rio 92); - Agenda 21 e Metas do Milênio - Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável – UNESCO 87 3- A Institucionalização da - Políticas e Programas Nacionais de Educação Ambiental Educação Ambiental no - Política Nacional de Educação Ambiental – Lei 9795/99; Brasil - A Educação Ambiental no MEC e no MMA; - Programa Nacional de Educação Ambiental – PRONEA; - Sistema Brasileiro de Informações em Educação Ambiental. - Políticas e Programas de Educação Ambiental no Estado do Rio de Janeiro 4- A Educação Ambiental em - Espaço Formal de Ensino diferentes espaços - A dimensão cientifica, política e cultural da EA no currículo escolar; - Educação Ambiental: transversalidade e interdisciplinaridade. - Espaço Não-Formal de Ensino - As unidades de conservação e a educação para a gestão ambiental; - Outros espaços/atores: *Redes de Educação Ambiental (REBEA, REARJ etc.); *Coletivos Jovens e o Protagonismo Juvenil; *Organizações Não-Governamentais; *Empresas, hospitais, fábricas etc. 5- Comunicação e Educação Ambiental - Educomunicação: estratégias da comunicação e Educação Ambiental; - Comunicação e linguagem: processos de leitura crítica; - Novas tecnologias midiáticas e cidadania; - Dinâmicas de grupo e jogos cooperativos. - Ecossistemas naturais e unidades de conservação do Rio de 88 6- Ambiente Natural e Sócio- Janeiro; Cultural do Rio de Janeiro: - Bacias hidrográficas: unidades de estudo e ação; ontem, hoje e amanhã? - Bacia Hidrográfica da Baía de Guanabara; - A Mata Atlântica em destaque; - Ecossistema urbano: problemas e possíveis soluções; - Conflitos sócio-ambientais e a conservação do patrimônio natural e cultural. 7- Educação Ambiental e - Agenda 21 e Agendas Ambientais; Agenda 21 Escolar: da teoria - Projeto Político Pedagógico e as questões sócio-ambientais; à prática - Diagnóstico participativo da realidade sócio-ambiental local; - Elaboração, desenvolvimento e avaliação da Agenda 21 Escolar. Tabela 1. Conteúdos Programáticos por módulo – professores cursistas (RIO DE JANEIRO, 2007). A matriz curricular dos estudantes cursistas (tabela 2), procurou seguir a mesma perspectiva reflexiva e crítica proposta aos profissionais da educação. Nos dois últimos encontros presenciais, professores e estudantes tiveram a oportunidade de praticar o diálogo horizontal, no dizer de Freire (1987), pensando mutuamente a realidade socioambiental escolar. Para Freire (1987) esse momento é uma exigência existencial ao trabalho pedagógico, o diálogo é a base vital para as relações humanas. Matriz curricular do Curso para a formação continuada de estudantes MÓDULOS PROGRAMA 1 Ambiente, Educação Ambiental e Agenda 21: O que é? Como? Onde? Por que? 2 Bacias Hidrográficas do Rio de Janeiro: Unidade de Estudo 89 e Ação Agenda 21 Escolar e Particip-Ação: Um é pouco, dois é 3 bom, três é melhor! Tabela 2. Conteúdos Programáticos por módulos – estudantes cursistas (RIO DE JANEIRO, 2007). Freire (1987) enfatiza o quanto a prática do diálogo passa a ser primordial ao ambiente escolar (e para qualquer relação social), mas ele requer humildade, condição sine qua non para sua existência. “O diálogo, como encontro dos homens para a tarefa comum de saber agir, se rompe, se seus pólos (ou um deles) perdem a humildade. Como posso dialogar, se alieno a ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro, nunca em mim? (FREIRE, 1987, p. 46).” O diálogo horizontalizado é elemento essencial para o exercício da cidadania e da consolidação da democracia na escola. Promover o diálogo entre os atores sociais que compõe o cenário escolar, a fim de construir Agenda 21 Escolar e o projeto de intervenção em EA alinhavado ao Projeto Político Pedagógico (PPP), constituiu a preocupação central da segunda etapa do Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. De acordo com os documentos do Curso: Pelo exposto, não podemos, simplesmente, tentar trabalhar as questões ambientais sem que tenhamos delineado um projeto político-pedagógico com os nossos pares, isso seria “atirar no escuro”, “fazer uma viagem sem planejar o itinerário”. Daí a importância de conhecermos algumas das principais tendências, para traçarmos com a nossa comunidade aquela que atenda às nossas especificidades e enseje um tratamento específico àquilo que tanto nos angustia no mundo moderno: os problemas sócioambientais (SANTIAGO, 2007, p 3-4) 90 Na fase semipresencial do curso, promovida no período de fevereiro a outubro de 2008, os professores cursistas precisaram cumprir 90h e os estudantes cursistas 16h de atividades em suas escolas. Este tempo foi subdividido em: 30h para professores cursistas e 6h para estudantes cursistas; destinadas ao diagnóstico da realidade local e para elaboração da Agenda 21 Escolar juntamente com os interlocutores no âmbito escolar. E, ainda: 60h para professores cursistas e 10h para estudantes cursistas; aplicadas para o desenvolvimento das atividades juntamente com os estudantes, professores, direção e comunidade escolar (PEREIRA, 2008). Durante todo o processo da formação continuada, os professores cursistas e suas respectivas escolas receberam materiais didáticos35, visando fornecer suporte teóricometodológico. A proposta de compartilhar o saber construído durante o curso pode ser viabilizado, através da socialização do material distribuído. Estabelecer a comunhão escolar foi um grande desafio, diante do complexo problema socioambiental em que estão inseridas as Unidades Escolares da região metropolitana do Rio de Janeiro. Para compreender a dimensão do desafio político, no qual os profissionais da educação e estudantes em formação foram convidados a intervir, destacamos o diagnóstico socioambiental realizado pela Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro. 35 Lista de materiais recebidos pelos professores cursistas: - Material didático (apostilas, textos, roteiros etc.); - BRASIL. MEC. SECAD. Formando Com Vida. Construindo Agenda 21 na Escola. Brasília: MEC, 2004; - BRASIL. MMA. Programa Municípios Educadores Sustentáveis. 2ª ed. Brasília: MMA, 2005. - BRASIL. MMA, MEC e IDEC. Manual de educação para o consumo sustentável. Brasília: MMA/MEC/IDEC, 2005. - RIO DE JANEIRO. SEA. Agenda 21 Escolar. Guia Prático de Educação Ambiental. Rio de Janeiro: SEA, 2007. - TRIGUEIRO, André. Mundo Sustentável – abrindo espaço na mídia para um planeta em transformação. São Paulo: Globo, 2005. - 1 DVD com textos em PDF, vídeos e imagens (PEREIRA, 2008); 91 Trata-se de área de grande diversidade sócio-econômica e ocupada por cerca de 10 milhões de habitantes (2/3 da população do Estado do Rio de Janeiro). A região incorpora grandes pólos industriais, localidades com comunidades tradicionais pesqueiras, áreas agropecuárias e de grande valor paisagístico, histórico e turístico. Quase todos os municípios que compõe a área de desenvolvimento do curso funcionam como “cidade dormitório” do centro metropolitano do Rio de Janeiro. A ocupação espacial está marcada pela desigualdade social. Bolsões de comunidades de baixa renda são encontrados em toda a região metropolitana e se contrapõe aos luxuosos condomínios e moradias das áreas mais valorizadas. As comunidades que vivem nas localidades mais pobres e no entorno dos rios que compõe a Bacia da Baía de Guanabara sofrem intensamente com a poluição das águas, os desmatamentos das margens, a escassez de pescado, a presença de diferentes vetores de doenças, a distribuição desigual da infra-estrutura de saneamento básico, a dificuldade de acesso aos serviços públicos (saúde, educação, transporte, lazer etc) e vários outros problemas sócio-ambientais, caracterizando um quadro de exclusão social e injustiça ambiental (SEA, 2007, p. 3-4). Compete também destacar o diagnóstico ambiental levantado pelo mesmo órgão. A área de atuação do projeto apresenta remanescentes da Mata Atlântica e de ecossistemas associados, notadamente manguezais, praias e restingas. A existência na região de uma grande metrópole como o Rio de Janeiro faz com que tanto os ecossistemas terrestres quanto os ecossistemas aquáticos (dulcícolas e marinhos) sofram pressões antrópicas crescentes. Essas pressões são alimentadas pela ocupação desordenada do espaço, a constante especulação imobiliária, a implementação de muitas plantas industriais e a inexistência de uma infra-estrutura de saneamento básico que realmente atenda as necessidades da população local. Os grandes impactos sócio-ambientais, uma vez que acabam ocasionando perdas na identidade cultural das diferentes comunidades e na biodiversidade da Floresta Atlântica e gerando conflitos e confrontos que precisam ser explicitados, debatidos e solucionados de forma democrática e coletiva (SEA, 2007, p. 4). Talvez, nossos “heróis” em formação, não tivessem dado conta do imensurável desafio que tinham pela frente! O seu enfrentamento real requer um ensino político e a ruptura com o paradigma newtoniano-cartesiano. Talvez seja esse o desafio, num primeiro momento, mais intransponível que as escolas do século XXI precisem superar, abandonando as velhas práticas pedagógicas conservadoras do século retrasado. Como assinala Loureiro (2002): 92 Uma pedagogia crítica e ambientalista deve saber relacionar os elementos sociohistóricos e políticos aos conceitos e conteúdos transmitidos e construídos na relação educador-educando, de modo que evite um trabalho educativo abstrato, pouco relacionado com o cotidiano dos sujeitos sociais e com a prática cidadã. Entendemos que um maior grau de conhecimento formal-instrumental não é garantia de maior qualificação para o exercício da cidadania ecológica quando se apresenta isolado da compreensão global da realidade (p. 80-81). Loureiro (2002) reconhece a função democrática dos movimentos sociais, na qual a escola não pode deixar de ser inclusa. Movimentos sociais que cresceram com o passar das décadas, como resposta à crescente demanda da sociedade em resolver uma crise civilizatória construída historicamente por processos sociais, econômicos, políticos, culturais, éticos e ambientais no mundo. A estratégia de transformação dentro da dimensão micro a macro social “(...) deve estar relacionada à democratização do Estado e à construção de alternativas socioeconômicas, políticas e culturais, nos planos nacional e internacional (2002, p. 79).” Desse modo, os movimentos sociais, leia-se a escola em questão, pode ser capaz de desenvolver ações coletivas, classificadas pelo autor (2002) em três modalidades: a) denúncia, protesto e conflito; b) cooperação, parceria e solidariedade; c) construção de utopia societária ou civilizacional. Nesse contexto, a implantação de Agendas 21 Escolares passa a ser uma estratégia para o exercício da cidadania, tendo em vista que esse processo incentivará a participação ativa e o desenvolvimento de ações coletivas para além dos muros escolares (SEA, 2007). A SEA/SEAM entendeu que para se atingir tal proposição, em meio a tantos desafios no âmbito escolar, seria preciso fornecer uma forma-ação que realmente capacite professores e estudantes para o enfrentamento de seus problemas locais. 93 Um dos esforços para garantir a formação continuada em EA e Agenda 21 Escolar aos professores da Rede Estadual de Ensino do Rio de Janeiro passou pela preocupação em fornecer subsídio financeiro aos docentes. Além de um auxílio alimentação recebido por todos os cursistas durante a etapa presencial, pelo menos um professor de cada escola recebeu uma Gratificação por Lotação Prioritária (GLP)36, a fim de trabalhar e se dedicar às atividades propostas pelo curso. Esta conquista na área da educação merece o reconhecimento e o mérito da Coordenação Geral do curso, vinculada à UERJ, que defendeu politicamente a manutenção deste ato. Quanto aos professores cursistas vinculados à FAETEC, alguns tiveram seus horários ajustados convertidos em hora/aula disponível, possibilitando-os executar as ações da Agenda 21 Escolar. Durante todo o processo de formação continuada foram executadas avaliações contínuas dos professores, cursistas, tutores, material didático, desenvoltura dos professores com as atividades, conteúdos e outros por meio de um formulário padrão com perguntas fechadas, respondidas pelos professores cursistas ao término de cada módulo durante a etapa presencial (PEREIRA, 2008). A tabulação dos dados serviu de base para realizar as interferências, posterior à formação teórico-metodológica. 36 A proposta inicial da Coordenação Pedagógica do Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania (composta por professores da UERJ) requisitou GLP para todos os professores cursistas, todavia, a SEEDUC concedeu apenas uma GLP para cada escola. Vale lembrar que o piso salarial de um professor com curso superior no Estado do Rio de Janeiro, pago por esta secretaria somava a ridícula e humilhante quantia de R$ 562,28 (valor referente a outubro de 2007, período de início do curso). Com o desconto de 11% do Rioprevidência, o valor decaía para R$ 494,81 como salário líquido para muitos docentes alijados do processo da “Nova Escola” (gratificação responsável por acrescentar em média R$ 200,00 ao vencimento). 94 A avaliação da etapa semipresencial foi executada pelos professores cursistas37 através de relatórios mensais, no qual descreviam as ações planejadas e executadas coletivamente, compreendidas no período de fevereiro de 2008 a setembro de 2008. Nestes relatórios foram apresentadas as ações desenvolvidas coletivamente com a direção, os estudantes, demais professores e funcionários, além da comunidade escolar. Os professores cursistas sinalizaram também neste documento as dificuldades e potencialidades encontradas em suas escolas ao executarem as ações propostas pelo projeto de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. O documento precisou ser assinado pela direção da escola e pelos professores cursistas. Fotos, tabelas e gráficos sobre as ações nas escolas compuseram os anexos de alguns destes documentos (PEREIRA, 2008). As orientações metodológicas abordadas pelo módulo 7 (Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Da Teoria à Prática) fornecidas na fase presencial, tentou conduzir todo trabalho pedagógico escolar na fase semipresencial. A primeira iniciativa neste sentido ateve-se a explorar as concepções teóricas sobre a elaboração de um diagnóstico participativo da realidade socioambiental. A elaboração de uma Agenda 21 é, em última instância, um processo de planejamento coletivo que se formaliza em um projeto. Este projeto, organizado em um plano de ações de curto, médio e longo prazo, tem como objetivo, como já vimos, a melhoria da qualidade de vida de todas as pessoas, mediante o respeito ao ambiente (SANTIAGO e BASTOS, 2007, p. 3). 37 Cada professor cursista teve o dever de entregar ao Tutor de sua coordenadoria três vias dos relatórios mensais, destinadas para UERJ, SEA e SEEDUC/SETC (PEREIRA, 2008). 95 Um dos componentes sugeridos, inicialmente, na etapa de desenvolvimento do planejamento foi a estruturação de uma equipe de trabalho ou equipe técnica, responsável pela condução e articulação do processo na escola. O empoderamento dos interlocutores no ambiente escolar tentou estabelecer o diálogo horizontalizado, defendido por Freire (1987). O trabalho pedagógico proposto pelo Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania tentou superar a auto-suficiência docente, apontando para a prática do trabalho coletivo. A auto-suficiência é incompatível com o diálogo. Os homens que não têm humildade ou a perdem, não podem aproximar-se do povo. Não podem ser seus companheiros de pronúncia do mundo. Se alguém não é capaz de sentir-se e saber-se tão homem quanto os outros, é que lhe falta ainda muito que caminhar, para chegar ao lugar de encontro com eles. Neste lugar de encontro, não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos: há homens que, em comunhão, buscam saber mais (FREIRE, 1987, p. 46). Formada uma equipe de trabalho ou equipe técnica, a segunda etapa sugerida consistiu em promover o conhecimento da realidade, ou seja, reconhecer os grupos de interesse envolvidos com a escola, de forma a delimitar o objeto (SANTIAGO e BASTOS, 2007). Santiago e Bastos (2007) descrevem sucintamente quatro passos mínimos a serem dados pelos interlocutores no ambiente escolar rumo à criação da Agenda 21 Escolar: Análise dos Envolvidos - Trata-se do mapeamento dos principais atores. - Pergunta-chave: quem está envolvido? Análise dos Problemas e das Potencialidades (Diagnóstico) - Trata-se do mapeamento da situação atual. - Pergunta-chave: quais os principais problemas? Quais as principais potencialidades? Análise de Objetivos (Prognóstico) - Trata-se do mapeamento dos possíveis objetivos. - Pergunta-chave: qual a nossa meta? Análise de Alternativas ou Tomadas de Decisões - Trata-se do mapeamento das alternativas. 96 - Pergunta-chave: quais as estratégias possíveis para atingir nossas metas? (SANTIAGO e BASTOS, 2007, p. 6) A proposta da formação continuada de professores fornecida pelo Curso de Formação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania tentou auxiliar teórico-metodologicamente os professores cursistas e estudantes cursistas a darem os quatro passos mínimos, quatro passos concretos e condizentes com suas realidades socioambientais. Após, percorrido este caminho, a escola deveria elaborar a sua carta de intenção, estabelecendo seus compromissos juntamente com sua comunidade escolar. Almejando intervir a curto, médio e longo prazo em sua realidade, e buscando colocar em prática ações sustentáveis individuais e coletivas. Este documento compromisso chama-se, então, Agenda 21 Escolar. “Ela deve ter a cara da escola.” Ou seja, precisaria partir de sua realidade concreta, contextualizando seus problemas e potencialidades. Mediante a estruturação da Agenda 21 Escolar, a escola, em parceria com os interlocutores de seu ambiente, deveria elaborar um projeto de intervenção em Educação Ambiental38, coerente ao elenco de prioridades definidas pela Agenda. O projeto precisaria se concentrar num tema, identificando a situação-problema que precisa ser desafiada, ter um caráter mais prático de atuação e possuir também metas claras, a serem desdobradas em objetivo geral e objetivos específicos, de modo a viabilizar concretamente as mudanças que se esperam (SANTIAGO e BASTOS, 2007). Para Nóvoa (1995), a mudança no campo da formação continuada de professores não se faz antes da mudança, “(...) faz-se durante, produz-se nesse esforço de inovação e de procura dos melhores pressupostos para a transformação da escola (NÓVOA, 1995, p. 28)”. Investigar a contribuição da formação continuada de professores em Educação 38 De acordo com Santiago e Bastos (2007), um projeto de intervenção em Educação Ambiental precisa contemplar a seguinte estrutura: 1- Introdução (contextualização, problema e problematização); 2- Objetivos; 3- Relevância ou Justificativa; 4- Revisão Bibliográfica; 5- Metodologia; 6- Cronograma; 7- Orçamento; 8Referência Bibliográfica. 97 Ambiental e Agenda 21 Escolar para as mudanças ocorridas no trabalho pedagógico, durante e após a form-ação recebida pelos docentes será a próxima questão, descrita na metodologia dessa pesquisa. 98 CAPÍTULO 4 - PERCURSO METODOLÓGICO Este estudo tem como objetivo analisar a contribuição da proposta para formação continuada de professores em Educação Ambiental, um dos eixos do Programa Estadual de Educação Ambiental. Como já foi mencionado39, o Programa é composto por três eixos formativos e o curso corresponde ao de educação formal, constituindo, portanto, uma importante ação no conjunto das propostas. O foco da pesquisa dirigiu-se para o exame do Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. Buscou-se detectar a contribuição da formação continuada para o desenvolvimento de projetos, tendo em vista a disseminação e consolidação de uma perspectiva crítica em Educação Ambiental preconizada nos documentos que orientam o Programa. Para tanto, realizou-se um estudo de caso, procurando-se efetuar a análise da proposta de formação continuada. Segundo Gil (2007), um estudo de caso denso pode ser considerado representativo de muitos outros ou de todos os casos similares. O estudo de caso é uma pesquisa qualitativa tradicionalmente empregada nas Ciências Sociais. Lakatos (2006) apud Ludke e André (1986, p.18-20) ressalta algumas características essenciais desta metodologia que iluminam a compreensão do objeto da pesquisa: a) visar a descoberta; b) enfatizar a interpretação do contexto; c) retratar a realidade de forma ampla; d) valer-se de fontes diversas de informações; e) permitir substituições; f) representar diferentes pontos de vista em dada situação; g) usar linguagem simples. (LAKATOS, 2006 p. 274) 39 Ver capítulo 1, terceira seção. 99 A pesquisa envolveu diversas etapas. No primeiro momento, foi desenvolvida a pesquisa bibliográfica e documental40. A pesquisa bibliográfica envolveu a revisão de literatura sobre Educação Ambiental e formação de professores, objetivando-se rastrear teorias e concepções debatidas nestes campos de estudo. Foram examinados artigos de revistas, teses acadêmicas e livros sobre as temáticas. A pesquisa documental foi realizada em instâncias oficiais do Governo do Estado do Rio de Janeiro. Nestes órgãos, buscou-se localizar documentos sobre os programas em formação continuada em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. Na SEA, foram encontrados alguns dados sobre a as propostas atuais. Destaca-se que as informações estão mais organizadas a partir de 2007, quando ocorreu uma mudança na gestão da instituição. Na SEEDUC, por sua vez, não foi possível localizar muitos documentos, tendo em vista que a secretaria passou por diferentes endereços e trocas de gestores, segundo esclarecimentos prestados por indivíduos que atuam na instituição. Na UERJ, teve-se acesso a história dos programas estaduais de Educação Ambiental, aos relatórios de 2008, elaborados pelos cursistas das doze escolas da Coordenadoria Metropolitana I que participaram do processo, além dos projetos de intervenção em Educação Ambiental. Os documentos coletados auxiliaram a reconstrução da história do Programa. Na análise dos relatórios dos cursistas (anexo 2), procurou-se investigar as ações descritas e desenvolvidas na etapa prática, propostas pelos projetos de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. Dois aspectos foram observados na análise dos dados: as dificuldades e potencialidades encontradas pelos professores cursistas em suas escolas na implementação das propostas. 40 Segundo Lakatos (1991), a diferença entre ambas consiste na origem da fonte de informações: a primeira utiliza-se de fonte secundária (transcritos de fontes primárias retrospectivas) e a segunda utiliza-se de fonte primária (compilados após o acontecimento pelo autor). 100 Numa segunda etapa, foram aplicados questionários semi-estruturados (anexo 1). Buscou-se levantar as concepções prévias dos cursistas acerca de Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. Segundo Lakatos (1991), o questionário é um instrumento de coleta de dados, organizado por uma série de perguntas que devem ser respondidas por escrito e sem a presença do entrevistador. Foram aplicados e respondidos no primeiro dia do curso, na etapa presencial, 20 questionários, por docentes da Metropolitana I. Além dos questionários, foram perquiridos os projetos de intervenção em Educação Ambiental, desenvolvidos pelos professores na etapa à distância. O exame dos projetos, construídos coletivamente pelos professores, visou investigar se a contribuição da formação teórica foi traduzida em ações na escola. Destaca-se que a pesquisa focalizou o processo de formação continuada desenvolvido na Coordenadoria Metropolitana I. O foco nesta regional, composta pelos municípios de Nova Iguaçu, Nilópolis, Mesquita, Queimados e Japeri está relacionado à inserção da pesquisadora, que atuou como tutora nesta coordenadoria. Além disso, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRJ/Nilópolis) localiza-se nesta área. Portanto, almejou-se dar um retorno social da pesquisa com a investigação de escolas do entorno. Observa-se, ainda, que o elevado número de participantes do curso, 235 profissionais da educação41, a sua área de abrangência, desenvolvido em toda região metropolitana, e o tempo disponível para realização do estudo, contribuíram para delimitação desta amostra. 41 Dados do Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania em outubro de 2008: a- total de escolas: 154 (129 escolas da SEE; 15 escolas da FAETEC; 10 outras instituições); b- total de professores e profissionais da educação: 235 (204 da SEE; 21 da FAETEC; 10 outras instituições); c- total de estudantes: 209 (205 estudantes da SEE; 14 estudantes da FAETEC; 0 outra instituição) (UERJ, 2008). 101 Num terceiro momento, foram realizadas 11 entrevistas semi-estruturadas (anexo 3) com professores das 12 escolas focalizadas, que concluíram o curso em 2008 e possuíam maior carga horária na escola. O objetivo foi analisar, em que medida, as propostas defendidas pelo Programa foram apropriadas pelos professores, tendo em vista o processo de formação do qual participaram. A idéia era refinar as informações coletadas nos relatórios mensais dos cursistas. Uma vez terminado o vínculo institucional destes professores, buscou-se detectar dados sobre a continuidade ou não dos projetos e Agendas 21 Escolares criadas nas escolas. Ou seja, considerando que a proposta da política era enraizar a Educação Ambiental nas escolas, pretendeu-se verificar o impacto do Programa no cotidiano escolar. Para Lakatos (2007, p.278) “a entrevista, por se de natureza interativa, permite tratar de temas complexos, que dificilmente poderiam ser investigados adequadamente através de questionários, explorando-os em profundidade”. A entrevista semi-estruturada possibilitou uma conversação face a face, de maneira metódica, com onze professores cursistas. A entrevista possibilitou, também, produzir dados que contribuíram para elaboração do produto final: um vídeo. Nas entrevistas questionaram-se as dificuldades e potencialidades encontradas pelos professores nas escolas ao promoverem as ações contextualizadas dos projetos de intervenção. Buscou-se, ainda, compreender a contribuição da formação continuada promovida pelo curso, detectando as lacunas nesta formação docente. As entrevistas foram gravadas, depois transcritas e analisadas. As informações obtidas foram utilizadas como subsídios para elaboração de um vídeo que tem a intenção de contribuir para o processo de formação continuada de professores em Educação Ambiental. Observa-se que as estratégias de ensino precisam se adequar ao perfil que se configura na sociedade contemporânea. Sensibilizar o indivíduo e 102 persuadi-lo para a questão ambiental, dentre tantas outras questões emergentes na sociedade atual, torna-se tarefa árdua e desafiadora. Nesta perspectiva, o uso de vídeo possui grande potencial de interferência no processo ensino-aprendizagem, razão explicada pela sua composição de recursos capazes de estimular os sentidos da audição e visão. Um vídeo possui características vantajosas em relação a outros recursos didáticos comumente aplicados no espaço formal da educação, como livro, quadro-de-giz, rádio e outros. Além de constituir um recurso multimídia que possibilita a transmissão das informações por meio do uso de texto, som e imagem. E, ainda, o vídeo é economicamente viável, sob o ponto de vista do custo final do produto e do aparato tecnológico necessário para a sua aplicação. Este recurso didático pode ser um valioso aliado nos processos de formação de docentes, e de outros atores sociais, que objetivam debater as questões do meio ambiente. O vídeo pode ser empregado para sensibilizar os indivíduos, fomentando discussões que desvelem o conflito de interesses presentes nas questões ambientais, convidando-os a construir o conhecimento e refletir criticamente sobre o seu posicionamento político dentro da sociedade. É óbvio que este recurso por si só não será capaz de provocar a reflexão, ele precisará estar inserido dentro de um planejamento estratégico com metas bem definidas pelos professores e não ser um fim em si mesmo, mas um meio para se atingir uma finalidade. Ele também não poderá ser entendido como um recurso didático capaz de substituir o recurso humano, senão cairíamos num enorme equívoco e contradição ao retirar como componente fundamental no processo dialógico para uma Educação Ambiental transformadora: o ser humano. Além disto, a produção de um vídeo voltado para a formação continuada de professores em Educação Ambiental precisará integrar os princípios que a fundamentam. De acordo com Loureiro (2006), a Educação Ambiental deve ser e ter: 103 Como base o pensamento crítico e inovador, em qualquer tempo ou lugar, em seus modos formal, não formal e informal, promovendo a transformação e a construção da sociedade; Um ato político, baseado em valores para a transformação social. A EA não é neutra, mas ideológica. O dever em estimular a solidariedade, a igualdade e o respeito aos direitos humanos, valendo-se de estratégias democráticas e interação entre as culturas - valores nas diferentes formas de conhecimento. Este é diversificado, acumulado e produzido socialmente, não devendo ser patenteado ou monopolizado; O dever em ajudar a desenvolver uma consideração ética sobre todas as formas de vida com as quais compartilhamos este planeta, respeitar seus ciclos vitais e impor à exploração dessas formas de vida pelos seres humanos (p. 31). A seguir são discutidos os resultados da pesquisa ancorados no referencial teóricocrítico para os processos educativos da Educação Ambiental e do campo da formação do professor. 104 CAPÍTULO 5- RESULTADOS E DISCUSSÃO DOS DADOS 5.1 Concepções prévias (e em construção) dos professores sobre Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar Um dos objetivos específicos desta investigação foi analisar as concepções prévias dos professores sobre Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. No primeiro dia da etapa teórica do Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, em outubro de 2007, 20 professores cursistas da Coordenadoria Metropolitana I responderam um questionário semi-estruturado. O grupo foi composto, majoritariamente por docentes que atuam no segundo segmento do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Foi-lhes perguntado: “O que você entende por Educação Ambiental? E por Agenda 21 Escolar?” Além da análise das respostas dos questionários, foram perquiridos 12 documentos elaborados, em 2008, ao término do curso, a Agenda 21 Escolar e o projeto de intervenção em Educação Ambiental. O exame desses documentos objetivou investigar se as concepções prévias em EA e Agenda 21 Escolar foram reconstruídas pelos professores após o processo de formação continuada. Foram ainda, em 2009, realizadas entrevistas com onze professores de doze escolas da Coordenadoria Metropolitana I, com o objetivo de levantar a continuidade ou não da Agenda 21 Escolar e quais concepções em construção sobre Educação Ambiental. Lima (2007) aponta para a grande importância da compreensão das concepções prévias dos professores, tendo em vista que os mecanismos relativos ao controle do saber, ou seja, do conhecimento, envolvem a passagem de um conhecimento precedente para outro permanente relativo a um dado contexto. Para o autor, o conceito de concepção prévia corresponde: 105 (...) a um todo relativamente estruturado e durável, possuidoras de uma lógica ou, pelo menos, de sua coerência. Assim entendida, caracterizamse como algo sempre atualizado pela situação vivida, pelos questionamentos que naturalmente coloca, pela busca constante de mobilização do aporte de saberes que o sujeito detém, adaptando-o à situação vivenciada (p. 2). A análise das concepções prévias sobre Educação Ambiental dos professores cursistas apontou para existência de diferentes linhas teóricas, provavelmente, oriundas da formação inicial desses docentes nos cursos de Licenciaturas e suas áreas específicas. As contribuições do trabalho de Tozoni-Reis (2002) foram agregadas nesta análise, a fim de iluminar a compreensão dos pressupostos teóricos que fundamentam a formação de educadores ambientais. Essa autora sistematizou as representações docentes em três núcleos de concepções sobre a relação homem-natureza: tendência natural, tendência racional e tendência histórica. A tendência natural, presente principalmente na formação dos professores de Biologia, é resultado da naturalização na relação dos indivíduos com o meio ambiente aonde vivem, e no qual a natureza define a relação homem-natureza. Grande parte das respostas dos professores cursistas, contida nos questionários, expressa esta tendência, sugerindo uma Educação Ambiental que se limita ao papel de adaptar os indivíduos ao mundo pré-determinado dos processos naturais (TOZONI-REIS, 2002). Segundo alguns docentes: (Educação Ambiental é...) Um conjunto de procedimentos que leva o indivíduo a um conhecimento sobre o espaço em que vive, desenvolvendo meios para preservá-lo. A Ed. Ambiental está relacionada à mudança de comportamento (Professor cursista X, outubro de 2007) (Grifo do autor). (E ainda ...) Conscientiza a comunidade escolar em preservar o meio ambiente através de projetos interdisciplinares (Professor cursista Y, outubro de 2007) (Grifo do autor). 106 Na tendência naturalista, o homem não é destacado como sujeito histórico (TOZONI-REIS, 2002). A crise ambiental, muitas das vezes, é apresentada como produto das ações humanas desequilibradas em relação à natureza, ausentando do debate uma reflexão mais crítica e política sobre a tríade da relação entre homem-trabalho-natureza, enquanto construção social e histórica. Como conseqüência para a formação dos educadores ambientais, a Educação Ambiental apresenta-se com a função de reintegrar os indivíduos à natureza (TOZONIREIS, 2002). Ou seja, a concepção preponderante entre os professores que pensam e praticam a Educação Ambiental, está voltada para a mudança de comportamento e de atitude, a fim de se atingir um meio ambiente higienizado. Essa concepção prévia sobre Educação Ambiental, expressa por alguns docentes, foi pouco reelaborada pelos professores cursistas após passarem pela formação continuada. Dentre os doze projetos de intervenção em EA analisados, nove adotaram como tema gerador “o lixo” e a reciclagem como principal ação, predominando a concepção em EA tecnicista e comportamentalista. Ou seja, a idéia cristalizada de que Educação Ambiental é reciclagem de lixo, contribuiu por reforçar um modelo educacional pouco reflexivo e político, causando a falsa sensação de que todos estão contribuindo para a “salvação do planeta”. A grande maioria dos docentes destas escolas ao serem entrevistados em 2009, levantou como principais temas em EA que consideram difíceis de serem trabalhados em sala de aula: a mudança de comportamento e a descontinuidade do conhecimento-prática ensinada. De acordo com o Professor W: (...) Olha é a prática realmente. Todos os temas são fáceis de ser de serem colocados na sala de aula, mas mudar comportamento, o comportamental mesmo é o que eu acho mais difícil. Mas, qualquer assunto sobre ambiente eu acho que é fácil na sala de aula. Colocar eles entendem, mas o problema mesmo é mudar o dia-a-dia dessas pessoas ( julho de 2009). 107 (...) E são os temas básicos mesmos de vê. É o não, é o não (pausa) é o não jogar lixo aonde ele está! Porque aqui na escola a gente vê, a escola está limpinha, daqui a pouco você passa tem um copo jogado, tem um papel de bala. E isso aí é primordial, né?! Eu que tem que ser o básico, o básico do básico mesmo. Não adianta a gente querer aprofundar, quando os nossos alunos estão pré-maturos nessa de meio ambiente. Além do lixo, o tema “dengue” e “horta” também foram abordados nos documentos da Agenda 21 Escolar e do Projeto de Intervenção em Educação Ambiental42, sem grandes alterações das estratégias de intervenção socioambiental aplicado para os resíduos sólidos. A influência da tendência naturalista entre os professores foi bastante expressiva na construção dos documentos. A mudança de comportamento e atitudes em relação ao ambiente escolar inseriu ao planejamento da escola a Coleta Seletiva do Lixo, como principal ação interventora da realidade socioambiental da comunidade escolar. Todavia, ela se apresenta como solução insatisfatória percebida pelos atores sociais em curto prazo. A dificuldade encontrada pelos professores em sua prática pedagógica está relacionada ao não rompimento com a “armadilha paradigmática” mencionado por Guimarães (2007). Ainda, segundo Tozoni-Reis (2002): As práticas educativas ambientais fundamentadas por essas concepções esvaziam a função dos educadores como mediadores na interação dos indivíduos com o meio natural, social e cultural. Na concepção natural a função dos educadores é de supervalorizar as experiências sensíveis, de sugerir, ainda que não expressamente, a submissão do sujeito ao domínio natural da natureza. Essas experiências sensíveis têm como objetivo a formação da personalidade dos indivíduos/educandos e dizem respeito ao desenvolvimento de características supostamente inerentes à natureza humana, características de harmonia em sua relação com a natureza (p. 87). Layargues (2002) sinaliza que a prática educativa em torno da Reciclagem de Lixo acaba por ser uma atividade-fim, cujo objetivo central é solucionar de maneira pragmática 42 Documentos elaborados como produto final da formação continuada oferecida pelo Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. 108 um problema ambiental local, evadindo do debate a dimensão política da Educação Ambiental. Preparar os indivíduos para viverem em sociedade, a fim de evitarem o esgotamento dos recursos naturais através do uso de inovações tecnológicas, compreende uma segunda concepção da relação homem-natureza (TOZONI-REIS, 2002). Dentro desta perspectiva, a tendência racional também foi encontrada de forma articulada com a tendência natural nas respostas dos questionários aplicados durante o início da etapa teórica do curso. Tozoni-Reis (2002) delimita a concepção racional, predominantemente presente entre os professores de Química, mas também entre os professores de outros grupos. Segundo a citada autora, nesta tendência “já não é mais a natureza natural que ocupa a centralidade da vida social, mas a ciência – empírica, mecânica, positiva, racional e cartesiana (...)” (TOZONI-REIS, p. 88, 2002). A tendência racional preconiza a neutralidade da ciência e, ainda, destaca a sua capacidade de superar a crise civilizatória. Pode-se inferir que o conceito para o desenvolvimento sustentável, amplamente divulgado na Conferência do Rio de Janeiro em 1992, encontra-se muito bem acolhido pela concepção racional. A concepção prévia sobre Educação Ambiental expressa nos questionários dos professores cursistas está também relacionada a esta tendência que ressalta uma visão antropocêntrica de EA e a importância da transmissão de conhecimentos científicos na formação dos indivíduos. De acordo com alguns cursistas: (Entende-se por Educação Ambiental os ...) Processos que envolvem soluções e alternativas que podem ser utilizadas no dia a dia (Professor cursista A, outubro de 2007) (Grifo do autor). (E ainda...) A multidisciplinaridade sobre o objetivo comum para formar uma atitude científica e um pensamento crítico (Professor cursista E, outubro de 2007) (Grifo do autor). 109 A influência da tendência racional na formação de educadores ambientais reforça a visão de que a função central da EA é adaptar os indivíduos à sociedade, ajustando a conduta destes para viverem num ambiente natural limitado (TOZONI-REIS, 2002). Nesta perspectiva, a teoria e a prática em Educação Ambiental acabam por reproduzir um modelo conservador de educação, onde são perpetuadas as relações de poder e de dominação por parte de quem detém o conhecimento tecnológico e científico. Tozoni-Reis (2002) assinala que a: (...) conseqüência filosófico-política dessa proposta educativa é a dominação. Parece que o saber confere e legitima ao educador ambiental – em todos os níveis e modalidades de educação e ensino – atitudes autoritárias de dominação. O antropocentrismo da relação homemnatureza aparece, no processo educativo, sob a forma de autoritarismo. A assimilação, por imposição/ adesão, é princípio educativo fundamental (p.88-89). A concepção racional informou grande parte dos documentos da Agenda 21 Escolar e dos Projetos de Intervenção em Educação Ambiental que, nas entrelinhas, defendiam uma concepção de natureza utilitarista. O desenvolvimento sustentável43 foi significativamente abordado pelos documentos, presente no corpo do texto de seis Agendas 21 Escolares e compondo o título principal em duas Agendas, em um total de doze escolas 43 A primeira referência sobre desenvolvimento adaptada as questões ambientais foi lançada por Maurice Strong em junho de 1973, formulando o conceito de ecodesenvolvimento. Este novo estilo de desenvolvimento econômico voltava-se para as áreas rurais nos países capitalistas em desenvolvimento ou Terceiro Mundo. Na década de 1980 o economista Ignacy Sachs desenvolveu o conceito de ecodesenvolvimento, cujas bases ancoravam-se nos pilares da eficiência econômica, justiça social e prudência ecológica (LAYRARGUES, 1997). Sanchs (1986) apud Layrargues (1997) definiu o ecodesenvolvimento como “um estilo de desenvolvimento que, em cada ecoregião, insiste nas soluções específicas de seus problemas particulares, levando em conta os dados ecológicos da mesma forma que os culturais, as necessidades imediatas como também aquelas a longo prazo”. Como alternativa ideológica ao termo desenvolvido por Sanchs, o qual realizou um alerta sobre o crescimento ilimitado do mercado e propôs um teto do consumo material, a Assembléia Geral da ONU lançou o termo desenvolvimento sustentável. Ele foi postulado pela primeira vez em 1983 com a publicação do Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento coordenada por Gro Harlem Brundtland. O documento intitulado “Nosso Futuro Comum” possui a seguinte definição para desenvolvimento sustentável: “é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades” (ONU, 1991, p. 46). O termo ganhou notoriedade com a Conferência do Rio de Janeiro e foi incorporado ao vocabulário de ambientalistas, políticos, empresários, industriais, Organizações NãoGovernamentais (ONGs) e sociedade civil no final do século XX e início do século XXI. 110 participantes na Coordenadoria Metropolitana I. Destaca-se um trecho de Agenda 21 Escolar, onde o tema desenvolvimento sustentável ocupou centralidade na preocupação de uma determinada escola no município de Nilópolis. A Agenda 21 foi apresentada para a comunidade escolar na reunião de discussão do Projeto Político Pedagógico, onde foram levantados os principais problemas da escola e da comunidade do entorno. Os itens que mais se destacaram foram: a falta de postos de saúde e o lixo. Para realizar um diagnóstico mais exato dos problemas que afetam o entorno da escola, os moradores da comunidade Ás de Ouro responderam questionários sobre a qualidade de vida local. Como o lançamento de lixo nos corpos d’água e nas ruas continuou sendo o problema mais mencionado, buscou-se, ao longo do ano letivo, implementar as seguintes ações: - Palestras que estimulem a coleta seletiva, a reciclagem e desencorajem o lançamento de lixo nos rios; - Criar um centro de recolhimento de óleo de cozinha, papel e garrafas PET na escola; - Realizar uma “Gincana Ecológica” com as turmas do Ensino Fundamental e do Ensino Médio (RIO DE JANEIRO, 2008). Nota-se que as tendências racionais e naturais dialogam entre si na redação final do documento da Agenda 21 Escolar apresentada pelos professores cursistas, em 2008. Embora, os cursistas tenham participado da formação continuada que buscou disseminar uma perspectiva crítica, a ação pedagógica traduzida neste documento encontra-se engessada pelo modelo conservador de educação. As práticas interventoras no contexto da ausência do poder público na comunidade Ás de Ouro, pouco polemizaram ou levaram a reflexão crítica quanto ao papel do Estado na transformação da realidade descrita. Coleta seletiva, reciclagem e recolhimento de óleo de cozinha acabam por se constituir atividadesfim, ausentando o viés político da Educação Ambiental e o verdadeiro papel transformador dos atores sociais enquanto sujeitos que constroem a história. Assinala-se que poucos cursistas veicularam, nas respostas de seus questionários, concepções relacionadas à tendência histórica. Nessa concepção: 111 (...) a relação homem-natureza não é definida naturalmente pela natureza, nem é definida cientificamente pela razão, mas construída social e politicamente pelo conjunto dos homens, construção essa que também lança mão dos conhecimentos científicos sobre a natureza como elementos importantes, mas não exclusivos, no processo educativo (TOZONI-REIS, p. 89, 2002). Tozoni-Reis (2002) assinala que esta tendência se encontra mais disseminada entre os professores de Geografia e das áreas das Ciências Sociais. Algumas respostas questionários revelam relações com esta concepção histórica. Para o Professor C: (Educação Ambiental) É o processo por meio coletivo de construção de valores sociais; culturais, desenvolvendo consciência crítica como uma questão ética e política para a preservação da vida (Grifo do autor). A influência da tendência histórica para a formação de educadores ambientais repercute no modo de pensar e agir a Educação Ambiental no espaço educacional. Dentro desta perspectiva, o Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania tentou fornecer os instrumentos teóricos e metodológicos aos professores cursistas para elaboração da Agenda 21 Escolar. Em muitas escolas, a metodologia participativa44 responsável por estimular o trabalho com a comunidade escolar, se configurou como inovação e desafio. Embora quase a totalidade das Agendas 21 Escolares produzidas pelas escolas da Coordenadoria Metropolitana I expresse uma prática de Educação Ambiental comportamentalista e tecnicista, os cursistas buscaram estabelecer o diálogo horizontalizado com a comunidade escolar para a construção desse documento. Os docentes foram incentivados a romper com a cultura escolar conservadora, aflorando ao processo da formação continuada de professores algumas contradições. 44 Ver capítulo 3, seção 3.2. 112 Analisando os documentos produzidos pelos professores cursistas na Coordenadoria Metropolitana I em 2008, nota-se um tímido crescimento da influência da tendência histórica entre os professores, se comparado com as respostas encontradas nos questionários em 2007. A seguir, ressaltam-se os objetivos de duas Agendas 21 Escolares: a primeira construída numa escola do município de Nilópolis e a segunda referente a uma escola do município de Japeri. Objetivos: Criar junto à comunidade escolar, uma rede de aprendizagem, para compartilhar saberes e práticas, valorizar as relações interpessoais e estimular a cultura da responsabilidade sócio-ambiental, propiciando ao aluno do curso de normal contato e vivências com diferentes temas e situações sócio-ambientais e, desse modo, ampliar a aquisição de mais e melhores informações, assim como, instrumento de compreensão do mundo, para poder atuar no meio que o cerca, para melhorar a sua participação e cooperação com outros segmentos engajados nesta luta, formando-se cada vez mais como um cidadão-produtor e crítico, não apenas um mero reprodutor dos “status quo” dominante (RIO DE JANEIRO, 2008). Objetivos: - Criar espaços na escola que favoreçam o diálogo, estimulando a reflexão sobre as questões sócio-ambientais e possibilitando relações de interação com educador-familia-escola quer sejam, de natureza econômica, ética e moral, favorecendo também a internalização e compreensão coletiva da realidade. - Incorporar as práticas pedagógicas experiências vivenciais sobre questões sócio-ambientais que contribuam para elaboração coletiva de uma Agenda 21 na escola (RIO DE JANEIRO, 2008). A necessidade de se criar espaços para promoção do diálogo entre escolacomunidade foi um aspecto importante propiciado pela formação continuada em EA e Agenda 21 Escolar. Infere-se que o espaço do diálogo nesse ambiente foi estimulado pelo curso, através da criação de uma equipe de trabalho, com representantes dos diversos segmentos da comunidade escolar cuja finalidade foi discutir Educação Ambiental. Com a 113 criação das equipes de trabalho, os professores cursistas foram estimulados a exercer o papel de mediadores com seu meio natural e social. Nesse sentido, o investimento na formação continuada oferecida pelo Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania indica um impacto positivo não apenas nas práticas docentes, mas na vida na escola, dinamizando-a. Para além da conceituação de Educação Ambiental, a Lei n° 9.795/9945 determina que ela se constitua componente essencial e permanente no currículo, abrangendo todos os níveis e modalidades do processo educativo. Amparando-se na Lei federal e estadual sobre a Política de Educação Ambiental, outra análise sobre concepções de professores em Educação Ambiental foi realizada. Ela diz respeito à proximidade dos saberes docentes em relação ao conceito de EA expresso pelas Políticas federal e estadual. As concepções prévias dos professores cursistas da Coordenadoria Metropolitana I presentes nos questionários se apresentaram de forma difusa. Onze cursistas entenderam por Educação Ambiental “um conjunto de ações capazes de provocar mudança de valores, princípios e atitudes”; quatro cursistas entendem como um “tema a ser trabalhado interdisciplinar e multidisciplinar pelas escolas”; quatro cursistas entendem como “um processo de aprendizagem”, e um cursista entendeu como “tudo que envolve a manutenção da vida”. Foram estabelecidas quatro categorias de respostas sobre as concepções em Educação Ambiental (Figura 1). 45 “Art. 2o - A educação ambiental é um componente essencial e permanente da educação nacional, devendo estar presente, de forma articulada, em todos os níveis e modalidades do processo educativo, em caráter formal e não-formal (BRASIL, 1999).” 114 O que você entende por Educação Ambiental? 11 12 10 8 6 4 2 0 4 4 1 “um conjunto de “tema a ser ações capazes de trabalhado provocar mudança interdisciplinar e de valores, multidisciplinar pelas princípios e atitudes” escolas” “um processo de aprendizagem” “tudo que envolve a manutenção da vida” Categorias de respostas Figura 1. Categorias de respostas dos professores sobre Educação Ambiental. Em 2007, cerca de 50% dos professores cursistas entenderam por Educação Ambiental ações e não um processo que levem aos “(...) valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências (...)”, conforme prescrito na Lei n° 9.795/99. Apenas 25% (percentual aproximado) entendem como processo. Eles ressaltaram, principalmente, a palavra “prática” na tentativa de traduzir o que vem a ser (ou deveria ser) Educação Ambiental. Após passar pelo processo de formação continuada, praticamente todos os professores cursistas agregaram o conceito expresso na Política Nacional (e Estadual) de Educação Ambiental na redação final das Agendas 21 Escolares na Coordenadoria Metropolitana I, em 2008. No ano de 2009, a concepção em construção dos professores sobre Educação Ambiental sugere mudanças de valores e hábitos, em todas as entrevistas. Outra palavra muito presente nas concepções prévias dos professores foi “preservação”, contrariando o conceito empregado pela Política Nacional de Meio Ambiente, que diz que a Educação Ambiental deve estar voltada para a conservação do meio ambiente. Em termos teóricos preservação é diferente de conservação. Segundo o 115 Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, Lei n° 9.985/2000 artigo 2° (BRASIL, 2000), as diferenças residem quanto ao tipo de uso do meio ambiente. Na preservação aplica-se o uso indireto, ou seja, “aquele que não envolve consumo, coleta, dano ou destruição dos recursos naturais”; na conservação aplica-se o uso direto, “aquele que evolve coleta e uso, comercial ou não, dos recursos naturais”. Segundo Diegues (2000) o conceito de conservação foi precursor do conceito de desenvolvimento sustentável (previsto na Política Nacional de Educação Ambiental), que se fundamenta nos princípios de uso racional pela geração presente, prevenção de desperdício e uso dos recursos naturais para benefício da maioria dos cidadãos. Nas entrevistas, os professores pouco mencionaram o termo “preservação” ou “conservação” em seus discursos. Uma professora do município de Mesquita destacou a dificuldade sentida em distinguir os conceitos de preservação e conservação dentro de sua comunidade escolar. De acordo a Professora W: Com certeza! Eu acho mesmo sendo professora de Biologia e Ciências, antes era uma visão assim muito cristalizada que eu tinha. Eu mesma tinha essa visão errada de falar de repente falar pra eles. E não você ter que... (pausa) Por exemplo, o Parque Municipal de Nova Iguaçu é uma área de proteção. É só proteção? As pessoas podem visitar? Visitar em que medida? Será que podem conhecer? Conhecer para preservar? Então, acho que o curso me ajudou bastante nisto. Em ver o que que é de fato o que é Educação Ambiental, que todo um contexto né?! É muito maior do que a gente imagina (Professora W, setembro de 2009). Mais difíceis. Eu acho que é tentar desvincular essa idéia do senso comum de repente de que a Educação Ambiental ela está relacionada só as áreas verdes, a preservação. Eu acho que isso é difícil até pra gente! Difícil até pra gente mesmo tentar desvincular, eu acho a maior dificuldade. A gente acaba esbarrando nisto (Professora W, setembro de 2009). Apesar de assimilar o conceito de preservação, seu maior desafio consiste na falta de segurança ao promover um processo de ensino-aprendizagem construtivista. Trata-se de 116 uma insegurança compartilhada por muitos professores, mesmo após passar por uma formação continuada. Um dos aspectos dessa insegurança refere-se ao trabalho interdisciplinar. Nos questionários aplicados em 2007, aproximadamente 25% dos professores entenderam Educação Ambiental como tema transversal, ou atribuem a ela o caráter interdisciplinar: “é um tema transversal e interdisciplinar que a cada dia se torna mais relevante a nossa sociedade (Cursista K, outubro de 2007).” Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (1998) e a Política Nacional de Educação Ambiental, Meio Ambiente é um tema transversal e Educação Ambiental é o processo para se trabalhar tal tema no espaço pedagógico. Na visão de Loureiro (2006) tratar meio ambiente como tema transversal tornou-se uma falha e um entrave dos processos educativos, porque tira a clareza do significado da dimensão política em educação. O autor assinala que: Esse fato se verifica ao observarmos que a atuação dos educadores vem tornando as iniciativas educacionais ambientalistas, limitados à instrumentalização e a sensibilização para a problemática ecológica, mecanismos de promoção de um capitalismo que busca se afirmar como verde e universal em seu processo de reprodução, ignorando-se, assim, seus limites e paradoxos na viabilização de uma sociedade sustentável. (LOUREIRO, 2006, p. 70) Apesar de estruturarem equipes para discutir e criar a Agenda 21 Escolar, os professores cursistas relataram que uma das maiores dificuldades encontradas para promover um trabalho interdisciplinar foi: a falta de parceria interna e a falta de tempo. Nesse sentido, a insegurança percebida pelos docentes ao trabalhar um tema que propõe romper com a estrutura disciplinar da escolar, está aquém de ser resolvida meramente por qualquer formação continuada. Não desmerecendo o papel interventor do professor, mas 117 essa questão nos remete a refletir a própria estrutura do sistema de ensino e da organização do espaço escolar. Dentre as respostas encontradas nos questionários, apenas uma apresentou uma concepção prévia mais ampla: “é tudo o que envolve a manutenção da vida em seu aspecto mais amplo (Cursista U, outubro de 2007).” Percebe-se nas diferentes concepções prévias sobre Educação Ambiental dos professores uma sutil aproximação com a concepção traduzida na Política Nacional de Educação Ambiental, mas com concepções incompletas. Praticamente todos eles não mencionaram o termo “sustentável” nos questionários semi-estruturados, embora o maior percentual de respostas tenha sido direcionado para “ações individuais e coletivas”. Esta lacuna foi de certa forma superada na etapa presencial do curso, na qual os professores cursistas discutiram o conceito de desenvolvimento sustentável na redação dos documentos da Agenda 21 Escolar. Ao confrontarmos as concepções prévias sobre Educação Ambiental dos professores cursistas com a concepção determinada na Lei 9.795/1999 identifica-se um afastamento de base conceitual. Infere-se quanto à formação inicial dos professores a existência de uma lacuna na formação de educadores ambientais. Mesmo com a consolidação legal da Educação Ambiental e sua inserção curricular no sistema de ensino brasileiro, ela é acanhada ou inexistente nas instituições de ensino superior que promovem os cursos de licenciatura. Logo, o contingente de profissionais formados nos cursos de licenciatura que atuarão exatamente nas instituições promotoras da Educação Básica possui pouco preparo ou não foi formado para se preocupar com as questões ambientais (salvo algumas exceções). Compete então, a formação continuada tentar sanar essa deficiência. A capacitação de recursos humanos constitui-se um princípio fundamental na determinação do sucesso na implementação das políticas públicas. O investimento na 118 formação docente não deve negligenciar a formação inicial. Os cursos de formação de professores, em todas as áreas, modalidades e níveis, deveriam promover um debate amplo e consistente, contemplando a temática ambiental. Sem descuidar da formação inicial, há urgência que se invista na formação continuada. Os saberes docentes passam pela formação profissional e deve apoiar-se em conhecimentos especializados e formalizados, segundo Tardiff (2000) a noção de “saber” “engloba os conhecimentos, as competências, as habilidades (ou aptidões) e as atitudes, isto é, aquilo que muitas vezes foi chamado de saber, saber-fazer e saber-ser.” A construção desses saberes possui relação tanto com a formação inicial (acadêmica) tanto com a formação continuada dos professores, principalmente em seu local de trabalho. Os professores cursistas trouxeram para o Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania saberes em Educação Ambiental, que foram construídos socialmente e são resultado da sua formação inicial, de suas histórias de vida e das suas experiências profissionais. Buscou-se reconstruir este saber docente durante o processo de formação continuada. Através das entrevistas, observaram-se mudanças sutis nas concepções docentes sobre EA. O curso contribuiu para enraizar a Educação Ambiental nas escolas, ou pelo menos sistematizou os saberes escolares em torno da questão ambiental. Como destaca a Professora K: Bom. Eu acho que nós que conseguimos é (pausa) formalizar melhor o que acontecia na escola. Até porque a escola ela já tem uma experiência na área ambiental. Desde 2000 nós começamos a fazer trabalhos ambientais, de uma forma é... pela vontade de uma equipe de Biologia. E nos fizemos vários projetos, por isto até que a FAETEC reconhece e nos convidou para participar da Agenda 21. Mas agora, com o projeto da Agenda 21 mais estruturado e outros profissionais fora da área da Biologia participando, nós (pausa) foi assim importante foi dar um salto na mobilização dos outros atores neste processo. Que hoje não tem só Biologia tem professor de Química na Agenda 21, tem professora de Língua Portuguesa, tem profissional da área de coordenação pedagógica. Então, ampliou o trabalho da Educação Ambiental, saiu do foco de só uma equipe. 119 O mesmo êxito não foi percebido para a construção do conceito de Agenda 21 Escolar. Em 2007, os resultados da aplicação do questionário semi-estruturado junto aos professores cursistas da Coordenadoria Metropolitana I no início da etapa presencial revelaram uma grande lacuna na formação dos professores, no que diz respeito à matriz teórica desse tema (Figura 2). O que você entende por Agenda 21 Escolar? 8 7 6 5 4 3 2 1 0 7 6 3 2 1 “um conjunto de ações que passam por um trabalho de reflexão e prática” “projetos em Educação Ambiental” “compromisso assumido pela escola” “instruções ou “um interface estatutos a entre a ciências serem sociais e cumpridos pelas ciências escolas” naturais” 1 em branco Categorias de respostas Figura 2. Categorias de respostas - Concepções sobre Agenda 21 Escolar. Cerca de 35% dos professores cursistas entenderam Agenda 21 Escolar como um “conjunto de ações que passam por um trabalho de reflexão e prática.” Esta categoria de resposta foi a concepção que mais se aproximou da idéia contida no documento da Agenda 2146, elaborado pela Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada na cidade do Rio de Janeiro, em 1992. (Agenda 21 Escolar) é o processo político pedagógico sobre o "meio ambiente" "educação ambiental", tendo como clientela o alunado; procurando elaborar projetos dentro das escolas, para que haja 46 Ver o capítulo 1, seção 1.1. 120 conscientização sobre o ambiente urbano, buscando abranger a realidade – local (Professor cursista J, outubro de 2007) (Grifo do autor). A construção de meios coletivos, com participação de toda comunidade escolar, com objetivos à pequeno, médio e longo prazo que de relacione com agenda 21, com as necessidades ambientais existentes no meio comunitário, portanto com uma melhora na qualidade de vida de todos (Professor cursista H, outubro de 2007). Nos dizeres dos professores cursistas “J” e “H”, a Agenda 21 Escolar requer a participação de toda a comunidade escolar, princípio coerente com a Política Nacional e Estadual de Educação Ambiental. Outro aspecto relevante mencionado no questionário foi a compreensão da Agenda 21 como processo de pequeno, médio e longo prazo. Ela se constitui como uma construção gradativa que visa à melhora da qualidade de vida. Essa concepção prévia foi reestruturada até certo ponto pelos professores cursistas, tendo em vista que elaboraram documentos, na qual a escola assumiu o compromisso de trabalhar Educação Ambiental durante todo o ano letivo, e não somente no dia 05 de junho – Dia do Meio Ambiente. O estímulo a participação da comunidade escolar na construção da Agenda, também mereceu destaque como resultado do processo da formação continuada. Para Loureiro (2006) a educação e sua dimensão ambiental, dentro da perspectiva crítica e emancipatória necessita de uma ação educativa integral e articulada a outras esferas da vida social – que consolide as políticas públicas democráticas e venha romper com o modelo contemporâneo de sociedade. A escola como espaço político precisa refletir a sociedade e pautar sua Agenda de discussões e lutas com toda a comunidade escolar, objetivando a transformação não apenas na qualidade de vida local, mas a mudança do modelo de sociedade orientado pela política pública nacional e mundial para o século XXI. A tomada de consciência individual e coletiva do papel político dentro da sociedade desfaz o discurso ingênuo e aparentemente neutro. 121 Entretanto, os avanços esperados com a formação continuada não foram amplamente correspondidos. Observa-se que os professores cursistas entenderam Agenda 21 Escolar como “projeto em Educação Ambiental”. Essa concepção prévia permaneceu cristalizada, mesmo após o processo de formação continuada oferecida pelo Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. Na etapa presencial, professores e estudantes cursistas discutiram os pressupostos teórico-metodológicos47 para construção da Agenda 21 Escolar e do Projeto de Intervenção. Foram realizadas oficinas onde os cursistas utilizaram diferentes técnicas para elaborar um diagnóstico socioambiental. Na etapa à distância, os professores cursistas receberam orientação da tutoria durante o processo de implantação da Agenda 21 Escolar. Todavia, os produtos finais apresentados pelas escolas demonstraram certa dificuldade em desmistificar o que vem a ser “Agenda 21 Escolar”, distinguindo-a de um “projeto de intervenção em EA”. O trecho a seguir representa uma das poucas considerações encontradas na redação dos documentos analisados, produzido por uma das escolas do município de Nova Iguaçu. A questão da desmistificação da Agenda 21 que era vista apenas como um documento ambiental, e passou a ser vista e principalmente como um documento político e social, e de poder de todos. Tornando o indivíduo, não só apontador, mas como um grande solucionador de problemas, foi um grande marco do projeto. Apesar de algumas dificuldades, os resultados alcançados foram positivos. O projeto de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar é reconhecido pela comunidade escolar como um instrumento de transformação social implementado através de parcerias entre diferentes agentes sociais. Notou-se que alguns hábitos que geravam o consumo irracional de recursos naturais e alimentação industrializada foram modificados a partir das atividades propostas no projeto (RIO DE JANEIRO, 2008). 47 Ver capítulo 3, tabela de conteúdos programáticos proposta para a formação continuada. 122 Dentre as doze escolas da Coordenadoria Metropolitana I, quatro conseguiram elaborar uma Agenda 21 Escolar e um projeto de intervenção em Educação Ambiental. Oito escolas formularam na verdade um projeto, não deixando clara a distinção entre as duas propostas. Ou seja, a concepção de Agenda 21 Escolar foi compreendida como projeto em Educação Ambiental. Alguns projetos giraram em torno de mais de um eixo temático, como por exemplo, Horta de ervas medicinais e Reciclagem do óleo de cozinha; propondo ações desconectadas entre si. A análise dos documentos nessas oito escolas revelou a subutilização ou o não uso do diagnóstico socioambiental. Apesar dos equívocos teórico-metodológicos, os professores revelaram, nas entrevistas realizadas em 2009, que o processo de construção da Agenda 21 Escolar continua apesar de encerrado o vínculo institucional escola-governo por meio do curso. Este dado revela a superação da concepção prévia sobre Agenda 21 Escolar encontrado em apenas 15% das respostas (“compromisso assumido pela escola”) dos professores cursistas, nos questionários em 2007. Dentre as doze escolas que concluíram todas as etapas do Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, somente três deixaram de desenvolver ações vinculadas a Agenda 21 Escolar. Nos diversos documentos analisados, verificou-se que o Projeto Político Pedagógico agregou a questão ambiental como diretriz condutora do trabalho escolar. Nota-se que a palavra “compromisso” foi ressaltada no ambiente escolar, superando a quarta categoria de respostas presente nos questionários, que compreendeu Agenda 21 Escolar como “instruções ou estatutos a serem cumpridos pela escola.” Ou seja, uma medida imposta pela política pública ao ambiente escolar. A última categoria de respostas presente no questionário, diz respeito ao entendimento da Agenda 21 Escolar como “interface entre as ciências sociais e ciências naturais”. Essa concepção prévia, embora tenha destoado do padrão das respostas das 123 demais categorias, demonstra a idéia que a construção de um documento político e social não pode abrir mão do diálogo entre as ciências e dos distintos saberes. A seguir, serão analisadas algumas das dificuldades e potencialidades encontradas pelos professores cursistas em suas escolas durante o processo de construção das Agendas 21 Escolares. 5.2. Contribuições da formação continuada em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: dificuldades e potencialidades enfrentadas pelos professores As políticas públicas educacionais enfatizam, na atualidade, a qualidade do ensino e o exercício da cidadania, como metas a serem atingidas pelas escolas brasileiras. Nesse contexto, a formação do professor é alvo de investimento do poder público que busca preparar melhor estes profissionais para os desafios da educação no século XXI. Candau (1996) destaca a formação continuada como uma estratégia clássica das políticas públicas, cujo objetivo consiste em implantar propostas para renovação das escolas e das práticas pedagógicas. Segundo a autora: “Qualquer possibilidade de êxito do processo que se pretenda mobilizar tem no professor em exercício seu principal agente (CANDAU, 1996, p. 140)”. A análise deste tema possui uma natureza complexa, possibilitando a investigação a partir de diferentes enfoques e dimensões. Neste trabalho pretendeu-se analisar as ações descritas nos relatórios mensais desenvolvidas pelos professores cursistas da Coordenadoria Metropolitana I na etapa à distância, propostas pelos projetos de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 124 Escolar, destacando as potencialidades e dificuldades enfrentadas pelos docentes durante o processo. Refinando os dados da pesquisa, os professores das doze escolas que concluíram o curso foram entrevistados em 2009. Buscou-se compreender qual a contribuição da formação continuada para a renovação das práticas pedagógicas. Na tabela 3 foram sintetizadas as informações contidas nos relatórios mensais dos professores cursistas da Coordenadoria Metropolitana I, no período de fevereiro de 2008 a junho de 2008. Dificuldades e Potencialidades encontradas pelos professores cursistas Mês das atividades Número de Dificuldades encontradas no Potencialidades da Agenda 21 relatórios período destacadas no período Escolar/2008 examinados - a falta de tempo; - o apoio da equipe administrativa e - falta de envolvimento dos pedagógica; demais Fevereiro 22 profissionais e estudantes; - pequeno grupo de professores e alunos motivados; - a falta de tempo; - apoio da direção escolar, de um grupo Março a falta de recursos de professores e de 20 financeiros; alunos; - falta de envolvimento dos 125 estudantes; - poucas parceiras internas e externas - desenvolvimento de uma conquistadas; prática pedagógica interdisciplinar, - a participação da comunidade escolar - a falta de tempo; - a participação da comunidade escolar; Abril sobrecarrega de 17 atividades; - a baixa participação dos - a participação da estudantes; comunidade escolar; - resistência de uma parte - aumento do número Maio 15 do corpo docente para de aderir ao projeto; parceiros no projeto; - rotina escolar; - o fator tempo; - respaldo do trabalho em parte da Junho 16 incompatibilidade de comunidade escolar; horário com os demais professores; - fortalecimento das parcerias no projeto; 126 - a falta articulação com outros grupos; - falta de motivação por parte de um grupo de docentes; - a falta de apoio da Coordenadoria Metropolitana I; Tabela 3. Síntese das dificuldades e potencialidades encontradas durante a etapa à distância (fevereiro a junho de 2008). De acordo como os cursistas, o mês de fevereiro de 2008, período para a realização das ações de intervenção dos projetos, foi considerado curto e houve pouco contato com os discentes e comunidade escolar. As ações descritas dizem respeito à primeira etapa do planejamento participativo: sensibilização da comunidade escolar quanto à questão ambiental e estruturação de uma equipe de trabalho. Segundo o Professor Y: (...) As primeiras semanas foram de planejamento e escolha do Projeto Político Pedagógico, e alguns contratempos como falta de luz na escola fizeram com que as aulas fossem suspensas e os alunos dispensados. Meu primeiro contato com eles (os estudantes), só ocorreu dia 29/02/2008. Este processo de elaboração do planejamento participativo, suscitado pelo Curso, na escola, nos remete para a contribuição de Candau (1996) acerca da importância da escola como lócus da formação continuada. Entretanto, a construção dessa nova 127 perspectiva de formação continuada de professores não ocorre de maneira espontânea. Para a autora “(...) não é o simples fato de estar na escola e de desenvolver uma prática concreta que garante a presença das condições mobilizadoras de um processo formativo” (1996, p. 144). Os depoimentos dos professores cursistas, contidos nos relatórios, sinalizam a falta de tempo como fator limitante para mobilizar a comunidade escolar interna e externa. A FAETEC, por exemplo, não liberou os seus profissionais para realizarem as atividades da Agenda 21 Escolar. A falta de tempo também foi relacionada à incompatibilidade de horário com outros docentes, direção, demais estudantes e comunidade escolar. Algumas cursistas sinalizaram a não liberação da GLP como motivo que interferiu negativamente na execução do projeto: (...) Continuo com todas atividades anteriores e mais a Agenda 21. Diferente do oferecido aos professores da Rede Estadual de Educação (Professora cursista Z). Tendo em vista, o ano letivo ter iniciado há poucos dias e a escola ter sido “Pólo de Matrícula” e também a carência de diversos professores estes primeiros dias de atividades escolares, foram um pouco conturbados, tornando difícil o encontro para que pudéssemos estabelecer as metas que iremos seguir no decorrer deste ano (...) ( Professor cursista K,). Observa-se que o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania inseriu no lócus escolar uma proposta de trabalho pedagógico integrado e interdisciplinar, porém dentro de uma estrutura escolar fragmentada e disciplinar. As conseqüências deste impasse também foram relatadas pelos professores como dificuldades enfrentadas no período. A falta de envolvimento dos profissionais e estudantes foi justificada pela grande resistência encontrada a nova proposta na escola, 128 passando pelo pessimismo e desconhecimento da Agenda 21 Escolar. De acordo com o depoimento de alguns docentes: Estimular professores que trabalham com uma carga horária muito grande, são mal pagos e ainda assim conseguem nos ouvir e ajudar (Professor cursista C). (...) baixo comparecimento dos alunos, falta de interesse (por achar que a educação ambiental é um tema inútil e não dão a devida importância. (Professor cursista M) (...) apenas o pessimismo de alguns colegas que criticam, mas não apontam soluções e recursos financeiros. (Professor cursista J) A ausência de solução por parte do Estado para gerenciar os desencontros entre os atores sociais da escola, provocados pela estrutura educacional – dificulta o trabalho pedagógico reflexivo. Nessa direção, romper com a “armadilha paradigmática”, primeiro eixo formativo da formação continuada, defendido por Guimarães (2007), passa a ser um desafio quase intransponível. Desafio que oportuniza os docentes a atuarem como atores políticos, capazes de construir um projeto pedagógico contra-hegemônico, ao reivindicarem um espaço de diálogo e reflexão dentro da escola. Outro desafio relatado pelos professores cursistas consistiu em envolver a comunidade escolar nas ações dos projetos de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. Principalmente, nas escolas localizadas em áreas urbanas, cujo espaço geográfico foi densamente ocupado por comércios, indústrias, domicílios e outros. Além, de a própria escola atender um universo tão significativo de estudantes. Como assinala um professor: 129 Abranger todo o universo da escola requer muito trabalho. O fato de ser uma instituição muito grande torna a propagação e o desenvolvimento das ações, mais lentas. (...) A escola é muito grande. Temos uma média de 3.500 (três mil e quinhentos) alunos divididos em três turnos o que impede que possamos estar sempre em contato com todos os grupos (Professor cursista F). O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania traçou como meta da formação continuada levar os professores e a comunidade escolar a refletir sobre os problemas socioambientais locais e globais. Os cursistas procuraram estabelecer relação entre os grandes temas globais e a sua realidade local. O princípio deste processo contou como o apoio administrativo e pedagógico da escola. Outra potencialidade destacada nos relatórios foi o apoio de um pequeno grupo de professores e estudantes motivados que contribuíram positivamente. Uma professora cursista do município de Nilópolis mencionou o interesse dos professores quanto ao material pedagógico trabalhado na etapa teórica da formação continuada. O material fornecido pelo curso: Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21, que despertou o interesse de vários professores (Professora cursista M). No mês de março de 2008 as ações descritas em alguns relatórios dizem respeito ao diagnóstico socioambiental realizado por professores e estudantes. A maioria das escolas concentrou esforços para mobilizar toda a comunidade escolar, além do investimento em parcerias internas e externas. Outra ação importante foi a construção dos documentos da Agenda 21 Escolar e do projeto de intervenção em Educação Ambiental. 130 Embora, alguns professores cursistas tenham recebido remuneração por meio de GLP48 para se dedicar ao Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, ainda assim, encontrou no fator tempo uma das maiores dificuldades para executar as ações propostas. O tempo muito pequeno e a escola muito grande para tantas necessidades, nesse período principalmente, com a montagem e finalização do projeto (digitação) faltam oportunidades para dar seqüência às atividades que estão começando a se desenvolver (Professora cursista R). O pouco investimento na comunicação entre os interlocutores do processo de construção da Agenda 21 Escolar, devido principalmente à desarticulação entre os mesmos, dificultou o seu desenvolvimento. A falta de apoio por parte de um grupo de professores e de alunos continuou sendo outro fator muito mencionado nos relatórios. Apesar das dificuldades em agregar uma parte do corpo docente em torno do projeto (...), a falta de tempo dos agentes envolvidos é um fator que dificulta a elaboração de um planejamento participativo (Professora cursista A). Nos relatos dos professores cursistas ficou evidente a ausência de sinergia durante o processo de construção das Agendas 21 Escolares. Nesta direção, assinala-se que o Curso contribuiu para a formação de multiplicadores em EA, e não dinamizadores de ambientes educativos, dentro de uma perspectiva crítica. Os cursistas relataram que seus colegas alegavam que não era atribuição deles desenvolver a EA, sinalizando um não 48 Gratificação por Lotação Prioritária (GLP). 131 pertencimento e, ainda, que os únicos responsáveis pela Agenda 21 Escolar eram os cursistas. Segundo os depoimentos, mais uma vez a estrutura educacional fragmentada influenciou o processo de construção do diálogo entre os atores sociais pertencentes à comunidade escolar. A dificuldade em conquistar um espaço de reflexão e troca de experiência entre os professores, contribuiu para a não valorização dos saberes docentes durante o processo de debate e implantação da Agenda 21 Escolar. Candau (1996) aponta para a valorização do saber docente como um dos eixos essenciais que devem estar presentes dentro de uma nova perspectiva da formação continuada de professores. No entanto, estes saberes são continuamente desvalorizados, dentro de uma análise mais política, por reconhecer que o papel social dos professores é estratégico. De acordo com a autora: “Estratégico porque, como grupo social e por suas funções, os professores ocupam uma posição especialmente significativa no interior das relações complexas que unem as sociedades contemporâneas aos saberes que elas produzem e mobilizam com diversos fins (1996, p. 146).” Contraditoriamente, a desvalorização dos saberes docentes passa pelo não reconhecimento dos conhecimentos transmitidos por estes profissionais, devido a sua posição política estratégica na sociedade. Nesta direção, Ozga (2000) sinaliza que os professores passaram, então, a ser alvo do forte controle estatal. Nesse sentido, a diminuição da autonomia dos professores está presente, segundo Ozga (2002), no aumento: da responsabilidade, da burocracia, de stress, de organização e controle, da insegurança no emprego, da pressão em implementar a legislação e, ainda, na diminuição dos benefícios e da valorização profissional. 132 A desvalorização profissional se constituiu um fator muito citado nos discursos dos professores ao serem exigidos resultados vinculados ao Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania. Os relatórios acabaram por se constituir um campo de contestação e desabafo contra a política educacional do Estado do Rio de Janeiro. Alguns cursistas mencionaram a falta de recursos financeiros (atraso do repasse da GLP e falta de materiais na escola) como fator que prejudicou o andamento das atividades nas escolas: (...) O que está acontecendo é que o professor, além de dedicar sue tempo sem remuneração, acaba por gastar dinheiro do próprio bolso para o cumprimento de tarefas e compromissos pertinentes ao projeto (Professor cursista F). Concatenar horários dos diversos professores envolvidos, pois todos têm uma grande carga de trabalho (Professor cursista G). Esta ausência de apoio por parte dos professores é justificada em alguns relatórios devido à grande carga horária de trabalho assumida pelos professores da rede estadual de ensino. Embora tenham que cumprir dezesseis horas, de acordo com o concurso público, praticamente todos os profissionais possuem outra matrícula na rede estadual e/ou municipal e vínculos com a rede particular de ensino, decorrente da baixa valorização e remuneração do magistério pelo Poder Público. O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania contribuiu não apenas para fomentar a discussão sobre a crise ambiental, mas para submergir a crise nas relações de trabalho. Esta questão não foi aprofundada dentro de uma perspectiva política e crítica, apenas a “ponta do iceberg” foi revelada. 133 Outro problema mencionado por alguns professores cursistas está relacionado com a dificuldade de estes profissionais desenvolverem uma prática pedagógica interdisciplinar, proposta da Educação Ambiental e enfatizada por todos os documentos oficiais. (...) marasmo e quem sabe, até falta de traquejo de alguns colegas, em trabalhar o projeto transdisciplinar, incorporando a temática e ações propostas aos seus conteúdos conceituais e procedimentais (Professor cursista P). Mudar a cultura escolar calcada no conhecimento fragmentado e disciplinar não constitui uma tarefa fácil. O processo de formação continuada proposto pelo curso não foi suficiente para modificar uma cultura cristalizada. Romper como o paradigma dominante leva tempo e persistência. Além disso, demanda transformação nas relações de trabalho, na própria organização da escola. Depositar no processo de formação continuada (dentro de uma visão hegemônica) tanta esperança revela uma postura de certo modo ingênua ou, ainda, o desconhecimento acerca dos complexos processos de formação de professores. Esta crença, além de constituir um posicionamento idealista, também colabora para a implementação de ações pouco satisfatórias no âmbito das políticas públicas. Nos meses de abril, maio e junho de 2008, dentre as ações da escola, destacou-se a entrega dos documentos construídos coletivamente pelos professores cursistas, como resultado da formação continuada. As ações específicas de cada projeto foram mencionadas. O tema central abordado pela maioria das escolas foi o lixo, e em menor proporção dengue e horta. Falta de tempo, desmotivação e resistência de um grupo de discentes e docentes foram os relatos freqüentes nos relatórios. Além da falta de apoio de uma parcela dos 134 docentes, um cursista mencionou também a falta de apoio da Coordenadoria Metropolitana I quanto às ações dos projetos de intervenção em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar diretamente nas unidades escolares. Nossas maiores dificuldades ocorreram à medida que alguns colegas ainda resistem à idéia de trabalharmos algo novo na escola e principalmente por acharem que o projeto da Agenda 21 escolar tratavase de um projeto particular, sendo responsabilidade apenas das professoras cursistas (Professora cursista P). A disponibilidade de tempo é um fator que não tem contribuído muito, pois na minha opinião, neste momento aonde estão sendo realizados esforços hercúleos para que estas práticas se internalizem em uma prática contínua e permanente, o tempo é um fator imprescindível (Professor cursista N). Também, acredito que uma dificuldade, ou provavelmente a palavra certa não seja esta, mas percebo que a Coordenadoria Metropolitana I parece ou não se importa muito ou quem sabe, não vê a importância destas ações, pois não conheço e nem participei ainda de um evento ou algo parecido que procure divulga ou mesmo ampliar para outras unidades. Digo, uma ação séria, não uma maquiagem momentânea (Professor cursista N). O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania foi capaz de estimular o protagonismo ambiental entre os profissionais da educação e os estudantes da Rede Estadual de Ensino. Os professores cursistas assumiram o papel de liderança em suas escolas, e alcançaram resultados positivos se comparado com o fator limitante: tempo. Pode-se afirmar que o quarto eixo formativo defendido por Guimarães (2004) foi alcançado no curso, ao investir na formação de lideranças com uma visão mais crítica quanto ao processo educativo em EA. No mês de outubro de 2008 o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania foi encerrado com a apresentação dos resultados 135 parciais do projeto de intervenção em Educação Ambiental, através de uma Mostra da Agenda 21 Escolar na UERJ/Campus Maracanã. Em 2009, terminado o vínculo institucional da escola como o Curso, onze professores das doze escolas da Coordenadoria Metropolitana I foram entrevistados. O relato dos professores nas entrevistas sinalizou que o impacto da formação continuada foi pontual na prática pedagógica dos profissionais envolvidos. Dentre as doze escolas, nove continuaram a desenvolver um projeto de Educação Ambiental de maneira parcial; três escolas deixaram de executar ações relacionadas com o tema. A justificativa das três escolas pode ser sintetizada pelo discurso do professor F, do município de Queimados, que ao ser perguntado sobre o porquê da não continuidade da Agenda 21 Escolar, respondeu: Olha eh! Acabou meio que caindo no esquecimento após o curso. Mesmo durante o curso já houve muita dificuldade em tentar implementar alguma coisa lá. A gente fez na época uma atividade voltada praquela questão da dengue. Tentar envolver os alunos, tentando fazer um viés meio que a parte da saúde com a questão ambiental também, que tem alguma coisa a ver. Culminou com a apresentação aqui na UERJ, na semana de apresentação de pôsteres. Depois disso, eh... a gente não desenvolveu mais nada. Pretendia até implementar uma horta orgânica na escola. Foi pedido auxílio da direção. Na época a direção disse eh... que ia providenciar os recursos necessários, só que ficou nisso. A escola nunca deu retorno (Professor F). Olha eh! Um pouco a questão de tempo. Falta de envolvimento do restante da escola. A questão dos recursos mesmos pra colocar alguma coisa em prática. Talvez tenham sido estes os maiores empecilhos (Professor F). Os mesmos fatores sinalizados como dificuldades enfrentadas professores, mencionados nos relatórios em 2008, voltaram a estar presente nos discursos dos docentes em 2009. Ou seja, a estrutura e a organização do espaço escolar não mudaram mesmo após 136 o processo da formação continuada em EA e Agenda 21 Escolar. Vale ressaltar que as cópias de todos os relatórios dos cursistas, em todas as Coordenadorias Metropolitanas foram encaminhadas para a SEEDUC. Logo, a Secretaria de Estado de Educação tomou ciência dos fatores que dificultaram o processo da formação continuada em EA como uma política pública. O lixo continuou a ocupar centralidade nas ações do projeto de intervenção em Educação Ambiental, outras temáticas não foram mencionadas. A conscientização dos alunos foi um discurso recorrente entre os professores quanto à maior dificuldade encontrada para trabalhar temas em Educação Ambiental. Eu acho que é mais difícil que eu sinto em nossos alunos é a conscientização. Que tem que ser constante, constantemente, diariamente feita pelos nossos professores em sala de aula. Porque se o professor não tiver uma... uma... um envolvimento né, se não tiver um envolvimento com a questão do meio ambiente, fica muito difícil! (Professora E). Trabalhar a interdisciplinaridade continua sendo um desafio para os professores, na qual a insegurança foi esboçada em alguns discursos. Mudou bastante o meu olhar sobre esta temática. Mas, é aquele negócio eu ainda sinto dificuldade! Acho que deveria ter uma linha. Não sei! Uma linha a seguir. Tá muito solto ainda (Professora K). A descontinuidade do trabalho também voltou a ser mencionada entre os professores como uma das dificuldades enfrentadas pelos docentes nas escolas. Eh... mais uma vez a descontinuidade. Você (pausa) Alguns professores participaram e esses professores continuam em suas escolas isolados. Não 137 existe nenhum mecanismo, nenhum outro órgão, nenhuma outra estrutura, nenhuma outra agência, nada que faça com que essas pessoas retornem a conversar de novo. A trazer os seus trabalhos, e ficam isolados. Fica cada um fazendo a seu modo, a seu tempo... e entra aí de novo o processo da descontinuidade. Estes professores poderiam ser multiplicadores, ao invés não sei se isto seria possível ao invés de estarem em sala de aula, seriam usados como multiplicadores em outras escolas. Eu acho que seria vantajoso tanto pra Secretaria de Educação, tanto pra Secretaria de Meio Ambiente e pros próprios professores. Porque professores estariam vendo professores de rede que mesmo com suas dificuldades conseguem pelo menos fazer algo, fazer a diferença para a questão ambiental!(Professor X) Percebe-se que, no discurso do professor X, o trabalho em EA nas escolas continua sendo um trabalho muito solitário, mesmo dentro da realidade das Unidades Escolares que continuaram a desenvolver ações da Agenda 21 Escolar. Outra questão extremamente importante levantada pelo professor F na entrevista foi o questionamento sobre como promover um trabalho pedagógico que conduza a cidadania dentro de áreas desamparadas pelo poder público. Em relação a questão ambiental? Eh! (pausa) Se for pensar não tem mais eh... difícil. Acho que a própria questão de cidadania é uma coisa complicada! Quando você trata com alunos que muitas vezes vivem em condições um tanto precárias, fica difícil você eh... conscientizar pessoas a não realizar determinadas atitudes eh... dada a condição dele. Por exemplo, fica difícil você falar para uma pessoa fazer uma coleta seletiva em casa, separar o lixo e coisa do tipo, enquanto na rua dele não existe nem uma coleta de lixo comum, convencional! Entendeu? A questão de esgoto também. Jogar lixo em margem de córregos. Quer dizer, você fala pro aluno, então ele fala: - Mas professor, eu vou jogar aonde? Acho que é mais ou menos por aí que é o maior problema (Professor F). O problema da ausência do recolhimento do lixo comum pelo órgão público, no entorno da escola do professor F, remete-se a reflexão de que nem sempre a escola deve resolver problemas. A escola não é a responsável pelo serviço de limpeza pública, todavia 138 pode exercer uma cidadania de conquista no ambiente escolar. O problema não é só a produção de lixo, é preciso questionar o consumo dentre outras questões. O diagnóstico socioambiental da Região Metropolitana do Estado Rio de Janeiro, levantado pela SEA49 apresentou um complexo quadro para a região. O enfrentamento dos problemas socioambientais nas áreas mais críticas requer ações coletivas oriundas de vários setores da sociedade civil. A localidade da escola do professor F pode ser enquadrada como uma área crítica, onde os serviços essenciais não são prestados a população, negligenciando condições sanitária, sociais e ambientais equilibradas e satisfatórias para todos. É ingênua a proposta de formação continuada em EA que pensa ser a escola a heroína no combate aos problemas sociais e ambientais. A escola enquanto instituição educacional exerce importante papel como pólo de reflexão, discussão e intervenção política sobre a realidade local de sua comunidade. Desde que seu Projeto Político Pedagógico seja fruto de uma construção coletiva e possua clareza política e ideológica sobre sua função social. Torna-se importante reconhecer os limites a as potencialidades da escola dentro do jogo político. Importante também é inserir ao trabalho pedagógico uma perspectiva de educação construtivista, que leve educando e educadores a refletir/agir politicamente o seu espaço local/global, reconstruindo as relações sociais – caminho legítimo para o exercício da cidadania. A questão do financiamento de projetos em EA e o pouco envolvimento de parcerias (interna e externa) na escola voltaram a ser mencionadas nas falas dos professores como fatores que dificultaram o trabalho pedagógico. 49 Ver capítulo 3, seção 3.2. 139 Eu tinha uma parceira que não era matrícula na escola, ela era GLP. Não retornou para a escola como GLP. Eu fiquei sozinha. Então, ficou muito difícil para o projeto eu sozinha levar. Ainda mais que a escola já desenvolve vários projetos, então a gente não tem parceria. Ficamos sem parceiros. Eu continuo desenvolvendo algumas ações, mas sozinha (Professora K). Quanto às potencialidades mencionadas nas entrevistas, todos os professores relataram que a formação continuada propiciada pelo Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania auxiliou o trabalho pedagógico em sala de aula. O curso foi capaz de atender as expectativas dos professores quanto à instrumentalização teórico-metodológica. Houve uma ampliação de conhecimentos sobre o trabalho escolar em Educação Ambiental. Muitos mencionaram a mudança de postura sobre o tema, após a formação continuada. Olha teve, porque eu passei a ter uma postura mais de discussão. Não só aquela coisa de ficar ali passando informação para os alunos, mas tentar mudar um pouco a dinâmica de trabalhar o tema. A apresentação é um pouco mais informal. Uma roda de conversa. Uma roda de debate. Eh... isso foi visível (Professor F, Queimados, 2009). Todos os professores relataram que o formato do curso foi adequado. Criticaram a etapa presencial aligeirada, e reconheceram algumas falhas existentes em qualquer processo. Defenderam um modelo de formação continuada presencial, capaz de valorizar os saberes docentes. Os professores sinalizaram a necessidade de continuarem a participar de uma formação continuada em Educação Ambiental. Eles ainda se sentem inseguros ao trabalhar com projetos em EA sob uma perspectiva emancipatória. Com o objetivo de auxiliar o processo de formação continuada em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar dentro do viés crítico, a presente pesquisa elaborou um vídeo sobre essa temática, discutido na seção a seguir. 140 5.3. O vídeo como produto final: “Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: construindo o espaço da cidadania” A abordagem em Educação Ambiental, encontrada nos diversos documentos oficiais (internacionais e nacionais), recomenda investir numa mudança de mentalidade, conscientizando os grupos humanos acerca da necessidade de adotar novos pontos de vista e novas posturas diante dos dilemas e das crises a qual atravessa a humanidade, almejando alcançar a sustentabilidade ambiental (BRASIL, 1999). As estratégias de ensino precisam se adequar ao perfil que se configura a sociedade contemporânea. Fazer com que o indivíduo seja sensibilizado e persuadi-lo para a questão ambiental, dentre tantas outras questões emergentes na sociedade torna-se tarefa árdua e desafiadora diante dos educadores ambientais. Num primeiro momento, a tarefa que compete aos educadores ambientais no processo de ensino-aprendizagem é sensibilizar o discente quanto aos problemas socioambientais que lhe são mais próximos. O discente precisa ser levado a desconfiar da aparente normalidade, dizendo não a “aparência dos fatos” sociais e afastando-se dos perigos da compreensão espontânea (BARDIN, 2009). E, neste processo, o aluno precisa ser tocado em suas emoções, por meio de reflexões e ações capazes de propiciar uma aprendizagem significativa. Num primeiro instante levá-lo a emoção, posteriormente à razão. Daí então, aprender a olhar e ler o mundo criticamente. O trabalho pedagógico em Educação Ambiental pode/deve provocar reações emocionais e oportunizar a reflexão crítica da realidade por todos aqueles envolvidos no ambiente escolar, desconstruindo a visão ingênua e apolítica sobre os problemas socioambientais (locais e globais). A compreensão dos componentes fisiológicos, psicológicos e sociais das emoções ilumina nosso entendimento quanto a sua interferência 141 para uma aprendizagem significativa. A complexa definição de emoção para a ciência, no âmbito da fisiologia das emoções segundo Vonderhahe (1944) apud Mariano Jr. (1975) encontrada na literatura é: Emoção é uma maneira de sentir e uma maneira de agir. Pode ser definida como a tendência de um organismo a aproximar-se ou afastar-se de um objeto, acompanhada de marcadas alterações somáticas – um impulso para agir e um elemento de prontidão ou alerta, uma superconsciência ou vividez dos processos mentais (MARINO Jr., 1975, p. 4). Infere-se que a emoção está diretamente relacionada à aprendizagem humana, e esta interage com as estruturas orgânicas, psicológicas e sociais do indivíduo. Explicar o comportamento humano fundamentado em sólidas bases bioquímicas, psicofisiológicas, funcionais e psicogenéticas traz valiosas contribuições na logística da economia, educação, ciência, política e outras áreas. Por exemplo, no campo da publicidade o uso de imagens pela sociedade contemporânea tem se constituído como um poderoso instrumento da indústria do consumo, devido ao seu papel de estimular as emoções persuadindo o consumidor a comprar uma idéia ou produto. Ao mesmo tempo em que o conhecimento sobre o comportamento humano tem sido usado para fixar valores embasados no consumismo desenfreado e desmedido, a sociedade precisa reagir e usá-lo a favor da conservação do meio ambiente e preservação da vida. Guimarães (2007) afirma que a sociedade tem pressionado as escolas a desenvolver ações em Educação Ambiental, difundindo-a e institucionalizando-a através da prática pedagógica dos professores. Segundo o autor: “a EA já é uma realidade para os professores e estes estão fazendo, ou se sentem compelidos a se debruçar sobre essa nova dimensão 142 educativa” (2007, p. 119). No entanto, essa prática pedagógica ainda se apresenta muito fragilizada e engessada pelo modelo conservador de educação. Mesmo sensibilizados os professores que inoculam a dimensão ambiental em suas práticas educativas, segundo Guimarães (2007), não conseguem ir além de uma proposta de educação conservadora. As ações em EA refletem um modelo tecnicista e comportamentalista, não modificando ou problematizando a realidade. Um dos caminhos possíveis de serem apontados para a transformação desta realidade trata-se de um investimento na formação continuada de professores. A elaboração do vídeo, como recurso didático para a formação continuada de professores em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, levou em consideração a possibilidade de sua inserção social. A construção do vídeo, produto final da dissertação de mestrado, procurou corresponder à necessidade e demanda de novos recursos tecnológicos no âmbito educacional. O objetivo é fornecer um suporte teórico comprometido com uma Educação Ambiental transformadora, e ainda auxiliar o trabalho pedagógico dos professores em exercício. Observa-se que a formação continuada de professores em EA transformadora não pode abrir mão do momento de sensibilização dos atores envolvidos quanto aos problemas socioambientais locais e globais, levando-os a reflexão crítica da realidade. O vídeo como recurso didático pode constituir um imponente aliado no processo de formação continuada de professores. Sua utilização poderá sensibilizar e persuadir o indivíduo, convidando-o a construir o conhecimento e refletir criticamente sobre o seu posicionamento político dentro da sociedade. O uso de vídeo possui grande potencial de interferência no processo ensinoaprendizagem, razão explicada pela sua composição de recursos capazes de estimular os sentidos da audição e visão. Um vídeo possui características vantajosas em relação a outros 143 recursos didáticos comumente aplicados no espaço formal da educação, como livro, quadro-de-giz, rádio e outros porque pode formar um mosaico de possibilidades na transmissão das informações por meio do uso de texto, som e imagem. Além de ser economicamente viável, sob o ponto de vista do custo final do produto e do aparato tecnológico necessário para a sua aplicação. Obviamente, este recurso por si só não é capaz de provocar a reflexão, ele precisa estar inserido dentro de um planejamento estratégico com metas bem definidas e não ser um fim em si mesmo, mas um meio para se atingir uma finalidade. Ele também não pode ser entendido como um recurso didático capaz de substituir o recurso humano, se não cairíamos num enorme equívoco e contradição ao retirar como componente fundamental no processo dialógico para uma Educação Ambiental transformadora – o ser humano. O uso de vídeo no processo de ensino-aprendizagem estimula diferentes partes do sistema límbico, estabelecendo diferentes conexões neurais devido aos diferentes recursos 50 empregados: texto, som e imagem. Além disto, um vídeo pode ser capaz de estimular as emoções registrando positivamente as informações transmitidas. Portanto, o vídeo como recurso didático pode trazer valiosa contribuição para a formação continuada de professores em Educação Ambiental, favorecendo os mecanismos 50 Segundo Esperidião-Antonio et al (2007) as informações que chegam ao cérebro percorrem um determinado trajeto ao longo do qual são processadas. Elas são direcionadas para as estruturas límbicas e paralímbicas, pelo circuito de Papez, ou por outras vias, para adquirirem significado emocional, dirigindo-se em ato contínuo para determinadas regiões do córtex cerebral, permitindo que sejam tomadas decisões e desencadeadas ações e processos relacionados à autonomia – função geralmente dependente do córtex frontal ou pré-frontal. A capacidade de retenção das informações pelo telecéfalo no processo de aprendizagem passa a ser alvo de interesse não apenas da ciência, mas de outras áreas que constituem sociedade. No âmbito do sistema educacional, o uso deste saber pode vir a orientar a adoção de novas metodologias de ensino e a aplicação de recursos didáticos mais eficazes, por exemplo, as multimídias. Para Esperidião-Antonio: “As imagens certamente provocam, em sua maioria, ativação do córtex visual occipital (giro occipital e giro fusiforme), porém a amígdala também recebe quantidade substancial de estímulos provenientes das áreas temporais associadas à visão, participando na formação de memórias através dos circuitos hipocampais ou dos circuitos estriatais. Tal fato decorre do papel especializado da amígdala no processamento de insinuações emocionais visualmente relevantes, sinalização do medo e aversão ou outras evidências” (ESPERIDIÃO-ANTONIO et al, 2007, p. 63). 144 de assimilação e acomodação do pensamento e aprendizagem humana para as questões socioambientais. A construção do vídeo “Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: construindo o espaço da cidadania” amparou-se nas reflexões e análise desta pesquisa. A partir das concepções prévias e em construção dos professores sobre EA e Agenda 21 Escolar, levantadas e analisadas nos questionários, relatórios e entrevistas semi estruturadas, constatou-se uma fragilidade teórica entre os professores quanto à perspectiva crítica da EA. A compreensão das dificuldades e potencialidades enfrentadas pelos professores da Coordenadoria Metropolitana I ao executarem as ações propostas pelo Curso de Formação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania revelou um grande equívoco na concepção metodológica ao serem elaborados os documentos da Agenda 21 Escolar e do Projeto de Intervenção em EA. Nesse sentido, o roteiro do vídeo foi estruturado de maneira a fomentar a discussão teórica sobre os conceitos de Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar sob uma perspectiva crítica. Além de propor uma metodologia de construção de Agenda 21 Escolar e de projeto em EA no âmbito escolar. Com o objetivo de estabelecer um diálogo horizontalizado na pesquisa entre pesquisador-pesquisado, foram coletados dados com onze professores da Coordenadoria Metropolitana I que participaram do processo de formação continuada, usando a entrevista semi-estruturada. Buscou-se valorizar os saberes docentes na construção do vídeo “Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: construindo o espaço da cidadania”. Nestas entrevistas foram investigados os temas mais difíceis em EA de serem abordados em sala de aula pelos professores, questionando-se o que os professores acham da utilização de vídeo para trabalhar com EA e quais os temas que eles gostariam que fossem abordados. As entrevistas apontam para a dificuldade dos docentes em trabalhar 145 uma Educação Ambiental transformadora. O lixo, o consumo e a mudança de atitudes dos alunos em relação ao meio foram as maiores dificuldades mencionadas pelos professores para se trabalhar em sala de aula. Guimarães (2007) aponta para o motivo desta limitação encontrada pelos docentes na escola: a falta de reflexão crítica e a não ruptura educacional com o paradigma sustentado pelo modelo hegemônico da sociedade capitalista. Os professores cursistas adotam como ações dentro de um projeto em EA para discussão a cerca do lixo, a reciclagem, a coleta seletiva e a mudança de hábitos de higienização do ambiente. Layargues (2002) compreende que estes projetos enquadram-se dentro da visão reducionista do que vem a ser a Educação Ambiental. A ausência de um debate mais profundo sobre a cultura da sociedade de consumo, passa despercebida de questões como o industrialismo, o modelo de produção capitalista e os aspectos políticos e econômicos do lixo (LAYARGUES, 2002). O modelo educacional conservador impregnado nos projetos em EA desenvolvidos pela escola, e pelos professores refletem outra dificuldade relatada pelos cursistas em sala de aula: a descontinuidade e a não transformação dos valores sociais, culturais, ambientais e éticos dos discentes após passar por estes projetos. Segundo depoimento dos professores cursistas, existe uma constante necessidade em falar repetidamente as mesmas recomendações aos discentes quanto ao cuidado como o ambiente, como se fosse a primeira vez. Os temas sugeridos pelos professores cursistas para serem abordados num vídeo também giraram em torno da questão do lixo, em sua maioria, dos problemas socioambientais e da necessidade de se provocar a mudança. Majoritariamente, o vídeo como recurso didático para ser trabalhado em sala de aula foi elogiado e aprovado pelos professores cursistas. Eles ressaltaram o papel significativo do mesmo no processo ensino- 146 aprendizagem, através da capacidade que este recurso possui em sensibilizar o aluno, provocando reações emocionais. Obviamente, sinaliza que o vídeo precisa estar inserido dentro de uma proposta pedagógica coerente, capaz de levar os discentes a reflexão. As contribuições dos professores sobre os temas em EA, na qual encontram maior dificuldade e suas sugestões de temas abordados num vídeo foram agregadas a edição. Todavia, pretende-se fornecer subsídios teóricos capazes de construir uma reflexão crítica sobre o quem vem a ser Educação Ambiental emancipatória, transformadora, popular, crítica e outros adjetivos que apontam para a ruptura com o modelo societário hegemônico. A construção do vídeo em EA e Agenda 21 Escolar propõem debater a conceituação destes dois eixos temáticos, agregando aos conhecimentos do senso-comum, o conhecimento escolar e o conhecimento acadêmico compondo um mosaico de diferentes saberes. O uso de imagens sobre os contrastes (Figuras 3 e 4) e contradições da sociedade capitalista tem o intuito de fomentar a discussão crítica pelos professores em suas escolas. Através das diferentes linguagens possíveis de ser utilizada num vídeo, a meta do recurso didático para a formação continuada de professores vai além da sensibilização do outro. Objetiva-se, portanto, dar uma pequena contribuição neste oceano de possibilidades do ambiente escolar e de riquezas de saberes docentes. Foto: Jacqueline Bento, junho/2009 147 Foto: Jacqueline Bento, junho/2009 Figura 3. Rio Dona Eugênia dentro do Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu. Figura 4. Rio Dona Eugênia fora do Parque, trecho degradado. 148 A produção das imagens para o vídeo foi composta por: a) entrevista em quatro escolas que participaram do curso nos municípios de Nova Iguaçu, Nilópolis, Mesquita e Japeri (região da Baixada Fluminense). Foram entrevistados diretores, professores, estudantes maiores de 18 anos, funcionários, responsáveis por alunos e pessoas da comunidade escolar. Investigou-se a concepção destes sobre Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar. O ambiente escolar e o entorno das escolas foram filmados (ecossistema urbano). b) entrevista com um pesquisador em EA da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), um pesquisador em EA da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e um representante da ONG Defensores da Terra. Buscou-se um referencial teórico sobre uma Educação Ambiental transformadora e Agenda 21 Escolar, explorando os fundamentos que sustentam cada tema. c) gravação no Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu (ecossistema natural). Além dos depoimentos e entrevistas, o vídeo contém outros tipos de linguagens como: poesias, música (trilha sonora e composição de letra de um hip hop feita por um dos alunos envolvidos no curso), animação de desenho e texto. O vídeo foi editado em parceria entre o IFRJ/Nilópolis e o Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio de Janeiro (CEFET Celso Suckov)/Maracanã. E ainda, contou com o apoio técnico de um aluno de graduação do Curso de Produção Cultural do IFRJ/Nilópolis. Existe a intenção de registrar o vídeo “Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: construindo o espaço da cidadania” com propriedade intelectual, realizar cópias deste recurso didático e distribuí-lo as escolas que fizeram parte da pesquisa. 149 CAPÍTULO 6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS Os resultados da investigação indicam que o Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania foi capaz de contribuir para construção de projetos pontuais em Educação Ambiental nas escolas estaduais do Estado do Rio de Janeiro que participaram do processo de formação estudado. Assinala-se que os objetivos do curso eram mais amplos, enraizar a EA nas escolas como um processo permanente, que deveria envolver toda comunidade escolar. Detectou-se a elaboração de projetos e não de Agenda. A pesquisa documental, realizada no primeiro capítulo, revelou que algumas das escolas indicadas pela Coordenadoria Metropolitana I para o curso, outrora, haviam participado da primeira formação continuada de professores em Educação Ambiental no Estado, através do PDBG/PEA. Pode-se supor que as sementes lançadas no período compreendido entre o término do século XX e o princípio do século XXI, através de ações pioneiras do Programa, frutificaram iniciativas e auxiliaram o despertar das escolas para a questão ambiental. A grande contribuição do curso de acordo com os entrevistados consistiu em colaborar com a sistematização do trabalho escolar, na medida em que os docentes receberam suporte teórico-metodológico. O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania contribuiu não apenas para fomentar a discussão sobre a crise ambiental, mas para submergir a crise nas relações de trabalho. Esta questão não foi aprofundada dentro de uma perspectiva política e crítica, apenas a “ponta do iceberg” foi revelada. O curso contribuiu quanto ao tímido crescimento da influência da tendência histórica entre os professores, comparando as análises dos documentos produzidos pelos 150 professores cursistas na Coordenadoria Metropolitana I em 2008, com as respostas encontradas nos questionários em 2007. Apesar dos equívocos teórico-metodológicos sobre Agenda 21 Escolar, os professores revelaram, nas entrevistas realizadas em 2009, que o processo de construção da Agenda 21 Escolar continua apesar de encerrado o vínculo institucional escola-governo por meio do curso. A inserção da Agenda 21 Escolar no Projeto Político Pedagógico encontra-se em fase de construção, de acordo com o relato dos professores. O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania contribuiu para disseminar entre os docentes os pressupostos teóricos contidos nas políticas federal e estadual, veiculados na Lei n° 9597/99 e Lei n° 3325/99. Entretanto, a concepção dos professores em Educação Ambiental expressa, predominantemente, ainda um modelo de educação conservador, embora o curso tenha procurado seguir uma perspectiva crítica. Essas concepções dos docentes sobre EA foram traduzidas em práticas pedagógicas pragmáticas e fragmentadas do contexto socioambiental das escolas, de acordo com as descrições nos relatórios, nos projetos de intervenção em EA e nas entrevistas realizadas em 2009. As concepções prévias em EA dos professores cursistas foram reconstruídas e ressignificadas durante o processo de formação continuada fornecida. Alguns eixos formativos propostos por Guimarães (2007)51 foram alcançados pela formação em EA e Agenda 21 Escolar, como por exemplo, formar o educador ambiental como liderança e sensibilizá-lo para desconstruir uma cultura individualista na escola. Outros eixos formativos, ainda não foram superados, mesmo com a promoção da formação continuada, principalmente no que diz respeito à inserção de um trabalho pedagógico construtivista em EA. 51 Ver proposta apresentada por Guimarães (2007) para a formação de educadores ambientais, dentro de uma perspectiva de educação emancipatória, contida no capítulo 2, seção 2.3. 151 A análise das dificuldades encontradas pelos professores nas escolas, ao executarem as ações do projeto e da Agenda 21 Escolar, aponta para as deficiências da estrutura do sistema de ensino. A falta de tempo para o planejamento pedagógico coletivo, além da estrutura fragmentada da escola, constitui grande obstáculo para concretização de um trabalho interdisciplinar, capaz de estimular a participação plena da escola. Nesta direção, Ozga (2000) afirma que um projeto da Ciência Social entendido como uma política elaborada pelo aparelho governamental pouco impacto possui para transformar a realidade. O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania foi concebido como uma política do Estado do Rio de Janeiro para implantar a Agenda 21 Escolar. A Secretaria de Estado de Educação propiciou pouco ou nenhum espaço de negociação, de contestação e de luta entre os atores sociais da comunidade escolar, a fim de provocar profunda transformação de sua realidade. Um projeto socioambiental que seja capaz de provocar mudanças locais não pode estar ancorado apenas na formação continuada de professores, conforme orientações da SEEDUC. Tal postura não contribui para superar a ingenuidade e a falta de clareza política quanto ao papel e a limitação do professor dentro da complexa rede de poder na sociedade. E, ainda, remove o foco ideológico da questão. Um projeto social em Educação Ambiental precisa investir não apenas na atuação política individual, mas numa escala macro de mudança da organização do espaço escolar e da reestruturação do sistema de ensino. A continuidade destas ações pode perpetuar a cínica sensação de que as políticas públicas, ao centralizar investimentos na formação continuada de professores, são suficientes para transformarem o contexto escolar. Ao mesmo tempo em que, freqüentemente responsabilizam os docentes de forma unilateral pela melhoria da qualidade do ensino. O aparelho governamental vem sufocando o diálogo e os conflitos políticos quando é levantada a questão do plano de cargos e salários dos 152 profissionais da educação, da reestruturação do sistema educacional, da matriz curricular sob perspectiva crítica, dentre outras bandeiras históricas da profissão docente. O Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania propiciou a criação de um espaço na escola para a promoção do diálogo entre diferentes atores sociais, girando em torno dos temas socioambientais globais e locais. A proposta dessa formação continuada de professores no lócus escolar, defendida por Candau (1996), apresentou, entretanto, fragilidade no que se refere ao tipo de prática pedagógica conservadora essencialmente adotada pelas escolas, e que não favorecem a reflexão. Como conseqüência da falta de integração na escola, muitos professores cursistas sinalizaram a dificuldade em mobilizar outros professores no projeto, gerando ações isoladas e descontínuas. Destaca-se que o modelo de Educação Ambiental tecnicista e comportamentalista informou, amplamente, os projetos de intervenção em Educação Ambiental e pela Agenda 21 Escolar, das escolas da Coordenadoria Metropolitana I. A escola enquanto instituição educacional exerce importante papel como pólo de reflexão, discussão e intervenção política sobre a realidade local de sua comunidade. Desde que seu Projeto Político Pedagógico seja fruto de uma construção coletiva e possua clareza política e ideológica sobre sua função social. Torna-se importante reconhecer os limites a as potencialidades da escola dentro do jogo político. Importante também é inserir ao trabalho pedagógico uma perspectiva de educação construtivista, que leve educando e educadores a refletir/agir politicamente o seu espaço local/global, reconstruindo as relações sociais – caminho legítimo para o exercício da cidadania. Pode-se afirmar que o quarto eixo formativo defendido por Guimarães (2004) foi alcançado no curso, ao investir na formação de lideranças com uma visão mais crítica quanto ao processo educativo em EA. Segundo depoimentos dos professores cursistas o 153 apoio de um pequeno grupo de professores e estudantes motivados trouxeram contribuições positivas. Logo, neste aspecto, o curso teve êxito ao estimular a formação de lideranças, através da formação continuada em EA. As ações no âmbito do Programa Estadual de Educação Ambiental para o eixo formal precisam estar articuladas com a política pública educacional. Em dez anos, desde a criação da Lei n° 3325/99, as ações do Programa tem procurado investir no enraizamento da Educação Ambiental nas escolas do Estado do Rio de Janeiro. É preciso avançar a discussão e construir um projeto social de EA crítica, capaz de fomentar uma educação política e transformadora. Para tanto, é preciso conceber a política pública como processo e não como não como produto. Infere-se quanto à formação inicial dos professores a existência de uma lacuna na formação de educadores ambientais. Mesmo com a consolidação legal da Educação Ambiental e sua inserção curricular no sistema de ensino brasileiro, ela é acanhada ou inexistente nas instituições de ensino superior que promovem os cursos de licenciatura. A formação continuada de professores em EA crítica precisa estar na pauta das políticas públicas para o campo da formação de professores, investindo na formação inicial e continuada, constituindo-se um processo permanente. Espera-se que a pesquisa tenha trazido colaborações no campo da formação continuada em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar, através de reflexões sobre o modelo de formação de educadores ambientais dentro da perspectiva crítica. Almeja-se compartilhar os resultados desta pesquisa (incluindo a distribuição do Produto Final) com as Secretarias de Estado do Ambiente, de Educação e de Ciência e Tecnologia, e, ainda, com a coordenação pedagógica do Curso de Form-ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania, coordenado por uma equipe de docentes da Universidade 154 do Estado do Rio de Janeiro, além das escolas da Coordenadoria Metropolitana I que participaram da construção desse trabalho. 155 7- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARAÚJO, Flávia Monteiro de Barros. Políticas Públicas para formação de professores em nível superior: a construção dos Institutos Superiores de Educação no sistema público de Ensino no Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: UERJ, 2006. 183f. 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( ) Não ( ) Sim Qual?_________________________________________________ 3- Você já utilizou algum material sobre AGENDA 21? ( ) Não ( ) Sim Qual?______________ Onde conseguiu?_________________ 4- A escola desenvolve ou já desenvolveu algum projeto (ou ação) sobre AGENDA 21? ( ) Sim ( ) Não ( ) Desconheço 5- Quais são as pessoas que devem participar da elaboração e do desenvolvimento da AGENDA 21?(Você pode marcar mais de uma opção.) ( ) Não sei. ( ( ) Funcionário ( ) Diretor de escola ( ) Responsável pelo aluno ) Professor ( ( ) Aluno ) Comunidade escolar do entorno 165 6- O que você entende por AGENDA 21 ESCOLAR? _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 7- E Educação Ambiental? _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ 8- O que você espera do “CURSO DE FORM-AÇÃO EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL E AGENDA 21 ESCOLAR: ELOS DE CIDADANIA”? _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ 9- Você acha possível desenvolver uma Agenda 21 Escolar baseada nas necessidades e características da comunidade escolar em que atua? ( ) Não ( ) Sim Justifique: _________________________________________________________ 166 Anexo 2 - Modelo de relatório de atividades mensais dos cursistas (2008) Curso de Form-Ação em Educação Ambiental e Agenda 21 Escolar: Elos de Cidadania RELATÓRIO CURSISTA Cursista: Período: 1. Metropolitana: Unidade Escolar: 2. Atividades desenvolvidas junto aos estudantes: 3. Atividades desenvolvidas junto aos professores/profissionais da educação da unidade escolar em que atua: 4. Atividades desenvolvidas junto à comunidade do entorno da unidade escolar em que atua: 5. Atuação da tutoria: 6. Atuação da equipe administrativa: 167 7. Auto-avaliação: 8. Dificuldades encontradas para o desenvolvimento das atividades: 9. Fatores que contribuíram positivamente para o desenvolvimento das atividades: 10. Observações: Data: ____ de_____________________ de 2008. _______________________________ _______________________________ Diretor(a) da Unidade Escolar Professor(a) 168 Anexo 3 – Roteiro de entrevista semi-estrutura aplicada após o encerramento do curso (2009) 1. A escola continua a desenvolver a Agenda 21? 2. Caso não continue, por quê? 3. Quais os temas que você considera mais difíceis de serem abordados em sala de aula? 4. A formação da agenda 21 auxiliou você? Em que medida? 5. O que você acha da utilização de vídeo para trabalhar com EA? Quais os temas que você gostaria que fossem abordados? 6. Você acha que a formação continuada teve impacto sobre a sua prática pedagógica? Trouxe alguma abordagem nova para você? Algum conceito novo? Ou metodologia? 7. Você acredita que o formato do curso foi adequado? Por que?