Clínica de Psicologia da Unijuí ENTREVISTA PARA INFORMATIVO “FALANDO NISSO...” Solange Castro Schorn, nossa entrevistada, graduou-se em Psicologia na Unijui - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, em 1995,e atualmente atua na Secretaria Municipal da Saúde e Meio Ambiente vinculada ao Hospital Materno Infantil de São Luiz Gonzaga, onde desenvolve um trabalho que tem servido de referência na área. 1) Você poderia nos falar sobre o seu percurso acadêmico? Cursei a Faculdade de Psicologia na Unijuí nos anos de 1991 a 1995. Momento de extremo valor nessa caminhada, principalmente porque ser psicóloga sempre foi uma de minhas grandes aspirações. Tive professores brilhantes que me acompanharam nesse percurso e que, ainda hoje, continuam sendo fortes referências em minha trajetória profissional. Concluí o Curso apresentando uma monografia sobre o lugar do idoso na sociedade moderna, contando com a orientação da professora Ângela Lângaro Becker. Em 1997 e 1998, cursei a especialização em Psicanálise na Cultura: Saber e Ética, também na Unijuí. Nesse Curso, sob a orientação do professor Eduardo Ely Mendes Ribeiro, retomei o tema sobre a terceira idade, abordando a importância da memória e seu valor de transmissão. No início de 2000, retornei novamente a Unijuí, ingressando no Curso de Mestrado em Educação nas Ciências. Sob a orientação das professoras Drª Anna Rosa Santiago e Mestre Ângela M. S. Drügg estou desenvolvendo uma pesquisa sobre a escolarização de crianças psicóticas. Tema que vem gerando muita inquietação tanto no trabalho clínico quanto no processo de escrita sobre o assunto. Não é tarefa fácil, mas o mérito é que estou aprendendo muito com isso. 2) E sobre a sua experiência de trabalho? Qual é a contribuição que sua formação acadêmica lhe traz? Minha formação vem sendo ancorada pelo referencial psicanalítico, quer dizer, é em referência a esta teoria que procuro desenvolver meu trabalho. É onde busco sustentação para seguir essa empreitada. A psicanálise nos ensina que não temos um saber absoluto sobre as coisas, mas um compromisso com uma verdade, a verdade do desejo. Isso nos conduz a trabalhar com respeito à singularidade de cada um. 3) Partindo de um referencial psicanalítico, como você vê o trabalho com crianças numa instituição pública? Existem algumas particularidades na clínica infantil e a principal delas está no fato de que uma criança não procura a terapia. Independente de ser ou não em um a instituição pública o trabalho começa sempre com os pais. O pedido da criança é sempre veiculado pelos pais. São eles que formulam o pedido e cabe a nós escutar isso, assim como verificar a possibilidade de mudar a queixa que é trazida em demanda de tratamento. É a partir da escuta do discurso dos pais que podemos pensar um trabalho de construção da demanda na criança. Isso só acontece na relação de transferência. 4) Qual a diferença da abordagem na clínica infantil pública e na privada? Existem diferenças dependendo da especificidade de cada profissional, pois são muitos os que trabalham com a clínica infantil. No serviço público da cidade em que trabalho estou me reunindo com outros profissionais, para discutir e refletir sobre nossas práticas no atendimento infantil. Estamos procurando, juntos, desenvolver nossos trabalhos referidos a uma mesma ética. Nossa preocupação é com um sujeito que está se constituindo. Penso que, tanto no âmbito público quanto no particular, a escuta do discurso que sustenta esse sujeito se faz necessária. Portanto, dependendo do caso, buscamos diferentes formas de intervenção, mas sem nos afastarmos da referência teórica que nos orienta. 5) O que você pensa a respeito da criança “ser” ou “estar” psicótica? A partir dos aportes teóricos da psicanálise, entendemos a psicose na infância como não estruturada, justamente, por se tratar de um sujeito que está se subjetivando. Alfredo Jerusalinsky nos demonstra que apesar da psicose na infância se manifestar clinicamente isso não significa que a criança seja psicótica, mas que ela está numa posição psicótica, é diferente. Se não há uma estrutura determinada, então é possível pensar numa saída dessa posição. 6) Qual a relação do terapeuta com a família de uma criança psicótica? Não é muito fácil trabalhar com a família. Principalmente com aquelas que não aceitam uma terapia para seus filhos. Procuro, nas entrevistas preliminares, direcionar as intervenções no sentido de organizar uma demanda e estabelecer laços transferenciais. Até porque, a relação de transferência com a criança passa pela relação que os pais estabelecem conosco. Na medida em que sustentamos essa relação abrimos a possibilidade de construção de um lugar de referência que marca o início de trabalho objetivando a implicação dos pais na problemática da criança. As significações que os pais dão aos sintomas de seus filhos e suas implicações subjetivas na problemática da criança se dão em um movimento muito particular. É na relação transferencial que os pais vão falar disso. Na escuta do discurso desses pais que podemos pensar e entender como essas questões estão articuladas para a criança. 7) Quais são as dificuldades no tratamento com crianças autistas e psicóticas? As dificuldades são grandes. As crianças, geralmente, chegam para o atendimento encaminhadas pelas escolas, pelos professores. Os pais, muitas vezes, não querem o atendimento, mas trazem porque os professores pediram. Há uma espécie de descomprometimento desses pais e nem sempre a criança permanece na terapia. Então, a dificuldade começa por aí. Quanto ao tratamento, muitas vezes, vemos-nos confrontado com uma certa impotência. Talvez porque buscamos nesse trabalho que a criança apresente sinais verbais e isso nem sempre acontece. Muitas crianças psicóticas não falam, não demandam nada. No caso do autismo parece quase impossível porque o tempo todo ele nos vira as costas. Jerusalinsky fala muito sobre isso quando aponta que o autista recebe qualquer manifestação do laço social como demanda de exclusão. Tudo isso dificulta enormemente o trabalho com essas crianças. Por esse motivo é importante buscar, constantemente, um suporte teórico, uma supervisão, uma interlocução com outros colegas que possam nos abrir caminhos para pensarmos formas de intervenção. Penso que o referencial psicanalítico seja privilegiado nesse sentido, de poder nos dar melhor sustentação nesse trabalho. Mas, apesar de encontrarmos dificuldades, isso não inviabiliza um tratamento.