AS NOVAS REGRAS PARA REPRODUÇÃO ASSISTIDA
NA FOLHA DE S. PAULO
Maria de Fátima Ferreira1
Profa. Adjunto CAHL-UFRB
RESUMO: A proposta deste texto é analisar a cobertura jornalística dada à Reprodução
Assistida - RA e às normas estabelecidas pela Resolução CFM no. 1957/10, definidas
pelo CFM - Conselho Federal de Medicina pelo Jornal Folha de S. Paulo, no período de
dezembro/2010 a maio/2011. A primeira resolução do CFM para reprodução assistida
entrou em vigor em 19 de novembro de 1992, após dez anos de prática de RA no Brasil.
Após 18 anos da primeira resolução, o CFM criou novas regras para a RA no país. Na
primeira resolução o paciente era o “casal infértil” e era necessário o consentimento do
companheiro da pessoa casada; na segunda o paciente é “Todas as pessoas capazes, que
tenham solicitado o procedimento e cuja indicação não se afaste dos limites desta
resolução, podem ser receptoras das técnicas de RA desde que os participantes estejam
de inteiro acordo e devidamente esclarecidos sobre o mesmo, de acordo com a
legislação vigente.”. Nesse caso abre a possibilidade para que casais homossexuais e
homens e mulheres solteiros possam realizar o desejo da maternidade/paternidade, sem
serem portadores de infertilidade/esterilidade. A cobertura jornalística mostra que as
normas andam a reboque das pesquisas e descobertas científicas e que as práticas
médicas da reprodução assistida nem sempre seguem as normas estabelecidas, e são
divulgadas pela mídia impressa muitas vezes sem nenhum questionamento.
Palavras-chave: divulgação científica; reprodução assistida; gênero
ABSTRACT: The purpose of this paper is to analyze the news coverage given to the
Assisted Reproduction - AR and policy established by resolution in FCM 1957/10
defined by the FCM - Federal Council of Medicine the newspaper Folha de S. Paulo in
the period December/2010 May/2011. The first resolution of FCM for assisted
reproduction came into effect on November 19th, 1992, after ten years of practice of AR
in Brazil. 18 years after the first resolution, the FCM has created new rules for AR in
the country. In the first resolution the patient was "infertile couple" and required the
consent of the companion of this married person; the second patient is "All the capable
people who have requested the procedure and whose appointment shall approximate the
limits of this resolution, may be receiving the techniques of AR since the participants
are in entire agreement and properly informed about the same, according to law.". This
case gives the possibility for gay couples and unmarried men and women can fulfill the
desire of maternity/paternity, without being patients with infertility/sterility. The media
coverage shows that the rules follow the rhythm of research and scientific discovery and
medical practice of assisted reproduction do not always follow the standards, and is
provided by the print media often without question.
Keywords: scientific communication, assisted reproduction, gender
1
Professora Doutora do Curso de Comunicação Social, habilitação em Jornalismo do Centro de Artes,
Humanidades e Letras – CAHL, em Cachoeira da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.
Email: [email protected]
1
Introdução:
A proposta deste texto é analisar a cobertura jornalística feita pelo Jornal Folha de S.
Paulo ao tema da Reprodução Humana Assistida – RHA, no período de dezembro/2010
a maio/2011, com enfoque nas novas normas criadas pelo Conselho Federal de
Medicina para a RHA, de acordo com a Resolução CFM no. 1957/10, publicada no
Diário Oficial da União, em 6 de janeiro de 2011. Este estudo faz parte de uma pesquisa
maior, que visa investigar como as NTRc vem sendo abordadas pela mídia impressa
desde 1982, sob a perspectiva da divulgação científica, das relações de gênero e da
ética.2
Reprodução Humana Assistida (RHA), Reprodução Assistida (RA), Novas Tecnologias
Reprodutivas Conceptivas (NTRc) e Novas Tecnologias Reprodutivas Conceptivas e
Genética (NTRc e Genética), Procriação Medicamente Assistida (PMA) são termos que
definem um conjunto de técnicas médicas que têm a finalidade de auxiliar os indivíduos
a procriarem. Sua principal característica é que a relação sexual fecundante é substituída
pela técnica de fecundação aplicada por um médico/biólogo, dispensando, portanto,
relações heterossexuais para a reprodução e a concepção e introduzindo a figura do
doador/doadora de material reprodutivo humano (óvulos, espermatozóides, embriões,
útero).
O interesse da mídia pela RHA e tudo que a rodeia no mundo e no Brasil é contínuo e
crescente. Em 5 de julho de 1978, a revista Manchete3 publica a reportagem com o
título “Bebê de proveta, o milagre do século”. E acompanha com muito interesse o
nascimento e os primeiros dias da inglesa Louise Joy Brown, a primeira criança
concebida fora do útero materno, como resultado da técnica de fertilização in vitro,
realizada pelos médicos Patrick Steptoe e Robert Edwards4, na Inglaterra.5
Na década de oitenta a imprensa brasileira começa a publicar o envolvimento de
equipes brasileiras com a reprodução humana assistida. No período de 9 a 22 de outubro
de 1982 ocorre o “Primeiro curso internacional de fertilização in vitro e transferência de
embrião”, organizado pelo médico Milton Nakamura, culminando com a primeira morte
pública de uma mulher, por causa de complicações dos tratamentos e manipulações
decorrentes dos processos de RA. A revista Manchete e o programa Fantástico da TV
Globo ajudaram a patrocinar e tiveram direito de exclusividade na cobertura do evento.6
Em 1984, finalmente Milton Nakamura teve sucesso na produção da primeira filha de
fecundação in vitro brasileira, com o nascimento de Anna Paula Caldeira. O número de
clínicas particulares e de hospitais públicos em todo o território nacional multiplicou-se,
assim como o número de nascimento de bebês. Ampliaram-se as técnicas e a introdução
2
3
4
5
6
Pesquisa realizada pelo Grupo de Estudo e Pesquisa Cultura Científica, Gênero e Jornalismo,
coordenado pela Profa. Dra. Maria de Fátima Ferreira, no Centro de Artes, Humanidades e Letras –
CAHL, em Cachoeira, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB.
A revista Manchete até o início da década de sessenta, se constitui em um espaço privilegiado da
divulgação científica no Brasil (ANDRADE, CARDOSO, 2001) e é uma das principais publicações
semanais da década de setenta.
Robert G. Edwards é um embriologista britânico, vencedor do Prêmio Nobel na categoria Medicina ou
Fisiologia, em 2010, pelo desenvolvimento da Fertilização In Vitro.
A Revista Manchete comprou as fotos e reportagens exclusivas do Daily Mail, tablóide inglês que
pagou a Lesley Brown, a mãe de Louise J. Brown, £$ 325 mil (ou US$ 565 mil) pelas primeiras
imagens do bebê.
FERREIRA, M.F. Estudo de caso do “Primeiro Curso Internacional de Fertilização in vitro e
Transferência de embrião”e da morte de Zenaide Maria Bernardo na mídia brasileira. Trabalho
apresentado no VII Congresso Iberoamericano de Ciência e Tecnologia e Gênero, em Curitiba/PR,
2010.
2
de novas técnicas no país. Em 1992 a RHA já estava estabelecida no país criando
polêmicas e exigindo o estabelecimento de uma regulamentação.
Vários estudos (7, 8, 9, 10) mostram a participação intensa da mídia na vulgarização da
NTRc para o público brasileiro. Atualmente a reprodução humana assistida é tema em
duas telenovelas brasileiras exibidas pela TV Globo: em A vida da gente, exibida no
horário das 19h, de autoria de Lícia Manzo e Fina Estampa11, escrita por Aguinaldo
Silva, para o horário das 21h. Os problemas abordados são a esterilidade masculina
congênita e criada pela vasectomia, doação de gametas e doação de óvulo por mulher
jovem sem a intenção de se reproduzir. O tema não é novo para a TV Globo, desde
1990 ele aparece nas telenovelas: Barriga de Aluguel, escrita por Glória Peres, exibida
primeiramente em 1990-1991, no horário das 18h e reprisada no Vale a Pena Ver de
Novo, em 1993, as 14h; Laços de Família, escrita por Manuel Carlos, exibida em 20002001; O Clone, escrita por Glória Peres, exibida pela primeira vez em 2001-2002 e
reprisada em 2011; o seriado Araponga, de autoria de Dias Gomes, Lauro César Muniz
e Ferreira Gular, exibido em 1990-1991. Essas novelas abordaram a gestação substituta,
a perspectiva de alguém ter um filho para possibilitar transplante de medula óssea para
outro filho com leucemia, testes de paternidade, clonagem reprodutiva, etc.
Novas Tecnologias Reprodutivas conceptivas – NTRc que revolucionaram
profundamente a sexualidade, a forma de conceber, gestar e parir, a constituição da
família, os conceitos de maternidade e paternidade; colocaram questões sociais e éticas
sobre a possibilidade de seleção dos embriões (descarte de embriões portadores de
anomalias e escolha do sexo do embrião); e criaram novas demandas de organização
social com a possibilidade do uso da RA pelos solteiros e homossexuais.
A RHA, inicialmente, foi criada e utilizada com uma finalidade precisa: ajudar às
mulheres com disfunções tubárias a engravidarem, mas à medida que foi aperfeiçoada e
se tornou conhecida, sua indicação e sua demanda se ampliaram. As indicações da
fecundação in vitro e transferência de embrião (FIVETE) vem aumentando
paulatinamente desde sua criação. Foi usada, primeiramente, para casais estéreis. Em
seguida se ampliou para os casais provavelmente não estéreis e sem filho(a)s, depois
para casais esterilizados. Atualmente, o aumento das indicações visa os casais
reconhecidamente férteis, mas que correm o risco de ter crianças portadoras de doenças
genéticas graves. Portanto, a RA passa a ser utilizada não mais somente para contornar a
esterilidade, como também pode ser empregada para “melhorar” geneticamente a
humanidade.
7
SILVA, Margareth Arilha (1991): Tecnologias reprodutivas: a concepção de novos dilemas. São
Paulo: ECOS.
8
FERREIRA, Maria de Fátima (1998): Esterilidade e reprodução assistida: no jornal impresso diário e
na narrativa de homens e mulheres estéreis no Brasil. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e
Letras, Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Araraquara.
9
CORRÊA, Marilena V. (2001): Novas tecnologias reprodutivas: limites da biologia ou biologia dos
limites? Rio de Janeiro: Eduerj.
10
COMISSÃO DE CIDADANIA E REPRODUÇÃO – CCR (2002): Um Olhar sobre a Mídia, Belo
Horizonte: Mazza Edições.
11
A novela mostra um casal com mais de 40 anos, bem sucedido profissionalmente, cujo homem não
pode conceber naturalmente e a mulher ainda deseja ter filhos, que procuram uma clinica médica de
RA para engravidar. Descobrem que somente podem engravidar com material genético doado. A
mulher decide engravidar com o embrião doado (criado a partir de espermatozóide congelado de um
homem morto e de óvulo doado por uma jovem), situação que causa rompimento na relação do casal.
3
O impacto das técnicas médicas reprodutivas no corpo humano é sexualmente
diferenciado. É, sobretudo, no corpo feminino que são aplicadas as tecnologias médicas:
cesariana, laqueadura e RHA. Na RA, o embrião é obtido a partir da contribuição
genética do óvulo e do espermatozóide, o que pressupõe a participação masculina e
feminina igual. Porém, essa contribuição não é igual, pois a mulher dá uma
contribuição física e social maior que o homem. A diferença sexual no emprego da
reprodução assistida não é visível, ao contrário ela é ocultada. Essa diferença vai marcar
fortemente todo o discurso e a prática médica com a reprodução assistida.12
A primeira Resolução CFM no. 1358/92 foi aprovada em 11 de novembro de 1992,
pelo Conselho Federal de Medicina. A regulamentação foi tardia, após dez anos do
início dos experimentos com RHA no Brasil, depois da morte de Zenaide Maria
Bernardo13 e do nascimento de Anna Paula Caldeira14, e mesmo após a regulamentação
algumas práticas médicas contrariam as normas estabelecidas. Após 18 anos de
vigência, a Resolução CFM Nº 1.358/92 foi revogada. No seu lugar, entrou em vigor a
Resolução CFM Nº 1.957/10, publicada em 06 de janeiro, no Diário Oficial da União.
Para realizar esta análise se tomou como fonte principal o Jornal Folha de S. Paulo em
virtude de ser o jornal de maior tiragem no país, com ampla circulação nacional, possuir
um banco de dados sistematizados e espaços dedicados à divulgação científica. É uma
das mídias escritas que mais veicula notícias sobre RHA (15, 16, 17).
Foram levantadas as matérias impressas sobre RA, no período de 01/12/2010 a
31/05/2011, totalizando 13 matérias. Estabelecemos um roteiro de análise com os
aspectos que foram alterados na resolução: 1) Novos pacientes da Reprodução
Assistida; 2) Redução Embrionária; 3) Reprodução Assistida pos mortem; 4) Novos
arranjos sociais com RA.
Infertilidade e Reprodução Assistida
Ao tratarmos de infertilidade, esterilidade ou reprodução assistida vamos nos deparar
com a falta de consenso no emprego dessas palavras ou conceitos.18 Os sentidos variam
conforme seus utilizadores ou a área de conhecimento. Para esse trabalho vamos usar
12
LABORIE, Françoise (1992): Rapports sociaux de sex dans les nouvelles technologies de la
reproduction. Cahiers du GEDISST, Paris: IRESCO-CNRS, pp.29-36.
13
Zenaide Maria Bernardo morreu num procedimento de RHA, quando participava do “Primeiro curso
internacional de fertilização in vitro e transferência de embrião”, no período de 9 a 22 de outubro de
1982, organizado pelo médico Milton Nakamura.
14
Primeira criança a nascer no Brasil pela RA, em 1984.
15
O projeto Olhar sobre a Mídia, desenvolvido pela Comissão de Cidadania e Reprodução (CCR) e a
Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Reprodutivos (RedeSaúde), monitora notícias sobre
saúde sexual e reprodutiva nos principais jornais (Folha de S.Paulo, O Estado de S.Paulo, O Globo e
o Jornal do Brasil) e revistas do país (Veja e Época).
16
BUENO, Wilson (1996): A classe médica vai a UTI: os raios X de uma imagem desgastada. LOPES,
B. e Nascimento, J. Saúde & Imprensa: o público que se dane. Rio de Janeiro, Mauad, 1996. pp. 7987.
17
FERREIRA, Maria de Fátima (2010): Estudo de caso do “Primeiro Curso Internacional de Fertilização
in vitro e Transferência de embrião”e da morte de Zenaide Maria Bernardo na mídia brasileira.
Trabalho apresentado no VII Congresso Iberoamericano de Ciência e Tecnologia e Gênero, em
Curitiba/PR.
18
Sobre esse assunto ver FERREIRA, Maria de Fátima (1998): Esterilidade e reprodução assistida: no
jornal impresso diário e na narrativa de homens e mulheres estéreis no Brasil. Tese de doutorado,
Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Araraquara.
4
infertilidade e esterilidade como sinônimos e com o sentido de denominar os seres
humanos que necessitam de ajuda médica e tecnológica para terem filhos.
Atualmente já está bem provado que a infertilidade é tanto feminina quanto masculina.
No Brasil, os dados estatísticos evidenciam que a infertilidade afeta cerca de 20% da
população do país. As causas estão distribuídas, aproximadamente, como segue: 30% de
causas masculinas, 30% femininas e 40% de fatores masculinos e femininos
conjugados. Por outro lado, a taxa de fecundidade é decrescente, em 2006 era de 2,3
filhos por casal; atualmente se aproxima de 2,1 e tende a cair para 1,8 até 2050, criando
demanda para a RHA, sobretudo pelo uso da esterilização. Enquanto que o uso de
Reprodução Assistida é crescente, já nasceram em todo o mundo mais de 4 milhões de
pessoas graças à fecundação in vitro.
Mesmo comprovando que a infertilidade é tanto masculina como feminina é no corpo
da mulher que vão ser realizadas as intervenções tecnológicas, mesmo se a causa da
infertilidade for apenas masculina. Portanto, a contribuição física das mulheres na
concepção da criança, através da RA, é maior do que a dos homens.
As Resoluções Médicas e seus limites
Na exposição dos motivos da criação da Resolução CFM no. 1957/10 encontramos a
seguinte informação: “No Brasil, até a presente data não há legislação específica a
respeito da reprodução assistida. Transitam no Congresso Nacional, há anos, diversos
projetos a respeito do assunto, mas nenhum deles chegou a termo.”. Isso significa que é
o Conselho Federal de Medicina que regulamenta a prática médica da reprodução
humana assistida e desta forma determina quais as pessoas que serão aceitas como
pacientes e os tratamentos a serem feitos.
A primeira resolução do Conselho Federal de Medicina foi publicada no Diário Oficial
da União em 19 de novembro de 1992, com dez anos de atraso. Nesse período já havia
muita polêmica no país, com o experimento científico sobre RA e a morte de Zenaide
Maria Bernardo, em 1982. Esse evento coloca várias questões éticas sobre a RA, dentre
elas um experimento científico que é realizado com o direito de exclusividade na
publicação por duas grandes empresas de comunicação, a Revista Manchete e a Globo,
pelo programa Fantástico; a situação obscura em torno do “acidente” ocorrido e da
causa morte, que nunca foi esclarecida para a família; a exposição das pacientes e dos
procedimentos usados por elas pelo médico e pela mídia.19
Até mesmo a “paternidade médica” do primeiro bebê de fertilização brasileiro é coberta
de dúvida, pois os dois pioneiros da RA no Brasil (Dr. Milton Nakamura e Dr. Nilson
Donádio) reivindicam para si a tal fato. Anna Paula Caldeira, nascida em 1984, sob a
responsabilidade do Dr. Milton Nakamura é considerada o primeiro bebê brasileira
nascido pela RA.20
A resolução CFM no. 1.358/1992 estabelece normas éticas para utilização das técnicas
de reprodução assistida, “orientadora dos médicos quanto às condutas a serem adotadas
diante dos problemas decorrentes da prática da reprodução assistida, normatizando as
19
FERREIRA, Maria de Fátima (2010): Estudo de caso do “Primeiro Curso Internacional de Fertilização
in vitro e Transferência de embrião”e da morte de Zenaide Maria Bernardo na mídia brasileira.
Trabalho apresentado no VII Congresso Iberoamericano de Ciência e Tecnologia e Gênero, em
Curitiba/PR.
20
FERREIRA, Maria de Fátima (1998): Esterilidade e reprodução assistida: no jornal impresso diário e
na narrativa de homens e mulheres estéreis no Brasil. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e
Letras, Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Araraquara.
5
condutas éticas a serem obedecidas no exercício das técnicas de reprodução assistida.”
21
À revelia das normas éticas orientadoras dos médicos e clínicas responsáveis pela RA
ficamos sabendo através da mídia de várias condutas não aprovadas pela resolução do
CFM, tais como, uso da RA em casais homossexuais, escolha do sexo do embrião;
como também sensacionalismo de possibilidades através da RA: maternidade na
menopausa, uso de óvulos de fetos mortos ou de mulheres mortas, venda de gametas,
mãe de aluguel, clonagem etc.
Na resolução de 1992 reconhece-se a infertilidade humana como um problema de saúde
e se normatiza o uso das técnicas médicas para resolver a infertilidade, permitindo
doação de gametas, embriões; congelamentos de gametas e embriões, implantação de
embriões depois de congelados, mas não se manifesta em relação aos novos arranjos
sociais que a reprodução humana assistida permite, como a gravidez para homossexuais
solteiros em casal, heterossexuais solteiros ou viúvos. Os usuários das técnicas de RA
devem ser “toda mulher, capaz”, na qual o “casal é infértil”. A mulher era vista como
componente do casal e era o casal infértil, mesmo que a infertilidade fosse masculina,
que era o usuário da RA. Aqui tínhamos uma questão de gênero: ao atribuir a
esterilidade ao casal, mascara-se o fato da esterilidade ser masculina ou feminina
exclusivamente e, portanto, esconde-se o tipo de intervenção, completamente
diferenciado para homens e mulheres. O uso desse discurso, no qual o sujeito sexuado é
suprimido em favor do sujeito indefinido, o casal – testemunha uma valorização da
imposição de relações sociais de gênero onde a mulher só existe no casal. 22
Na segunda resolução CFM no. 1.957/2010 foram feitas poucas alterações. Ainda
considera-se “a importância da infertilidade humana como um problema de saúde, com
implicações médicas e psicológicas, e a legitimidade do anseio de superá-la”, mas agora
considera-se “que o avanço do conhecimento científico já permite solucionar vários dos
casos de reprodução humana” para o paciente de RA que são “todas as pessoas
capazes”, na forma de “paciente” ou “pessoas submetidas às técnicas de reprodução
assistida”. As palavras “reprodução humana” substituíram as palavras ”infertilidade
humana”; não são mais usuários de RA e sim pacientes da RA, o “casal infértil” se
tornou “toda pessoa capaz”.
Aqui reside a grande novidade da resolução, pois agora qualquer pessoa, não
importando se heterossexual ou homossexual, solteira ou casada, se portadora de
infertilidade/esterilidade ou não, pode procurar uma clínica de RA e se submeter aos
tratamentos para engravidar, gestar, parir e criar uma família. Com essa resolução os
novos arranjos de parentesco e familiares ficam contemplados enquanto possibilidade
médica, faltando ainda um debate e normas jurídicas para regularizar essas
possibilidades.
A outra mudança foi em relação ao número de embriões a serem transferidos para a
receptora. Na primeira resolução “O número ideal de oócitos e pré-embriões a serem
transferidos para a receptora não deve ser superior a quatro... ”. Na resolução de 2010
mudou para “O número máximo de oócitos e embriões a serem transferidos para a
21
22
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (1992): Resolução CFM nº 1.358/1992. Brasília: CFM.
FERREIRA, Maria de Fátima (1998): Esterilidade e reprodução assistida: no jornal impresso diário e
na narrativa de homens e mulheres estéreis no Brasil. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e
Letras, Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Araraquara.
6
receptora não pode ser superior a quatro.”. E foi acrescentado: “Em relação ao número
de embriões a serem transferidos, são feitas as seguintes determinações: a) mulheres
com até 35 anos: até dois embriões); b) mulheres entre 36 e 39 anos: até três embriões;
c) mulheres com 40 anos ou mais: até quatro embriões. É uma tentativa de diminuir os
problemas relacionados a implantação de muitos embriões, dentre eles a gravidez
múltipla e será um desafio pois o sucesso da taxa de RA depende de maior número de
implantação de embriões. A palavra pré-embrião foi substituída por embrião.
As clínicas, centros ou serviços que aplicam técnicas de RA são responsáveis, tanto
“pelo controle de doenças infecto-contagiosas, coleta, manuseio, conservação,
distribuição e transferência”, como pelo „descarte‟ de material biológico humano.”. “As
clínicas, centros ou serviços podem criopreservar espermatozóides, óvulos e embriões”.
Na segunda resolução foi acrescentado que “Do número total de embriões produzidos
em laboratório, os excedentes, viáveis, serão criopreservados. O que leva a entender que
os não viáveis podem ser descartados pela clínica ou usados como a clínica desejar.
Na segunda resolução foi acrescentado o oitavo item, Reprodução Assistida post
mortem, no qual dispõe que “Não constitui ilícito ético a reprodução assistida post
mortem desde que haja autorização prévia específica do (a) falecido (a) para o uso do
material biológico criopreservado, de acordo com a legislação vigente.”
A Resolução CFM nº 1.957/10 na FOLHA
O conjunto das matérias analisadas (13) ocupa predominantemente espaços do jornal
voltados para Saúde (5), Cotidiano (5), Ciência (1), Opinião (1) e Poder (1). Do total de
matérias analisadas, sete tratam das resoluções de 1992/2010. Em pesquisa realizada no
mesmo jornal Folha de S. Paulo, nos anos de 1993-1994, logo após a publicação da
resolução de 1992, encontramos somente duas matérias que trataram das normas
estabelecidas pelo CFM.23 Em seguida as matérias foram analisadas com a intenção de
verificar como as novas mudanças propostas pela Resolução CFM nº 1.957/2010 foram
divulgadas pela Folha a partir de 4 pontos: 1) Novos usuários da RA; 2) Novos arranjos
familiares; 3) Redução embrionária; 4) Reprodução pós-mortem.
1) Novos usuários da Reprodução Assistida
O maior número das matérias analisadas trata dos novos usuários da reprodução
humana assistida (36%).
Na resolução de 1992 “as técnicas de Reprodução Assistida (RA) deveriam ser usadas
como auxiliar na resolução dos problemas de infertilidade humana” e os candidatos
deveriam ser os “pacientes inférteis”, “casal infértil”. Na de 2011 os “pacientes
inférteis, “casal infértil foi trocado por “paciente” ou “pessoas submetidas às técnicas de
reprodução assistida”. Quanto aos usuários das técnicas de RA em 1992 era “toda
mulher, capaz”, em 2011 passa a ser “todas as pessoas capazes”.
Nublat (06/01/2011)24 apresenta as novas regras para a RA e informa que “O texto
estabelece que casais gays podem usar essas técnicas, em que o embrião é fertilizado no
laboratório.” Levanta a questão de que “O uso da fertilização por casais do mesmo sexo,
pessoas solteiras e "post mortem" não era claro na regra antiga, de 1992, o que gerava
23
24
FERREIRA, Maria de Fátima (1998): Esterilidade e reprodução assistida: no jornal impresso diário e
na narrativa de homens e mulheres estéreis no Brasil. Tese de doutorado, Faculdade de Ciências e
Letras, Universidade Estadual Paulista, Câmpus de Araraquara.
NUBLAT, Johanna: Reprodução assistida tem novas regras. Folha de S. Paulo, São Paulo, 6 jan.2011.
Saúde, pp.C10.
7
dificuldade na aplicação, além de batalhas jurídicas.” Usa a palavra de Waldemar Naves
do Amaral, presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana para mostrar o
conservadorismo da resolução de 1992. E aponta que o uso da RA como indicação
social para homossexuais é geradora de polêmicas, “como o reconhecimento da dupla
paternidade ou maternidade e questões patrimoniais.”.
Na segunda matéria opinativa, também publicada no dia 06/01/2011 por Hélio
Schwartsman25 afirma que “Não há muita novidade nas regras anunciadas pelo CFM”,
“o que a nova resolução faz é fixar em norma escrita as práticas e os consensos da
área.”, “que já estão consolidados”. O jornalista não apresenta as mudanças, prefere
fazer alguns questionamentos: sobre a proibição da sexagem, da redução embrionária e
a proibição do pagamento a doadores. Os argumentos sobre a permissão da sexagem é
que no Brasil não há uma preferência declarada como na China, pelas crianças do sexo
masculino e não existe possibilidade de a fertilização "in vitro" criar alterações
demográficas importantes, por causa de seu alto preço. Quanto à redução embrionária
“O lógico aqui seria limitar o número a um ou no máximo dois - reduzindo
drasticamente a eficácia da reprodução assistida -, ou permitir a retirada de embriões na
hipótese de gravidez tripla ou quádrupla - o que configuraria um caso de aborto.”. A
diminuição do sucesso da RA por causa da redução embrionária é apenas um, dos
problemas causados pelo número excessivo de implantações de embriões. O elenco de
problemas causados à saúde da mulher e do bebê em decorrência das gravidezes
múltiplas é vasto, além de que ao se tratar do problema das reduções de embriões
enfrenta-se a problemática do aborto no Brasil, que ainda é considerado crime, salvo em
casos especiais. Considera que se todos os envolvidos na RA ganham porque não pagar
também ao doador.
Em uma matéria opinativa Débora Diniz (28/01/2011) considera que “A antiga
resolução do Conselho Federal de Medicina era discriminatória, ao restringir o acesso às
tecnologias reprodutivas a mulheres ou casais heterossexuais.” e que
havia
“interpretações equivocadas que supunham ser a família ou a filiação um direito
exclusivo de pessoas heterossexuais”. Defende os direitos reprodutivos de “todas as
pessoas” se reproduzirem e constituirem família através da RA e que os direitos
reprodutivos não devem estar restritos às pessoas heterossexuais. Considera que foi um
reparo na “marca heterossexista da sociedade brasileira”. Afirma que “Novos arranjos
familiares já existentes na sociedade brasileira agora estarão também nos consultórios
médicos à procura de auxílio para o nascimento do filho biologicamente vinculado.
Grande parte dessas novas famílias já havia alcançado os tribunais em busca de adoção
legal.” E que o grande desafio “será a mudança nas concepções privadas de cada
médico sobre definições de família e filiação.” 26
Nublat27 (06/02/2011) cita a fala de Munira Khalil El Ourra, uma das duas mulheres que
ganharam o direito da dupla maternidade: (A nova Resolução da CFM) “Vai mudar um
pouco a mentalidade dos médicos, que terão um respaldo maior. Vamos ver se acaba um
pouco com esse preconceito, porque é grande a procura pelo que eu e a Adriana
25
SCHWARTSMAN, Hélio: É irracional não pagar doador de sêmen e "barriga de aluguel". Folha de S.
Paulo, São Paulo, 6 jan.2011. Saúde, C10.
26
DINIZ, Debora: Desejo de filhos. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 jan.2011. Opinião, pp. A3.
27
NUBLAT, Johanna: Nossa história Adriana Tito Maciel, 28 e Munira Khalil El Ourra, 29. Folha de S.
Paulo, São Paulo, 6 fev.2011. Cotidiano, pp.C12.
8
fizemos.”
Nublat, Guerreiro28 (30/01/2011) mostram que o deputado Eros Biondini
(PTB-MG) pretende “reapresentar, se necessário, o chamado Estatuto do Nascituro,
projeto que garante o direito à vida mesmo antes do nascimento.” e que “Como medida
imediata, o grupo "pró-vida" no Congresso vai tentar a revogação da resolução do
Conselho Federal de Medicina que confirmou o uso da reprodução assistida por casais
gays.”.
2) Redução de Embriões
Nublat29 (06/01/2011) informa que a resolução de 2010 “limita o número de embriões a
serem implantados de cada vez, a depender da idade da mulher.“, como medida de
prevenção de “gestações múltiplas” e "redução embrionária".
Na opinião de Hélio Schwartsman30 (06/01/2011) “O lógico aqui seria limitar o número
a um ou no máximo dois - reduzindo drasticamente a eficácia da reprodução assistida -,
ou permitir a retirada de embriões na hipótese de gravidez tripla ou quádrupla - o que
configuraria um caso de aborto.”
GERAQUE, MOI31 (03/04/2011) ilustram a problemática do uso de transferência de
embrião através do caso da mulher do Paraná, de 28 anos, que recebeu três embriões,
antes da resolução de 2010. Ela ficou grávida dos três, mas não queria três, acabou
levando a gestação até o final e nasceram trigêmeas, mas “quiseram sair da maternidade
com apenas duas, deixando a que tinha insuficiência pulmonar”. O jornalista usa a fala
de especialistas em reprodução para determinar de quem é a decisão final sobre a
transferência dos embriões: “A decisão final sobre quantos embriões serão transferidos
para o útero da mãe num processo de fertilização "in vitro" é do casal ...”. Explica que
“O limite de embriões por idade, criado pelo Conselho Federal de Medicina, visa baixar
o número de gestações múltiplas. Na Europa, vários países defendem a tese de que só
um embrião seja transferido ao útero. Enquanto lá 15% das transferências são de apenas
um embrião, no Brasil a taxa é de menos de 1%.”. Apresenta ainda que gestações
múltiplas podem “provocar problemas psicológicos nos pais” e “são consideradas de
risco.
Em outra matéria sobre o mesmo caso Carazzai mostra que o casal desejava ter apenas
duas filhas dos três embriões que estavam grávidos, por isso cogitaram fazer redução
embrionária fora do país, mas desistiram. Coloca a fala do obstetra Alfonso Massaguer,
especialista em reprodução humana para mostra que: “Nos EUA, pode ser feita até a 16ª
semana de gravidez... O procedimento é simples e pode ser feito em consultório: com
uma agulha, aplica-se uma solução de cloreto de potássio no coração do bebê para ele
parar de bater.”, mas “No Brasil, a prática é proibida por uma resolução do Conselho
Federal de Medicina.” 32
28
NUBLAT, Johanna, GUERREIRO, Gabriela: Legislativo vai encarar velhas polêmicas. Folha de S.
Paulo, São Paulo, 30 jan.2011. Poder, pp.A13.
29
NUBLAT, Johanna: Reprodução assistida tem novas regras. Folha de S. Paulo, São Paulo, 6 jan.2011.
Saúde, pp.C10.
30
SCHWARTSMAN, Hélio: É irracional não pagar doador de sêmen e "barriga de aluguel". Folha de S.
Paulo, São Paulo, 6 jan.2011. Saúde, C10.
31
GERAQUE, Eduardo, MOI, Izabela: Risco de gestação tripla era conhecido, dizem médicos. Folha de
S. Paulo, São Paulo, 03 abr.2011. Poder, pp.A13.
32
CARAZZAI, Estelita Hass: Lei tende a impedir que trigêmeas sejam separadas na adoção. Folha de S.
Paulo, São Paulo, 09 abr.2011. Cotidiano, C8.
9
Nublat33 (2011) aborda a norma sobre o descarte de material biológico mostrando que o
“descarte do material biológico fica por conta das clínicas”. Usa a fala Waldemar Naves
do Amaral, presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana para mostrar que
“trata-se só do descarte de espermatozóides e óvulos, já que o de embriões é proibido.”
4) Reprodução Assistida pós-mortem
Essa regra não existia na resolução de 1992, foi acrescentada na resolução de 2010. Nas
matérias selecionadas foi abordada apenas uma vez na matéria de Nublat34
(06/01/2011): “A técnica também é permitida após a morte de um dos genitores, desde
que haja autorização prévia para o uso dos gametas ou embriões congelados.”, sem
nenhum comentário.
5) Novos arranjos familiares
Duas das matérias analisadas mostram as possibilidades de novos arranjos familiares,
um acontecido no Brasil, antes mesmo das novas regras da Resolução de 2011 e outro
no Reino Unido. O primeiro caso foi apresentado por Nublat (06/01/2011) e conta a
estória de duas mulheres, uma infértil, que engravidaram pela RA, antes da “Resolução
do Conselho Federal de Medicina que garantiu, no mês passado, o direito de casais do
mesmo sexo à reprodução assistida”. Para a criação do embrião foi usado o óvulo de
uma e gestado na barriga da outra, que ganhou o direito em primeira instância pela
Justiça paulista de dupla maternidade. A criança que está com 1 ano e oito meses
recebeu o nome das duas mães.35
O caso relatado acima pela jornalista Johanna Nublat mostra que as alterações da nova
Resolução CFM nº 1.957/2010 só vieram confirmar o que já ocorria em algumas
clínicas médicas como a gravidez em casal de lésbicas.
O outro caso aconteceu no Reino Unido e pela matéria de Pastore36 (12/03/2011)
ficamos sabendo da novidade que está sendo criado: “Um método de fertilização in
vitro que envolve três pais biológicos (óvulos da mãe e de uma doadora e
espermatozóides do pai)... O objetivo é prevenir doenças hereditárias, substituindo
parte do óvulo defeituoso da mãe pelo de outra.”. O texto da jornalista explicaria melhor
se informasse que seriam duas mulheres doando óvulos e um homem doando
espermatozóide. Na fala de um especialista em reprodução da clínica brasileira Genics,
Gustavo Kröger, ela explica como ocorre o processo: "O óvulo da doadora é fertilizado,
e seu núcleo, retirado. O óvulo da mãe também é fertilizado para ter só o núcleo (onde
estão informações genéticas como cor de olhos e cabelos) fundido ao óvulo da
doadora."
Nublat37 (06/01/2011) relaciona a nova Resolução de 2010 com o caso do médico Roger
Abdelmassih “acusado de estupro por pacientes e condenado a 278 anos de prisão e uma
33
NUBLAT, Johanna: Reprodução assistida tem novas regras. Folha de S. Paulo, São Paulo, 6 jan.2011.
Saúde, pp.C10.
34
NUBLAT, Johanna: Reprodução assistida tem novas regras. Folha de S. Paulo, São Paulo, 6 jan.2011.
Saúde, pp.C10.
35
NUBLAT, Johanna: Reprodução assistida tem novas regras. Folha de S. Paulo, São Paulo, 6 jan.2011.
Saúde, pp.C10.
36
PASTORE, Mariana: Fertilização com duas mães e um pai é avaliada no Reino Unido. Folha de S.
Paulo, São Paulo, 12 mar.2011. Saúde, pp. C8.
37
NUBLAT, Johanna: Reprodução assistida tem novas regras. Folha de S. Paulo, São Paulo, 6 jan.2011.
Saúde, pp.C10.
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investigação, em andamento no conselho, levantou possível uso de material genético
que não era do casal, falta de prontuários, cobrança para escolha do sexo do bebê e
promessa de taxas de sucesso irreais.” E acrescenta que “A resolução reforça a
proibição da escolha do sexo da criança e a necessidade de a clínica manter um cadastro
completo com informações dos pacientes e de esclarecê-los sobre as chances de sucesso
da fertilização.”
Conclusão
A conclusão do artigo que analisou as tendências dos últimos 20 anos, dos dados
correspondentes aos procedimentos de RA, no período entre 1990 e 2009, coletados
pelo Registro Latinoamericano de Reprodução Assistida (RLA) é que: “O acesso a RA
teve um aumento insuficiente durante o período abrangido por este relatório. Nossa
região enfrenta dois desafios principais: facilitar o acesso à RA e diminuir as taxas de
nascimentos múltiplos.”38
A nova resolução CFM nº 1.957/2010 facilita o acesso à RA, pois dentre as mudanças, a
principal delas é a ampliação da reprodução humana assistida para além das indicações
médicas, ou seja, não somente as pessoas inférteis, mas sim “toda pessoa capaz”. Na
falta legislação específica a respeito da reprodução humana assistida, o Conselho
Federal de Medicina estabeleceu as regras orientadoras dos médicos e das clínicas, o
que coloca a Medicina como construtora de significados sobre a procriação,
maternidade, paternidade, família e parentesco, para quem puder pagar pelos
procedimentos, em hospitais e clínicas particulares e para alguns poucos que podem ter
acesso através dos quatro hospitais centro de referência público, que oferecem o
tratamento gratuito.
Vale lembrar que o impacto da RA é sexualmente diferenciado, portanto, é sobretudo no
corpo feminino que são aplicadas as tecnologias médicas, sua contribuição física e
social na RA é maior que a do homem, é seu corpo que sofrerá mais fortemente as
conseqüências dos tratamentos.
A pesquisa nacional sobre percepção publica da ciência de 2010 mostrou que o interesse
declarado pelos brasileiros por Ciência e Tecnologia é contínuo e crescente, mas eles
desconhecem a ciência e tecnologia que é feita no país. A grande maioria apontou os
médicos e jornalistas como os profissionais que mais inspiram confiança no público
brasileiro.39
O jornal Folha de S. Paulo tem uma grande participação na divulgação científica sobre
a Reprodução Assistida. Em pesquisa feita em 1998 mostramos que o jornal nem
sempre divulga todas as versões do fato, como também a informação científica
publicada pelo jornal diário pode ser considerada como um “espetáculo da ciência”, sem
valor pedagógico, pois falta ao material divulgado e estudado elementos de explicação e
reflexão. Nas matérias analisadas nesse trabalho a situação se repete, a Folha de S.
Paulo não cumpre o seu papel de informar de forma adequada e ajudar a população
brasileira a vencer a barreira do pouco conhecimento científico.
38
ZEGERS-HOCHSCHILD, Fernando et all (2011): Twenty years of Assisted Reproductive Technology
(ART) in Latin America. JBRA Assist. Reprod. v.15, n.2, march-april.
39
MINISTÉRIO DA CIÊNCIA TECNOLOGIA (2010) : Percepção Pública da Ciência e Tecnologia.
Departamento de Popularização e Difusão da C&T. Secretaria de Ciência e Tecnologia para Inclusão
Social.
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AS NOVAS REGRAS PARA REPRODUÇÃO ASSISTIDA NA