Mestrado Integrado em Medicina Veterinária Ciências Veterinárias Características electrocardiográficas em equinos da raça Puro-Sangue Lusitano Alexandre Manuel Martins Triguinho Orientador: Professor Doutor Mário Pedro Gonçalves Cotovio Co-Orientador: Professora Doutora Ana Patrícia Fontes de Sousa UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO VILA REAL, 2011 Mestrado Integrado em Medicina Veterinária Ciências Veterinárias Características electrocardiográficas em equinos da raça Puro-Sangue Lusitano Alexandre Manuel Martins Triguinho Orientador: Professor Doutor Mário Pedro Gonçalves Cotovio Co-Orientador: Professora Doutora Ana Patrícia Fontes de Sousa UNIVERSIDADE DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO VILA REAL, 2011 2 RESUMO Os cavalos Puro-Sangue Lusitano (PSL) são dos mais versáteis do mundo e são muito utilizados em competições desportivas, sendo cada vez maior a importância dos estudos de salubridade desta raça. Este é um trabalho com importância para o PSL por ser o primeiro que utiliza a electrocardiografia. Com o objectivo de caracterizar o traçado electrocardiográfico do cavalo adulto clinicamente saudável da raça PSL foram realizados e analisados dois registos electrocardiográficos de 76 animais, através dos métodos de Einthoven e de base-ápice, já que são os métodos mais comummente utilizados em equinos. Foi ainda feita uma análise estatística dos resultados com vista a estudar a influência do género, idade e preparação física nos vários parâmetros electrocardiográficos avaliados. Alguns dos valores obtidos poderão ser encarados como bons indicadores desportivos e de uma grande capacidade mental dos cavalos desta raça, como a percentagem de ondas P bífidas e T negativas observadas, a duração da onda T e a duração do intervalo Q-T. Alguns dos resultados também divergem dos publicados noutras raças próximas, como o Andaluz ou o Mangalarga Marchador, o que comprova a necessidade de obter valores de referência específicos para a raça. Também se constatou que a realização deste exame é, de um modo geral, simples, relativamente rápida, pouco dispendiosa e os resultados são relativamente fáceis de analisar e fornecem valiosas informações sobre a sanidade e, até certo grau, capacidade desportiva do animal. Palavras-chave Puro-Sangue Lusitano; cavalo; ECG; género; idade; treino i ABSTRACT The Puro-Sangue Lusitano breed is one of the most versatile breeds of the world and is utilized at a great scale in sport competitions, which makes the healthiness tests in this breed of the most importance. This is an important study for the Puro-Sangue Lusitano breed because it is the first to use the electrocardiography. With the purpose of characterize the electrocardiographic tracing of the clinically healthy adult horse from the Puro-Sangue Lusitano breed, we performed and analyzed 76 electrocardiographic registers, using the Einthoven and base-apex lead systems, since these are the most used methods in the equine species. A statistic analysis was also made in order to study the influence of the gender, age and training in the evaluated electrocardiographic parameters. Some of the values obtained could be seen as good sport performance indicators, and also demonstrate the great tolerance characteristic of this breed, such as the percentage of bifid P waves and negative T waves found, the duration on the T wave and the duration of Q-T interval. Some of the results also diverge from the results published for other breeds close related to the Lusitano horse, such as the Andalusian and the Mangalarga Marchador, which attests the importance of obtaining reference values for each breed. We also found that this diagnostic test is generally simple, quick, not expensive and the results are relatively easy to analyze and provide us with valuable information about the health and, to a certain degree, the sport capacity of the animal. Keywords Puro-Sangue Lusitano; horse; ECG; gender; age; training ii ÍNDICE GERAL Revisão bibliográfica……………………………………………………………. .1 o o o o o o o o o Bases electrofisiológicas do coração de equino……………………………1 O ciclo cardíaco…………………………………………………………….2 Ritmo cardíaco em repouso………………………………………………...4 Electrofisiologia celular…………………………………………………….6 Potencial de acção……………………………………………………..6 Despolarização, repolarização e fase de repouso…………………….7 Meios de registo das alterações eléctricas a nível celular…………...8 Inervação cardíaca………………………………………………………...9 Forças electromotrizes cardíacas………………………………………….10 Obtenção de um electrocardiograma……………………………………..13 Bases de funcionamento……………………………………………...13 Métodos existentes…………………………………………………...13 Previsão da capacidade desportiva através da electrocardiografia………..17 O cavalo Puro-Sangue Lusitano…………………………………………..19 Objectivos……………………………………………………………………….....21 Material e Métodos………………………………………………………………22 Resultados………………………………………………………………………..25 Discussão dos resultados…………………………………………………………35 o o o o o o o Onda P…………………………………………………………………….35 Complexo QRS……………………………………………………………38 Onda T…………………………………………………………………….41 Intervalo P-R e Q-T……………………………………………………….43 Influência do género…………………………………………………..45 Influência do grupo etário……...…………………………………………46 Influência do treino físico……………………………………….47 Conclusão………………………………………………………………………………49 Referências bibliográficas………………………………………………………50 Anexos………………………………………………………………………….53 o Ficha de questionário efectuado ao proprietário………………………….53 iii ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Esquema representativo do potencial de acção numa célula muscular do miocárdio e numa célula marcapasso. (pág. 7) Figura 2 – Esquema dos locais de colocação dos eléctrodos e um exemplo de um ciclo cardíaco retirado de um ECG obtido segundo o método de Einthoven durante o presente estudo. (pág. 14) Figura 3 – Esquema dos locais de colocação dos eléctrodos e um exemplo de um ciclo cardíaco retirado de um ECG obtido segundo o método base-ápice durante o presente estudo. (pág. 16) Figura 4 – Exemplo da localização dos eléctrodos no método de Einthoven num dos cavalos utilizados no estudo. (pág. 23) Figuras 5 e 6 – Exemplo da localização dos eléctrodos no método de base-ápice num dos cavalos utilizados no estudo. (pág. 23) Figura 7 – Exemplos dos formatos de onda P observados no estudo: (A) bífida; (B) simples positiva; (C) bifásica. (pág. 35) Figura 8 – Exemplos dos formatos do complexo QRS observados no estudo relativamente aos dois métodos utilizados: (A) RS (base-ápice); (B) S (base-ápice); (C) QRS (Einthoven); (D) QR (Einthoven); (E) R (Einthoven); (F) RS (Einthoven); (G) S (Einthoven); (H) QS (Einthoven). (pág. 39) Figura 9 - Exemplos dos formatos da onda T observados no estudo: (A) onda T simples negativa (B) onda T bifásica (-/+); (C) onda T simples positiva. (pág. 41) iv ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 – Distribuição das percentagens dos vários formatos de cada elemento observados no ECG para o método Base-ápice. (pág. 25) Tabela 2 – Distribuição das percentagens dos vários formatos de cada elemento observados no ECG para o método de Einthoven. (pág. 26) Tabela 3 – Média (e desvio padrão da média) dos valores de amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados em ambos os métodos. (pág. 26) Tabela 4 – Média (e desvio padrão da média) dos valores de duração, em segundos, para os vários elementos avaliados em ambos os métodos. (pág. 27) Tabela 5 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, para ambos os géneros, em ambos os métodos. (pág. 27) Tabela 6 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da duração, em segundos, para os vários elementos avaliados no ECG, para ambos os géneros, em ambos os métodos. (pág. 28) Tabela 7 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com idade entre os 3 e os 5 anos, grupo 1 (n = 22). (pág. 28) Tabela 8 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos do ECG avaliados, em ambos os métodos, para os animais com idade entre os 6 e os 14 anos de idade, grupo 2 (n = 41). (pág. 29) Tabela 9 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com idade superior a 14 anos, grupo 3 (n = 12). (pág. 29) Tabela 10 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da duração, em segundos, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os 3 grupos etários. (pág. 30) Tabela 11 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais sem qualquer sessão de treino semanal, grupo 1 (n = 13). (pág. 30) v Tabela 12 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com uma a duas sessões de treino semanal, grupo 2 (n = 14). (pág. 31) Tabela 13 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com três a quatro sessões de treino semanal, grupo 3 (n = 7). (pág. 31) Tabela 14 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com cinco a seis sessões de treino semanal, grupo 4 (n = 28). (pág. 32) Tabela 15 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com sessões de treino diárias, grupo 5 (n = 12). (pág. 32) Tabela 16 – Média (e desvio padrão da média) dos valores da duração, em segundos, dos vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os vários grupos de treino. (pág. 33) vi LISTAGEM DE SIGLAS AV – aurículo-ventricular bpm – batimentos por minuto ECG – electrocardiograma HV-UTAD – Hospital Veterinário da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro mV – milivolt PSL – Puro-Sangue Lusitano s – segundo SA – sinusal vii AGRADECIMENTOS Aos meus pais por todo o apoio que sempre me deram durante todo o curso e pelo acompanhamento sempre presente e todos os sacrifícios feitos em prole de mim ao longo da minha vida. Agradeço também a toda a minha restante família, em especial ao meu sobrinho, Luís, pela ajuda directa na elaboração desta dissertação; À minha namorada, Susana, por me fazer sempre acreditar que seria possível cumprir prazos que me pareciam impossíveis e pela grande disponibilidade e paciência para me ajudar directamente na elaboração desta dissertação; Ao Professor Doutor Mário Cotovio e à Professora Doutora Ana Patrícia Fontes de Sousa pela grande disponibilidade em me ajudarem durante todos os passos desta investigação e por todos os conselhos dados; Ao Professor Doutor Jorge Colaço pela ajuda dada na análise estatística dos resultados; Ao corpo clínico do HV-UTAD pelo auxílio na realização dos electrocardiogramas aos animais internados no hospital, nomeadamente a Dra. Ana Costa, Dr. Pedro Fonseca, Dra. Joana Elias, Dra. Ana Jacinta e Dra. Vanda Santos; Ao Dr. Núncio Fragoso pela grande disponibilidade demonstrada e por nos facilitar o acesso a um grande leque de coudelarias e centros hípicos; Aos meus colegas Ana Margarida Pereira e Mário Maia pela ajuda dada na realização dos electrocardiogramas; A todos os proprietários que se disponibilizaram a colaborar com esta investigação, cedendo os seus cavalos e o seu tempo. A todos os meus amigos pela amizade e carinho que sempre me concederam durante estes seis anos e que me permitiram chegar até este ponto final da minha vida académica, especialmente ao João, Romano, Marta, Fernanda, Ghost, Sara, Pedro e Lúzia. viii PARTE DO TRABALHO DESENVOLVIDO AO LONGO DESTA APRESENTADO NAS SEGUINTES REUNIÕES CIENTÍFICAS: II Jornadas Internacionais do Grupo de Trabalho de Investigação Equina (Ponte-de-Lima, Portugal, 25 de Junho de 2011) Caracterização do Electrocardiograma em Cavalos da Raça Lusitana A. Triguinho, M. Cotovio, A.P. Fontes-Sousa (Apresentação sob a forma de comunicação oral) II Encontro de Formação da Ordem dos Médicos Veterinários (Lisboa, Portugal, 8 e 9 de Outubro de 2011) Caracterização do Electrocardiograma em Cavalos da Raça Lusitana A. Triguinho, M. Cotovio, A.P. Fontes-Sousa (Apresentação sob a forma de comunicação oral) ix TESE FOI 1. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 1.1. Bases electrofisiológicas do coração de equino Para que ocorra contracção dos miócitos é necessário que um potencial de acção eléctrico atinja a membrana celular, provocando a despolarização da mesma através da abertura de canais iónicos (Bright e Marr, 2010). No coração há certas populações celulares capazes de criar estes potenciais de acção sem qualquer estímulo externo. Esta capacidade denomina-se automatismo, e é evidenciada pelas células do nódulo sinusal (SA), nódulo aurículo-ventricular (AV) e das fibras de condução do sistema His-Purkinje, sendo que as primeiras apresentam uma frequência de geração espontânea de potenciais de acção mais célere (Bonagura e Reef, 1998). Por este motivo, no coração normal, são as células do nódulo SA que marcam o ritmo cardíaco, originando a onda de despolarização que irá percorrer o coração. Ao grupo de células responsável pela formação duma dada onda de despolarização, dá-se o nome de marcapasso (Physick-Sheard, 1991). Em casos de depressão do nódulo SA, ou de actividade exacerbada de um dos outros tecidos com automatismo, verifica-se a ocorrência de um ritmo cardíaco ectópico ou, em casos pontuais, de um mecanismo de escape (Bonagura e Reef, 1998). A onda de despolarização começa por descrever um trajecto dorso-ventral, desde o nódulo SA, localizado na junção do átrio direito e da veia cava cranial até ao nódulo AV (Jones, 1989), e também na direcção da aurícula esquerda, provocando neste trajecto a activação da massa muscular auricular (Bright e Marr, 2010). A existência de células cardíacas especializadas compostas por ligações internodais e pelas bandas de Bachman facilitam esta dispersão do impulso cardíaco através das aurículas (Bonagura e Reef, 1998). Ao atingir a aurícula esquerda, a massa muscular desta estrutura despolariza-se a partir de vários pontos simultaneamente, surgindo várias ondas de despolarização que partem em várias direcções (Physick-Sheard, 1991). Por outro lado, aquando da passagem do impulso cardíaco das aurículas para os ventrículos, através do nódulo AV, o potencial de acção sofre um atraso devido à baixa velocidade de condução destas células (Jones, 1989). Este facto permite que as aurículas contraiam, e que o sangue contido no seu interior passe para os ventrículos, antes que estes últimos comecem a contrair (Bright e Marr, 2010). Após esta lenta passagem pelo nódulo AV, o potencial de acção é rapidamente conduzido pelo feixe de His até ao pólo apical do coração (Patteson, 1996). O ramo direito do feixe de His liga-se directamente ao sistema especializado de Purkinje da parede ventricular direita e do ápice 1 cardíaco, enquanto o ramo do lado esquerdo se divide em três sub-ramos que se conectam com o sistema de Purkinje da parede ventricular esquerda, septo e músculos papilares (Physick-Sheard, 1991). Aqui, ao contrário do que acontece, por exemplo, nos carnívoros domésticos, as fibras do sistema especializado de Purkinje propagam-se, profusamente, ao longo da massa muscular de ambos os ventrículos. Tal facto é de extrema importância para o mecanismo electrofisiológico ventricular, uma vez que estas fibras têm uma capacidade de condução cerca de 6 vezes superior aos miócitos (Bright e Marr, 2010). A ordem pela qual o potencial de acção percorre os ventrículos inicia-se com a despolarização duma pequena porção apical do septo. Nesta fase inicial da activação ventricular, o vector da onda de despolarização segue geralmente, ainda que possa divergir desta regra em alguns indivíduos, uma direcção cranio-ventral e da esquerda para a direita, sendo imediatamente seguido por outro vector que segue a direcção caudo-dorsal e da direita para a esquerda (Hamlin et al, 1964). De seguida, há uma rápida activação dos dois terços mais apicais do septo e da massa muscular de ambos os ventrículos. Nesta fase, a onda de despolarização não segue um vector definido como nos cães ou humanos, ocorrendo, ao invés, uma série de vectores de despolarização, que partem em diferentes direcções (Muylle e Oyaert, 1977). Na fase final da activação ventricular, a onda de despolarização percorre o terço basal do septo, numa direcção dorsal e apico-basal (Hamlin et al, 1964; Bright e Marr, 2010). Há ainda a acrescentar que a regulação fisiológica do ritmo cardíaco em equinos é largamente influenciada pelo sistema nervoso autónomo (Mark Patesson, 1996). O sistema parassimpático, especificamente através do nervo vago, exerce um efeito de bradicardia a dois níveis. Por um lado, diminui a frequência de geração de impulsos nervosos pelo nódulo SA e, por outro, diminui a capacidade de condução do impulso nervoso através do nódulo AV. Este efeito é conhecido por tónus vagal (Jones, 1989). Em situações em que o sistema simpático intervém, como no exercício físico ou qualquer situação de stresse, o tónus vagal diminui consideravelmente, aumentando então a frequência cardíaca (Bonagura e Reef, 1998). 1.2. O ciclo cardíaco Para compreender o funcionamento do coração saudável é necessário conhecer o seu ciclo normal de funcionamento, bem como saber relacioná-lo com os acontecimentos eléctricos que detectamos no electrocardiograma (ECG). O ciclo cardíaco é composto pela sístole e diástole ventricular, sendo que cada uma destas pode ser decomposta numa série de fases. A sístole alberga as fases de contracção isovolumétrica 2 e de ejecção ventricular. Já a diástole é dividida nas fases de relaxamento isovolumétrico, enchimento ventricular rápido, diástase e contracção atrial (Hamlin, 1986). A decomposição do ciclo cardíaco nestas fases é feita com base nas alterações de pressão e volume que ocorrem no interior dos ventrículos. Geralmente considera-se que o ciclo cardíaco se inicia quando da despolarização dos ventrículos. Uma vez que os chamados acontecimentos mecânicos são uma resposta muscular aos acontecimentos eléctricos, os primeiros ocorrem ligeiramente depois dos segundos (Bright e Marr, 2010). Deste modo, por exemplo, a contracção ventricular e o encerramento das válvulas AV iniciam-se pouco depois da despolarização ventricular. A primeira fase de contracção dos miócitos ventriculares ocorre sem alteração do volume de sangue intra-ventricular com consequente aumento da pressão intra-ventricular (Patteson, 1996). Este aumento da pressão intra-ventricular continuará, rapidamente, até que esta exceda a pressão sanguínea na artéria aorta, momento em que a válvula aórtica se abre (Voronova et al, 2009). O mesmo se passa no lado direito do coração até à abertura da válvula pulmonar, com a diferença de que os valores de pressão atingidos no ventrículo direito e na artéria pulmonar são consideravelmente inferiores aos obtidos no lado esquerdo do coração. O intervalo de tempo entre o início da contracção miocárdica e encerramento das válvulas AV, e a abertura da válvula aórtica marca a fase de contracção isovolumétrica (Hamlin, 1986). Se, a este intervalo lhe adicionarmos a fase de despolarização ventricular e o tempo de atraso electromecânico, obtemos o tempo de pré-ejecção (Patteson, 1996). No momento em que a válvula aórtica se abre inicia-se a fase de ejecção ventricular, sendo o sangue do ventrículo esquerdo rapidamente ejectado para a artéria aorta. Durante praticamente toda esta fase a pressão intra-ventricular é sempre maior que a pressão aórtica (Bright e Marr, 2010). No entanto, à medida que o volume intra-ventricular diminui, a diferença de pressão entre a aorta e o ventrículo esquerdo também vai diminuindo, até que se inverta novamente a favor da aorta (Patteson, 1996). No final do período de ejecção o fluxo sanguíneo reverte-se, causando o encerramento abrupto da válvula aórtica, o que origina o segundo som cardíaco (S2). Neste ponto termina a sístole ventricular, e inicia-se a diástole (Hamlin, 1986). No início da diástole ventricular os miócitos começam a relaxar, não obstante, não há qualquer alteração do volume intra-ventricular, dando-se, por isso, a esta fase o nome de relaxamento isovolumétrico. É nesta altura que no ECG se identifica a repolarização dos ventrículos (Voronova et al, 2009). Nesta fase a pressão dos ventrículos cairá até que seja inferior à pressão auricular e ocorra a abertura das válvulas AV, altura em que se enceta a fase de enchimento ventricular rápido (Patteson, 1996). 3 A velocidade com que o sangue passa das aurículas para os ventrículos depende do gradiente de pressão, que se forma devido à diminuição de tensão dos miócitos ventriculares. Assim sendo, o enchimento ventricular durante esta fase é um enchimento exclusivamente passivo (Patteson, 1996). O sangue nesta fase movimenta-se a tal velocidade que provoca a oscilação e vibração de certas estruturas cardíacas, como as cordas tendinosas. Esta vibração é responsável pelo terceiro som cardíaco (S3) (Bright e Marr, 2010). Enquanto há um aumento do nível de sangue intra-ventricular há, logicamente, uma diminuição da diferença de pressão AV. Esta diferença decrescerá até níveis perto de zero, fazendo com que a curva de enchimento ventricular atinja, aqui, um planalto (Hamlin, 1986). Neste momento o coração está na fase de diástase e as diferenças de pressão e volume que ocorrem a nível ventricular são desprezáveis (Patteson, 1996). A duração desta fase é inversamente proporcional à frequência cardíaca, e no cavalo em descanso esta é a fase mais longa de todo o ciclo cardíaco. À medida que a frequência cardíaca vai aumentando, esta fase encurta no tempo, porém a sua acção no enchimento ventricular continua a ser negligenciável (Bright e Marr, 2010). Na fase final da diástole ventricular identifica-se no ECG a onda P, referente à despolarização das aurículas (Patteson, 1996). Pouco depois acontece a contracção atrial e o sangue passa activamente das aurículas para os ventrículos. Esta movimentação rápida do sangue causa a vibração de algumas estruturas cardíacas produzindo o quarto som cardíaco (S4) (Hamlin, 1986). Embora a contribuição desta sístole atrial para o funcionamento cardiovascular normal, dum cavalo em repouso, seja de pouca importância, o mesmo já não se verifica enquanto o cavalo está a realizar exercício físico. Neste último caso, a ausência de contracção atrial, ou a descoordenação desta em relação à contracção ventricular, leva a uma diminuição do enchimento ventricular, do débito cardíaco e, em última instância, da performance desportiva do cavalo (Bright e Marr, 2010). No final da fase de contracção atrial a pressão intra-ventricular é superior à pressão intra-auricular, fechando-se as válvulas AV, e começando um novo ciclo cardíaco. O encerramento destas válvulas origina o primeiro som cardíaco, que é normalmente o mais audível (Hamlin, 1986). 1.3. Ritmo cardíaco em repouso O típico ritmo sinusal observado nos equinos em estado saudável está sob forte influência do sistema nervoso autónomo, como já referido anteriormente. Essa interferência visa, em última instância controlar a pressão arterial sistémica, de modo que a frequência cardíaca aumente em 4 situações de hipotensão. Em oposição, a frequência cardíaca diminuirá em situações de hipertensão (Evans e Young, 2010). Contudo, a interferência acrescida do sistema parassimpático, através do tónus vagal, provoca um progressivo bloqueio da condução nervosa ao nível dos nódulos SA e AV. Este bloqueio resulta no desenvolvimento de irregularidades do ritmo cardíaco em cavalos completamente saudáveis, quando estes estão em repouso (Holmes, 1966; Raekallio, 1992). As anomalias mais comummente encontradas são, bradicardia sinusal, bloqueio sinusal, arritmia sinusal e bloqueios AV de 1º e 2º grau (Jones, 1989). Define-se por bradicardia sinusal o estado em que a frequência cardíaca desce para níveis inferiores a 25 batimentos por minuto (Jones, 1989), e por bloqueio sinusal a ausência completa de formação dum impulso cardíaco. Num ECG esta última é traduzida pelo aparecimento dum intervalo R-R sensivelmente igual ao dobro do valor normal deste intervalo e sem qualquer formação duma onda P (Patteson, 1996). Uma arritmia sinusal é reconhecida pelo aparecimento de flutuações no ritmo cardíaco normal, que acompanham as flutuações da actividade do sistema autónomo, durante um certo período de tempo. Pensava-se que esta arritmia era característica de fases pós-exercício, mas estudos revelam que esta correlação pode estar errada (Raekallio, 1992). Ao passo que estas alterações do ritmo sinusal advêm do efeito produzido pelo sistema nervoso autónomo no nódulo SA, os bloqueios AV provêm do efeito deste sistema no nódulo AV e são consideravelmente mais comuns (Patteson, 1996). Um bloqueio AV de 1º grau é difícil de identificar, tal é a variação normal do intervalo P-R, mas assume-se existir quando este intervalo é superior a 0,5 segundos (Bonagura e Reef, 1998). O bloqueio AV de 2º grau é a alteração mais comum do ritmo sinusal normal e ocorre quando o impulso cardíaco é completamente travado ao nível do nódulo AV (Hilwig, 1977). É importante perceber que todas estas alterações, tal como a taquicardia sinusal provocada pela diminuição do tónus vagal (frequência cardíaca acima dos 50 batimentos por minuto) (Jones, 1989), são alterações fisiológicas do ritmo sinusal normal que podem estar presentes em qualquer animal saudável (van Loon e Patteson, 2010). A maior parte destas irregularidades desaparecem quando a frequência cardíaca aumenta e, por isso, não afectam a capacidade desportiva do animal (Holmes, 1966; Marr, 1997; Bonagura, 1985). No caso de estas alterações persistirem mesmo durante o exercício devem ser consideradas como sinais de doença cardíaca (Jones, 1989). Parece haver, ainda, uma relação entre o achado de outras alterações cardíacas em cavalos em repouso e a sua baixa performance desportiva, especificamente quando se trata de fibrilação auricular, bloqueio cardíaco completo e extra-sístoles ventriculares ou atriais (Thomas, 1980). 5 1.4. Electrofisiologia celular a. Potencial de acção Quando atingidos pelo impulso nervoso, os miócitos evidenciam o fenómeno de tudo-ounada, isto é, se um certo limiar de acção é alcançado toda a célula é completamente activada pelo potencial de acção, ocorrendo assim a contracção celular. Por este motivo diz-se que os miócitos são células excitáveis (Bonagura e Reef, 1998). Após a célula ter sido activada por um potencial de acção existe um período de tempo durante o qual esta retorna ao seu estado de repouso, abaixo do limiar de acção. Durante este período de repolarização nenhum estímulo pode provocar nova activação. A este intervalo é chamado de período refractário. Esta característica permite que haja um relaxamento celular após cada contracção, o que, por sua vez, garante que haja tempo para que o sangue circule para as câmaras cardíacas antes de uma nova contracção miocárdica (Patteson, 1996). Uma outra característica evidenciada pelos miócitos é a condutividade, ou seja, a capacidade de transmitir um impulso às células vizinhas, causando a sua despolarização. É esta capacidade que permite a formação de uma onda de despolarização, que garante a circulação correcta do sangue no interior das câmaras cardíacas. Por exemplo, o facto da activação ventricular se iniciar pela porção apical do septo interventricular e dos ventrículos e só depois ocorrer a contracção do terço médio e, por fim, basal dos mesmos permite que o sangue flua na direcção das válvulas aórtica ou pulmonar (van Loon e Patteson, 2010). Também é importante compreender que, embora a recepção de um impulso pelos miócitos leve a uma despolarização dos mesmos, existem células cardíacas nas quais tal não sucede. São estas as células do sistema especializado de condução. Nestas células o impulso é recebido e passado a células vizinhas sem que haja contracção celular, pois estas não possuem as proteínas de contracção, actina e miosina. Tal como foi dito anteriormente, esta condução pode ser lenta (nódulo AV) ou rápida (sistema His-Purkinje) (van Loon e Patteson, 2010). Outro conceito que é necessário ser compreendido é o de potencial transmembranar. Todas as células vivas apresentam uma grande concentração de iões negativamente carregados no seu interior, o que leva a que haja uma diferença de voltagem entre o interior e o exterior celular. A esta diferença dá-se o nome de potencial transmembranar, cujo valor varia entre -80 e -90 mV (Patteson, 1996). Para além dos iões negativos, também o potássio apresenta uma maior concentração intracelular do que extracelular, verificando-se exactamente o oposto com o sódio e o cálcio, sendo este último imprescindível para a contracção muscular (Bonagura e Reef, 1998). Normalmente esta situação mantém-se durante toda a vida da célula, mas nos casos das células 6 excitáveis existem microporos e canais pelos quais é possível fazer-se trocas de iões entre o interior e o exterior celular. É este fluxo de iões que provoca a despolarização e repolarização dos miócitos (Bonagura e Reef, 1998). Quando o miócito é activado por um impulso o seu potencial transmembranar passa de -90 mV para cerca de 20 mV (despolarização) e, seguidamente volta aos -90 mV (repolarização). É à representação gráfica da alteração do potencial transmembranar durante a despolarização e repolarização que se dá o nome de potencial de acção (van Loon e Patteson, 2010). O potencial de acção diverge nos vários tecidos atravessados pelo impulso de despolarização, definindo as propriedades de cada célula especializada, e pode ser dividido em cinco fases ou, dum modo mais prático, apenas em três fases: despolarização, repolarização e fase de repouso. b. Despolarização, repolarização e fase de repouso Após uma célula atingir o seu limiar de excitabilidade iniciam-se uma série de alterações na sua membrana visando aumentar a concentração da célula em iões positivos, causando assim a sua despolarização. No caso de células dos nódulos SA ou AV, bem como de células de tecidos com lesões isquémicas, tal acontece através dos canais lentos de cálcio (Bonagura e Reef, 1998), enquanto nas células do sistema de condução ou nos miócitos são os canais rápidos de sódio que desempenham este papel (Noble, 1979). Outra diferença entre as células de tecidos marcapasso e de tecidos condutores é o potencial transmembranar de repouso. Ao passo que nas primeiras este é de -60 mV, nas células do sistema de condução ronda os -90 mV. Estas diferenças são as responsáveis por haver uma menor velocidade de condução nas células marcapasso, pois a velocidade a que ocorre a despolarização também é menor (Noble, 1979), como se pode verificar na Figura 1. Ao mesmo tempo, pelo facto do potencial de repouso ser mais elevado nas células marcapasso, torna-se mais fácil para estas células atingir o limiar de excitabilidade espontaneamente (Patteson, 1996). Relativamente ao processo de repolarização, podemos dividi-lo em três fases. Uma fase inicial rápida, uma fase intermédia lenta e uma fase final novamente rápida. 7 Na primeira fase o potencial transmembranar desce até um valor próximo de zero, principalmente devido à inactivação dos canais de sódio e cálcio e ao efluxo de potássio (Bonagura e Reef, 1998). Numa segunda fase, chamada fase de planalto pela longa e lenta descida do potencial transmembranar, a permeabilidade membranar é baixa para qualquer ião. A membrana celular transfigura-se de modo a permitir uma complexa troca de iões de sódio, potássio, magnésio e cloro entre o interior e o exterior celular. Concomitantemente verifica-se também um importante fluxo de cálcio para o interior da célula (Patteson, 1996). Esta intricada actividade celular provoca um prolongamento acentuado do período de repolarização e, consequentemente, da duração do potencial de acção. É na realidade a fase mais preponderante para a duração do potencial e é durante esta fase que muitas arritmias se formam (Nattel, 2002). É também de supor que qualquer alteração da concentração no organismo dos referidos iões possa provocar importantes perturbações nesta fase. Na fase final há uma rápida descida do potencial até aos níveis de repouso devido a uma saída activa de potássio que, de modo a manter os gradientes de concentração, é depois compensada pela acção da bomba de sódio-potássio. Esta bomba encarrega-se de trocar o sódio intracelular em excesso por potássio. Estados de hipercalemia aceleram a repolarização, causando encurtamento desta fase, que pode ser visualizada num ECG pela diminuição da duração da onda T (Bonagura e Reef, 1998). Durante esta última fase a célula vai readquirindo excitabilidade, podendo, ainda antes de atingir o nível de repouso, ser novamente excitada por cargas eléctricas elevadas (Jalife et al, 2009). Se tal não acontecer a célula continuará o seu processo de repolarização até estabilizar nos -90 mV, ou -60 mV no caso das células marcapasso, atingindo então a fase de repouso e terminando o potencial de acção (Patteson, 1996). Numa representação esquemática podemos então dividir o potencial de acção em 5 fases, sendo a despolarização representada pela fase 0, os três estados da repolarização pelas fases 1, 2 e 3 e o estado de repouso pela fase 4 (Figura 1). c. Meios de registo das alterações eléctricas a nível celular As fases de despolarização e repolarização das células cardíacas podem ser registadas a nível intracelular, intracardíaco ou à superfície da pele (Fish, 1988, citado por van Loon e Patteson, 2010). O uso de eléctrodos intracelulares permite-nos conhecer as variações do potencial eléctrico transmembranar de uma célula durante a despolarização e repolarização (Noble, 1979). Deste modo podemos caracterizar e comparar as propriedades electrofisiológicas dos diferentes 8 tecidos, baseando-nos na reacção das células que os constituem. Outra vantagem deste modo é que nos permite estudar e, assim, prever o efeito de alterações iónicas, fármacos e, até certo ponto, doenças miocárdicas, no mecanismo de despolarização e repolarização celular (Noble, 1979). A obtenção de um registo da alteração dos potenciais transmembranares durante o ciclo cardíaco é conseguida pela utilização de eléctrodos intracardíacos. A aplicação destes eléctrodos é efectuada por via transvenosa, com a ajuda de um catéter especial, até estes atingirem a aurícula direita ou o ventrículo direito (McGurrin, et al, 2005). Colocando o eléctrodo em contacto com a parede das câmaras é possível a obtenção do registo. No entanto, como a orientação do eléctrodo em relação ao miocárdio interfere largamente na morfologia do traçado (Kadish, 2004), este método deve ser unicamente utilizado para medir a duração do potencial de acção (Kondo et al, 2004). A utilização dos eléctrodos intracardíacos também nos permite comparar a reacção dos diferentes tecidos que são atravessados pelo impulso cardíaco, ajudando assim a compreender melhor todo o processo de activação (van Loon e Patteson, 2010). O ECG clássico é um registo gráfico das diferenças do potencial eléctrico entre vários pontos à superfície da pele, ao longo do tempo. No eixo dos xx é representado o tempo e no eixo dos yy a voltagem (Jones, 1989). As diferenças detectadas são, quase exclusivamente, atribuídas às alterações eléctricas causadas pelos processos de despolarização e repolarização dos miócitos cardíacos (Patteson, 1996). Este exame é actualmente considerado indispensável quando se avalia um doente cardíaco, e pode fornecer importantes informações quando utilizado em conjunto com outros meios de diagnóstico (White e Rhode, 1974). Embora deva ser tido em conta que este registo está dependente do somatório de todas as forças eléctricas a actuar no coração e da sua condução por vários tecidos até à pele, o ECG continua a ser o método mais fidedigno para avaliar a formação e propagação do impulso cardíaco, bem como para auxiliar ao diagnóstico e prognóstico de certas doenças cardíacas e não-cardíacas (Fregin, 1985, citado por Escudero et al, 2009). 1.5. Inervação cardíaca Tal como foi referido anteriormente, o sistema cardiovascular é controlado pelo sistema nervoso autónomo. O sistema parassimpático actua através do nervo vago, libertando acetilcolina nas suas terminações nervosas. Este neurotransmissor vai actuar no potencial de membrana das células marcapasso (Boyden e Wit, 1985), provocando a diminuição do automatismo destas 9 células, diminuição da velocidade de condução do impulso e aumento do período refractário, ou seja, dum modo geral diminuindo o ritmo e o débito cardíaco e, consequentemente, a pressão vascular (Bonagura e Reef, 1998). Por outro lado, o sistema simpático actua no sentido oposto. A libertação de adrenalina e noradrenalina actua principalmente nas proteínas contrácteis das células musculares (van Loon e Patteson, 2010), podendo também afectar o potencial transmembranar e o ritmo cardíaco (Nattel, 2002; Hamlin, 1986). O resultado final é um aumento do automatismo das células marcapasso, aumento da velocidade de condução no nódulo AV, diminuição do período refractário e aumento da contractilidade das células musculares e tensão da parede miocárdica. O exacerbamento da actividade simpática também predispõe ao aparecimento de certas arritmias (Bonagura e Reef, 1998). 1.6. Forças electromotrizes cardíacas Durante o ciclo cardíaco a despolarização e repolarização de cada célula gera um fluxo eléctrico entre diferentes pontos da mesma. Este fluxo actua como um sistema bipolar e gera um campo eléctrico em redor da célula. O somatório de todas as forças electromotrizes a actuar em cada célula age como um único sistema bipolar, e gera um campo eléctrico em redor do coração (Boyden e Wit, 1985) passível de ser analisado num ECG de superfície (Jones, 1989). A despolarização do nódulo SA não é visualizável no ECG, no entanto a despolarização da massa muscular das aurículas gera um campo eléctrico suficientemente amplo para que tal aconteça. Este campo eléctrico origina a onda P no ECG, normalmente positiva nas derivações I, II e aVF do método de Einthoven e nos métodos base-ápice e Y de Holmes (Bonagura e Reef, 1998). No cavalo em repouso a onda P apresenta-se, comummente, bífida denominando-se os seus dois picos de P1 e P2. O pico P1 tem a sua origem na despolarização dos terços médio e caudal da massa auricular direita, e o P2 na despolarização do septo interauricular e uma pequena parte da massa auricular esquerda (Bonagura e Reef, 1998). A despolarização da maior parte da massa muscular da aurícula esquerda não é detectável no ECG pois os vários vectores de despolarização que a causam anulam-se mutuamente antes de atingirem a superfície corporal (Physick-Sheard, 1991). Através da conformação da onda P podemos tirar conclusões acerca do local onde o impulso cardíaco se forma. Deste modo, por exemplo, a visualização de ondas P de diferentes formatos no mesmo ECG pode ser indicativo da condição conhecida como marcapasso oscilante (Hamlin et al, 1964). Uma onda P bifásica (-/+) indica normalmente que a 10 actividade marcapasso está a ser levada a cabo na zona caudal do átrio direito, perto do seio coronário (Bonagura e Reef, 1998). Quando o impulso cardíaco atinge o nódulo AV, a sua velocidade diminui drasticamente, devido às características destas células especializadas, como já foi referido anteriormente, e o número de células despolarizadas é muito reduzido, o que se traduz no aparecimento duma linha isoeléctrica no ECG. O período de tempo durante o qual se mantém esta linha denomina-se segmento P-R (van Loon e Patteson, 2010). O intervalo P-R é o somatório da onda P e do segmento P-R, ou seja, demonstra o intervalo de tempo entre o início da despolarização auricular e o início da despolarização ventricular (Martin, 2007). Um aumento deste intervalo é causado, normalmente, pela existência dum bloqueio AV (Jones, 1989). A condução do impulso pelo feixe de His e pelo sistema especializado de Purkinje, após atravessar o nódulo AV, também não é detectada à superfície da pele, englobando-se no intervalo P-R, mas a despolarização da massa ventricular que lhe sucede origina o complexo QRS no ECG (Jones, 1989). Devido ao facto da massa ventricular não se activar através duma frente de despolarização, mas sim de várias que partem em diferentes direcções, muitas das forças electromotrizes nela implicadas anulam-se entre si antes de alcançarem a superfície corporal, não sendo por isso registadas no ECG (Muylle e Oyaert, 1977). Actualmente é aceite que o complexo QRS nos cavalos, no método de base-ápice, traduz maioritariamente a despolarização do septo interventricular, sendo que as ondas Q e R resultam da despolarização do seu terço apical e a onda S do seu terço basal (Physick-Sheard, 1991). Uma consequência importante que daqui advém é o facto se de tornar impossível tirar ilações sobre o desenvolvimento da massa muscular ventricular nos cavalos, ao contrário do que acontece nos carnívoros domésticos. Em relação à configuração do complexo QRS, esta é muito variável (Jones, 1989). Nas derivações do plano frontal do método de Einthoven a amplitude das ondas do complexo QRS pode ser bastante reduzida e a sua configuração divergir muito de animal para animal. Nos métodos que acompanham o eixo cardíaco, como o método base-ápice, as amplitudes são normalmente maiores, principalmente da onda S (Bonagura e Reef, 1998) devido à direcção apico-basal do vector cardíaco no terço final da activação ventricular (Bright e Marr, 2010). Ao analisar este complexo deve ter-se em conta que complexos QRS que advenham de extra-sístoles ventriculares apresentam conformações diferentes dos que provêm de estímulos do nódulo SA, normalmente não se identificando qualquer das ondas normais deste complexo. A duração e amplitude das ondas deste tipo de complexos são normalmente maiores e não são antecedidas de qualquer onda P, como ocorre no ritmo sinusal normal (Hamlin et al, 1966). 11 Alguns autores realçam ainda que a análise do complexo QRS pode fornecer informações sobre o aparelho respiratório. Segundo Grauerholz, o aumento da amplitude da onda R pode estar associado a alterações respiratórias, sendo que esta aumenta na expiração e diminui durante a inspiração. Estas alterações são mais evidentes em cavalos com problemas respiratórios (Grauerholz, 1990). A repolarização das células da massa ventricular dá origem a forças electromotrizes que são identificadas no ECG pela onda T. A repolarização da massa atrial pode também, por vezes, ser visualizada no ECG, causando assim a formação duma onda Ta, principalmente face a frequências cardíaca elevadas (Bonagura e Reef, 1998). No cavalo em repouso, no entanto, esta onda é normalmente pequena e está mascarada pelo complexo QRS, não sendo visualizável (Jones, 1989). Actualmente alguns autores acreditam que alterações do segmento S-T, juntamente com hipovolemia ou choque, podem indicar isquémia do miocárdio, ao passo que o aumento da onda T pode indicar situações de hipóxia do miocárdio ou hipercalemia (Bonagura e Reef, 1998). Por fim, o intervalo QT engloba o complexo QRS, o segmento QT (período de tempo entre o final do complexo QRS e início da onda T) e a onda T. Ou seja, demonstra o período de tempo durante o qual se verifica a despolarização e a repolarização ventricular (Martin, 2007). Através do estudo da conformação, temporização e relação entre os vários elementos do ECG o clínico pode, então, reconhecer o momento em que cada fase do ciclo cardíaco ocorre, e como se origina e propaga o impulso cardíaco em cada caso. É recomendada a realização dum ECG em equinos que apresentem ritmo cardíaco anormal à auscultação, principalmente se concomitante com história de baixa performance ou síncopes, bradicardia ou taquicardia sem razões aparentes, sopros cardíacos expressivos, tosse crónica juntamente com dispneia e cianose, sinais clínicos de endocardite, pericardite ou miocardite, derrame pleural e pulso arterial fraco ou irregular (Jones, 1989). Um estudo recente em medicina humana deu, inclusivamente, um novo uso ao ECG. Com base na teoria da elevada fluidez dos líquidos, Voronova et al (2009) demonstrou a elevada utilidade do ECG associado ao uso de um medidor de pressão e fluidez (RHEO), para analisar cada fase do ciclo cardíaco. Através do cruzamento de dados entre os resultados dos dois aparelhos é possível criar uma relação causa-efeito para o problema cardíaco que enfrentamos, facilitando assim a nossa acção para o solucionar. 12 1.7. Obtenção de um electrocardiograma a. Bases de funcionamento O campo eléctrico existente em redor do coração pode ser detectado e analisado através da colocação de um galvanómetro à superfície da pele. Este galvanómetro medirá as diferenças de potencial entre dois eléctrodos, um positivo e um negativo, cuja ligação se denomina de derivação bipolar. Num ECG obtemos o registo da soma total das diferenças entre vários eléctrodos colocados em diversos pontos do corpo, a cada momento (van Loon e Patteson, 2010). As diferenças de potencial entre dois eléctrodos dever-se-ão maioritariamente a alterações no campo eléctrico cardíaco, no entanto a raça (Hilwig, 1977), a idade (Fernandes et al, 2004), a posição do coração no interior do tórax, a forma do tórax, a condutividade intrínseca dos tecidos entre o coração e o eléctrodo e a própria localização exacta dos eléctrodos na superfície corporal também afectam os resultados dos registos obtidos (Hamlin et al, 1964). A soma de todas as forças electromotrizes a actuar no coração, num dado momento, apresenta uma certa magnitude e direcção, que são traduzidas por um vector cardíaco (Patteson, 1996). O registo obtido apresentará uma deflexão positiva em momentos em que o vector cardíaco se direccione para o eléctrodo positivo, e uma deflexão negativa quando o vector cardíaco se direccione para o eléctrodo negativo. A inclinação da onda medida será inversamente proporcional ao ângulo formado entre o vector e o eixo que separa o eléctrodo positivo do negativo. Ou seja a deflexão será maior se o vector cardíaco estiver completamente alinhado com o eixo, do que se realizar um ângulo com o mesmo. Se a direcção do vector cardíaco for perpendicular ao eixo positivo-negativo não aparecerá nenhuma deflexão no ECG (Patteson, 1996). A amplitude atingida pela deflexão depende da magnitude do vector que, por sua vez, está relacionado com a massa muscular que foi despolarizada ou repolarizada nesse instante (van Loon e Patteson, 2010). O período de tempo durante o qual se mantém a deflexão depende do tempo que demora a onda de despolarização a atravessar o músculo (Physick-Sheard, 1991). b. Métodos existentes Os métodos de obtenção dum ECG existentes baseiam-se na utilização dos vários eléctrodos conectados ao animal em certas combinações, unipolares ou bipolares, de modo a conseguir-se analisar as alterações do campo eléctrico cardíaco, ao longo do tempo, através de vários ângulos (Jones, 1989). 13 Vários estudos foram realizados ao longo dos anos para descobrir os melhores locais para a colocação dos eléctrodos, de modo a melhor analisar os vectores cardíacos formados a cada instante (Holmes, 1970, citado por Van Loon e Patteson, 2010). Um método comummente usado é o método de Einthoven (Bonagura e Reef, 1998) que visa analisar a actividade eléctrica cardíaca que atinge a superfície corporal no plano frontal (Boyden e Wit, 1985). Neste método é teorizado que o coração se situa no centro dum triângulo em que os membros anteriores e o membro posterior esquerdo são os vértices. É então colocado um eléctrodo negativo em cada membro anterior e um eléctrodo positivo no membro posterior esquerdo (Fregin, 1985, citado por Escudero et al, 2009). É também aconselhada a colocação de um eléctrodo neutro no membro posterior direito (Physick-Sheard, 1991). A Figura 2 ilustra os locais de colocação dos eléctrodos e ainda um exemplo de um ciclo cardíaco retirado de um registo electrocardiográfico obtido segundo este método. Figura 2 - Esquema dos locais de colocação dos eléctrodos (adaptado de www.cal.vet.upenn.edu) e um exemplo de um ciclo cardíaco retirado de um ECG obtido segundo o método de Einthoven durante o presente estudo. Como o coração no cavalo não se encontra no centro deste triângulo, ao contrário do cão e do homem, o método de Einthoven foi modificado, analisando o campo eléctrico através de 3 campos semiortogonais (Hamlin et al, 1964), obtendo-se 3 derivações bipolares e 3 unipolares aumentadas (Jones, 1989). Cada uma das 3 derivações bipolares obtidas por este método advém da combinação de dois eléctrodos. Assim sendo, a derivação I demonstra a combinação entre os eléctrodos do membro anterior esquerdo, que funciona como negativo (-), e do membro anterior direito que funciona como positivo (+); a derivação II entre os eléctrodos do membro anterior direito (-) e membro posterior esquerdo (+); a derivação III entre os eléctrodos do membro anterior esquerdo (-) e do membro posterior esquerdo (+). No caso das 3 derivações unipolares 14 aumentadas, aVR, aVL e aVF um eléctrodo é utilizado como positivo e as suas medições comparadas com a dos outros dois eléctrodos, sendo que na derivação aVR o eléctrodo positivo é o eléctrodo do membro anterior direito, na aVL o do membro anterior esquerdo e na aVF o do membro posterior esquerdo (van Loon e Patteson, 2010). Na prática clínica as derivações II e aVF são as que oferecem resultados mais significativos (Jones, 1989). Um conceito que pode também ser estudado neste método é o de eixo eléctrico médio. Este representa a direcção geral da onda de despolarização ventricular e é apresentado em graus (Jones, 1989). Cada derivação encontra-se num ângulo distinto, de modo que a derivação aVL está a -30º, a derivação I a 0º, a derivação II a +60º, a derivação aVF a +90º, a derivação III a +120º e a derivação aVR a -150º. A orientação do eixo eléctrico médio pode ser calculada analisando a amplitude da onda R nas várias derivações. As derivações I e aVL estão orientadas na direcção do aspecto cranial do ventrículo esquerdo, as derivações II e aVF na direcção do aspecto caudal do ventrículo esquerdo e, por fim, as derivações III e aVR na direcção do ventrículo direito. Desta forma, avaliando as derivações em que a onda R aparece positiva conseguimos saber qual a orientação geral da onda de despolarização ventricular (eixo eléctrico médio) (Jones, 1989). Este valor deve, porém, ser abordado cuidadosamente e correlacionado com a história clínica do animal, uma vez que é altamente variável de animal para animal, variando inclusivamente com a idade (Hanak, 1981, citado por Ayala et al, 1999). Contudo, alguns autores indicam que a amplitude pode estar reduzida em casos de derrame pleural ou pericárdico, e aumentada em casos de excitação ou de extra-sístoles ventriculares (Patteson, 1996). Embora o método modificado de Einthoven seja útil para avaliar o ritmo cardíaco e a condução do impulso pelo coração, as ondas e complexos visualizados são por vezes muito pequenos e de difícil análise (Jones, 1989), e a movimentação dos membros afecta a leitura dos resultados (Physick-Sheard, 1991). Para contornar esses problemas outros métodos podem ser utilizados, como o método de base-ápice, em que o eléctrodo negativo é colocado na fossa jugular direita, no seu terço caudal, o eléctrodo positivo no 5º espaço intercostal esquerdo, ao nível do cotovelo e um terceiro eléctrodo (neutro) num local afastado do coração. A derivação I é, neste caso, a seleccionada para registar o ECG (Van Loon e Patteson, 2010). Este método é o mais utilizado para a obtenção de ECG’s de esforço, pois dada a localização dos eléctrodos, obtém-se um menor número de artefactos causados pela movimentação dos membros (PhysickSheard, 1991). Na Figura 3 temos uma ilustração do esquema de colocação dos eléctrodos e de um ciclo cardíaco retirado de um ECG obtido segundo este método. 15 Figura 3 - Esquema dos locais de colocação dos eléctrodos (adaptado de www.cal.vet.upenn.edu) e um exemplo de um ciclo cardíaco retirado de um ECG obtido segundo o método base-ápice durante o presente estudo. Outro método que também pode ser utilizado para obter ondas e complexos mais amplos e um menor número de artefactos de movimento é o método Y de Holmes (Physick-Sheard, 1991). Neste método o eléctrodo positivo é colocado sobre o processo xifóide e o negativo sobre a ponta do manúbrio. Um terceiro eléctrodo (neutro) deve ser colocado num local afastado do coração. Tal como acontece no método base-ápice a derivação I também é a seleccionada para registar o ECG (van Loon e Patteson, 2010). Como o sistema nervoso autónomo desempenha um importante papel na regulação da actividade cardíaca e, por sua vez, no aparecimento de certas arritmias, um registo electrocardiográfico de 24 horas com monitorização Holter é o método mais indicado para avaliar o verdadeiro impacto destas anomalias, bem como a frequência cardíaca e o ritmo normal do animal (Raekallio, 1992). Com este método conseguimos eliminar o stresse causado pela presença do clínico ou investigador e pelo manuseamento do animal e aparelho (Scheffer et al, 1995). Neste tipo de ECG o local mais prático de colocação dos eléctrodos é no tronco do animal, uma vez que há menos interferências causadas pela movimentação do animal (PhysickSheard, 1991). Uma das combinações usadas para a localização dos eléctrodos visa a colocação de dois eléctrodos de cada lado do tórax, a meio deste e um eléctrodo neutro no vértice da escápula (Raekallio, 1992). Noutro estudo, os eléctrodos foram colocados ao nível da linha média ventral, sobre a cartilagem xifóide (eléctrodo positivo), vértice cranial da escápula esquerda (eléctrodo negativo), parede torácica esquerda ao nível do cotovelo e caudalmente ao mesmo (eléctrodo positivo) e ainda outro na parede torácica esquerda ao nível da cernelha 16 (eléctrodo negativo). A partir destes eléctrodos foram obtidas duas derivações (Scheffer et al, 1995). 1.8. Previsão da capacidade desportiva através da electrocardiografia É actualmente aceite que o tamanho e a função do coração são factores que desempenham um papel importante na performance desportiva do cavalo (Evans e Young, 2010). Com base nestas informações muitos estudos foram realizados com vista a descobrir se existe alguma relação entre os sinais electrocardiográficos de um dado animal e a sua capacidade desportiva. Uma das teorias mais conhecidas denomina-se de Heart Score Theory e utiliza a média dos valores da duração do complexo QRS nas derivações I, II e III do método modificado de Einthoven para prever a dimensão da massa muscular ventricular (Stewart, 1981). Esta teoria foi proposta pela primeira vez em 1957 por Steel e tem sido alvo de muitos estudos desde então. Num estudo em que se avaliou o valor monetário médio ganho por cada animal numa corrida e o valor monetário total ganho durante a vida desportiva de cada cavalo foi encontrado uma correlação positiva entre estes valores e a pontuação cardíaca calculada pela Heart Score Theory (Stewart e Steel, 1970, citado por Stewart, 1976). Resultados semelhantes foram obtidos também por outros investigadores que relacionaram a pontuação cardíaca com o tempo levado pelos cavalos para completarem um dado circuito e ainda com o seu número de vitórias em corridas (Nielsen e Vibe-Petersen, 1980). Porém quando novas descobertas foram feitas no campo da dispersão das fibras de Purkinje através do miocárdio ventricular, esta teoria foi posta em causa. Alguns investigadores concluem que, embora uma maior duração e amplitude do complexo QRS possa demonstrar um aumento do volume miocárdico patológico ou fisiológico (White e Rhode, 1974), um valor normal, ou até abaixo da média, não quer dizer que este volume seja menor (Patteson, 1996; Piccione et al, 2000, citado por Lightowler et al, 2004). Por fim, outros autores sugerem ainda que a maior duração do complexo QRS está relacionado com a capacidade desportiva do animal porque os animais que treinam mais conseguem aumentar a dimensão do seu miocárdio, à imagem do que está descrito em humanos (Cohen et al, 1980, citado por Zehender et al, 1990). Deste modo, a duração do QRS é que está dependente da capacidade desportiva do animal e não o contrário, ou seja, o complexo QRS apenas pode ser usado para confirmar a capacidade cardíaca dum indivíduo e não para prevê-la (Dojana et al, 2008, citado por Dumont et al, 2010). 17 Alguns autores indicam também o uso da amplitude da onda R nas derivações I e II do método de Einthoven para avaliar o tamanho do coração, no entanto ressalvando a baixa sensibilidade do ECG para este fim. Nos seus estudos em cavalos de corrida a amplitude normal da onda R na derivação II variou entre 0,8 e 1,1mV, e foi considerada anormal acima dos 2,2mV. Na derivação I valores acima dos 1,7mV foram também considerados acima da média (Jones, 1989). Num outro estudo realizado por Muylle e Oyaert foi utilizado o método Y de Holmes para avaliar a amplitude da onda R, e a sua relação com a massa muscular cardíaca. Neste estudo não houve qualquer relação, tendo sido concluído que alterações na amplitude da onda R devem-se apenas a diferenças no local exacto onde se inicia a activação ventricular (Muylle e Oyaert, 1977). Um outro tema de discussão durante muitos anos foi a utilização de achados anormais ao nível da onda T no método de Einthoven, para prever a capacidade desportiva do cavalo (Rose e Davies, 1978; Stewart et al, 1983). Vários autores defendiam haver uma relação entre o aparecimento de ondas T anormais em 3 ou mais derivações no ECG de cavalos em repouso e a sua fraca performance (Rose e Davies, 1978), principalmente se concomitantes com ondas T de baixa amplitude, positivas e arredondadas registadas durante o exercício (Steel et al, 1976). Contudo esta teoria foi, posteriormente, testada por outros autores, que relacionaram a ocorrência destas ondas, ditas, anormais com vários índices metabólicos e respiratórios (King et al, 1994) e com a performance desportiva prévia dos animais (Evans e Polglaze, 1994), e concluíram não existir qualquer correlação negativa entre estes factores. A implicação do treino físico na alteração do perfil da onda T foi também estudada, concluindo-se ser normal o aparecimento de alterações à forma da onda T com o evoluir do treino (Evans e Polglaze, 1994; Evans, 1991, citado por van Loon e Patteson, 2010). Actualmente a teoria sobre a relação entre o achado de ondas T anormais no ECG de cavalos em repouso, e a sua pobre capacidade desportiva está grandemente desacreditada (Evans e Young, 2010). Há, contudo, uma outra avaliação passível de ser feita através da onda T, que diz respeito à oxigenação do miocárdio. Durante uma sessão de exercício a onda T torna-se normalmente positiva, e durante a fase de repouso volta a ficar predominantemente negativa (Holmes e Rezakhani, 1975, citado por Hamid et al, 2010). Quanto mais rápida for a taxa de recuperação do animal, mais rápida será a inversão da onda T. É assumido, então, que animais com uma boa oxigenação do miocárdio tenham uma recuperação mais rápida e apresentem uma onda T predominantemente negativa quando em repouso (Hamid et al, 2010). 18 Por fim há ainda quem realce o intervalo Q-T (período de despolarização e repolarização ventricular) como um indicador da massa miocárdica. Estes autores afirmam que o intervalo Q-T é uma medição directa da duração da sístole eléctrica ventricular (Stewart e Steel, 1970, citado por Hamid et al, 2010). A duração da sístole eléctrica ventricular reflecte a massa ventricular e, assim sendo, a dimensão cardíaca afecta o intervalo Q-T (Glazier, 1966, citado por Hamid et al, 2010). Zehender et al (1990) também afirma que o intervalo Q-T é prolongado para 10% a 15% da sua duração em atletas, principalmente os que praticam actividades de resistência, e que assim sendo se prova que este parâmetro electrocardiográfico é dependente do treino. Contudo, este autor aponta alterações que ocorrem a nível do sistema nervoso autónomo, derivadas do treino, como a provável causa desta constatação. 1.9. O cavalo Puro-Sangue Lusitano O cavalo Puro-Sangue Lusitano (PSL) teve a sua origem em Portugal (Kelley, 2002) e é actualmente a raça autóctone de maior releve, tanto a nível nacional como internacional. É um cavalo de “sangue quente” como o Puro-Sangue Inglês ou o Árabe. Seleccionado desde há milhares de anos como cavalo de guerra e de sela, o cavalo Lusitano é considerado o cavalo de sela mais antigo do Mundo, com mais de 5000 anos. Tal permite-lhe uma maior “empatia” para com os humanos face a raças mais modernas. Apesar de ser reconhecido como o cavalo de excelência para o desempenho da arte tauromáquica, a sua versatilidade e boa capacidade mental permitiram-lhe expandir-se para grande parte das disciplinas do desporto equestre moderno, como o ensino, alta escola, dressage ou atrelagem de competição (Associação Portuguesa de Criadores do Cavalo Puro Sangue Lusitano IN: www.cavalo-lusitano.com, 2011). A raça PSL é considerada uma raça rara, estimando-se a existência de apenas 20000 exemplares em todo o Mundo (Boiselle et al, 2006), dos quais apenas cerca de 2000 são éguas reprodutoras (Associação de criadores do cavalo Puro Sangue Lusitano IN: www.cavalo-lusitano.com, 2011). O seu temperamento dócil (Boiselle et al, 2006) associado a uma grande antiguidade e “pureza” genética tornou o PSL alvo de grande interesse como reprodutor para melhoramento de raças, sendo actualmente um dos “produtos nacionais” com mercado em expansão no estrangeiro (Associação de criadores do cavalo Puro Sangue Lusitano IN: www.cavalo-lusitano.com, 2011). Também no mundo científico a importância do Lusitano tem aumentado, o que se pode verificar pelo crescente número de publicações sobre esta raça nos últimos anos. 19 Exposto isto e dado que existem já vários trabalhos publicados sobre a caracterização do traçado electrocardiográfico em várias raças, como o Andaluz (Ayala et al, 1999), o Mangalarga Marchador (Diniz et al, 2008), o Thoroughbred e o Standardbred (Fregin, 1982) entre outras, e que a electrocardiografia é um meio de diagnóstico indispensável a um exame cardíaco completo (Fregin, 1985, citado por Escudero et al, 2009), considerámos importante a realização de um estudo similar para esta raça. 20 2. OBJECTIVOS Os objectivos desta investigação foram: Estabelecer quais os padrões normais da onda P, complexo QRS e onda T no método de Einthoven e método base-ápice em equinos adultos da raça PSL; Estabelecer quais os valores normais de duração e amplitude dos vários elementos do ECG no método de Einthoven e método de base-ápice em equinos adultos da raça PSL; Comparar os valores obtidos com aqueles publicados noutras raças; Analisar a influência do género, idade e estado de preparação física nos resultados de duração e amplitude dos vários elementos do ECG; Utilizar uma abordagem prática que possa ser facilmente aplicada pelo clínico de equinos no seu dia-a-dia, de modo a facilitar a comparação de resultados; Utilizar uma abordagem que aporte o mínimo de stresse para o animal de modo a obter resultados mais fidedignos. 21 3. MATERIAL E MÉTODOS Neste estudo foram utilizados cavalos da raça PSL pertencentes a diferentes proprietários e que se encontravam em diversas localidades do território nacional. Só foram aceites no estudo animais com idade acima dos 3 anos e cujo exame de estado geral não tenha demonstrado a presença de qualquer tipo de doença. O período de realização dos ECG’s compreendeu-se entre Dezembro de 2010 e Junho de 2011. A todos os animais foi realizado um exame de estado geral para comprovar o seu estado de saúde. Foi preenchido um questionário para cada cavalo com vista a obter informações sobre a sua idade, peso, alojamento, alimentação, aptidão, número de sessões de treino semanais (no caso de animais de desporto) e tipo de trabalho (no caso de animais de trabalho). Um exemplo do questionário efectuado encontra-se em anexo. De seguida, e após alguns minutos de adaptação por parte do animal aos examinadores e aparelho, foram realizados dois ECG’s a cada animal, seguindo dois métodos comummente utilizados em equinos: o método bipolar de Einthoven e o método base-ápice. Estes exames foram levados a cabo num local familiar ao animal, fora da boxe do mesmo, utilizando o electrocardiógrafo cedido pelo Hospital Veterinário da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (HV-UTAD) (Auto Cardiner FCP-145u Fukuda Denshi). Durante os registos electrocardiográficos foi utilizada uma velocidade de gravação de 25 mm/s e uma sensibilidade de 1 (1 cm equivale a 1 mV). Em ambos os métodos os eléctrodos foram fixados à pele através de pinças de crocodilo metálicas. O pelo não foi sujeito a tricotomia devido ao incómodo que este acto traria a muitos dos proprietários, mas foi sempre aplicado álcool no local de colocação das pinças, antes e após o uso destas para melhorar o seu contacto com a pele. Na abordagem segundo o método de Einthoven foi fixo um eléctrodo em cada membro do animal. Nos membros anteriores estes eram colocados quinze centímetros abaixo do olecrâneo, na sua face caudal, e nos membros posteriores eram aplicados na sua face cranial, distalmente à articulação do joelho. A combinação dos eléctrodos foi feita de tal modo que os eléctrodos negativos ficassem nos membros anteriores, o eléctrodo positivo no membro posterior esquerdo e o eléctrodo neutro no membro posterior direito, como está descrito no estudo realizado por Escudero et al (2009) e como está representado na Figura 4. Durante a obtenção do traçado os membros anteriores foram mantidos paralelos tanto quanto possível. 22 Figura 4 - Exemplo da localização dos eléctrodos no método de Einthoven num dos cavalos utilizados no estudo. Na abordagem segundo o método base-ápice o eléctrodo positivo foi fixo no quinto espaço intercostal esquerdo ao nível do cotovelo, o eléctrodo negativo no terço caudal da fossa jugular direita e o eléctrodo neutro no tórax direito dorsalmente à escápula, como está descrito por Van Loon, G. e Patteson, M. (2010). Nas figuras seguintes (Figuras 5 e 6) pode ver-se um exemplo da colocação dos eléctrodos num dos animais utilizados no estudo. Figuras 5 e 6 - Exemplo da localização dos eléctrodos no método base-ápice num dos cavalos utilizados no estudo. 23 Para cada método, e por animal, foi obtido mais de um minuto de traçado electrocardiográfico. Sempre que possível os procedimentos foram elaborados no local onde o animal era mantido para reduzir o factor de stresse causado pela deslocação do animal e pela aclimatação a um novo local. Por uma questão de facilidade logística, a alguns dos animais o exame foi realizado no HV-UTAD. Estes foram animais que se apresentaram no referido hospital e que ficaram internados vários dias por motivos de reprodução ou acompanhando outros animais doentes, como fêmeas acompanhando poldros, encontrando-se por isso saudáveis e aptos para o estudo. O registo foi posteriormente digitalizado e escolheram-se três complexos P-QRS-T sem artefactos, por método, por animal, para serem analisados manualmente e encontrar-se a média para cada medida dentro do mesmo animal. A partir destes valores foi efectuada uma análise estatística descritiva, para a obtenção da média da amostra para cada medida, bem como o seu desvio padrão. Também se analisaram os resultados de modo a avaliar a existência, ou não, de diferenças significativas entre géneros, classes etárias e número de treinos por semana a que o cavalo era submetido, através dos métodos de análise estatística de T-student (para os géneros) e de One-way ANOVA e Bonferroni (idade e número de treinos por semana). De acordo com a classe etária, os animais foram divididos em três grupos: grupo 1 dos 3 aos 5 anos, grupo 2 dos 6 aos 14 anos e grupo 3 acima dos 14 anos. Para a análise do efeito do treino no ECG foram divididos os animais em cinco grupos da seguinte maneira: grupo 1 sem qualquer sessão de treino semanal, grupo 2 com 1 a 2 sessões de treino, grupo 3 com 3 a 4 sessões de treino, grupo 4 com 5 a 6 sessões de treino e grupo 5 com treino diário. As diferenças entre grupos foram consideradas significativas quando o resultado de P era inferior a 0,05 e altamente significativas quando P era inferior a 0,01. Para a realização de todas as análises estatísticas mencionadas foi utilizado o programa SPSS versão 19. 24 4. RESULTADOS Neste estudo foram utilizados 76 cavalos da raça PSL, dos quais 13 eram fêmeas e 66 eram machos. Os animais tinham idades compreendidas entre os 3 e os 22 anos (9±4,72) e um peso corporal médio de 472 kg. Em 67 (88,2%) dos animais os procedimentos foram realizados no local onde o animal era mantido. Nos restantes 9, os ECG’s foram realizados no HV-UTAD. A um dos animais só foi realizado o exame electrocardiográfico pelo método base-ápice pois este não tolerou a colocação dos eléctrodos nos membros, exigida no método de Einthoven. A média da frequência cardíaca registada na auscultação durante o exame físico do animal foi de 38±7,8 batimentos por minuto (bpm). Os valores da média e o seu desvio padrão para a amplitude e duração, bem como as percentagens de conformação observadas, dos vários elementos do ECG analisados estão expostos nas tabelas seguintes. Tabela 1 - Distribuição das percentagens dos vários formatos de cada elemento observados no ECG para o método base-ápice. Elemento Onda P Complexo QRS Onda T Conformação Percentagem Bífida 88,2% Monofásica positiva 9,2% Bifásica (-/+) 2,6% RS 61,9% S 36,8% QRS 1,3% Bifásica (-/+) 82,9% Monofásica negativa 10,5% Monofásica positiva 6,6% 25 Tabela 2 - Distribuição das percentagens dos vários formatos de cada elemento observados no ECG para o método de Einthoven. Elemento Onda P Complexo QRS Conformação Percentagem Bífida 67,6% Monofásica positiva 32,4% QR 25,3% R 24% QRS 22,7% RS 13,3% S 10,7% QS 4% Bifásica (-/+) Onda T 76% Monofásica negativa 12% Monofásica positiva 12% Tabela 3 - Média (e desvio padrão da média) dos valores de amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados em ambos os métodos. Amplitude (mV) Elemento Método base-ápice Método Einthoven P1 0,14 (0,07) 0,11 (0,004) P2 0,33 (0,01) 0,23 (0,01) P simples positiva 0,30 (0,04) 0,23 (0,01) P(-) 0,08 (0,00) - P(+) 0,26 (0,06) - Q 0,13 ( - ) 0,16 (0,02) R 0,38 (0,03) 0,56 (0,04) S 1,70 (0,04) 0,27 (0,04) T(-) 0,70 (0,05) 0,32 (0,02) T(+) 0,27 (0,02) 0,20 (0,02) T simples negativa 0,96 (0,09) 0,35 (0,03) T simples positiva 0,70 (0,11) 0,32 (0,05) 26 Tabela 4 - Média (e desvio padrão da média) dos valores de duração, em segundos, para os vários elementos avaliados em ambos os métodos. Duração (s) Elemento Método base-ápice Método Einthoven P 0,13 (0,002) 0,11 (0,002) QRS 0,12 (0,003) 0,09 (0,004) T 0,18 (0,006) 0,17 (0,007) Intervalo P-R 0,30 (0,006) 0,28 (0,005) Intervalo Q-T 0,50 (0,008) 0,51 (0,008) Intervalo R-R 1,72 (0,04) 1,67 (0,04) Tabela 5 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, para ambos os géneros, em ambos os métodos. Amplitude (mV) Elemento P1 P2 P simples positiva P(-) P(+) Q R S T(-) T(+) T simples negativa T simples positiva Sexo Método base-ápice Método Einthoven M 0,14 (0,06) 0,11 (0,03) F 0,13 (0,03) 0,10 (0,03) M 0,33 (0,08) 0,23 (0,05) F 0,30 (0,07) 0,18 (0,05) M 0,30 (0,10) 0,22 (0,05) F - 0,26 (0,06) M 0,08 (0,00) - F - - M 0,26 (0,08) - F - - M 0,13 ( - ) 0,15 (0,09) F - 0,19 (0,14) M 0,40 (0,25) 0,61 (0,35) F 0,29 (0,12) 0,38 (0,26) M 1,76 (0,39) 0,28 (0,25) F 1,60 (0,40) 0,20 (0,08) M 0,71 (0,41) 0,31 (0,18) F 0,65 (0,57) 0,37 (0,16) M 0,27 (0,16) 0,20 (0,14) F 0,25 (0,13) 0,16 (0,05) M 1,02 (0,18) 0,32 (0,05) F 0,78 (0,41) 0,40 (0,10) M 0,67 (0,28) 0,36 (0,14) F 0,80 (-) 0,24 (0,14) 27 Tabela 6 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da duração, em segundos, para os vários elementos avaliados no ECG, para ambos os géneros, em ambos os métodos. Duração (s) Elemento P QRS T Intervalo P-R Intervalo Q-T Intervalo R-R Sexo Método base-ápice Método Einthoven M 0,13 (0,02) 0,11 (0,02) F 0,14 (0,01) 0,11 (0,02) M 0,12 (0,02) 0,09 (0,03) F 0,13 (0,03) 0,08 (0,04) M 0,18 (0,06) 0,17 (0,06) F 0,18 (0,04) 0,15 (0,04) M 0,30 (0,05) 0,28 (0,04) F 0,30 (0,05) 0,29 (0,03) M 0,50 (0,06) 0,51 (0,06) F 0,51 (0,10) 0,50 (0,06) M 1,77 (0,32) 1,71 (0,31) F 1,50 (0,25) 1,44 (0,24) Tabela 7 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com idade entre os 3 e os 5 anos, grupo 1 (n = 22). Amplitude (mV) Elemento Método base-ápice Método Einthoven P1 0,13 (0,04) 0,11 (0,04) P2 0,33 (0,08) 0,21 (0,05) P simples positiva 0,34 (0,14) 0,20 (0,01) P(-) 0,08 (0,00) - P(+) 0,26 (0,08) - Q - 0,16 (0,07) R 0,32 (0,19) 0,49 (0,25) S 1,75 (0,24) 0,23 (0,17) T(-) 0,68 (0,25) 0,35 (0,19) T(+) 0,27 (0,11) 0,23 (0,12) T simples negativa 0,81 ( - ) 0,30 (0,03) T simples positiva 0,48 ( - ) 0,15 ( - ) 28 Tabela 8 -Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos do ECG avaliados, em ambos os métodos, para os animais com idade entre os 6 e os 14 anos de idade, grupo 2 (n = 41). Amplitude (mV) Elemento Método base-ápice Método Einthoven P1 0,14 (0,06) 0,10 (0,03) P2 0,33 (0,08) 0,23 (0,05) P simples positiva 0,26 (0,05) 0,23 (0,07) P(-) - - P(+) - - Q - 0,14 (0,11) R 0,40 (0,25) 0,62 (0,38) S 1,77 (0,44) 0,30 (0,29) T(-) 0,66 (0,50) 0,29 (0,15) T(+) 0,28 (0,18) 0,20 (0,15) T simples negativa 1,00 (0,11) 0,39 (0,10) T simples positiva 0,86 (0,32) 0,34 (0,15) Tabela 9 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com idade superior a 14 anos, grupo 3 (n = 12). Amplitude (mV) Elemento Método base-ápice Método Einthoven P1 0,14 (0,05) 0,12 (0,05) P2 0,33 (0,08) 0,25 (0,10) 0,35 ( - ) 0,24 (0,03) P simples positiva P(-) - - P(+) - - Q 0,13 ( - ) 0,19 (0,12) R 0,39 (0,23) 0,51 (0,37) S 1,56 (0,39) 0,23 (0,15) T(-) 0,89 (0,46) 0,36 (0,23) T(+) 0,20 (0,05) 0,14 (0,04) T simples negativa 0,95 (0,42) 0,40 ( - ) T simples positiva 0,64 (0,22) 0,35 ( - ) 29 Tabela 10 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da duração, em segundos, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os 3 grupos etários. Duração (s) Elemento Grupo etário Método base-ápice P QRS T Intervalo P-R Intervalo Q-T Intervalo R-R Método Einthoven 1 0,12 (0,02) 0,11 (0,02) 2 0,13 (0,02) 0,11 (0,02) 3 0,13 (0,02) 0,12 (0,01) 1 0,11 (0,03) 0,07 (0,02) 2 0,12 (0,02) 0,09 (0,03) 3 0,14 (0,02) 0,10 (0,04) 1 0,17 (0,04) 0,15 (0,05) 2 0,17 (0,04) 0,16 (0,05) 3 0,22 (0,09) 0,20 (0,08) 1 0,30 (0,05) 0,28 (0,04) 2 0,29 (0,05) 0,28 (0,05) 3 0,31 (0,04) 0,29 (0,02) 1 0,50 (0,05) 0,49 (0,04) 2 0,50 (0,06) 0,51 (0,05) 3 0,53 (0,10) 0,55 (0,08) 1 1,81 (0,29) 1,77 (0,31) 2 1,71 (0,33) 1,68 (0,31) 3 1,67 (0,29) 1,47 (0,23) Tabela 11 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos do ECG, em ambos os métodos, para os animais sem qualquer sessão de treino semanal, grupo 1 (n = 13). Amplitude (mV) Elemento Método Base-ápice Método Einthoven P1 0,14 (0,05) 0,09 (0,03) P2 0,29 (0,06) 0,19 (0,05) 0,35 ( - ) 0,22 (0,03) P simples positiva P(-) - - P(+) - - Q - 0,17 (0,11) R 0,40 (0,19) 0,44 (0,34) S 1,78 (0,45) 0,16 (0,09) T(-) 0,93 (0,57) 0,36 (0,13) T(+) 0,22 (0,09) 0,16 (0,05) T simples negativa 0,95 (0,42) 0,33 (0,11) T simples positiva - 0,30 ( - ) 30 Tabela 12 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com uma a duas sessões de treino semanal, grupo 2 (n = 14). Amplitude (mV) Elemento Método Base-ápice Método Einthoven P1 0,13 (0,03) 0,13 (0,04) P2 0,36 (0,10) 0,25 (0,09) P simples positiva 0,23 (0,04) 0,25 (0,09) P(-) - - P(+) - - Q 0,13 ( - ) 0,23 (0,14) R 0,38 (0,24) 0,64 (0,43) S 1,79 (0,38) 0,37 (0,19) T(-) 0,60 (0,50) 0,37 (0,25) T(+) 0,27 (0,11) 0,17 (0,10) T simples negativa 1,12 ( - ) 0,40 (0,08) T simples positiva 0,48 ( - ) 0,08 ( - ) Tabela 13 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com três a quatro sessões de treino semanal, grupo 3 (n = 7). Amplitude (mV) Elemento Método Base-ápice Método Einthoven P1 0,12 (0,04) 0,09 (0,03) P2 0,28 (0,08) 0,22 (0,05) 0,30 ( - ) 0,15 ( - ) P simples positiva P(-) - - P(+) - - Q - 0,13 (0,08) R 0,26 (0,15) 0,43 (0,18) S 1,74 (0,41) 0,21 (0,23) T(-) 0,71 (0,34) 0,32 (0,12) T(+) 0,23 (0,10) 0,18 (0,09) T simples negativa - - T simples positiva - - 31 Tabela 14 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com cinco a seis sessões de treino semanal, grupo 4 (n = 28). Amplitude (mV) Elemento Método Base-ápice Método Einthoven P1 0,14 (0,07) 0,11 (0,03) P2 0,33 (0,07) 0,22 (0,05) P simples positiva 0,38 (0,16) 0,21 (0,03) P(-) 0,08 (0,00) - P(+) 0,26 (0,08) - Q - 0,14 (0,08) R 0,36 (0,19) 0,64 (0,34) S 1,72 (0,26) 0,28 (0,34) T(-) 0,71 (0,34) 0,31 (0,20) T(+) 0,26 (0,16) 0,23 (0,20) T simples negativa 0,94 (0,18) 0,31 (0,04) T simples positiva 0,78 (0,42) 0,37 (0,15) Tabela 15 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da amplitude, em mV, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os animais com sessões de treino diárias, grupo 5 (n = 12). Amplitude (mV) Elemento Método Base-ápice Método Einthoven P1 0,14 (0,04) 0,12 (0,04) P2 0,35 (0,07) 0,24 (0,04) P simples positiva - 0,24 (0,04) P(-) - - P(+) - - Q - 0,11 (0,08) R 0,47 (0,35) 0,52 (0,34) S 1,74 (0,43) 0,26 (0,20) T(-) 0,61 (0,39) 0,25 (0,16) T(+) 0,32 (0,14) 0,21 (0,10) T simples negativa 0,90 (0,04) - T simples positiva 0,80 ( - ) 32 0,35 ( - ) Tabela 16 - Média (e desvio padrão da média) dos valores da duração, em segundos, para os vários elementos avaliados no ECG, em ambos os métodos, para os vários grupos de treino. Duração (s) Elemento P QRS T Intervalo P-R Intervalo Q-T Intervalo R-R Grupo de treino Método Base-ápice Método Einthoven 1 0,13 (0,02) 0,11 (0,02) 2 0,13 (0,02) 0,11 (0,02) 3 0,13 (0,02) 0,11 (0,02) 4 0,12 (0,02) 0,11 (0,02) 5 0,14 (0,02) 0,12 (0,02) 1 0,13 (0,03) 0,08 (0,03) 2 0,12 (0,02) 0,09 (0,04) 3 0,12 (0,02 0,10 (0,02) 4 0,11 (0,02) 0,08 (0,03) 5 0,13 (0,02) 0,10 (0,02) 1 0,19 (0,04) 0,20 (0,06) 2 0,19 (0,08) 0,17 (0,06) 3 0,20 (0,06) 0,19 (0,06) 4 0,17 (0,05) 0,14 (0,04) 5 0,17 (0,03) 0,18 (0,07) 1 0,31 (0,05) 0,31 (0,04) 2 0,28 (0,04) 0,27 (0,03) 3 0,30 (0,02) 0,27 (0,02) 4 0,30 (0,05) 0,27 (0,04) 5 0,31 (0,04) 0,29 (0,02) 1 0,53 (0,09) 0,30 (0,04) 2 0,50 (0,08) 0,51 (0,06) 3 0,51 (0,03) 0,52 (0,05) 4 0,49 (0,07) 0,48 (0,04) 5 0,50 (0,03) 0,53 (0,05) 1 1,65 (0,28) 1,55 (0,26) 2 1,69 (0,28) 1,56 (0,17) 3 1,66 (0,27) 1,60 (0,39) 4 1,77 (0,34) 1,78 (0,31) 5 1,77 (0,36) 1,67 (0,30) 33 Todos os valores de duração e amplitude dos vários elementos avaliados no ECG foram comparados entre as diferentes classes definidas (género, idade, classes de treino). No que diz respeito ao género, os machos demonstraram uma frequência cardíaca significativamente mais baixa que as fêmeas (37 bpm versus 42 bpm respectivamente) (P <0,05). Esta diferença entre géneros também se reflectiu, em ambos os métodos, na presença de um intervalo R-R maior nos machos (P <0,01 no método base-ápice e P <0,05 no método de Einthoven). Foi ainda verificado no método base-ápice que o complexo QRS apresentava uma duração maior em fêmeas (P <0,05) e no método de Einthoven que as ondas P2 e R apresentavam uma amplitude maior em machos (P <0,05). Quando se compararam os grupos etários pré-definidos, no método base-ápice, o grupo de animais com idade superior a 14 anos (grupo 3) demonstrou uma duração do complexo QRS e da onda T significativamente maiores que o grupo 1 (P <0,01 para o complexo QRS e P <0,05 para a onda T) e o grupo 2 (P <0,05 para o complexo QRS, e P <0,01 para a onda T). No método de Einthoven foram encontradas diferenças significativas entre os grupos 1 e 3 na duração dos intervalos R-R (P <0,05) e Q-T (P <0,01), sendo o intervalo R-R superior nos animais com idade entre os 3 e os 5 anos (grupo 1) e o intervalo Q-T superior nos animais com mais de 14 anos (grupo 3). Por fim, em relação à comparação entre os vários grupos de treino, a duração do complexo QRS no método base-ápice foi significativamente maior no grupo de animais sem sessões de treino (grupo 1) do que no grupo de animais com 5 a 6 sessões de treino (grupo 4) (P <0,05). Ainda no método base-ápice, o grupo de animais com sessões de treino diárias (grupo 5) demonstrou uma duração da onda P significativamente maior que o grupo 4 (P <0,05). No método de Einthoven verificou-se que o grupo 1 apresentava uma duração da onda T superior à do grupo 4 (P <0,05). 34 5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS De seguida discutimos os resultados acima descritos através da comparação dos mesmos com os valores existentes na literatura. Primariamente são consideradas as conformações e os valores da amplitude e duração para cada elemento avaliado no ECG provenientes da totalidade dos 76 animais. Na parte final da discussão são abordados os resultados da análise comparativa dos valores da amplitude e duração entre os vários grupos classificados anteriormente (género, idade e treino). 5.1. Onda P No presente estudo a distribuição das percentagens de cada conformação da onda P no método base-ápice segue o padrão descrito na literatura, sendo a conformação bífida a mais frequente (88,2%), seguida da monofásica positiva (9,2%) e por fim a bifásica (-/+) (2,6%) (Alidadi et al, 2002; Diniz et al, 2008; Hamid et al, 2010). A percentagem de ondas bifásicas é inclusivamente a mais baixa de entre os estudos publicados em outras raças. Sendo a conformação bífásica originada quando o impulso cardíaco é formado na zona caudal do átrio direito, perto do seio coronário (Bonagura e Reef, 1998), ao invés de ser no nódulo SA como é considerado normal (Patteson, 1996), o facto de esta conformação aparecer apenas em dois animais pode ser considerado um bom indicador de sanidade. Na Figura 7 estão representados exemplos dos três formatos de onda P acima referidos, retirados de registos electrocardiográficos efectuados durante o presente estudo. Figura 7 - Exemplos dos formatos de onda P observados no estudo: (A) bífida; (B) simples positiva; (C) bifásica. A amplitude observada da onda P2 no método base-ápice (0,33±0,01 mV) é superior à descrita para as raças Trotador Italiano (Pampana et al, 2004) e Turco (Alidadi et al 2002) e inferior à descrita para o cavalo Kurdo (Hamid et al 2010). No entanto, resultados de amplitude e duração da onda P semelhantes aos nossos foram encontrados no cavalo Mangalarga Marchador (Diniz et al, 2008) e no Andaluz (Ayala et al, 1994, citado por Diniz et al, 2008). Sendo o 35 Mangalarga Marchador descendente directo do PSL e o cavalo Andaluz intimamente relacionado com o mesmo, as diferenças de amplitude da onda P para as restantes raças poderão estar relacionadas com uma base genética. Também é de considerar a correlação positiva que existe entre a frequência cardíaca e a amplitude da onda P (Tilley, 1992, citado por Hamid et al, 2010). No caso do cavalo Turco a frequência cardíaca registada foi efectivamente mais baixa que a observada no corrente estudo (Alidadi et al 2002), o que pode contribuir para a menor amplitude da onda P naquele cavalo. Porém, no caso do cavalo Kurdo a frequência cardíaca é na realidade consideravelmente mais baixa que a registada nos Lusitanos (Hamid et al, 2010), não corroborando, assim, a hipótese desta ser a causa da diferença observada nas amplitudes. A amplitude das ondas P(-) e P(+) registadas no método base-ápice foram inferiores às publicadas por Hamid et al (2010), contudo como os nossos valores provêm apenas de dois animais esta diferença não deverá ser tida em grande consideração. A duração da onda P no método baseápice está de acordo com o descrito em cavalos de outras raças, nomeadamente o Mangalarga Marchador, o Turco e o Kurdo (Diniz et al, 2008; Alidadi et al, 2002; Hamid et al 2010; Pampana et al, 2004; van Loon e Patteson, 2010). Na onda P obtida segundo o método de Einthoven encontrámos uma percentagem de ondas P bífidas superior à encontrada por Ayala et al (1999) na raça Andaluza (67,6% versus 45%). As ondas P1 estão sob forte influência do sistema nervoso autónomo (Fregin, 1982), de modo que não se tornam visíveis em alturas em que o tónus vagal diminui, sendo incorporadas na onda P2 (Steel et al, 1976). Assim sendo, esta diferença pode advir do facto dos cavalos no nosso estudo estarem sujeitos a menos factores de stresse, pois no estudo mencionado os registos foram obtidos com o animal no interior da boxe. A entrada de sujeitos estranhos na boxe, acompanhados de todo o material necessário para a realização do exame é possivelmente uma situação de maior stresse para o animal, do que aquela que estes enfrentavam no nosso estudo, em que eram retirados da boxe para um local mais amplo, onde estão habituados a ser tratados e onde já se encontrava todo o material necessário montado de modo a que não houvesse tanta movimentação em redor do animal. Outras justificações possíveis prendem-se com a reconhecida capacidade mental dos animais da raça Lusitana, que lhes poderá permitir serem mais tolerantes a todo o procedimento, ou ainda a diferenças genéticas entre as duas raças, embora neste caso seja de realçar que estas são, na realidade, bastante próximas entre si, o que diminui de algum modo a probabilidade desta hipótese. Em relação aos valores de amplitude dos componentes da onda P [P1 (0,11±0,004 mV) e P2 (0,23±0,01 mV)] registados no método de Einthoven, estes divergem do encontrado na 36 literatura para outras raças. No estudo de Fregin (1982) com equinos das raças Standardbred e Thoroughbred os valores obtidos para cada raça foram superiores aos que nós encontrámos. No entanto, num outro estudo os mesmos valores para o cavalo Andaluz foram semelhantes aos nossos (Ayala et al 1999). Sendo que a amplitude duma onda depende da magnitude do vector de despolarização que lhe deu origem (Patteson, 1996), e este, por sua vez, depende do número de células despolarizadas ou repolarizadas em cada momento (van Loon e Patteson, 2010) é de supor que há um menor número de células a dar origem às ondas P1 e P2 nos cavalos usados no nosso estudo face aos cavalos usados por Fregin. Este facto pode estar relacionado com a aptidão das raças estudadas. De facto os cavalos das raças Standardbred e Thoroughbred são fortemente seleccionados para apresentarem uma grande capacidade desportiva, nomeadamente em corridas de velocidade, o que poderá justificar uma maior massa miocárdica nestes cavalos. Por outro lado, nas raças Andaluz e Lusitana as características procuradas prendem-se mais com questões de versatilidade e capacidade mental que permitam a estes animais desempenhar funções de alta escola equestre ou de toureio, por exemplo, não sendo requerida uma capacidade desportiva tão elevada, verificando-se assim uma menor massa muscular cardíaca. Em casos em que a divisão da onda P não foi tida em conta, os valores encontrados na literatura também ajudam a suportar esta suposição. Num estudo com cavalos não treinados de várias raças (Costa et al, 1985), obtiveram-se valores de amplitude da onda P muito inferiores aos verificados em cavalos da raça Trotador Italiano submetidos a um programa de treino regular (Pampana et al, 2004) (0,16±0,009 mV versus 0,29±0,01 mV, respectivamente). Esta diferença pode ser explicada se tivermos em conta que animais submetidos a treino diário poderão aumentar a massa do miocárdio, apresentando, assim, valores superiores relativamente a animais que nunca foram treinados (Glazier, 1966, citado por Hamid, 2010). O resultado que obtivemos, se também não tivermos em conta a divisão da onda P em dois elementos, situa-se entre os dois valores referidos [resultado da amplitude de P2 (0,23±0,01 mV)]. Tendo em conta que a maior parte dos animais incluídos no nosso estudo estavam, também, sob condições de treino regular [47 animais com 3 ou mais sessões de treino semanal (61,8%)], mas que o Trotador Italiano é, mais uma vez, um cavalo seleccionado para corridas, a observação deste valor pode ser explicado na mesma linha do que foi referido anteriormente. Por seu lado, os valores de amplitude das ondas P monofásicas positivas obtidas no método de Einthoven vão de encontro ao descrito na literatura (Ayala et al, 1999). Ainda no método de Einthoven, os valores de duração da onda P no estudo que apresentamos aqui estão de acordo com o que foi publicado por Pampana et al (2004) e Costa et 37 al (1985), mas são inferiores ao publicado por Fregin (1982). A duração das deflexões no ECG dependem da duração das ondas de despolarização que lhe dão origem (Physick-Sheard, 1991), ou seja, dependem do tempo que estas demoram a atravessar a massa muscular. Uma maior massa muscular dará origem a uma maior duração da onda, pois esta demora mais tempo a atravessá-la (van Loon e Patteson, 2010). Deste modo é normal que a duração da onda P seja maior nos Standardbred e Thoroughbred pelas características destas raças já mencionadas anteriormente. 5.2. Complexo QRS No método base-ápice as diferentes apresentações do complexo QRS observadas estão de acordo com as mencionadas na literatura para os métodos de obtenção do ECG que acompanham o eixo longitudinal do coração, como o método Y de Holmes e base-ápice (Muylle e Oyaert, 1977). Os diferentes padrões são originados por diferentes trajectos percorridos pelo impulso cardíaco quando da activação ventricular (Physick-Sheard, 1991). Uma deflexão negativa no início do ECG (onda Q) provém da activação do aspecto esquerdo do septo ventricular, enquanto a activação do aspecto direito dá origem a uma deflexão positiva (onda R) (Muylle e Oyaert, 1977). Em todos os trabalhos encontrados realizados noutras raças o formato RS foi, também, o mais visualizado (Diniz et al, 2008; Alidadi et al 2002; Hamid et al, 2010) (61,9% no presente estudo). No que diz respeito às percentagens dos restantes formatos, estas são divergentes do publicado por Hamid e colaboradores (2010) para a raça Kurdo e por Physick (1991) num estudo proveniente de 286 cavalos de várias raças (principalmente Standardbred), mas concordantes com os resultados de Diniz et al (2008) no seu estudo em cavalos Mangalarga Marchador. Esta constatação poderá demonstrar um envolvimento genético no padrão seguido pelo impulso cardíaco durante a activação ventricular, dado a grande proximidade existente entre o Lusitano e o Mangalarga Marchador, que não se verifica entre o Lusitano e os cavalos Kurdo ou Standardbred. As amplitudes das ondas do complexo QRS são muito variáveis no cavalo (Jones, 1989). A amplitude média da onda R que registámos no método base-ápice para a raça Lusitana (0,38±0,03 mV) é próxima da encontrada noutras raças (Hamid et al 2010; Diniz et al, 2008; Alidadi et al 2002). Num estudo realizado por Pampana et al (2004), com cavalos da raça Trotador Italiano, a média para a amplitude da onda R foi muito superior à encontrada nos restantes estudos. No entanto uma diferença desta magnitude (2,36 mV no Trotador Italiano versus 0,22-0,50 mV nos restantes estudos) pode dever-se a diferenças na abordagem da análise 38 dos elementos do ECG ou devido ao diferente posicionamento dos eléctrodos realizado por Pampana et al (2004), que optou por colocar o eléctrodo negativo na fossa jugular esquerda, ao invés da direita como ocorreu nos restantes estudos. O valor médio da amplitude da onda S (1,70±0,04 mV) foi por sua vez semelhante ao obtido no cavalo Turco (Alidadi et al, 2002), mas muito inferior ao verificado no cavalo Kurdo (Hamid et al, 2010) e no cavalo Mangalarga Marchador (Diniz et al, 2008). Sendo a onda S correspondente à despolarização do terço basal do septo interventricular (Muylle e Oyaert, 1977) e dependendo a amplitude duma onda da magnitude do vector que lhe deu origem (Patteson, 1996), pode-se supor que a massa muscular do septo interventricular na raça Lusitana será inferior à de outras raças. Todavia, dado o padrão de despolarização ventricular dos equinos, esta suposição não deve ser tomada como absoluta (van Loon e Patteson, 2010). Os resultados da amplitude da onda Q para o método base-ápice por nós encontrados não serão considerados nesta discussão, dado que estes provêm apenas de uma única observação. No que diz respeito à duração do complexo QRS os resultados por nós obtidos (0,12±0,003 s) são semelhantes aos encontrados noutros estudos (Alidadi et al, 2002; Hamid et al, 2010; Pampana et al, 2004). Em relação à morfologia do complexo QRS no método de Einthoven, esta pode ser muito variável (Bonagura e Reef, 1998). Na Figura 8 estão representados exemplos dos vários formatos do complexo QRS observados em ambos os métodos, retirados de registos electrocardiográficos obtidos durante o estudo que descrevemos. Figura 8 - Exemplos dos formatos do complexo QRS observados no estudo relativamente aos dois métodos utilizados: (A) RS (base-ápice); (B) S (base-ápice); (C) QRS (Einthoven); (D) QR (Einthoven); (E) R (Einthoven); (F) RS (Einthoven); (G) S (Einthoven); (H) QS (Einthoven). 39 Na literatura não foram encontradas as percentagens para cada configuração segundo este método, mas sim percentagens para a presença ou ausência de cada onda. Assim sendo, analisando desse modo os nossos resultados para podermos efectuar uma comparação, concluímos que a onda Q esteve presente em 62% dos animais, a onda R em 85,3% e a onda S em 50,7%. No estudo de Fregin (1982) com Thoroughbreds e Standardbreds, a onda R também foi a mais visualizada e a onda S a que menos vezes se verificou, com uma percentagem próxima da nossa (55% e 42,5% para cada raça). No entanto a onda R foi visualizada em 100% dos casos em ambas as raças e a onda Q em 90% dos Thoroughbred e 97,5% dos Standardbred. Esta diferença pode advir de diferenças intrínsecas das raças, no padrão de distribuição das fibras de Purkinje e, consequentemente, no trajecto efectuado pelo impulso cardíaco responsável pela despolarização dos ventrículos (Muylle e Oyaert, 1977), uma vez que este não é afectado por qualquer tipo de factores externos como stresse, por exemplo (Steel et al, 1976). Esta diferença também é visível na amplitude das ondas. Os Thoroughbreds e Standardbreds revelaram, duma maneira geral, uma menor amplitude das ondas negativas do complexo (Q e S) e uma maior amplitude da onda R (Fregin, 1982), comparativamente com os nossos resultados no PSL. Isto pode demonstrar uma prevalência das ondas de despolarização oriundas do aspecto direito do septo interventricular responsável pela deflexão positiva, face às oriundas do aspecto esquerdo, responsáveis pelas deflexões negativas (Muylle e Oyaert, 1977) nestas raças, enquanto se registará o contrário na raça Lusitana. Outro aspecto a ter em conta, segundo a opinião de alguns autores, é a possível relação entre a dimensão ventricular e a amplitude da onda R neste método (Jones, 1989). Principalmente no caso dos Thoroughbreds a diferença nos valores de amplitude em relação aos por nós obtidos (1,13±0,23 mV versus 0,56±0,04 mV) é considerável e o facto destes animais serem fortemente seleccionados para apresentar uma grande capacidade desportiva pode ter culminado num aumento da sua massa muscular cardíaca, o que por sua vez iria resultar numa maior amplitude da onda R. Relativamente aos resultados obtidos noutros estudos para as amplitudes das ondas do complexo QRS foram encontrados valores semelhantes aos nossos para a amplitude da onda R em éguas Puro-Sangue Inglês (Fernandes, 2004) (0,40±0,02 mV versus 0,56±0,04 mV) e para a amplitude da onda Q no Trotador Italiano (Pampana et al, 2004) (0,19±0,03 mV versus 0,16±0,02 mV). No entanto, neste último a amplitude registada da onda R foi, à semelhança do Thoroughbred, consideravelmente superior à nossa. Mais uma vez o facto de esta raça ser normalmente utilizada em eventos de corrida de trote e de os animais utilizados no estudo estarem todos submetidos a sessões de treino diárias pode influenciar os resultados. É de referir que mais uma vez a relação entre a massa do 40 miocárdio e a amplitude da onda R não deve ser tida como absoluta, sendo que esta teoria não é apoiada por outros autores (Muylle e Oyaert, 1977). Finalmente no que diz respeito à duração do complexo QRS no método de Einthoven, foram encontrados resultados semelhantes aos nossos (0,09±0,004 s) em éguas Puro-Sangue Inglês (0,08±0,02 s) (Fernandes, 2004) e cavalos não treinados (0,095±0,03 s) (Costa et al, 1985). Em cavalos das raças Thoroughbred, Standardbred (0,13±0,00 s para ambos) (Fregin, 1982) e Trotador Italiano (0,11±0,004 s) (Pampana et al 2004) os resultados registados foram superiores aos da raça Lusitana, o que, segundo alguns autores, se poderá dever ao nível de treino dos indivíduos, pois estes treinando mais conseguem aumentar a dimensão do seu miocárdio, à imagem do que está descrito em humanos (Cohen et al, 1980, citado por Zehender et al, 1990). 5.3. Onda T As conformações visualizadas no método de base-ápice, bem como a sua percentagem, são corroboradas pela literatura (Physick-Sheard, 1991; Alidadi et al, 2002; Hamid et al, 2010). A presença de uma grande percentagem de ondas T negativas visualizadas (93,4%), derivadas do formato monofásico negativo (10,5%), e da porção negativa do formato bifásico (82,9%) é tido como um bom indicador de oxigenação do miocárdio (Alidadi et al, 2002). Na Figura 9 estão expostos exemplos das várias conformações da onda T observadas, retirados de registos electrocardiográficos realizados durante o presente estudo. Figura 9 - Exemplos dos formatos da onda T observados no estudo: (A) onda T simples negativa (B) onda T bifásica (-/+); (C) onda T simples positiva. A onda T é a onda mais lábil do ECG em equinos e, como tal, grandes variações nos resultados são expectáveis (Steel et al, 1976). No único estudo encontrado no qual a amplitude das ondas foi avaliado individualmente para cada formato, como foi realizado na nossa investigação, os resultados encontrados foram semelhantes (Hamid et al, 2010). Contudo, estes 41 autores apenas encontraram um animal com o formato monofásico negativo e outro com o formato monofásico positivo, pelo que os resultados das amplitudes para estes formatos serão pouco significativos. Num outro estudo, com cavalos da raça Mangalarga Marchador, em que os resultados da amplitude da onda T foram apenas divididos em ondas negativas e positivas, as ondas negativas tiveram uma maior amplitude e as ondas positivas uma menor amplitude do que as observadas no presente trabalho (Diniz et al, 2008). Todavia, dada a diferente abordagem na avaliação das ondas, é difícil reconhecer se estas divergências se devem a diferenças intrínsecas entre as raças. Um dado a ter em conta é o de que a onda T tende a ter uma porção positiva cada vez mais ampla consoante a frequência cardíaca vai aumentando, podendo perder inclusivamente a sua porção negativa (Steel et al, 1976). Assim sendo, estes resultados poderiam advir duma menor frequência cardíaca demonstrada pelos Mangalarga Marchador. Contudo, a frequência cardíaca média destes animais (42 bpm) foi ligeiramente superior à encontrada nos Lusitanos (38 bpm), o que torna esta explicação menos plausível. O valor da duração da onda T verificada no método base-ápice (0,18±0,06 s) está de acordo com a literatura (Pampana et al, 2004; Alidadi et al, 2002; Hamid et al, 2010). As conformações da onda T visualizadas no método de Einthoven (bifásica – 76%; monofásica negativa – 12%; monofásica positiva – 12%) são apoiadas pela publicação de Physick-Sheard (1991), porém as suas percentagens divergem bastante do verificado por Ayala et al (1999) em cavalos de Pura Raça Espanhola acima dos três anos de idade, sendo que neste estudo a percentagem de ondas T bifásicas não foi além dos 34,7%. Esta diferença assume um maior interesse quando verificamos que a presença de ondas T negativas, sob o formato de ondas T monofásicas e porção negativa de ondas T bifásicas, no nosso estudo efectua-se em 88% dos casos, enquanto na raça Andaluza apenas em 61% (Ayala et al, 1999). Sendo que a presença duma onda T negativa é considerada um bom indicador de oxigenação do miocárdio (Alidadi et al, 2002), como já referido, e, consequentemente, um bom indicador da capacidade desportiva do animal, este achado pode ser relevante. No entanto há que ter em conta que, tal como foi mencionado anteriormente, a onda T assume um formato positivo quando a frequência cardíaca aumenta (Steel et al, 1976). Assim sendo, e se tivermos em conta que também no formato da onda P verificámos diferenças que podem provir duma situação em que o animal se encontra em taquicardia, esta constatação pode indicar que os animais utilizados no nosso estudo toleraram melhor todo o procedimento, dada a boa capacidade mental e docilidade características da raça Lusitana. 42 A amplitude da onda T no método de Einthoven, nos seus vários formatos, está de acordo com o publicado por Ayala et al (1999), exceptuando no que diz respeito à porção positiva do formato bifásico, no qual a amplitude foi inferior à que nós encontrámos. Esta diferença poderia ser explicada com base na hipótese de que os animais utilizados naquele estudo estivessem mais calmos do que os do nosso estudo, contudo essa explicação não é concordante com os restantes achados já acima mencionados, pelo que esta hipótese é menos provável. Assim sendo a explicação para esta menor amplitude pode prender-se com diferenças genéticas entre as raças (embora estas sejam próximas entre si), com o treino levado a cabo pelos animais (Holmes e Rezakhani, 1975, citado por Ayala et al, 1999) ou, simplesmente, devido à grande variabilidade desta onda (Steel et al, 1976). Num outro estudo realizado com éguas Puro-Sangue Inglês, no qual as amplitudes das ondas T foram apenas divididas em ondas negativas ou positivas, a amplitude das ondas positivas assemelhou-se aos resultados constatados no nosso estudo (Fernandes et al, 2004). Respectivamente à duração da onda T no método de Einthoven, os resultados obtidos no nosso estudo (0,17±0,007 s) são superiores aos resultados descritos na literatura (Pampana et al, 2004; Costa et al, 1985; Fernandes et al, 2004). A duração da onda T parece ter uma relação positiva com o crescimento da massa muscular dos ventrículos (Fernandes et al, 2004), pelo que esta maior duração da onda T na raça Lusitana poderá representar um bom indicador desportivo. 5.4. Intervalos P-R e Q-T A duração do intervalo P-R no método base-ápice observada é concordante com a literatura (Hamid et al, 2010; Alidadi et al, 2002; Diniz et al, 2008; van Loon e Patteson, 2010). Este facto corrobora a afirmação de Hamid et al (2010) de que o intervalo P-R não varia de raça para raça, neste método. Apenas no estudo de Pampana et al (2004), com cavalos da raça Trotador Italiano, encontramos uma diferença significativa (0,15±0,06 s versus 0,30±0,006 s), o que se pode dever a um estado mais excitado destes animais durante a realização do estudo, uma vez que o intervalo P-R diminui face a uma menor acção do tónus vagal (Steel et al, 1976). Outra razão para esta diferença pode ser o diferente posicionamento do eléctrodo negativo utilizado por estes autores, ou uma diferente abordagem na análise deste intervalo. Quanto ao intervalo Q-T no método base-ápice, a sua duração também está de acordo com o encontrado na literatura (Hamid et al, 2010; Alidadi et al, 2002; van Loon e Patteson, 2010). No estudo de Diniz et al (2008), com cavalos da raça Mangalarga Marchador, os resultados foram ligeiramente inferiores (0,469±0,008 s versus 0,50±0,008 s). A duração do 43 intervalo Q-T está directamente relacionada com a acção do tónus vagal, à imagem do que acontece com o intervalo P-R, pelo que esta menor duração do intervalo Q-T poderia demonstrar um estado menos relaxado destes animais durante a realização do estudo, quando comparados com os nossos animais. No entanto, a média da duração do intervalo P-R neste estudo é muito semelhante à nossa, o que não seria de esperar se o motivo fosse a acção do tónus vagal, já que este actua em ambos os intervalos simultaneamente. Outra razão para esta discrepância pode ser a dimensão da massa ventricular, já que parece existir uma relação entre esta e o tempo de despolarização e repolarização ventricular, ou seja, o intervalo Q-T (Stewart e Steel, 1970, citado por Hamid et al, 2010). Assim sendo poderia ser um indicador de uma maior massa miocárdica do Puro-Sangue Lusitano comparativamente ao Mangalarga Marchador. Dada a proximidade entre as raças, uma diferença genética é menos provável. Ao contrário do que acontece no método base-ápice, os valores encontrados na literatura para a duração do intervalo P-R no método de Einthoven são muito divergentes. Tal pode deverse ao facto de os animais tolerarem, de um modo geral, melhor a abordagem segundo o método base-ápice, comparativamente ao método de Einthoven, havendo assim uma menor flutuação do tónus vagal no primeiro. Assim sendo encontrámos resultados coincidentes com os nossos (0,28±,005 s) em cavalos da raça Standardbred (0,30±0,001 s) (Fregin, 1982), mas também encontrámos resultados superiores em cavalos da raça Thoroughbred (0,35±0,006 s) (Fregin, 1982) e inferiores em cavalos de várias raças não treinados (0,25±0,005 s) (Costa et al, 1984). Relativamente à diferença para com os resultados que Fregin (1982) encontrou nos cavalos Thoroughbred é de salientar que, como foi mencionado anteriormente, a duração da onda P também foi superior, logo será normal que a duração do intervalo P-R também o seja. Para além disso é provável que os cavalos utilizados naquele estudo apresentassem uma menor frequência cardíaca, dada a sua aptidão desportiva, o que levaria a um aumento da duração do intervalo P-R (Steel et al, 1976). Porém no estudo em causa não é fornecida informação sobre a frequência cardíaca média daqueles animais, o que impõe algumas restrições a esta hipótese. No caso do estudo de Costa et al (1984) o raciocínio é feito ao contrário, uma vez que a frequência cardíaca média destes animais (44 bpm) foi superior à verificada no nosso estudo (38 bpm). Esta maior frequência cardíaca poderá ser responsável pelo encurtamento do intervalo P-R. Todavia, os resultados para a duração do intervalo Q-T verificados neste estudo são semelhantes aos nossos e, mais uma vez, seria suposto que a diminuição do tónus vagal ao encurtar o intervalo P-R também encurtasse o Q-T. 44 Também no que diz respeito à duração do intervalo Q-T no método de Einthoven os resultados encontrados são muito divergentes. Como foi dito, foram encontrados registos semelhantes em cavalos não treinados (Costa et al, 1984), mas em cavalos da raça Thoroughbred este intervalo é mais longo e em cavalos da raça Standardbred é mais curto (Fregin, 1982). Em relação aos resultados obtidos em Thoroughbreds a mesma explicação relacionada com a frequência cardíaca dada para o intervalo P-R anteriormente pode ser utilizada para o intervalo Q-T. É de considerar ainda neste caso que a duração do complexo QRS verificada nesta raça é também maior que aquela que nós obtivemos, o que fará aumentar a duração do intervalo Q-T. Outro factor que pode influenciar este resultado é a dimensão cardíaca que será, provavelmente, maior nesta raça como já foi discutido previamente. No caso dos Standardbred, a menor duração do intervalo Q-T é mais difícil de explicar, pois o seu intervalo P-R é semelhante ao verificado no nosso estudo e o seu complexo QRS tem inclusivamente uma maior duração. A maior aptidão desportiva desta raça também faria antever uma maior duração do intervalo Q-T, consequente duma maior massa cardíaca. O facto de os cavalos PSL terem uma duração deste intervalo superior a esta raça pode ser um dado interessante do ponto de vista desportivo. 5.5. Influência do género Na análise comparativa entre géneros verificou-se que os machos apresentavam uma frequência cardíaca média inferior às fêmeas, o que está de acordo com outros estudos já publicados (Hamid et al, 2010), e que se traduziu também num maior intervalo R-R nos machos em ambos os métodos, ou seja, num maior intervalo entre cada ciclo. Outra diferença significativa encontrada no método base-ápice foi uma maior duração do complexo QRS por parte das fêmeas, o que vai contra os resultados de Diniz et al (2008) em cavalos da raça Mangalarga Marchador, que verificaram uma maior duração deste parâmetro nos machos. Os mesmos autores referem ainda que noutras espécies, incluindo o ser humano, também é normal o complexo QRS ser mais longo nos machos. Este dado torna-se ainda mais intrigante se atendermos que praticamente nenhuma fêmea se encontrava a realizar qualquer tipo de treino, algo que, segundo alguns autores, é um factor com alguma influência neste parâmetro electrocardiográfico (Cohen et al, 1980, citado por Zehender et al, 1999). Deste modo, talvez esta constatação advenha do facto da amostra de fêmeas ser reduzida, tendo este achado um valor, de algum modo, menos significativo. Devemos ainda acrescentar que, embora a análise através do teste T de student nos diga que a diferença é estatisticamente significativa a verdade é 45 que as médias não foram muito diferentes quando analisadas directamente (0,12±0,02 s nos machos versus 0,13±0,03 s nas fêmeas). 5.6. Influência do grupo etário Os resultados da comparação entre classes etárias demonstraram uma maior duração do complexo QRS e da onda T, no método base-ápice, nos animais acima dos 14 anos relativamente aos restantes indivíduos. Este achado é concordante com os resultados de Fernandes et al (2004) num estudo com cavalos Puro-Sangue Inglês. Este autor refere que esta diferença provém do crescimento corporal dos animais. No entanto, no seu estudo, as classes etárias analisadas eram compostas por animais com menos de 1 ano, animais entre 1 e 2 anos e éguas adultas, pelo que a comparação entre o nosso estudo e o estudo destes autores pode não ser uma comparação exacta. Para além desta maturação fisiológica proveniente da idade, há também outro factor a ter em conta no nosso caso e que se prende com o facto de muitos dos cavalos mais velhos, embora actualmente não estivessem sob condições de treino, já tinham tido durante a sua vida uma carga desportiva que lhes proporcionaria uma dimensão cardíaca superior aos cavalos mais novos (Stewart, 1980). Num outro estudo realizado por Diniz et al (2008), no qual as classes etárias se assemelham mais com as nossas (1 a 3 anos, 3 a 10 anos e superior a 10 anos), a duração do complexo QRS também aumentou com a idade, embora não o suficiente para ser considerada uma diferença significativa. No método de Einthoven também se verificaram indicações duma maior dimensão cardíaca nos animais mais velhos, comparativamente aos animais entre os 3 e os 5 anos de idade, nomeadamente através duma maior duração do intervalo Q-T nos primeiros (0,58±0,08 s versus 0,49±0,04 s). O intervalo Q-T, sendo uma medição directa da duração da sístole eléctrica ventricular (Stewart e Steel, 1970, citado por Hamid et al, 2010), é tido por alguns autores como representante da massa muscular ventricular, aumentando directamente com esta (Glazier, 1966, citado por Hamid et al, 2010). Mais uma vez esta maior dimensão pode ser resultado duma maturação relacionada com a idade ou com a vida desportiva passada dos animais mais velhos. Ainda no método de Einthoven o intervalo R-R mais longo, aliado a uma menor frequência cardíaca (embora esta sem diferença significativa), nos animais entre os 3 e 5 anos de idade, quando comparados com os animais com mais de 14 anos (1,77±31 s versus 1,47±23 s), parecem demonstrar uma maior acção do tónus vagal nos indivíduos mais novos. Esta maior acção do sistema nervoso parassimpático provoca a diminuição da frequência cardíaca 46 (Bonagura e Reef, 1998) e, consequentemente, o aumento do intervalo R-R (Steel et al, 1976). Esta constatação é interessante pois a frequência cardíaca é normalmente mais elevada nos animais mais novos (Fernandes et al, 2004). Uma possível explicação para este resultado é que a maior parte dos cavalos entre os 3 e 5 anos de idade estavam em coudelarias ou centros hípicos nos quais eram tratados e trabalhados diariamente, ficando deste modo mais tolerantes ao contacto humano. Durante a nossa investigação foi, inclusivamente, possível constatar uma maior cooperação destes animais a todos os procedimentos realizados, quando comparados com os cavalos mais velhos que não se encontravam sob as mesmas condições de maneio. 5.7. Influência do treino físico No método base-ápice obtivemos uma duração mais longa da onda P nos animais submetidos a sessões de treino diárias do que em qualquer outro grupo, apesar de esta diferença ter sido apenas significativa quando comparados com os animais do grupo 4 (5 a 6 sessões de treino semanal) (0,14±0,02 s versus 0,12±0,02 s). Como já foi mencionado na discussão dos resultados da onda P, uma maior duração desta onda poderá corresponder a uma maior massa muscular que a onda de despolarização que lhe deu origem teve que atravessar (van Loon e Patteson, 2010). Assim será normal que os animais submetidos a um maior esforço físico apresentem uma duração da onda P mais longa. Esta diferença seria, supostamente, maior entre os animais do grupo 1 (sem qualquer sessão de treino) e 5 (sessões de treino diárias). Uma possível explicação para que tenham sido os animais do grupo 4 a apresentar uma menor duração desta onda prende-se com o facto destes animais terem apresentado uma média de idades significativamente inferior (P <0,05) aos animais do grupo 5. Deste modo, para além duma menor preparação física, havia ainda uma menor maturação cardíaca relacionada com a idade destes animais (Fernandes et al, 2004; Diniz et al, 2008). Exceptuando o grupo 4, o aumento da duração da onda P acompanhou o aumento do número de sessões de treino realizadas por cada grupo. Os animais do grupo 4 apresentaram ainda uma duração do complexo QRS no método base-ápice significativamente inferior aos animais do grupo 1 (0,11±0,02 s versus 0,13±0,03 s) o que mais uma vez pode ser explicado pelas diferenças de idade entre os grupos, já que o grupo 4 também apresentou uma média de idades muito inferior ao grupo 1 (P <0,01). Como foi referido na discussão da comparação entre classes etárias os animais mais velhos apresentaram uma duração média do complexo QRS significativamente superior aos restantes animais, quer 47 derivado do crescimento corporal dos animais (Fernandes et al, 2004), quer por muitos deles, apesar de já não estarem sob condições de treino actualmente, terem apresentado uma vida desportiva activa no passado. No método de Einthoven os indivíduos do grupo 1 apresentaram uma maior duração da onda T do que os do grupo 4 (0,20±0,06 s versus 0,14±0,04 s). Não tendo sido encontrada na literatura qualquer indicação sobre a correlação da duração da onda T com os efeitos do treino em equinos, este achado pode estar, uma vez mais, relacionado com a diferença de idades. Na discussão dos resultados da comparação entre classes etárias já foi feita referência à relação entre a idade e a duração da onda T (Fernandes et al, 2004), algo que também foi constatado no nosso estudo. Em todos os casos aqui referidos é de considerar que esta divisão de classes de treino efectuada por nós poderá estar sujeita a viés, uma vez que a intensidade física exigida pelos diferentes treinadores a cada animal durante as sessões de treino não foi quantificada. Ainda assim considerámos ser esta a maneira mais prática de abordar esta variável. 48 6. CONCLUSÃO Através da elaboração deste estudo encontrámos alguns bons indicadores desportivos para a raça Lusitana como a duração da onda T e do intervalo Q-T e ainda sinais confirmadores da grande capacidade mental e tolerância características desta raça, como a percentagem de ondas P bífidas e ondas T negativas observadas. Nos resultados da análise comparativa entre grupos (género, idade e treino) destacamos os indícios de que a maturação cardíaca nos equinos pode ainda não estar completa até aos 5 anos de idade, atendendo à diferença dos valores obtidos entre os animais até esta idade e os animais mais velhos para a duração do complexo QRS, onda T e intervalo Q-T. Da análise comparativa entre classes de treino realçamos a relação positiva encontrada entre a duração da onda P no método base-ápice e o número de treinos semanais efectuados pelo animal. Consideramos, assim, que este estudo é relevante uma vez que até este momento não havia qualquer informação sobre quais os valores-padrão do traçado electrocardiográfico para os equinos da raça PSL e, sendo este um método de diagnóstico indispensável na abordagem ao doente cardíaco, o conhecimento destes valores pode auxiliar o clínico de equinos a estabelecer diagnósticos e prognósticos para os casos que se lhe depararem, com base em dados objectivos e quantificáveis. O reconhecimento da influência de características como o género, a idade e a actividade física também oferece ao clínico valiosas informações que podem ser utilizadas tanto no campo médico como, até certo grau, no campo desportivo. Os autores consideram ainda ser necessário a realização de mais estudos na área para clarificar certos pontos que, pela dimensão reduzida da amostra representativa de alguns dos grupos, não puderam ser conclusivos neste trabalho. É por isso nossa intenção continuar a recolher registos electrocardiográficos para aumentar a nossa amostra, de modo a auferir ainda mais credibilidade aos nossos resultados, bem como para podermos obter uma distribuição mais homogénea entre os grupos. Através dos ECG’s obtidos também poderemos realizar futuramente a análise de prevalência de arritmias cardíacas na raça Lusitana. Seria também interessante a realização de estudos com grupos de animais de idade semelhante, mas com diferentes graus de treino e vice-versa, de modo a analisar a influência destes factores separadamente. 49 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Ayala I, Gutierrez G, Benedito JL, Hernadéz J, Castillo C, Alonso ML, Miranda M, Montas A. Morphology and amplitude values of the P and T waves in the electrocardiograms of Spanish-Bred horses of diferent ages. J of Vet Med A. 1999;46: 225-230. Alidadi N, Dezfouli M R, Nadalian M G, Nouroozian I. The ECG of the Turkman horse using the standard lead base-apex. 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Ficha de questionário efectuado ao propietário Ficha clínica – Exame electrocardiográfico Nº do estudo ________ Nome do proprietário ___________ Nº de tlf ____________ Nome do Animal ____________________ F □ M Sexo □ Se Fêmea: Em lactação Se Macho: Inteiro Aptidão: Lazer Idade ________ Desporto Início de gestação Peso ________ Final de gestação Castrado Trabalho No caso de desporto: Tipo de competição: Salto Intensidade do treino: Diariamente Velocidade Resistência Outro ________________ 5 a 6 vezes por semana 3 a 4 vezes por semana 1 a 2 vezes por semana No caso de trabalho: Especificar as condições do mesmo ________________________________________ Alimentação e alojamento _________________________________ Exame físico: Temp ______ FC ____ FR ____ Estado das mucosas _____ Estado de hidratação _______ Pulso ______ Pulso digital _________ Motilidade intestinal: Alterações a assinalar à auscultação ___________________________________________________________ 53