Inadimplência municipal às distribuidoras de energia elétrica: um entrave ao
desenvolvimento da economia brasileira
Aldem Johnston Barbosa Araújo
Advogado da UEN de Direito Administrativo do Escritório Lima & Falcão e assessor jurídico da
Diretoria de Vigilância em Saúde da Secretaria de Saúde do Recife
“- Nunca serão!”. Esta frase, já icônica, é bradada a plenos pulmões pelo
personagem principal do Filme/Fenômeno Cultural: Tropa de Elite.
Na película, o Capitão Nascimento, em tom provocativo e desafiador, afirma
categoricamente aos policiais militares que se inscrevem como alunos do curso formação
para integrar o Batalhão de Operações Especiais – BOPE que eles jamais vestirão o
uniforme negro com a insígnia da faca encravada na caveira que caracteriza a tropa de elite,
que dá título ao longa.
O Brasil, colosso geográfico cercado de liliputianos vizinhos na América do Sul,
se assemelha aos destinatários dos gritos do Capitão Nascimento nas suas pretensões de
pertencer à “Tropa de Elite” da Economia Mundial, principalmente quando comparamos
sua tímida economia de commodities com as diversificadas economias de vanguarda dos
países do Primeiro Mundo.
Na era do silício, da química fina, da mecatrônica e da informação interativa e
digital, o fato de um país ter energia que dê suporte à demanda gerada por estas áreas é vital
para aproximar sua economia daquelas que disputarão as melhores market shares e ao
mesmo tempo se distanciar daquelas que, tal quais os peixes-rêmoras, ficarão apenas com
os desprezíveis restos dos tubarões que eles parasitam.
A inadimplência dos municípios brasileiros para com as concessionárias de
serviço público que fornecem energia elétrica, ao ser albergada por inconseqüentes decisões
judiciais que impedem a suspensão do fornecimento do serviço, cria um dantesco quadro de
um bombeiro apagando um incêndio com gasolina, onde ele alimenta aquilo que devia
combater.
Diante do fato de termos no Brasil o beneplácito de um Estado-Juiz que unge os
municípios alçando-os à condição de mártires da economia e demoniza as concessionárias
que distribuem energia elétrica, incentivando a prática por parte destas de uma
benemerência/beneficência compulsória como forma de expiarem o pecado mortal de
almejarem lucro, pergunta-se: Como fica o Estado-Administração compelido pela
necessidade de atrair investimentos para o setor elétrico tão vital para o desenvolvimento de
um país como o nosso, que deseja ser tubarão e não peixe-rêmora?
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A resposta é simples, fica o Estado-Administração com a mesma credibilidade dos
pregadores de barba comprida que perambulam nas cidades com cartazes de papelão com
os dizeres de “o fim está próximo”.
E sem credibilidade para atrair o capital necessário para se investir no setor
elétrico brasileiro, o sistema atual não se expande, pelo contrário definha – e, por
conseqüência, as áreas de química fina, informática, mecatrônica e telecomunicações, que
geram a riqueza necessária para alçar o Brasil à condição player de destaque no teatro de
operações do mercado global -, não se desenvolvem e o Estado-Administração continuará o
seu périplo de mendicância às associações de proteção ao comércio, batalhando arduamente
por taxas alfandegárias mais camaradas para o feijão, o fumo, o algodão, o açúcar e outras
commodities que compõem um quadro de comércio exterior que remonta aos tempos das
pré-capitanias hereditárias.
Ou seja, por causa do Estado-Juiz, o bombeiro que apaga o fogo com gasolina, o
Estado-Administração tem de se apequenar diante de um Capitão Nascimento que está
ocupando o cargo de porteiro do clube privê dos países ricos, e que toda vez que vê o Brasil
plantando minas terrestres no caminho do seu próprio desenvolvimento, brada para ele
quando questionado sobre a pretensão do Brasil em entrar no clube dos países de Primeiro
Mundo: “- Nunca será!”.
Por mais incrível que possa parecer, é quase patente a certeza de que todas as
pessoas que vivem no Brasil entendem muito perfeitamente que energia elétrica é uma
necessidade vital. Porém, paradoxalmente, neste mesmo Brasil, temos um quadro
contraditório: Se a energia é tão vital para o “País do Carnaval”, porque vivemos à beira de
um “apagão”? E se alguém duvida de tal risco, veja-se o seguinte:
“A limitação das usinas e a escassez de água, motor propulsor das
hidrelétricas, deixem sempre possível haver um apagão. O Brasil
produz, normalmente, 75 mil megawatts de energia elétrica. A
quantidade é suficiente para o consumo habitual, mas não para os
picos – momentos como o intervalo do futebol, quando milhões
brasileiros abrem a geladeira para pegar uma cerveja, ou às 19h30,
quando a maioria liga o chuveiro. Quando as 158 hidrelétricas não
dão conta da demanda, o país é obrigado a acionar as usinas
termoelétricas, que usam como combustível gás natural, carvão,
xisto ou óleo diesel e lançam muito dióxido de carbono na
atmosfera. Com todos os tipos de usinas ligados, a capacidade a
capacidade de fornecimento sobe para 100 mil megawatts. Já que é
impossível armazenar energia em grande quantidade, qualquer
consumo superior a isso obrigaria à construção de mais usinas e
linhas de transmissão.
Imagine se os 186 milhões de brasileiros decidissem tomar banho em
chuveiros elétricos às 19h30. Como cada chuveiro gasta cerca de 1
kWh em 11 minutos de banho, o país precisaria de quase duas vezes
mais usinas para não apagar.” (matéria extraída da revista
Superinteressante, edição 247, 15 dez/2007, pág. 61)
O quadro descrito acima é deveras grave e, em curto prazo, imutável conforme se
depreende desta reportagem da revista Veja sobre as novas usinas hidrelétricas a serem
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construídas no Complexo do Rio Madeira, a de Santo Antonio cuja concessão foi a leilão
em dezembro de 2007, e a de Jirau, ainda não licitada à época da publicação da revista:
“Santo Antonio e Jirau são duas das obras estrategicamente mais
importantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com o
qual o governo espera colocar de pé a combalida infra-estrutura do
país. Visam a reduzir o risco de racionamento que ronda o sistema
elétrico desde o apagão de 2001. A situação é dramática. Só não
houve um novo colapso até agora porque as chuvas ajudaram a encher
os reservatórios, e o crescimento da economia vinha em ritmo de
banho-maria. O país precisa urgentemente de fontes novas de
energia porque o consumo per capita, que aumentou 1% ao ano entre
2000 e 2005, vai crescer a taxas três vezes mais altas entre 2005
e 2010. A região amazônica, onde fica o Complexo do Madeira, é a
mais promissora fronteira energética do país, pouco aproveitada em
relação aos grandes centros consumidores. Alguns estudos indicam
que a exploração na região pode chegar 43.000 megawatts nos
próximos dez anos. Isso equivale a mais de três usinas de Itaipu.
Também na região, o governo pretende levar a leilão a construção
da usina de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará, entre 2009 e 2010.
As três usinas juntas vão adicionar 17.450 megawatts ao potencial
de produção de energia – um pouco menos que a capacidade instalada
do estado de São Paulo.
Será um enorme avanço, mas talvez venha tarde demais. Estimativas
mostram que, se o país crescer a 5%, serão necessários 3.500
megawatts por ano, já em 2008, para que não haja falta de energia.
O problema é que Santo Antonio, a primeira das duas usinas do
Madeira, só começará a gerar energia em 2012, inicialmente com
apenas 450 megawatts.” (matéria extraída da revista Veja, edição
2.040, nº 51, 26 dez/2007, pág. 69)
Cabe ao Estado-Administração trazer o Estado-Juiz para um debate acerca do
papel do Estado, não apenas do Estado-Administração e nem tampouco do Estado-Juiz,
mas dele (Estado) como um todo, que é o de fomentar o pleno desenvolvimento da
sociedade da qual ele é, em última análise, servo incondicional.
Inexistindo tal debate, corremos o risco de assistir o Estado-Juiz - ao permitir que
os municípios utilizem energia elétrica sem ter que pagar por ela – de, primeiro: promover
o “assassinato” das empresas concessionárias que distribuem energia elétrica e, segundo:
fulminar de morte às pretensões do seu irmão bifronte (o Estado-Administração) de um dia
ser um país que integre o rol das grandes economias mundiais.
A incúria dos alcaides aliada à exagerada municipalização gerou uma miríade de
“municípios-parasitas” que sobrevivem unicamente à custa do repasse do Fundo de
Participação dos Municípios (FPM) e do naco a que lhes cabem da receita proveniente da
arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
Tais municípios, ainda que não bastassem estar em lamentável situação de
penúria, muitas vezes tem como gestores pessoas despreparadas para o trato com a coisa
pública, o que faz com que estes entes da federação se tornem “caloteiros” contumazes
daqueles que tem o azar de com eles ter de manter relações comerciais.
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Imaginemos a seguinte anátema: Um empresário qualquer, que tem de cumprir
suas obrigações com empregados, fornecedores e fisco e depois ainda tentar obter lucro,
firma um negócio, sob contrato, é claro, com um consumidor, onde ficou acordado um
pagamento X pelo serviço Y a ser fornecido pelo empresário. O consumidor, após se
beneficiar do serviço oferecido pelo empresário resolve não lhe pagar pelo serviço. Não
disposto a engrossar às fileiras da mão de obra escrava, resolve o empresário suspender o
serviço e cobrar a quantia que lhe é devida pelo consumidor. Entretanto, sentindo-se
ameaçado no seu “legítimo” direito de ter outrem lhe fornecendo benesses de forma
gratuita, resolve o consumidor ingressar na justiça e, surpreendentemente obtém êxito. E o
que era antes da intervenção judicial um simples contrato, tornou-se uma relação de
vassalagem onde o tirânico senhor feudal dá lugar a um todo poderoso consumidor que
passa a contar com um serviço gratuito (e que mesmo assim terá de atender os requisitos de
qualidade e segurança) quando, na verdade, deveria estar a pagar por ele.
As distribuidoras de energia elétrica caminham, de joelhos e com uma pedra nas
suas cabeças, sobre os mesmos cacos de vidro do amaldiçoado empresário citado no
parágrafo anterior e que, no exemplo acima, foi reduzido à condição análoga de escravo
(vez que trabalha compulsoriamente de graça). Com a desvantagem de que o fictício
empresário citado neste texto, se conseguir reverter a decisão judicial que lhe converteu em
legítimo “genitor” do consumidor (pois quem acolhe os outros da forma como foi obrigado
a fazer o empresário, só pode ser pai ou mãe do acolhido), poderá nunca mais celebrar
contrato com aquele mau pagador que tanto lhe rendeu aborrecimentos.
As distribuidoras não têm a mesma sorte. Elas são obrigadas a continuar a
fornecer energia elétrica para os municípios mesmo que eles tenham, em passado recente
ou remoto, se negado a lhes pagar um mísero centavo que seja. Não há prerrogativa de se
vetar um consumidor problemático.
Assim, ao se negar o direito das distribuidoras de suspender o fornecimento de
energia elétrica aos municípios inadimplentes, lança-se as empresas que exercem tal
atividade a seguinte maldição: além de não poderem escolher os seus clientes (vez que
estão num mercado regulado), também não podem suspender os serviços pelos quais
eventualmente não estejam sendo remuneradas. Ou seja, a distribuidora de energia elétrica
tem necessariamente de trabalhar para o município, fornecer-lhe um serviço de qualidade e
seguro e de forma gratuita. Nem dos escravos que trabalhavam nas lavouras de cana-deaçúcar era exigido tanto!
E qual é o grande argumento utilizado pelos municípios (e abraçado notadamente
pelos juízes da 1ª instância) para serem agraciados com a dádiva de utilizarem energia
elétrica à vontade sem a necessidade de pagar por ela e sem o risco de o serviço ser
suspenso pelo seu não pagamento? É o da continuidade do serviço público.
Os que alegam a impossibilidade de ser suspensa a prestação do serviço público
por falta do pagamento respectivo, invocam as disposições contidas na referida lei, em
especial o artigo 22:
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"Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas,
concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de
empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados,
eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos."
Apesar de garantir a continuidade dos serviços (art. 22), o Código de Defesa do
Consumidor não emoldurou quais deles poderiam ser considerados essenciais, o que
dificulta a aplicação do dispositivo supra mencionado.
A Carta Magna de 1988 (em seu art. 9º, §1º, que trata do direito de greve) também
foi omissa no que se refere à identificação dos serviços essenciais deixando ao alvedrio do
legislador ordinário a função de defini-los.
Como, então, identificar os serviços essenciais? A jurisprudência mais esclarecida
tem apontado na direção de que deve ser aplicado, por analogia, o art. 10, da Lei Federal nº
7.783/89 (trata do direito de greve) e que prevê, in verbis:
"Art. 10. São considerados serviços ou atividades essenciais:
I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de
energia elétrica, gás e combustíveis;
II - assistência médica e hospitalar;
III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos;
IV - funerários;
V - transporte coletivo;
VI - captação e tratamento de esgoto e lixo;
VII - telecomunicações;
VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas,
equipamentos e materiais nucleares;
IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais;
X - controle de tráfego aéreo;
XI compensação bancária."
Seguindo este raciocínio, nas relações contratuais que regem o serviço do
fornecimento de energia elétrica, o Princípio da Continuidade do Serviço Público, alcança,
para fins do art. 22, do CDC, unicamente os serviços essenciais constantes no rol do art. 10,
da Lei Federal nº 7.783/89.
Ainda sobre esta necessária delimitação ao alcance do art. 22 do Código de
Defesa do Consumidor, deve ser dito que o Princípio da Continuidade do Serviço Público é
uma garantia para a coletividade de que jamais os serviços qualificados como essenciais
poderão deixar de ser oferecidos à comunidade administrada. É, portanto, uma exigência
legal que determina que o Poder Público não poderá se eximir da oferta dos serviços:
“Não pode a Administração, por exemplo, de uma hora para outra,
decidir que não mais prestará serviços de telefonia, sobre o
pretexto de que o próprio mercado deles se encarregará. Uma vez
que a iniciativa privada não esteja habilitada a atender, com
eficiência, as necessidades dos consumidores, o Poder Público
acha-se, então obrigado a dar continuidade ao serviço que prestava
anteriormente.” (Antônio Herman Benjamin, Comentários ao Código do
Consumidor, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, pág. 111)
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Assim, está evidenciado que a finalidade do art. 22 do Código de Defesa do
Consumidor é de garantir que o Poder Público não se omita de ofertar o serviço.
Revelado, pois, o real espírito do Princípio da Continuidade do Serviço Público
encartado no Código de Defesa do Consumidor, conclui-se que é plenamente possível a
suspensão do fornecimento de energia elétrica, até porque, se esta não fosse permitida,
corre-se o risco de a inadimplência fulminar a prestação do serviço público:
“O usuário dos serviços remunerados por taxa ou tarifa, deve
satisfazer as obrigações concernentes ao pagamento e, ainda,
observar as normas administrativas e técnicas da prestação, sob
pena de sanções que podem chegar à suspensão do fornecimento.”
(Diógenes Gasparini, Direito Administrativo, São Paulo: Saraiva,
2000, pág. 149)
Em interessante exposição, Fábio Amorim da Rocha, faz alguns questionamentos
sobre as conseqüências da inadimplência e da eventual impossibilidade do fornecimento de
energia elétrica sob a alegação da proteção ao Princípio da Continuidade do Serviço
Público:
“Podem as distribuidoras de energia elétrica, apenas por serem
concessionárias de um serviço essencial e pondo em risco,
inclusive a sua própria subsistência como empresas, submeterem-se
ao
sacrifício
de
fornecer
energia
elétrica
a
consumidor
inadimplente,
sem
dele
receber
a
contrapartida
financeira
respectiva, inobstante tentados exaustivamente, todos os meios
suasórios para o recebimento das contas em atraso? E quem
responderá pelo pagamento da energia elétrica comprada à
supridora, de energia dessas distribuidoras, que é portadora, por
força da legislação aplicável à concessão (art. 3º, § 4º, da Lei
nº 8.631, de 4/3/1993, DOU de 5/3/1993), de procuração com poderes
para movimentar as contas das distribuidoras, na hipótese de
inadimplemento no tocante às faturas mensais emitidas contra essas
concessionárias pela referida supridora? E quem responderá pelos
pagamentos dos serviços, materiais e equipamentos adquiridos com a
finalidade de manter o sistema elétrico em pleno funcionamento e
em níveis tensão recomendados pela legislação específica não
apenas dos inadimplentes, mas de todos os consumidores de energia
do País, sob pena de cassação da concessão pelo Poder Concedente,
a teor do disposto na Lei nº 9.074, de 7/7/1995 (DOU de 8/7/1995)?
E quem, afinal, assumirá o ônus pela prestação do serviço de
distribuição de energia elétrica se todos os consumidores, a
exemplo do que vêm fazendo o os inadimplentes, se julgarem no
direito de consumir e não pagar a fatura respectiva?” (Fábio
Amorim da Rocha, A Legalidade da Suspensão do Fornecimento de
Energia Elétrica aos Consumidores Inadimplentes, Rio de Janeiro:
Editora Lúmen Juris, 2004, págs. 37/38)
Verifica-se, ante aos questionamentos acima expostos, que, se prejuízos poderão
advir para o município devedor por um eventual corte no fornecimento de energia elétrica,
muito maiores serão eles para as concessionárias de distribuição de energia elétrica do País
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e para toda a população brasileira se, apenas por ser um serviço essencial e de natureza
contínua, o inadimplemento dos consumidores, que deve ser exceção, passar a ser regra.
Permitindo-se a perpetuidade do inadimplemento ao fornecimento de energia
elétrica, gravosas conseqüências irão se abater não só sobre a concessionária prestadora de
serviço público, mas também sobre outras pessoas (físicas e jurídicas):
“Que muitos clientes consomem energia elétrica, mas não pagam é
fato incontroverso. Portanto, a suspensão desse fornecimento
configura-se como uma rescisão de contrato perfeitamente legal
(art. 476 do Código Civil), visando proteger o patrimônio do
fornecedor, posto que interrompe o fornecimento futuro em face da
inadimplência do consumidor.
Outrossim, o usuário inadimplente não tem idoneidade para compelir
a concessionária a manter o fornecimento da mercadoria. A
inadimplência carrega quase sempre o mesmo caráter pejorativo de
desonestidade.
É de se observar também que, em toda a extensão das ações
judiciais propostas em face das concessionárias de distribuição,
os inadimplentes raciocinam como se as mesmas não fossem empresas,
mas sim espécies de instituições de caridade que distribuem
gratuitamente a sua mercadoria. Aliás, tem-se a impressão de que a
crise econômica que assolou o País atinge só os inadimplentes. Por
esse motivo, vale destacar que a inadimplência dos consumidores de
energia elétrica causa às concessionárias os mesmos transtornos
suscitados pelos devedores, só que em proporções infinitamente
maiores, como por exemplo:
- dispensa de milhares de trabalhadores, agravando a situação
financeira das famílias que dela dependem;
- o orçamento das empresas também necessita de um certo
“equilíbrio”, como já foi demonstrado, porque poderá tornar-se
inoperante
se
todos
os
usuários
seguirem
o
exemplo
dos
inadimplentes;
- com a inadimplência dos usuários fica impraticável a expansão do
sistema
energético,
o
que,
conseqüentemente
obsta
o
desenvolvimento do País.” (Fábio Amorim da Rocha, A Legalidade da
Suspensão do Fornecimento de Energia Elétrica aos Consumidores
Inadimplentes, Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 2004, págs.
27/28)
Como em todo negócio jurídico, o fornecimento de energia elétrica objetiva o
lucro, ou seja, é carente de uma contraprestação pelo seu exercício.
A Administração Pública deve cumprir com as obrigações contratuais negociadas,
sendo o pagamento do preço seu principal dever, não sendo justo exigir-se que a
concessionária de energia elétrica continue a prestar serviços apesar da falta de pagamento,
muitas vezes contumaz, do órgão público.
Nos contratos sinalagmáticos, o cumprimento das obrigações ajustadas é dever
indisponível das partes e sua inadimplência autoriza a exceção do contrato não cumprido.
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Negar-se a possibilidade de suspensão do fornecimento de energia elétrica a
pessoas jurídicas de direito público inadimplentes, à guisa de observância ao Princípio da
Continuidade do Serviço Público, sem os devidos limites, é estimular o administrador
ineficaz a não cumprir suas obrigações.
A mencionada possibilidade, todavia, deve sofrer com a limitação de não alcançar
os serviços públicos essenciais, assim considerados aqueles constantes no rol do art. 10, da
Lei nº 7.783/89.
Aliás, esse é o posicionamento do STJ, conforme se constata nas decisões que
passamos a citar:
"ADMINISTRATIVO - FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA - FALTA DE
PAGAMENTO - CORTE - MUNICÍPIO COMO CONSUMIDOR. 1. A Primeira Seção
já formulou entendimento uniforme, no sentido de que o não
pagamento das contas de consumo de energia elétrica pode levar ao
corte no fornecimento. 2. Quando o consumidor é pessoa jurídica de
direito público, a mesma regra deve lhe ser estendida, com a
preservação apenas das unidades públicas cuja paralisação é
inadmissível. 3. Legalidade do corte para as praças, ruas,
ginásios de esporte, etc. 4. Recurso especial provido." (STJ, REsp
n. 460271/SP, Rel. Min. ELIANA CALMON)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ARTIGO 535 DO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO. INOCORRÊNCIA. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO
DE ENERGIA ELÉTRICA. IMPOSSIBILIDADE. INADIMPLEMENTO. UNIDADES
PÚBLICAS ESSENCIAIS. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DOS ARTS. 22 DO
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E 6º, § 3º, II, DA LEI Nº 8.987/95.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL INDEMONSTRADA.
1. Não basta que o recorrente postule a nulidade do acórdão dos
embargos de declaração, é necessário que indique precisamente
sobre quais pontos o julgado tenha supostamente incorrido em
omissão, contradição ou obscuridade, demonstrando os motivos de
sua relevância, a fim de possibilitar o exame da preliminar de
ofensa ao artigo 535 do Código de Processo Civil, sob pena de não
conhecimento do recurso especial, ante o óbice da Súmula 284 da
Suprema Corte. 2. O artigo 22 da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do
Consumidor), dispõe que: "os órgãos públicos, por si ou suas
empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra
forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços
adequados,
eficientes,
seguros
e,
quanto
aos
essenciais,
contínuos".
3. O princípio da continuidade do serviço público assegurado pelo
art. 22 do Código de Defesa do Consumidor deve ser amenizado, ante
a exegese do art. 6º, § 3º, II da Lei nº 8.987/95 que prevê a
possibilidade de interrupção do fornecimento de energia elétrica
quando, após aviso, permanecer inadimplente o usuário, considerado
o interesse da coletividade.
4. Quando o consumidor é pessoa jurídica de direito público,
prevalece nesta Turma a tese de que o corte de energia é possível,
desde que não aconteça de forma indiscriminada, preservando-se as
unidades públicas essenciais.
5. A interrupção de fornecimento de energia elétrica de Município
inadimplente somente é considerada ilegítima quando atinge as
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unidades públicas provedoras das necessidades inadiáveis da
comunidade, entendidas essas - por analogia à Lei de Greve – como
"aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a
sobrevivência, a saúde ou a segurança da população", o que se
perfaz na hipótese.
6. Não se conhece do recurso especial interposto pela alínea "c"
do permissivo constitucional quando os casos trazidos pra
confronto não possuem a mesma moldura fática do acórdão paradigma.
7. Recurso especial improvido." (STJ, RESP nº 791713-RN, Rel. Min.
Castro Meira, DJ Data: 1/2/2006).
Observe-se que o STJ, nos precedentes colacionados, assegura a continuidade dos
serviços públicos considerados essenciais, sem impedir, todavia, de forma absoluta, a
suspensão do fornecimento de energia elétrica, tendo em vista o inadimplemento da
contraprestação pelo Poder Público respectivo.
Conclui-se, ante o exposto, que o Princípio da Continuidade do Serviço Público,
impede a interrupção do fornecimento de energia elétrica, por falta de pagamento, apenas e
tão somente quanto aos serviços públicos essenciais, assim entendidos, por analogia,
aqueles constantes no rol, do art. 10, da Lei nº 7.783/89.
Some-se ao entendimento acima exposto o fato de haver expressa previsão
legislativa que autoriza a suspensão do fornecimento de energia elétrica de serviços nãoessenciais em caso do inadimplemento do usuário do serviço:
Lei Federal Nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995 - Dispõe sobre o
regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos
previsto no art. 175 da Constituição Federal, e dá outras
providências.
(... omissis ...)
Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de
serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme
estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo
contrato.
(... omissis ...)
§ 3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua
interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso,
quando:
(... omissis ...)
II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da
coletividade.
Sobre esta possibilidade de suspensão do fornecimento do serviço prestado pela
concessionária prevista na Lei Federal Nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, assim se
manifesta Luiz Alberto Blanchet:
“O artigo transcrito acima ressalva que certas circunstâncias
justificam a interrupção, não configurando, em conseqüência,
afronta ao princípio da permanência do serviço público: são as
situações decorrentes de razões de caráter técnico ou de segurança
das
instalações
utilizadas
na
execução
do
serviço
e
o
inadimplemento, por parte do usuário, considerado o interesse da
coletividade. Ao excetuar estas duas circunstâncias, o § 3º
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estabelece como pressupostos a emergência ou o prévio aviso, e o
faz alternativa e não cumulativamente, ou seja, se a situação não
for de emergência, mas os usuários forem previamente avisados a
interrupção é admissível.
O segundo motivo legitimador da suspensão – inadimplemento do
usuário – põe termo a equivocado entendimento de alguns no sentido
de que o consumidor de energia elétrica, por exemplo, mesmo quando
inadimplente teria direito à continuidade do serviço. O princípio
da permanência do serviço público ampara exclusivamente aqueles
que se encontram em situação juridicamente protegida, e o
consumidor inadimplente evidentemente não se encontra em tal
situação, inclusive em fincão do princípio da igualdade dos
usuários perante o prestador de serviço. Além do que, até por
motivos de natureza material e não apenas jurídica, não pode
prevalecer aquele paradoxal entendimento, pois basta que o
inadimplemento seja maciço ou apenas considerável para se
inviabilizar qualquer prestador de serviço público resultando, daí
sim, na interrupção do serviço, e não apenas em relação ao
inadimplente, mas também para o usuário que sempre cumpriu sua
contraprestação. Esta regra é válida para todo serviço público
cuja
remuneração
(paga
pelo
usuário)
represente
uma
contraprestação, ou contrapartida, de caráter contratual, pela
prestação do serviço remunerado por tarifa (preço público), e não
por taxa, e tampouco por preço político.” (Luiz Alberto Blanchet,
Concessão e Permissão de Serviços Públicos, 1ª Ed. Curitiba:
Editora Juruá, 1995, pág.41/42)
A hipótese de suspensão da execução do serviço por inadimplemento do usuário
prevista na Lei Federal Nº 8.987/95 assim reverbera em nossa jurisprudência:
Acórdão
Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 840864
Processo: 200600782470 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA
Data da decisão: 17/04/2007 Documento: STJ000743797
Fonte DJ DATA:30/04/2007 PÁGINA:305
Relator(a) ELIANA CALMON
Ementa
ADMINISTRATIVO – SERVIÇO PÚBLICO – CONCEDIDO – ENERGIA ELÉTRICA –
INADIMPLÊNCIA.
1. Os serviços públicos podem ser próprios e gerais, sem
possibilidade de identificação dos destinatários. São financiados
pelos tributos e prestados pelo próprio Estado, tais como
segurança pública, saúde, educação, etc. Podem ser também
impróprios e individuais, com destinatários determinados ou
determináveis. Neste caso, têm uso específico e mensurável, tais
como os serviços de telefone, água e energia elétrica.
2. Os serviços públicos impróprios podem ser prestados por órgãos
da administração pública indireta ou, modernamente, por delegação,
como previsto na CF (art. 175). São regulados pela Lei 8.987/95,
que dispõe sobre a concessão e permissão dos serviços públicos.
3. Os serviços prestados por concessionárias são remunerados por
tarifa, sendo facultativa a sua utilização, que é regida pelo CDC,
o que a diferencia da taxa, esta, remuneração do serviço público
próprio.
10
4. Os serviços públicos essenciais, remunerados por tarifa, porque
prestados por concessionárias do serviço, podem sofrer interrupção
quando há inadimplência, como previsto no art. 6º, § 3º, II, da
Lei 8.987/95. Exige-se, entretanto, que a interrupção seja
antecedida por aviso, existindo na Lei 9.427/97, que criou a
ANEEL, idêntica previsão.
5. A continuidade do serviço, sem o efetivo pagamento, quebra o
princípio da igualdade das partes e ocasiona o enriquecimento sem
causa, repudiado pelo Direito (arts. 42 e 71 do CDC, em
interpretação conjunta).
6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, provido.
Indexação
Aguardando análise.
Data Publicação
30/04/2007
Acórdão
Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 794539
Processo: 200501834506 UF: RJ Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da decisão: 08/08/2006 Documento: STJ000703933
Fonte DJ DATA:31/08/2006 PÁGINA:239
Relator(a) DENISE ARRUDA
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL EM AGRAVO DE
INSTRUMENTO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. INAPLICABILIDADE DO ART. 542,
§ 3º, DO CPC.
ALEGADA VIOLAÇÃO DOS ARTS. 165, 294, 458, II, E
535, II, DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA.
SUSPENSÃO. MUNICÍPIO. DISCUSSÃO JUDICIAL DO DÉBITO ARGÜIDO PELA
CONCESSIONÁRIA. INADIMPLÊNCIA NÃO-CONFIGURADA. SUPOSTA OFENSA AOS
ARTS. 17, DA LEI 9.427/96, E 476 DO CC/2002. EXAME PREJUDICADO.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA E
JURÍDICA. NÃO-CONHECIMENTO. PRECEDENTES DO STJ.
... omissis ...
3. É lícito à concessionária interromper o fornecimento de energia
elétrica se, após aviso prévio, o usuário permanecer inadimplente
(Lei 8.987/95, art. 6º, § 3º, II).
4. Tratando-se de pessoa jurídica de direito público, prevalece
nesta Corte Superior a tese de que o corte de energia é possível,
desde que não aconteça de forma indiscriminada, preservando-se as
unidades públicas essenciais.
Data Publicação
31/08/2006
Acórdão
Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL – 721119
Processo: 200500121590 UF: RS Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da decisão: 11/04/2006 Documento: STJ000686006
Fonte DJ DATA:15/05/2006 PÁGINA:167
Relator(a) LUIZ FUX
Ementa
ADMINISTRATIVO. CORTE DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA.
RECONHECIMENTO, PELO MUNICÍPIO, DA INADIMPLÊNCIA DO PAGAMENTO DA
TARIFA
RELATIVA
À
ILUMINAÇÃO
PÚBLICA.
"UNIDADES
PÚBLICAS
ESSENCIAIS".
ILEGALIDADE.
SEGURANÇA
PÚBLICA.
INTERESSE
DA
11
COLETIVIDADE.
GARANTIA.
PRINCÍPIOS
DA
ESSENCIALIDADE
E
CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. OBSERVÂNCIA.
1. A Corte Especial, no julgamento do AgRg na SS 1497/RJ,
perfilhou o entendimento de que: "AGRAVO REGIMENTAL - SUSPENSÃO DEFERIMENTO - FORNECIMENTO DE ENERGIA - CORTE POR INADIMPLÊNCIA MUNICÍPIO - POSSIBILIDADE.
1. A interrupção do fornecimento de energia elétrica por
inadimplemento não configura descontinuidade da prestação do
serviço público. Precedentes.
2. O interesse da coletividade não pode ser protegido estimulandose a mora, até porque esta poderá comprometer, por via reflexa, de
forma mais cruel, toda a coletividade, em sobrevindo má prestação
dos
serviços
de
fornecimento
de
energia,
por
falta
de
investimentos,
como
resultado
do
não
recebimento,
pela
concessionária, da contra-prestação pecuniária.
... omissis ...
2. Destarte, é lícito à concessionária interromper o fornecimento
de energia elétrica se, após aviso prévio, o consumidor de energia
elétrica permanecer inadimplente no pagamento da respectiva conta.
3. A Lei de Concessões, entretanto, estabelece que é possível o
corte desde que considerado o interesse da coletividade (artigo
6º, § 3º, inciso II, da Lei 8.987/95), que significa não
empreender o corte de utilidades básicas de um hospital ou de uma
universidade, quando a empresa tem os meios jurídicos legais da
ação de cobrança.
(...)
3. O princípio da continuidade do serviço público assegurado pelo
art. 22 do Código de Defesa do Consumidor deve ser amenizado, ante
a exegese do art. 6º, § 3º, II da Lei nº 8.987/95 que prevê a
possibilidade de interrupção do fornecimento de energia elétrica
quando, após aviso, permanecer inadimplente o usuário, considerado
o interesse da coletividade.
4. Quando o consumidor é pessoa jurídica de direito público,
prevalece nesta Turma a tese de que o corte de energia é possível,
desde que não aconteça de forma indiscriminada, preservando-se as
unidades públicas essenciais.
5. A interrupção de fornecimento de energia elétrica de Município
inadimplente somente é considerada ilegítima quando atinge as
unidades públicas provedoras das necessidades inadiáveis da
comunidade, entendidas essas - por analogia à Lei de Greve – como
"aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a
sobrevivência, a saúde ou a segurança da população", o que se
perfaz na hipótese.
Data Publicação
15/05/2006
Registre-se que, com muito acerto, resolveu o Tribunal de Justiça de Pernambuco,
seguindo a mesma linha de raciocínio do Superior Tribunal de Justiça, colocar em súmula,
a possibilidade de a concessionária de serviço público vir a promover a suspensão do
fornecimento de energia elétrica de município inadimplente:
Súmula 014 do Tribunal de Justiça de Pernambuco - É possível a
suspensão do fornecimento de energia elétrica a pessoa jurídica de
direito público, desde que preservadas as unidades que prestam
serviços essenciais à comunidade.
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Por força dos argumentos elencados, reiteramos que o Princípio da Continuidade
do Serviço Público impede a interrupção do fornecimento de energia elétrica, por falta de
pagamento, apenas e unicamente quanto aos serviços públicos essenciais, assim entendidos,
por analogia, aqueles constantes no rol, do art. 10, da Lei nº 7.783/89, podendo desta forma,
à luz da legislação aplicável (art. 6º, § 3º, II, da Lei 8.987/95) e de entendimentos
jurisprudenciais como a súmula nº 14 do Tribunal de Justiça de Pernambuco, ser “possível
a suspensão do fornecimento de energia elétrica a pessoa jurídica de direito público, desde
que preservadas as unidades que prestam serviços essenciais à comunidade”.
Verifica-se, por tudo o que foi até aqui exposto, que a diferença de
posicionamentos sobre as repercussões sociais da questão do fornecimento da energia
elétrica repousa basicamente na 1ª instância das decisões judiciais, onde vemos nitidamente
um Estado-Juiz dissociado da preocupação do Estado-Administração de garantir o perfeito
funcionamento do setor elétrico brasileiro.
No STJ, longe das pressões exercidas pelas lamúrias dos Administradores
Municipais, que chegam ao Juiz da comarca com lágrimas nos olhos e em genuflexão,
clamando para que não tenham a energia cortada, já há uma consonância de objetivos entre
o Estado-Juiz e o Estado-Administrador.
À exemplo do STJ, deveria todo o Poder Judiciário ter ciência do seu papel de
preservar a higidez do sistema elétrico nacional, pois caso se perpetuem as decisões que
convertem as distribuidoras de energia elétrica em instituições de caridade e benemerência,
corremos o sério risco de inviabilizar os investimentos necessários para manutenção (e
sobretudo ampliação) do sistema de distribuição de energia no Brasil e, sem uma rede de
distribuição, de nada valerão os esforços (tardios) para a construção de novas hidrelétricas,
pois não haverá malha hábil para distribuir a nova energia gerada.
Ou seja, ou se passa a ter uma postura mais dura para com os municípios que
almejam perpetuar-se na inadimplência, ou corremos o risco de pagarmos um pesado
tributo, que nos alijará da competição por mercados mais atraentes e que repelirá
investimentos externos no Brasil.
Um país que não consegue garantir uma relação harmoniosa entre os atores que
contracenam no palco de um setor tão estratégico como é o da geração de energia, está
fadado à bancarrota, pois a energia é a mola-motriz para o desenvolvimento e para a
produção de riquezas.
Por fim, há de ser dito que, a continuar o Estado-Juiz a tratar o setor de
distribuição de energia elétrica como Robin Hood tratava os asseclas do Xerife de
Nottingham, o Brasil não irá agendar jogos noturnos na Copa do Mundo que ele sediará em
2014, vez que não haverá energia elétrica para ligar os refletores.
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Inadimplência municipal às distribuidoras de energia elétrica: Um