PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRÁTICA REGISTRADO(A) SOB N° ACÓRDÃO i mm um um um mi mu nu mu i mi *03187623* Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 990.10.168488-8, da Comarca de Araraquara, em que é apelante CLAUDIA FERNANDA ZERAIB BOZZI sendo apelado PROMOTOR JUSTIÇA VARA INFÂNCIA E JUVENTUDE DE ARARAQUARA. ACORDAM, em Câmara Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "REJEITARAM A MATÉRIA PRELIMINAR, E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO V. ACÓRDÃO, V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento Desembargadores VICE teve a PRESIDENTE participação dos (Presidente sem voto), MARTINS PINTO E ENCINAS MANFRÉ. São Paulo, 13 de setembro de 2010. MARIA OLIVIA ALVES RELATORA PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CÂMARA ESPECIAL Apelação n° 990.10.168488-8 Voto n° 6.353 Recorrente: Claudia Fernanda Zeraib Bozzi Recorrido: Ministério Público Comarca: Vara da Infância e Juventude de Araquara - SP APELAÇÃO - Ação Civil Pública - Destituição de Conselheira Tutelar - Negligência em atendimento de criança e Improbidade Administrativa - Acolhimento do pedido - Cerceamento de defesa, por ausência de processo administrativo - Inocorrência Acesso ao Poder Judiciário garantido pela Constituição Federal Preliminar já rejeitada em sede de agravo de instrumento Defesa amplamente garantida e exercida - Prova entretanto extremamente frágil, para o decreto de destituição - Demora no atendimento não evidenciada - Autoria da adulteração da nota fiscal não demonstrada — Laudo pericial a registrar ausência de condições de atribuir a autoria à requerida - Pagamento do valor, sem reconhecimento do ato - Provimento do recurso, com rejeição da matéria preliminar. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público contra Claudia Fernanda Zeraib Bozzi, conselheira tutelar da Cidade de Araraquara, para obtenção da destituição desta última do referido cargo, em razão de violação de seus deveres funcionais, quais sejam negligência no atendimento de uma criança e adulteração de nota fiscal, para apropriação de valor maior que o registrado. Conforme sentença de fls. 306/315, o pedido foi julgado procedente. 1 / PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CÂMARA ESPECIAL Apelação n° 990.10.168488-8 Voto n° 6.353 Inconformada, apela Claudia e sustenta, preliminarmente, nulidade processual, por cerceamento de defesa. No mérito, aduz que não foi omissa no atendimento da criança e que não praticou o ato de improbidade descrito na petição inicial (fls. 317/336). O representante do Ministério Público ofertou contrarazões e pugnou pelo não provimento do recurso e, mantida a sentença, no mesmo sentido foi à manifestação da digna Procuradoria de Justiça (fls. (fls. 338/346 e 354/358). É o relatório. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e, rejeitada a matéria preliminar, no mérito, dou-lhe provimento. Primeiramente, a preliminar argüida pela recorrente já constitui matéria preclusa, pois foi objeto do julgamento do agravo de instrumento, cuja cópia está a fls. 359/364. De qualquer forma, convém repetir, não há que se falar em cerceamento de defesa. E que Lei Municipal não pode excluir a legitimidade do Ministério Público, conforme reiteradamente reconhecido, para ajuizar ação civil pública, em questões de interesse da Infância e Juventude, nem pode excluir a possibilidade de apreciação do fato diretamente, pelo Poder Judiciário, nos termos do artigo 5 o e 201, da Constituição Federal. Além do mais, verifica-se que, como bem sustentou o ilustre Procurador de Justiça, a recorrente teve ampla oportunidade de 2. L\J0^—- PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CÂMARA ESPECIAL Apelação n ° 990.10.168488-8 Voto n"6.353 defesa. No mérito, contudo, o recurso merece provimento. Cumpre reconhecer que a prova reunida no processo realmente deixou duvidosa a conduta de violação dos deveres funcionais, atribuída à requerida. A conduta de omissão e negligência a ela imputada, no tocante ao atendimento da criança Lorrainy, por estar cuidando de interesses profissionais particulares, não ficou demonstrada. r E certo que, segundo o testemunho do conselheiro Alan, a recorrente teria sido avisada de que Lorrainy estava com ferimentos, decorrentes de espancamento do pai, por volta das 17h30min, e que, como consta de fls.08 (autos em apenso) o atendimento teria ocorrido somente após as 23 horas. Mas não há prova segura de que a recorrente tenha deixado de adotar qualquer providência, durante todo esse mencionado intervalo de tempo. Em sua defesa, ao contrário, Claudia afirmou que, muito embora não tenha se dirigido imediatamente ao local, não deixou de prestar o atendimento que lhe foi solicitado. Explicou que, como era de conhecimento de todos, realmente trabalhava na faculdade Uniara, de segunda a sexta-feira das 14 às 18 horas, mas em horário compatível com seus compromissos junto ao Conselho. No entanto, naquele dia, não estava trabalhando, e o plantão, aliás, não era de sua responsabilidade, mas se dispôs a auxiliar. Assim, como no Conselho não havia outro veículo para atendimento, e soube que a mãe da criança já a havia levado ao 3. ^ \ r ~ — PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CÂMARA ESPECIAL Apelação n° 990.10.168488-8 Voto n" 6.353 atendimento médico, aguardou o veículo que atendia o CTII e, depois foi ao Pronto Socorro, onde confirmou o atendimento e, por fim, dirigiu-se à residência da família, onde após confronto com o genitor, que acabou preso, é que encaminhou todos para a Delegacia de Polícia. E essa versão não ficou refutada, quer pela prova oral, quer pela prova escrita. Ao contrário, há registro de que a recorrente estava na Delegacia de Polícia, no horário em que, segundo consta da petição inicial, estaria trabalhando, ao invés de ir prestar o atendimento solicitado (fls. 57). Há ainda o cartão de ponto juntado à fl. 70 do apenso, onde se verifica que, naquele dia, a recorrente saiu de seu posto de trabalho às 18hs. Além disso, os demais conselheiros acabaram confirmando que o plantão era de responsabilidade outra conselheira e que a recorrente se dispôs a auxiliar. A testemunha Tatiana, também conselheira (fls. 100/101 do apenso e 119/128 do principal), confirmou que era ela a responsável pelo plantão naquele dia, mas teve que faltar por problemas pessoais (fls. 125/126). Além disso, há depoimento de um dos motoristas do Conselho, Ailton, a confirmar a versão da recorrente, no sentido de que somente um dos carros do Conselho Tutelar estava disponível e que, assim, a recorrente teve que acompanhar outra ocorrência antes de prestar atendimento à criança. Por outro lado, muito embora o conselheiro Alan inicialmente, tenha confirmado o retardo no atendimento, por "ouvir dizer'"' PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CÂMARA ESPECIAL Apelação n° 990.10.168488-8 Voto n° 6.353 (fls. 39/40 do apenso), em Juízo, disse que não se recordava dos fatos de modo claro. A testemunha Cristiane também inicialmente relatou que Claudia teria atendido seu telefonema, no dia dos fatos, na Faculdade Uniara. Mas, em juízo, alterou sua versão e passou a relatar que não sabia, com certeza, o local onde teria ocorrido o atendimento telefônico e quais as medidas que foram adotadas pela conselheira. Por fim, a testemunha Luciano (fls. 154/162) relatou que a recorrente era perseguida por Cristiane, que chegava a induzir pessoas a delatarem a conselheira. Como se vê, quanto a esta imputação, não há prova suficiente a evidenciar que a recorrente tenha negligenciado no atendimento da criança Lorrayni. Ao contrário, verifica-se que, sem estar programada, ela assumiu plantão de outra colega, não teve veículo, para maior agilidade e, mesmo assim, foi constatar se a criança havia sido socorrida e como estava em sua casa. Quanto à segunda imputação, no sentido de que a recorrente teria adulterado nota fiscal, para se apropriar de valor do erário público, do mesmo modo, cumpre reconhecer que não há prova suficiente nesse sentido. Como consta dos autos, a recorrente e os conselheiros Luciano e Alan foram a um evento, na Cidade vizinha, e, ali efetuaram despesas com alimentação, cujo reembolso pediram junto à Prefeitura de Araraquara. , r\ OAJ( PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CÂMARA ESPECIAL Apelação n° 990.10.168488-8 Voto n° 6.353 Ocorreu que, segundo ficou apurado, uma das notas fiscais fornecidas, pelo grupo havia sido adulterada, de R$ 6,00, para R$ 36,00 (fls. 41/42 do apenso). Chamados a prestar esclarecimentos, Alan disse que a nota era relativa a despesas de Cláudia e esta, sem qualquer explicação, pagou a diferença. Mas, em juízo, a recorrente, em sua defesa, disse ter efetuado o pagamento, para evitar problemas para o grupo e atribuiu a despesa a Alan (fls. 69 do apenso e 32/33 dos autos principais). Disse que a devolução do dinheiro foi a medida apontada para que o problema fosse resolvido. A testemunha Tatiana, por sua vez, como narrou, relacionou, inicialmente, tais gastos a Alan que, chamado no setor responsável, apontou a recorrente como sua possuidora (fls. 119/128). É certo que, em juízo, Alan voltou a afirmar que a nota era referente a despesas de Cláudia, mas aduziu ter sugerido a esta última que "pagasse a nota" (fls. 129/140) e que é costume ocorrerem problemas com as notas apresentadas, sendo o pagamento ao setor administrativo meio comum para se resolver tal questão. E nenhuma das outras testemunhas soube esclarecer nem sequer se a nota fiscal se referida efetivamente às despesas de Cláudia ou de Alan. Ninguém soube informar também nada sobre a adulteração da nota fiscal. Além disso, referidas testemunhas também relataram que era costume o pagamento ao setor administrativo, em razão de erros e 6^ /^r "' PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO CÂMARA ESPECIAL Apelação n" 990.10.168488-8 Voto n° 6.353 rasuras nas notas fiscais apresentadas. Assim, o fato de ter assumido o pagamento do valor faltante, não pode ser interpretado como reconhecimento de culpa ou responsabilidade pelo fato, pela recorrente. Por fim, o laudo grafotécnico de fls. 223/228, após confronto do material escrito pela recorrente, trouxe a conclusão de que não era possível, com tal material, elucidar a autoria da falsificação. Além disso, para essa prova só foi recolhido material relativo à escrita da recorrente e não dos demais conselheiros. Portanto, a prova reunida no processo também mostra-se frágil demais, para se reconhecer que a recorrente tenha praticado o ato de improbidade que lhe foi atribuído. Assim sendo, respeitado o entendimento contrário, impunha-se a absolvição da recorrente, por insuficiência probatória. Diante do exposto, pelo meu voto, dou provimento ao recurso, para julgar improcedente esta ação. MARIA OLÍVIA ALVES Relatora 7^