O ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO AO ALUNO QUE APRESENTA CEGUEIRA ADQUIRIDA DOMINGUES, Alexandre H. S.1 LEME, Carolina Guerreiro 2 FREITAS, Sônia Maria Moreno de 3 PITOLI, Ana Irina dos Santos 4 RESUMO: Através do Atendimento Educacional Especializado (AEE) é possível efetivar o convívio da diversidade no mesmo contexto escolar e auxiliar os alunos em suas necessidades educacionais especiais. Mesmo com a desmistificação da Deficiência Visual, que antes era vista como um infortúnio, onde reinavam alguns sentimentos como dó e pena, que ainda fazem parte da realidade do indivíduo que apresenta cegueira, e as dificuldades encontradas no cotidiano desta pessoa muitas vezes ainda não são compreendidas. Buscou-se observar a prática pedagógica em um Centro de Atendimento Especializado em Deficiência Visual – CAE-DV no município de Londrina-PR, além de analisar a aquisição do Sistema Braille por um aluno que apresenta cegueira adquirida e conhecer a prática e técnicas ensinadas ao aluno nas aulas de Orientação e Mobilidade (OM). O aluno observado tem 24 anos e apresenta amaurose com percepção de luz em olho esquerdo, causado por tumor cerebral. Possui fundo de olho apresentando atrofia do nervo óptico bilateral e alteração macular, não havendo a possibilidade de recuperação visual. Os encontros do aluno no CAE-DV são produtivos e os resultados surgem a cada dia através da apropriação do Sistema Braille (leitura e escrita), Soroban, Orientação e Mobilidade (OM) e Atividades de Vida Autônoma (AVA), porém, em alguns momentos o aluno ainda apresenta insegurança em relação a sua nova condição, pois encontra-se em processo de reabilitação. Palavras chave: Cegueira Adquirida, AEE, CAE-DV. 1 Graduado em Letras Anglo-Portuguesas pela Universidade Estadual do Norte do Paraná. Especialista em Educação Especial. E-mail: [email protected] 2 Pedagoga, professora e Guia Intérprete de alunos surdocegos no Centro de Atendimento Especializado em Surdocegos e Múltiplos Deficientes Sensoriais – CAE Surdocegueira de Londrina-PR. Especialista em Educação Especial e Atendimento Educacional Especializado. E-mail: [email protected] 3 Especialista em Deficiência Visual, professora do Centro de Atendimento Especializado em Deficiência Visual – CAE -DV de Londrina- PR. E-mail: [email protected] 4 Pedagoga e Especialista em Educação Especial, professora do Centro de Apoio Pedagógico para Atendimento às Pessoas com Deficiência Visual - CAP - Londrina e professora do Centro de Atendimento Especializado em Surdocegos e Múltiplos Deficientes Sensoriais- CAE-Surdocegueira de Londrina- PR. E-mail: [email protected] 1 INTRODUÇÃO A Constituição Federal de 1988 apresenta a educação especial “não como substitutiva da escolarização comum, mas como a oferta do AEE (Atendimento Educacional Especializado) em todas as etapas, em todos os níveis e em todas as modalidades educacionais, com atendimento, preferencialmente, na rede pública de ensino.” (RODRIGUERO et al. 2010, p. 05). Devido algumas mudanças do sistema educacional, o Atendimento Educacional Especializado (AEE) passou ser visto de maneira positiva, efetivando o convívio da diversidade no mesmo contexto escolar. (RODRIGUERO et al. 2010). Atuando no AEE, o professor especialista deve: Desenvolver atividades adequadas às necessidades ou condições educacionais especiais dos alunos. Essa adequação contemplará: enriquecimento curricular para as altas habilidades/superdotação; ensino da Língua Brasileira de Sinais (Libras) para alunos com surdez; ensino da língua portuguesa escrita para alunos com surdez; ensino da comunicação aumentativa e alternativa (CAA); ensino do código Braille, Soroban, Orientação e Mobilidade e atividades da vida autônoma e social para alunos cegos; ensino com a utilização da Tecnologia Assistiva e o desenvolvimento de atividades escolares que contribuam para o desenvolvimento das funções mentais superiores dos alunos. (RODRIGUERO et al., 2010, p. 07). Uma das deficiências atendidas pelo Atendimento Educacional Especializado é a Deficiência Visual (DV) que pode ser entendida como um dos principais sentidos da fisiologia humana. A Deficiência Visual é geralmente, referenciada à pessoa cega, mas nem todos acometidos pela Deficiência Visual são iguais, pois alguns indivíduos podem não enxergar nada, assim como outros podem ter resquícios da visão. (GIL, 2009). No presente trabalho serão enfocadas as observações feitas no AEE de um Centro de Atendimento Especializado em Deficiência Visual (CAE/DV), no município de Londrina-PR. As aulas observadas consistem no ensino do Sistema Braille, Soroban, e Orientação e Mobilidade (OM). O aluno observado tem 24 anos e apresenta amaurose com percepção de luz no olho esquerdo, causado por tumor cerebral. Possui no fundo de olho atrofia do nervo óptico bilateral e alteração macular, não havendo a possibilidade de recuperação visual. 2 MÉTODO A pesquisa em questão se pauta em observações de apenas um aluno, por isso é caracterizada como qualitativa, sendo operacionalizada com base no Estudo de Caso. Na análise de Triviños (1987 apud ALMEIDA 2008) esse tipo de pesquisa é entendida como uma categoria cujo objeto é uma unidade que se analisa profundamente, não podendo ser generalizada. Os dados não podem ser quantificados, mas sim descritos e interpretados. No entanto é mais limitado, pois muitas observações se restringem ao caso em estudo. No presente estudo, buscou-se reunir o maior número de informações detalhadas possíveis sobre o sujeito da pesquisa, com o objetivo de compreender e descrever o seu processo de desenvolvimento por meio do atendimento recebido no Centro de Atendimento Especializado em Deficiência Visual – CAE-DV, bem como as particularidades desse processo. Segundo Minayo (2004) esse tipo de pesquisa se refere a questões particulares e corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis, como no caso da pesquisa quantitativa. Porém o sucesso da pesquisa depende do bom senso do pesquisador, que deve ser imparcial, procurando não interferir nos depoimentos dos entrevistados. Dentro dos pontos positivos de tal metodologia para o estudo em questão, pode se destacar que o interesse se pauta no processo não apenas nos resultados. Dentro dessa abordagem Marconi e Lakatos (2004) esclarecem que a observação ajuda o pesquisador a identificar e obter provas em torno dos objetivos, o que possibilita um contato mais estreito do pesquisador com o fenômeno pesquisado. 2.1 SUJEITO DA PESQUISA O relato foi contado pelo aluno na primeira entrevista ao ser matriculado no CAE-DV Londrina-PR, no dia 07 de fevereiro de 2012. I. M., hoje com 24 anos, perdeu a visão em ambos os olhos no mês de abril, em 2008. Aos 21 anos, após um dia de trabalho exaustivo em uma fábrica de sacos, encontravase bastante cansado e suado. Ao chegar em sua casa foi tomar um banho frio e neste momento sentiu náuseas e sua visão começou a ficar dupla. Procurou, acompanhado de sua mãe, um posto de saúde que o encaminhou para o Hospital Universitário (HU), que o conduziu para o Hospital do Câncer (HC) para a realização de exame. Após isso, retornou para o HU onde ficou internado por 18 dias, com repouso absoluto. No HU verificaram pressão intraocular alta e conferiu-se através do exame de sangue suspeita de contaminação de veneno por manipulação de agrotóxicos, necessitando fazer biópsia. O aluno relata que a biópsia foi feita no HU e após esse procedimento, ao acordar, ouviu barulhos de vídeo game dentro da cabeça. I. M. ouviu, também, o médico mencionar que ele não sobreviveria por mais de 24 horas, pois o tumor havia se espalhado pelo cérebro. Neste instante, o batimento cardíaco de I. M. teve um aumento significativo, pois ele não estava dormindo, como o médico pensava. Quando os pais de I. M. saíram da sala da UTI, o paciente disse ao médico que ouviu a conversa, mas o médico explicou para I. M. que ele estava ouvindo coisas. Felizmente a afirmativa do médico não aconteceu. Tempo depois, a visão de I.M. voltou à sua condição normal e em 2009 tornou a cursar o 3º ano do Ensino Médio. Ainda no primeiro bimestre, a visão dupla retornou, mas o aluno não desanimou e passou a assistir às aulas tampando um dos olhos com a mão. Para dirigir seu jipe, I. M. utilizava um tampão em um dos olhos e disfarçava-o com óculos escuros. Com o passar dos meses, I. M. foi enxergando menos, até chegar na atual situação: a cegueira. A primeira coisa que fez após perceber que não enxergaria mais foi vender as duas coisas que ele mais amava: seu jipe e seu computador. Após esgotarem-se todas as possibilidades em outros exames, realizou-se a ressonância magnética. Neste exame detectaram um tumor maligno no cérebro. Iniciou-se em 06 de agosto de 2009 a radioterapia. Atualmente o aluno continua o tratamento no HC repetindo os exames e recebendo acompanhamento de três em três meses. O aluno relata que no olho direito enxerga a cor preta e no olho esquerdo a visão é acinzentada, com pouca percepção de luz, conseguindo identificar o claro do escuro. A síntese clínica do aluno é relatada através de laudo médico fornecido pela Drª Cristiane Assami Chuí CRM-PR 16.834 datado em 06 de janeiro de 2012 que indica que o aluno apresenta amaurose com percepção de luz em olho esquerdo, causado por tumor cerebral. Possui no fundo de olho atrofia do nervo óptico bilateral e alteração macular. Não há como recuperar a visão. 2.2 LOCAL DA PESQUISA O procedimento metodológico de observação foi realizado no Centro de Atendimento Especializado em Deficiência Visual – CAE-DV localizado nas dependências do Colégio Estadual Hugo Simas, Ensino Fundamental e Médio, situado à rua Pio XII, 195, na região central do município de Londrina, no norte do Paraná. O período das observações ocorreu entre 26 de março a 02 de julho, do ano de 2012, totalizando 15 encontros de 04 horas cada, no período matutino. Nos dias atuais estão matriculados 50 alunos cegos, entre eles alunos que apresentam baixa visão e cegueira. O horário de funcionamento do CAE-DV ocorre de segunda à sexta-feira nos períodos matutino e vespertino, das 7h30min às 11h55min e das 13h20min às 17h40min, respectivamente. 2.3 INSTRUMENTOS DE REGISTRO Além dos dados registrados em um diário de campo durante todo período de observação, foi realizada também entrevista com o próprio aluno, na qual I. M. foi informado sobre o interesse da produção do presente artigo e o aluno foi receptivo, aprovando e colaborando com a ideia. Houve a confecção de um portfólio com a compilação das principais atividades de I. M. objetivando a sistematização da pesquisa. 3 RESULTADOS O aluno matriculou-se no Atendimento Educacional Especializado (AEE) em Deficiência Visual no dia 07 de fevereiro de 2012. O CAE-DV está situado nas dependências do Colégio Estadual Hugo Simas – Ensino Fundamental e Médio, localizado no município de Londrina-PR. Sua avaliação teve início no dia 22 de março de 2012. O aluno chegou ao CAE-DV acompanhado de sua mãe, que se apresentou muito receptivo a novos conhecimentos apresentados pelo grupo de professores especialistas e muito dedicada e amorosa frente a esta nova condição de seu filho, porém o aluno apresentava insegurança, muito deprimido e com baixa autoestima. Assim, este foi o maior desafio encontrado antes de iniciar a proposta metodológica. A equipe do CAE-DV o acolheu com muito carinho e responsabilidade, dando-lhe conforto emocional e mostrando-lhe que a vida segue apesar das situações inesperadas que a ela nos apresenta. Todos os profissionais uniram forças para auxiliá-lo neste momento tão delicado em que o aluno se encontrava: fragilizado e sem esperanças de um futuro melhor. Quando a professora percebeu que já estava estabelecido um vínculo de confiança entre o aluno e ela, compreendeu-se que este era o momento oportuno para iniciar uma nova proposta educacional através de um novo fazer pedagógico, no qual seria oportunizado o ensino do Sistema Braille. Foi iniciado o desenvolvimento do sentido háptico (tátil) através da confecção de bolinhas de papel crepom, algodão, utilizando as falanges dos dedos indicadores, médios e polegares. Desenvolveu-se, também neste processo, a esfoliação das mãos com açúcar e creme hidratante para desenvolver a sensibilidade tátil. Esse processo foi rápido devido ao empenho do aluno. Posterior a este processo deu-se inicio ao pré-Braille, com uma proposta metodológica através de tais instrumentos: texto escrito em Braille e prancheta Brailex (prancheta de madeira perfurada). A professora especialista em deficiência visual mostrou um pequeno texto escrito em Braille para sua percepção tátil, de como seria sua leitura e escrita sobre essa nova perspectiva. Conheceu a cela braille através do Brailex, medindo 40cm x 18cm, com furos agrupados de seis em seis, reproduzindo as celas Braille. As celas são dispostas em três linhas horizontais, cada uma com oito celas. A prancheta tem um corte que identifica o canto superior direito e acompanha uma caixa com 72 pinos metálicos sem ponta. No dia 08 de março de 2012, o aluno compreendeu os 6 pontos da cela Braille na posição de leitura e foram trabalhados os movimentos de pinça. A professora especialista escreveu o nome do aluno na cela em madeira representada pelos pontos escritos com pinos, onde o aluno conseguiu ler seu nome com a falange do dedo indicador direito. Após a leitura de seu nome, o aluno conheceu a reglete e o punção, tudo descrito detalhadamente pela professora tanto o material tátil, quanto seu valor pedagógico. Neste momento, explicou-se para o aluno que a escrita em Braille, utilizando-se a reglete, é realizada da direita para a esquerda, sendo que a leitura é realizada como a nossa leitura em tinta, da direita para a esquerda. Sua primeira atividade utilizando-se a reglete foi completar todos os pontos da cela braille de uma linha (cela cheia). Ao retirar o papel da reglete o aluno foi ensinado a virar o papel para iniciar a leitura tátil em Braille e pôde perceber ao efetuá-la os pontos que havia deixado de colocar, momento este que a professora aproveitou para reforçar os pontos (ponto 1, ponto 2 e ponto 3) que na leitura ficam do lado direito da cela. Na sequência, foi realizada a apresentação dos outros pontos (4, 5 e 6), ainda remetendo-se a atividades de pré-Braille. A alfabetização através do letramento se deu a partir do trabalho realizado com o ditado (dos pontos) formando as letras de seu nome, pois ainda se encontrava em aquisição de conhecimento das letras do alfabeto. As letras de seu nome foram as primeiras letras em que o aluno teve contato e significado, para escrita e leitura em Braille. O trabalho aconteceu de forma contextualizada através de palavras e produção de pequenas frases com as letras já interiorizadas pelo aluno. O processo de alfabetização através do letramento aconteceu no período de março a junho de 2012, onde o aluno teve o conhecimento de todas as letras do alfabeto, vogais acentuadas, inclusive dos sinais de pontuação e números. O aluno recebe atendimento dois dias na semana: segundas e sextas-feiras, durante três horas aulas por atendimento, no período matutino das 7h30min às 10h. Nas segundas-feiras, no período vespertino, o aluno recebe atendimento especializado em Orientação e Mobilidade (OM). Os atendimentos acontecem em concordância com a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, 2008 que define o AEE como: O atendimento educacional especializado identifica, elabora e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade que eliminem as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando as suas necessidades específicas. As atividades desenvolvidas no atendimento educacional especializado diferenciam-se daquelas realizadas na sala de aula comum, não sendo substitutivas à escolarização. (BRASIL, 2008) O próximo passo nesta construção de conhecimento é iniciar o Atendimento Voltado às Tecnologias Assistivas, em específico com o ensino do NVDA – leitor de tela em código aberto para Windows que auxilia deficientes visuais na inclusão digital. Tecnologia assistiva – TA é um termo ainda pouco conhecido, utilizado para identificar todo o arsenal de recursos e serviços que contribuem para proporcionar ou ampliar habilidades funcionais de pessoas com deficiência e, consequentemente, promover vida independente e inclusão. (TURCHIELLO et al., 2012, p. 06). Entre as atribuições do Atendimento Educacional Especializado – AEE contempla-se também o ensino da Orientação e Mobilidade (OM) que foi iniciado no dia 23 de abril de 2012 por uma professora especialista em Educação Especial e formação específica em OM. Entende-se orientação como “o processo de utilizar os sentidos remanescentes para estabelecer a própria posição e o relacionamento com outros objetos significativos no meio ambiente.” E mobilidade é “a habilidade de locomover-se com segurança, eficiência e conforto no meio ambiente, através da utilização dos sentidos remanescentes.” (WEISHALN, 1990 apud MACHADO et al. 2003). Conforme Machado et al. (2003) apresentam, é fundamental que o deficiente visual tenha o conhecimento corporal, para que possa se movimentar com segurança, através da OM. É preciso dar atenção especial a: esquema corporal, lateralidade e direcionalidade, planos do corpo e suas partes, conceito corporal e imagem corporal. “Esses conceitos devem ser enriquecidos com outros da mesma importância, como: posição e relação com o espaço, forma, medidas e ações, ambiente, topografia, textura e temperatura.” (MACHADO et al., 2003, p. 38). No primeiro dia de atendimento especializado em Orientação e Mobilidade, conheceu sua professora, interagiu através de uma conversa informal, onde a professora iniciou uma avaliação diagnóstica sobre o quadro clínico e emocional que o aluno encontrava-se. O aluno apresentava insegurança, baixa autoestima, questionava sobre o fato de ter ficado cego, conflitos familiares (separação dos pais), sentindo-se culpado. A professora especialista mostrou-se sensível à sua história e com muita ética e responsabilidade lidou com a situação de forma profissional, porém iniciando uma cumplicidade que o auxilia muito até hoje. Essa insegurança é proveniente da falta de estímulo e faz com que [...] apresente um processo de desenvolvimento mais lento. Assim, os programas de atendimento devem ser individualizados e terem como referência o estudo de caso, no qual sejam adequadamente investigados os aspectos bio-psico-sociais, condições sensóriomotoras e história de vida. A partir desses dados devem ser oferecidas atividades variadas para propiciar o desenvolvimento das habilidades para perceber e discriminar similaridades no processo perceptual que são fundamentais para a formação de conceitos (WELSH, 1980 apud MACHADO et al., 2003). Na segunda semana de atendimento, a professora iniciou as noções básicas de OM, tais como posicionamento com guia vidente, como segurar em alguns pontos de articulação que oportunizaria segurança e percepção ao caminhar, correr, subir e descer escadas, meio fios, corrimãos e outros com o guia vidente, como segurar no cotovelo de seu guia. Foi trabalhado também o rastreamento com o dorso da mão sobre superfícies que indicam uma direção a seguir: parede, corrimão, balcão, móveis e etc. Segundo o Manual das Habilidades Básicas de Orientação e Mobilidade, 2004 o rastreamento se dá com o dorso da mão (de preferência apenas com o dedo mínimo e anular) a linha guia. Os dedos devem estar semi refletidos e relaxados. Oportunizou-se a técnica para o cumprimento, com o objetivo de proporcionar ao indivíduo uma forma eficiente e socialmente adequada para cumprimentar outras pessoas. Na terceira semana trabalhou-se retomando conceitos e práticas vivenciadas em aula anterior e avançando para a aquisição de outras atividades. Trabalhou-se como se dá a passagem estreita com o guia vidente (portas, entre carros, entre cadeiras e outros), rastreamento de assentos de cadeiras e sofás, andar em fileiras perfiladas rastreando assentos de cadeiras em auditórios e cinema. Trabalhou-se também a troca de lado com guia vidente, como achar trincos, maçanetas e puxadores em portas. Na quarta semana, desenvolveram-se atividades de percepção auditiva, tais como barulho em sua volta, pessoas conversando, carros, motos, sirenes, latidos de cachorro, crianças brincando, passarinhos cantando e objetos que caem no chão, além da busca de objetos em cima da mesa. Na quinta semana, trabalhou-se com proteções superiores e inferiores, com procura de objetos caídos no chão. Na sexta semana, foi oportunizada a apresentação da bengala longa, assim como seu manuseio (abrir e fechar a bengala), e início do ensino de rastreamento, identificação de obstáculos e como se proteger dos mesmos. O aluno teve também o aprendizado de descer e subir escadas com a utilização da bengala longa. Atualmente o aluno frequenta as aulas de Orientação e Mobilidade (OM), assiduamente de forma pontual, apresentando muito interesse, curiosidade, porém, com certa insegurança. Outra atividade que o professor de OM realizou com I.M. foi a visita domiciliar que oportuniza melhor reconhecimento do ambiente para o aluno com esta nova condição. Todos os conteúdos citados acima continuam sendo trabalhados de forma sistemática e com muita disciplina. 4 DISCUSSÃO Antes de ser acometido pela deficiência visual, o aluno foi reprovado no 3º ano do ensino médio, em 2007. No ano subsequente, em 2008, o aluno desanimou-se e deixou os estudos por conta própria. Coincidentemente no mesmo ano, descobriu o tumor cerebral, fazendo com que o aluno culpasse a sua nova condição associando, erroneamente, o câncer ao fracasso escolar. I. M. relata que antes de perder a visão gostaria de cursar Educação Física, mas hoje não se sente preparado fisicamente, pois apresenta cansaço e acredita que seus músculos atrofiaram pela ausência de atividade física. O aluno acredita estar mais preparado para seguir uma das duas carreiras acadêmicas: Direito ou Administração de Empresas, porém ainda não sabe qual escolherá. A partir das observações, percebeu-se a grande preocupação dos professores especialistas em colaborar com a continuação da formação educacional do aluno, que ficou estagnada após a sua perda visual. No CAE-DV, I.M. recebe atividades de complementação curricular em concordância com a proposta do AEE: ensino do sistema Braille, ensino do Soroban, Orientação e Mobilidade (OM) e Atividades de Vida Autônoma (AVA). Essas atividades respaldam o aluno oferecendo condições para o seu retorno ao ensino regular, para que conclua o Ensino Médio e posteriormente ingresse no Ensino Superior. I. M. comentou em sua última entrevista que se sente motivado a retomar seus estudos, pois agora está cercado de pessoas que o incentiva. É importante entender que esse apoio é muito importante, mas I. M. ainda precisa acreditar em seu potencial. 5 CONCLUSÃO Quando uma criança é acometida por alguma deficiência congênita, a família se prepara para o futuro dela, seja pensando nos desafios sociais que enfrentará nas escolas que a aceitarão ou nas dificuldades do dia-a-dia. Porém, quando a deficiência surge no decorrer da vida, após anos de experiência e vivência, há um confronto muito grande entre a expectativa de vida que se tinha e as novas experiências que acontecerão. Um dos maiores objetivos da equipe de especialistas que atuam com o aluno I.M., é promover melhores condições educacionais, sociais e emocionais resultando em uma melhor qualidade de vida, proporcionando independência e autonomia. O Centro de Atendimento está proporcionando condições para que o aluno possa retornar a sua vida acadêmica regular o mais rápido possível. O aluno acreditava ser impossível seu retorno a vida escolar, onde foi interrompida no 2º ano do ensino médio, mas agora percebe a cada dia que esta realidade esta muito próxima. Em seus relatos sobre sua nova condição, I. M. se mostrou, em vários momentos, insegurança. Parece querer encontrar um culpado pela deficiência visual em sua vida. Nas aulas de OM, o aluno permanece com dúvidas e demonstra medo em aprender o novo, porém sempre com um sorriso no rosto e bom humor. As práticas e técnicas de OM que estão sendo introduzidas ao aluno são de grande valia e importância para a sua independência e, com certeza, dentro de alguns meses I. M. estará apto a andar pelas calçadas e atravessar as ruas com segurança e da maneira correta. REFERÊNCIAS ALMEIDA, Célia Aparecida faria. A aquisição da Linguagem por uma surdocega pré linguística numa perspectiva sociocognitivo- interacionista. 2008. 337f. Dissertação (Doutorado em Linguística) – Universidade de Brasília, Brasília, 2008. BRASIL. Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008. GIL, Flávia Ceccon Moreira. A criança com deficiência visual na escola regular. 2009. 176 f. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009. MACHADO, Edileine Vieira et al. Orientação e mobilidade: Conhecimentos básicos para a inclusão do deficiente visual. Brasília: MEC, SEESP, 2003. 167p. MARCONI, Marina de Andrade; LAKATOS, Eva Maria. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2004. MINAYO, Maria Cecilia de Souza. Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2004. RODRIGUERO, Celma Regina Borghi et al. Atendimento Educacional Especializado. 2010. 42f. Apostila do Curso de Especialização em Atendimento Educacional Especializado, modalidade a distância, Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2010. TURCHIELLO, Priscila, et al. Atendimento Educacional Especializado. UFSM, Santa Maria, 2012.