TITULO: A redução fenomenológica praticada por Rogers: um caminho para a realidade
do sujeito1.
AUTOR: Mauro Martins Amatuzzi (PUC-Campinas)
RESUMO
Pretendo retomar o conteúdo de uma palestra recente sobre o assunto, para discuti-la com o grupo.
O percurso de Husserl, aprofundando a redução no contexto da filosofia, foi semelhante ao de
Rogers aprofundando sua abordagem no contexto da psicoterapia. Podemos dizer que Husserl parte
de uma colocação entre parênteses da realidade do mundo e de uma concentração no próprio ato de
conhecimento. Aqui começaria a filosofia. Aprofundando isso, ele fala de uma redução ao que é
essencial daquilo que se manifesta no ato de conhecer. Chega assim a uma ciência eidética.
Finalmente, ele fala de uma ultrapassagem do eu empírico, para se chegar ao eu transcendental.
Chegando nesse ponto há uma redescoberta do mundo a partir da intencionalidade do sujeito e da
intersubjetividade. Paralelamente, Rogers parte de um não considerar a realidade objetiva daquilo
que o cliente em terapia visa quando diz o que diz. Ele inaugura assim a escuta propriamente
psicológica. Num segundo momento, Rogers fala de um deixar de lado tanto as teorias da pessoa
que fala como as teorias do próprio terapeuta. Há aqui um aprofundamento da redução em direção
ao puro vivido. E, finalmente, ele fala de um deixar de lado qualquer intenção de remediar as coisas
a qualquer custo, porque ela pode obstruir a comunicação profunda que é a única coisa capaz de
reativar o centro da pessoa. Abre assim caminho para a realidade da pessoa que, por si só, é capaz
de orientá-la para os melhores caminhos.
PALAVRAS-CHAVE: fenomenologia, psicoterapia, abordagem centrada na pessoa.
(Segue o texto reescrito da palestra realizada em momento anterior ao fórum)
Creio que minha fala poderá ser mais viva se eu me propuser, não a dar uma aula completa
e didaticamente apresentada, mas a compartilhar com vocês algumas inquietações que
tenho em torno do tema. Essas inquietações estão ligadas a um estudo que fiz com Marcela
Carpes (uma aluna de Psicologia em Iniciação Científica) e que já resultou num texto
enviado (em 2009) para publicação na revista Memorandum. Aqui vai, pois, também meu
agradecimento à Marcela.
Trabalho apresentado no III Fórum Paulista da Abordagem Centrada na Pessoa.
Os pensamentos e inquietações a que me referi tentam aproximar dois nomes importantes.
Um é o fundador do movimento fenomenológico (não digo da “fenomenologia” porque esta
não é uma instituição; vejo-a mais como um movimento): o filósofo Edmund Husserl. E o
outro é o fundador da Abordagem Centrada na Pessoa (que também não é uma instituição,
mas um modo de ser e de fazer psicologia), de quem me sinto muito próximo: Carl Rogers,
um psicólogo americano.
A primeira coisa que a gente precisa ter bem claro nessa tentativa de aproximação entre
Husserl e Rogers, ou, nessa tentativa de aproximação da fenomenologia com a psicologia, é
que Husserl não era psicólogo. Isso parece óbvio, mas é preciso clarear o que significa. O
que Husserl escrevia não tinha por finalidade orientar o atendimento psicológico de
pessoas. As suas construções ficam na área da filosofia. E mesmo quando ele reflete sobre a
psicologia como ciência, e propõe a psicologia fenomenológica como nova forma de
exercer o pensamento nessa área, ele mesmo não se dedica sistematicamente a fazer isso e
nem pretendeu construir orientações para um novo modelo de prática de ajuda psicológica a
pessoas. Os problemas que Husserl tinha eram de ordem filosófica, não eram problemas
práticos de como lidar com as pessoas. É verdade que o psicólogo, consciente daquilo que
faz, precisa filosofar um pouco também, porque a psicologia se fundamenta numa teoria
psicológica que, por sua vez, depende de uma visão de homem, e esta é elaborada
criticamente em ambiente filosófico, digamos assim, e em ligação estreita com uma visão
de conhecimento e, portanto, com uma epistemologia.
Essa questão epistemológica, de como entender o conhecimento, está no centro do
pensamento filosófico. Foi justamente essa questão que ocupou Husserl em primeiro lugar.
Ele estava preocupado, basicamente, com “acertar as contas com o conhecimento”. Se não
entendermos a relevância da questão do conhecimento, vai ficar muito mais difícil entender
o que Husserl fala.
Até onde vai o nosso conhecimento? Qual o seu valor? Ele me permite saber coisas a
respeito de que âmbitos de realidade? Nosso conhecimento é, sem dúvida, uma construção
interior; então qual é a relação dessa construção com a realidade em si mesma? Até que
ponto nosso conhecimento (e, portanto, nossa ciência) retrata a realidade? Se não sentirmos
isso como problema, será difícil entender porque Husserl escreveu tudo que escreveu. E o
que eu disser aqui não fará nenhum sentido para vocês. Husserl está longe de ser um
filósofo fácil. Todos os filósofos, com raríssimas exceções, são difíceis (principalmente
numa época pragmática e imediatista como a nossa). Mas se precisamos ler 10 vezes um
texto filosófico, quando se trata de Husserl precisamos ler 20 vezes.
Falamos aqui da ciência moderna, aquela que segue o método empírico quantitativo, isto é,
que comprova através de medidas. O tipo de descrição que a ciência nos dá do mundo, por
esse seu método, esgota para nós o sentido de realidade? Podemos esperar da ciência isso?
Esse é um aspecto da pergunta de Husserl sobre o conhecimento.
Husserl participou de toda a empolgação que se teve com as conquistas científicas, e, ao
mesmo tempo, participou de toda a decepção que se teve com o fato de que a ciência não
conseguia trazer respostas aos problemas humanos. A ciência e a tecnologia, sua filha,
trouxeram equipamentos de destruição em massa, o que assustou muito a humanidade, e
toda aquela esperança que era depositada no progresso científico, não se verificou em
termos de uma vida social mais equitativa, mais igual. As guerras e as revoluções do século
20 estão ai para mostrar isso para a gente. O próprio Husserl em um dos livros dele, sobre
A Crise da Ciência Européia, fala da ciência e da crise européia, como se uma coisa
dependesse profundamente da outra. A crise européia estava dependente de uma concepção
de ciência, o que equivale a dizer que estava dependente de uma forma de relação cognitiva
do homem com o mundo. O modo como nos relacionamos com o mundo no ato científico,
expressa o modo de relação no qual depositamos nossa confiança. E então a questão sobre o
que podemos esperar do conhecimento científico (nos moldes da ciência moderna empírica
e quantitativa) e o que não podemos esperar, torna-se uma questão crucial. Como Husserl
enfrentou essa questão?
Uma primeira coisa que Husserl percebeu foi que é possível separar o ato de conhecer do
objeto conhecido. E ele falou isso em grego: noésis é o ato de conhecer e noema é o objeto
conhecido. Ele poderia ter falado (e falou também) em latim: cogitatio é o pensamento, o
ato de pensar, e cogitatum é aquilo que eu estou pensando. Separando o ato do objeto, a
cogitatio (o pensamento, o ato de conhecer) se sustentaria por si. Então, posso fazer
abstração do mundo externo, da realidade externa e olhar para dentro de mim e examinar
meu ato de conhecimento, como uma coisa passível de ser examinada em si mesmo,
independentemente da existência ou não do objeto de conhecimento. A isso ele chamou de
redução ou de epoché (lê-se epoquê), outra palavra grega, que tem a ver com “época”, em
português. O que é uma época? É um recorte do tempo; é isso que é uma época. Então,
epoché é um recorte epistemolótico. Faço um recorte: só considero o meu ato de
conhecimento e não considero o objeto conhecido; deixo o objeto “entre parênteses”.
Husserl dizia que em nossa vida cotidiana estamos sempre funcionando a partir do que a
gente chama de “atitude natural”: pressupomos a existência de um mundo. Eu aqui estou
pressupondo que vocês estão ai, que vocês não são uma ilusão minha; e vocês estão
pressupondo que eu estou aqui, com esse microfone na mão. Na prática do viver cotidiano
ninguém duvida disso. Essa é a nossa atitude natural: não separamos o ato de conhecer de
seu objeto. Se saindo daqui alguém tentar furtar a sua carteira enfiando a mão no seu bolso
ou na sua bolsa, evidentemente que você não vai entrar numa atitude reflexiva; você
permanece na atitude natural e trata de tomar providências urgentes para não perder a sua
carteira, ou, se não der certo, para sustar seu cartão de crédito junto ao banco, por exemplo.
Essa é a nossa atitude natural. Vivemos dentro do pressuposto que as coisas são reais, que
elas existem. Mas se você conseguir colocar entre parênteses as coisas do mundo real e
virar a flecha de seu pensamento (a flecha de sua atenção), habitualmente voltada para fora,
se você virar essa flecha para dentro e olhar não mais o objeto conhecido, mas o ato de
conhecer, então perceberá que o próprio ato de conhecer se sustenta em si mesmo. A essa
virada da flecha do conhecimento para dentro, Husserl chamou de atitude reflexiva, atitude
filosófica ou atitude fenomenológica, e marcou sua diferença em relação à atitude natural.
Fazer isso (colocar-se em atitude reflexiva) quando um ladrão estiver tentando lhe roubar,
seria uma insensatez completa. A atitude reflexiva não vale em muitos momentos da nossa
vida cotidiana, mas ela vale quando você está examinando as bases do seu pensamento.
Esse foi o primeiro passo da redução, com o qual se inaugura a reflexão filosófica. Por isso
Husserl considera a redução (ou epoché) como sendo o método da filosofia. Mas nesse
primeiro passo há outra coisa importante, e aqui Husserl usa outra palavra grega:
taumázein. Essa palavra foi usada por Aristóteles e significa “admirar-se”. Em português
“taumaturgo” é alguém que faz coisas admiráveis, espantosas. Taumázein é admirar-se,
espantar-se, sair do óbvio. Não sei se vocês já passaram por essa experiência: você vem
vivendo a sua vidinha de todo dia, e de repente se assusta com o óbvio. Eu me assusto; olho
para minha mão e me assusto; isto é a minha mão, e ela me aparece como diferente ou até
mesmo estranha. Olho para meu rosto com barba e me assusto; sinto a barba com a mão e
me espanto. De repente tomo consciência que existo, e me assusto. E não consigo explicar
para meu amigo que susto é esse. Seria preciso que ele sentisse algo parecido para entender.
É um susto filosófico. A filosofia se inaugura por um susto, por um admirar-se. É uma
repentina saída da atitude natural. Seguindo a pista desse susto, você vai se abrindo para
questões básicas da vida, como o destino, o sentido da vida, o sentido do mundo ou da
existência de tudo. Assim que você sai da atitude natural, e se volta para si mesmo numa
atitude reflexiva, fica pensando: qual o sentido da minha vida? Por que é que eu estou aqui?
O que é que eu estou fazendo aqui? Que mundo é esse? São questões filosóficas, que não
fazem muito sentido na atitude natural cotidiana. São questões que não podem ser
respondidas com o método científico de verificação e medida.
Entrando nessa atitude reflexiva, Husserl descobriu que nela seria possível criar um outro
tipo de ciência. E ele a denominou de ciência eidética, outra palavrinha grega que significa
referente à forma, ao aspecto, à aparência, ao que se manifesta. A ciência eidética consiste
em descrever as essências das coisas, tal como elas estão na sua experiência humana.
Então, eu posso fazer uma psicologia eidética. Por exemplo, posso descrever o que é uma
emoção só refletindo a minha própria experiência (fazendo redução) ou conversando com
as pessoas a respeito das experiências delas (ajudando-as a fazer redução, isto é, a sair da
atitude natural e entrar numa atitude reflexiva). Posso descrever o que é a emoção (a
essência do que sinto quando posso denominar a isso de “emoção”); o que é ciúme (a
essência do que sinto quando posso denominar a isso de “ciúme”); o que é pânico, e o que
mais se quiser.
E por esse caminho, voltando-nos para nossa própria experiência em uma atitude reflexiva,
podemos ir mais longe um pouco. Podemos não apenas descrever como as coisas aparecem
na experiência (na vivência), mas examinando como elas aparecem, é possível também
produzir conhecimentos sobre possíveis desdobramentos futuros dessas coisas. Se elas
aparecem assim e assado, então, vão prosseguir o seu rumo histórico desdobrando-se dessa
e dessa maneira. É possível montar uma ciência assim com rigor, e não dizendo qualquer
tipo de coisa.
O método nessas ciências eidéticas consiste, primeiro, em colocar entre parênteses o
mundo, o objeto, e olhar o próprio ato, olhar a experiência do objeto tal como ela se mostra
em mim (redução); e, depois, procurar o que se mostra aí como essencial. Faço isso por
variações imaginativas: por exemplo, retiro uma característica e verifico se ainda posso
dizer que é o que busco. Por esse processo (chamado justamente de “variação imaginativa”)
vou chegando ao essencial, ao que não pode ser retirado sem que se mude a essência
(redução eidética).
Mas a subjetividade humana é mais profunda ainda. Husserl considerou que era preciso dar
mais um passo a mais em sua aproximação. Já com a ciência eidética há um
aprofundamento da redução e poderíamos falar de “redução eidética”: não apenas
desconsiderar o mundo real, mas concetrar-se na essência do que aparece na experiência.
Teremos agora um aprofundamento mais radical. Vejamos. O ato de conhecer está dentro
de você, é imanente, e o objeto conhecido está fora de você, é transcendente (transcendente
quer dizer que está além). Então o que está além da sua interioridade é o transcendente.
Mas, na busca de conhecer o próprio conhecimento, surge a pergunta: por que nós nos
dedicamos a buscar, com rigor e método, a fundamentação e o alcance do conhecimento?
Essa pergunta não pode ser respondida usando o método científico, ela extrapola o método
científico. Fazendo uma comparação simples: o método científico procura medir as coisas,
e você pode até medir a inquietação do cientista, medir o grau de sua curiosidade; mas essa
medida não nos dá o sentido da ciência, o sentido da busca do conhecimento simplesmente
porque esse sentido não se mostra com números, com quantidades. É uma questão
eminentemente qualitativa. Para Husserl, esse foi justamente o grande equívoco da ciência
do tempo dele, no século 20. Essa ciência nos prometeu muita coisa (e em grande parte
cumpriu essa promessa com, por exemplo, os artefatos bélicos que produziu), mas nos fez
perdermos o sentido da realidade (e aqui ela decepciona: o que faremos com todas essas
bombas atômicas?). A ciência estuda a realidade e não o sentido. Então não podemos
esperar dela justamente aquilo que orienta nossa vida, inclusive nosso fazer ciência (ou
buscar conhecimento). Ou nós o encontramos por outro caminho, ou pensaremos que
vamos poder orientar nossa vida através da tecnologia. Merleau-Ponty, um filósofo
fenomenólogo francês, diz assim: a ciência constrói muitas afirmações sobre a realidade,
mas ela não consegue dizer o que é essa realidade. Ela diz quantos milésimos de
milímetros, ou quantos anos-luz, tem essa realidade, mas o que é essa realidade, ela não
consegue dizer. Husserl, que foi professor de Merleau-Ponty, diz que precisamos recuperar
esse sentido de realidade. Mas onde se encontra ele? Encontra-se no lugar mais profundo
dentro de nós. Embora eu tenha colocado entre parênteses o objeto de conhecimento, posso
encontrar, no ato de conhecer, uma referência a algo que está fora dele, fora do ato. Essa
referência a algo que está fora do ato de conhecer, ele denomina intencionalidade. Todos os
nossos atos psicológicos são intencionais. Cada um deles tem uma relação com algo que
não é ele próprio. Um sentimento meu tem uma intencionalidade (é um sentimento por
alguma coisa), um amor meu tem uma intencionalidade (é amor por alguém), uma raiva
tem uma intencionalidade (tenho raiva disto ou daquilo), um conhecimento tem uma
intencionalidade, uma recordação tem uma intencionalidade. Então aqui Husserl vai dar um
terceiro passo: o da redução transcendental. Permanecendo dentro da pessoa, permanecendo
na atitude filosófica e fenomenológica, ele vai além do eu empírico e descobre um eu
transcendental. O que é isso?
O eu empírico é o eu que descrevemos a partir da ciência: um conjunto de características
que se aplicam a uma determinada pessoa. Posso, por exemplo, preencher uma lista préestabelecida de adjetivos qualificativos escolhendo aqueles que se aplicam a mim: (alto,
baixo, gordo, magro, bonito, feio, inteligente, burro, afetuoso, não afetuoso, impulsivo,
controlado etc...). A soma total destas características aplicáveis a você corresponde bem de
perto àquilo que você pensa que é. Isso que você pensa que é faz parte do que Husserl
denominava de eu empírico: o eu mensurável, o eu ao qual a ciência tem acesso. Mas se, de
acordo com o que sentimos, não pudermos nos reduzir a esse tipo de eu empírico,
considerando que na experiência de “eu” há algo mais, então devemos procurar além do
empírico (no sentido da ciência) e buscar um eu transcendental. O que é esse eu
transcendental? Corresponde àquilo que nós denominamos de sujeito humano (por oposição
a objeto humano). O eu empírico é, de certa forma, o resultado de todas as determinações
que pesam sobre o ser humano e fazem com que ele seja como é; reúne todas as influências
internas e externas de sua vida, toda sua história passada. Mas fica fora disso aquela
capacidade de iniciativa, aquela capacidade de ser sujeito, de definir os próprios rumos de
vida. Isso que você está constantemente exercendo e que a ciência não consegue pegar (ela
só consegue pegar o eu-objeto), é o que Husserl chama de eu transcendental.
Ocorre que esse eu transcendental é muitíssimo importante numa concepção de psiquismo.
O psiquismo que você consegue descrever, aquele que você analisa exaustivamente com o
método científico, não é ainda o eu transcendental, o verdadeiro eu. O eu transcendental é
você sendo capaz de dizer não, é você tendo um mínimo de domínio sobre os seus
condicionamentos, é você tomando a iniciativa. Merleau-Ponty falava que a ciência nos deu
uma imagem de ser humano como resultado de causas determinantes (o homem-resultado).
Mas o que há de próprio em nossa experiência subjetiva é que somos ativos, respondemos
ao mundo, tomamos posição face a ele: não somos apenas resultado, somos iniciadores. O
ser humano é capaz de definir o seu rumo de vida, é capaz de influenciar as influências que
pesam sobre ele. É o esquecimento disso que faz com que sejamos tratados de modo
análogo a como se tratam os animais. A capacidade de ser sujeito é de outro nível de
complexidade no ser humano. O psiquismo não se restringe ao eu empírico (eu-objeto),
aquela parte de mim que é descritível pelo método científico; ele vai mais longe, e a ciência
que estamos acostumados a praticar, que tem métodos rigorosos e medidas quantitativas,
não chegou ainda a tocar o “eu-sujeito”, que é o que o Husserl chama de eu transcendental.
Ela fica com o “eu-objeto”. Falamos muito hoje em dia de cidadania para nos referirmos
justamente a esse lado ativo do ser humano, da pessoa. O psiquismo precisa ser pensado
muito mais profundamente se quisermos atender à complexidade do ser humano. Por isso é
que a grande discípula do Husserl, Edith Stein, considerava útil olhar para o ser humano e
pensar nele em termos de corpo, psiquismo e espírito. Espírito!? Sim, o espírito é o eu
transcendental, é a capacidade de dizer não, a capacidade de decidir sobre o próprio rumo
de vida, a capacidade de não viver sempre ligado ao imediato, de não viver como uma
resposta definida ao estímulo imediato, é a capacidade de recuo que tem o ser humano, e
que lhe garante duas coisas absolutamente fundamentais: o pensamento abstrato
(capacidade de pensar o próprio pensamento) e a liberdade (capacidade de decidir seu rumo
de vida). Isso me permite afirmar que eu não sou simplesmente um conjunto de respostas
determinadas a estímulos. É claro que os estímulos produzem respostas em nós, mas nós
podemos também nos posicionar face a eles (embora nem sempre o façamos). Além da
redução eidética, existe uma redução transcendental através da qual eu deixo para trás o euobjeto para chegar no eu-sujeito (eu transcendental).
Uma outra maneira de nos aproximarmos da subjetividade transcendental é percebemos que
um outro ser humano não é um mero objeto. De certa forma, com ele é mais adequado falar
de diálogo do que falar de manipulação. Então encontramos o eu transcendental também
em nossa experiência do outro, em nossa experiência de outras pessoas. Eles têm um núcleo
ativo assim como eu. Elas não se reduzem a ser meros objetos para mim. Há algo nelas que
resiste a mim.
É claro que uma psicologia verdadeiramente humana deve levar em conta o eu-sujeito, a
pessoa mobilizada por um desafio, o sujeito que reage a partir de um dinamismo interno.
Essa psicologia não pode parar no eu empírico e deve chegar ao eu transcendental. Mas
fazer isso equivale a ultrapassar todos os métodos através dos quais se lidava com o eu
empírico. Como Carl Rogers fez isso? Muito se poderia dizer a respeito desse assunto, mas
quero aqui me limitar ao caminho de Rogers para dialogar com o íntimo das pessoas.
A primeira coisa importante, então, é lembrar que Rogers é um psicólogo. Se formos
interpretá-lo como filósofo, ele certamente deixará a desejar. Então é preciso ter cuidado na
comparação de Rogers com Husserl. A perspectiva do Rogers é: o que eu posso fazer de
melhor para uma pessoa que vem me procurar pedindo ajuda? É essa sua pergunta. Já a
pergunta de Husserl é outra: qual o alcance do conhecimento? Então, com muito cuidado
indagamos: o que podemos ver no psicólogo Rogers a respeito dos três graus de redução?
Existiria em Rogers também um aprofundamento da redução até chegar subjetividade mais
radical da pessoa que lhe procura?
Em Husserl os três graus de redução que vimos podem ser resumidos assim. Na busca de
conhecer o conhecimento, em um primeiro grau, você considera o ato de conhecer e põe
entre parênteses o objeto conhecido, põe entre parênteses a realidade do objeto. No segundo
grau, que é o das ciências eidéticas (que incluem o estudo fenomenológico dos dinamismos
sociais), aquilo que era transcendente, que existia fora do sujeito que conhece, fica menor,
por assim dizer. É que você encontra no sujeito uma referência ao objeto e, posteriormente,
uma referência às possibilidades do objeto. Por exemplo, você encontra na sua própria
experiência subjetiva características do objeto (fenomenologia eidética que busca a essência
das coisas tal como ela se mostra a você), e mesmo (na fenomenologia dos movimentos
sociais) você encontra respostas sobre o que você, ou nós, devemos fazer na sociedade; e
encontra essas respostas quando considera as possibilidades de desdobramento do objeto.
Depurando o exemplo: quando um grupo se pergunta o que deve fazer na sociedade, pode
encontrar respostas examinando a própria experiência do grupo, pois nela encontrará
inscritas as possibilidades de ações futuras. Isso tudo está no segundo grau da redução: a
redução eidética. O terceiro grau equivale a você dizer: cuidado; a pessoa humana não se
reduz àquilo que a ciência consegue estudar dela. E por aí encontra um transcendente ao eu
empírico; e é por isso que ele chama esse transcendente de transcendental, porque é o que
está além do empírico, mas não na direção de fora (a realidade transcendente ao
conhecimento) e sim na direção de dentro (a subjetividade transcendental). Mas isso, para o
psicólogo, é uma sugestão a se repensar a psicologia, para além de uma concepção estreita
de psiquismo.
Podemos dizer que encontramos também em Rogers, e a partir de sua pergunta (que era
diferente da de Husserl, como vimos), três graus diferentes de redução. Trata-se de redução
tal como podemos ver na postura de um psicoterapeuta, por exemplo. O que devo deixar de
lado quando eu estou conversando com alguém, para compreender esse alguém e assim
facilitar seu processo pessoal?
Em primeiro lugar, devo deixar de lado qualquer julgamento sobre aquilo que a pessoa
falou. De fato, nossa tendência natural, quando alguém nos fala alguma coisa, é dizer:
“Você está errado! Pensando assim você só vai encontrar mais dificuldades”, por exemplo.
Nossa tendência natural é fazermos um juízo de realidade daquilo que a pessoa nos diz. É
um primeiro grau de redução ou epoché, você ser capaz de escutar o que a pessoa está
falando sem emitir nenhum juízo de realidade sobre o conteúdo daquilo que ela está
falando. A isso denominamos, justamente, uma escuta psicológica.
Mas, Rogers vai mais longe. Ele fala que você deve não apenas colocar entre parênteses a
realidade a que se refere àquilo que a pessoa está falando, mas também a teoria sobre o
funcionamento psíquico da pessoa, ou qualquer teoria explicativa daquilo que ela está
falando. E por de lado não só as teorias que possam estar atuando sobre você que escuta,
como também as teorias que o próprio sujeito que fala tem sobre aquilo que ele fala ou
sobre ele mesmo. É um segundo grau de redução prática, já mais difícil. Falando
positivamente, essa redução significa você estar totalmente aberto para captar a própria
experiência imediata da pessoa, para além de todos os pensamentos construídos por ela
mesma ou por você, ou por quem quer que seja. Poderíamos chamar a isso de uma certa
ingenuidade, digamos assim, que permite captar o vivido para além do pensado. É preciso
não encaixar aquilo que pessoa está falando em algum esquema teórico prévio seu, ou
mesmo em algum modelo prévio da própria pessoa. É preciso ir além dos modelos
interpretativos que a própria pessoa possa ter e que você possa ter. Então esse segundo grau
de redução nos coloca já em confronto com algo muito profundo na pessoa. Algo que não
se deixa enquadrar até mesmo em modelos culturais, num certo sentido; é algo
transcultural, embora sempre se manifeste em enquadres culturais determinados. Rogers
não usa nem a palavra redução nem a palavra epoché, mas, segundo ele, você não pode
ficar preso nas idéias ou no pensado, se quiser captar a experiência imediata do outro. Se na
primeira redução eu defino a conversa como uma conversa psicológica, na segunda, eu
tenho acesso aos sentimentos, à vivência do sujeito.
Mas há um terceiro grau redução (ou renúncia) que aparece quando Rogers diz que devo
deixar de lado o querer remediar as coisas a qualquer custo. Essa frase me fez pensar muito.
O verdadeiro psicólogo que quer entrar em contato profundo com a realidade da outra
pessoa, para além até do sentimento dela, e chegando em seu dinamismo de sujeito,
chegando em seus sentidos, precisa deixar de lado a intenção de resolver qualquer
problema. Se ele tiver a intenção de trazer a solução, estará impedindo a pessoa de ser
sujeito, por que nesse caso quem resolveu o problema foi ele às custas de uma importante
limitação da autonomia criativa do sujeito. Rogers diz, com toda sua simplicidade: “eu
renunciei a querer remediar tudo a qualquer preço”. Com isso ele falava, em nossas
palavras, a favor de uma atitude contemplativa, e não de uma atitude pragmática, quando se
escuta alguém com a intenção de mergulhar em sua realidade subjetiva. Quando a atitude é
essa, constata ele, a pessoa encontra seus próprios caminhos, desenvolve-se com autonomia
e encontra os melhores modos de sair das situações problemáticas em que ela vive. Quando
ela encontra alguém que consegue entrar na realidade mais radical de seu dinamismo, com
respeito total, ela se sente apoiada em sua tarefa existencial de viver criativamente.
Como seria isso para o Husserl? O correspondente a essa terceira redução está no tema da
intersubjetividade. Se você olha nos olhos de uma pessoa, consegue mergulhar em seu
mundo subjetivo. Até mesmo quando você olha nos olhos de um cachorrinho de estimação,
por exemplo, ou de um gatinho. Esse seu olhar, quando, por exemplo, você olha para o seu
namorado ou para a sua namorada com amor, é completamente diferente do olhar do
oculista. O que o oculista quer ver no seu olho? Ele não quer ver a sua alma ou a sua
subjetividade. Ele nem precisa pressupor a existência disso. O que ele quer ver está muito
mais perto da anatomia do que da subjetividade. O oculista não precisa saber nada de
subjetividade ou de alma. E mais, se algo dessa ordem interferir em seu olhar, ele estará
correndo sérios riscos de ser um mau oculista. Nisso Rogers e Husserl se aproximam muito:
eles usam o mesmo método da redução, embora com finalidades diferentes. Um para
clarear o problema do conhecimento e outro para abrir caminho para a experiência vivida
numa relação facilitadora de crescimento. Husserl chega na necessidade de um eu
transcendental, e Rogers formula as reduções necessárias para um contato humano
profundo e criativo. Husserl acredita que a redução desvenda uma face do humano que
tinha ficado escondida (o eu como sujeito) e cria a necessidade de um novo conceito (o eu
transcendental, que é afinal o eu sujeito). Rogers, um americano pragmático, acredita que
essa tríplice redução é que abre o caminho para os dinamismos da pessoa em pleno
funcionamento, e é isso que lhe interessa.
Perguntas
Ouvinte 1: Você falou sobre o eu empírico e sobre o eu transcendental. Antes de vir aqui
para o evento, eu estava andando no shopping, como faz muito tempo que não fazia isso, eu
me permiti caminhar com aquela postura de Sócrates, e que me fez dizer: quanta coisa
existe nesse shopping que eu não preciso para ser feliz! Eu adoto essa postura de Sócrates
para não me deixar seduzir por aqueles cento e cinqüenta mil itens que tem num shopping;
caso contrário vou sair daqui cento e cinqüenta mil vezes infeliz. E como nós vivemos
numa sociedade de consumo, numa sociedade que nos obriga a ser um eu empírico: como
sobreviver, ou como dar voz a um eu transcendental, se a gente não consegue encontrar
eco?
Resposta: Então, nós somos bombardeados a todo o momento para nos reduzirmos ao eu
empírico. Não tenho dúvida nenhuma sobre isso. Basta ligar a televisão, basta considerar as
exigências escolares, basta considerar, às vezes, como nossos pais nos condicionam. Ou
seja, nós somos bombardeados a esquecermos o nosso eu transcendental, a esquecermos
daquela parte ativa do nosso eu. Vamos dizer assim, o eu empírico é a parte que diz: Sim,
senhor! Sim, senhora! Enquanto o eu transcendental é aquela parte que diz: Não sei!
Podemos pensar sobre isso, pode ser que você tenha razão, pode ser que não. Então, eu
acho que o primeiro passo para isso é você desconfiar que existe alguma coisa mais
profunda para além do eu empírico, e isso vale para o terapeuta também e não só para nossa
postura de passeio num shoping. Se nem o terapeuta desconfia disso, nem a pessoa que o
procura, a terapia vai consistir numa mudança de condicionamento somente: de um
condicionamento pior para um condicionamento melhor somente. Pode ser até muito útil
essa troca de condicionamentos, mas isso não é despertar o sujeito ativo que existe dentro
de nós, e que é a nossa parte principal, que é o nosso verdadeiro eu. Então estou dizendo
que você psicóloga precisa ter a noção de que existe algo para além do eu empírico, no
próprio paciente; e também o paciente precisa desconfiar que existe algo para além das
respostas condicionadas dele. Mas como ele pode desconfiar disso? E aqui eu vou concluir
minha resposta. Ele pode desconfiar disso se o psicólogo entra em contato com essa parte
dele, e não com a outra. Se o psicólogo responde sempre à parte do eu transcendental e não
à parte do eu empírico, ou, tentando dizer de outra forma, se o psicólogo conversa com essa
parte transcendental dele que ele não sabe que existe, ele poderá tomar consciência que essa
parte existe. Então eu daria essas duas respostas, é preciso saber que existe algo para além
do eu empírico e, na relação psicológica, é preciso que o psicólogo converse com a
dimensão mais profunda da pessoa e não com as dimensões superficiais.
Ouvinte 2: ... Qual a relação da felicidade com o eu transcendental?...
Resposta: O que é ser feliz? O que é que preenche uma vida? Esse parece ser o sentido da
pergunta. É preciso dizer que essa pergunta só surge a partir de um espanto (thaumázein),
de um estranhamento com a própria vida. Lembro-me de um diálogo entre duas pessoas
tocadas por esse espanto. Uma diz à outra: E o Fulano? A outra responde: Ah! É um feliz,
coitado! Que dizer, existe uma idéia de felicidade que nos aprisiona naquilo que a televisão
quer nos aprisionar: felicidade se identifica com consumismo. Ou que nos aprisiona no que
os laboratórios farmacêuticos querem nos aprisionar; daqui a pouco vão vender pílulas da
felicidade... “Toma isso aqui que tudo vai se resolver!”. Então eu acho importante a gente
retornar ao conceito de felicidade e fazer uma redução fenomenológica para não confundir
a felicidade com aquilo que os meios de comunicação e os interesses comerciais estão,
implicitamente, dizendo que é a felicidade. A meu ver felicidade tem a ver com a ativação
desse centro da pessoa, desse centro ativo de que falamos.
Pergunta 3: Viktor Frankl viveu num campo de concentração nazista, uma situação de
absoluta violência, de absoluta falta de sentido; e ele fala da importância do sentido para
transformar a vivência dessa situação. Na sua perspectiva, a partir do Husserl e do Carl
Rogers, existe um sentido, ou esse sentido deve ser criado pelo homem?
Resposta: Se existe um sentido para a vida, então precisamos descobrir esse sentido e não
inventar um. Existe um sentido, ou devo criar um? Olha! Existe um sentido que você
gostaria de dar a sua vida, ou descobrir na sua vida, que fica no plano das elaborações
mentais, no plano das idéias; portanto no segundo grau de redução, não chega no terceiro.
Esse sentido pode não ter nada a ver com aquele que de fato você está construindo em sua
vida. Então,... eu tenho um cachorrinho de estimação, suponhamos; e esse cachorrinho tem
um sentido para mim que é diferente do sentido que ele possa ter, por exemplo, para você.
Você pode até achar ele bonitinho, mas ele não tem o mesmo sentido para você que tem
para mim. Mas se você me perguntar qual o sentido que tem esse cachorrinho para mim, eu
vou ser capaz até de falar uma coisa ou outra, mas não vou ser capaz de esgotar numa
resposta todo o sentido que esse cachorrinho tem para mim. Eu posso meditar e escrever
muito sobre sentido que tem um determinado objeto para mim; as vezes é um cachorrinho,
as vezes é algo mais importante, por exemplo, que sentido tem para mim estar fazendo um
curso determinado numa universidade? Que sentido tem para mim estar trabalhando em tal
jornal? Esse sentido já existe, você não vai criar esse sentido, você precisa primeiro
descobrir esse sentido, por que o sentido de estar fazendo uma universidade, é um sentido
que você criou a partir das decisões que você tomou na vida em relação à essa
universidade. O sentido daquele cachorrinho, ele existe a partir de uma história vivida junto
com o cachorrinho; por exemplo, ele me faz lembrar tal episódio que passamos junto.
Então, você pode modificar o sentido se primeiro você descobrir o verdadeiro sentido que
tem alguma coisa. Então o que acontece quando há uma re-significação de sentido? Viktor
Frankl conta como pessoas vinham perguntar a ele se é possível mudar o passado, se tem
como mudar o passado. E, a partir da minha experiência como psicólogo, posso imaginar
alguém dizendo: “Veja o que aconteceu na minha vida, meu pai é um alcoólatra, minha
mãe se submetia a maltratos e ofensas”, enfim, “uma história medonha!”; e depois diz: “A
minha vida tem que ser assim, veja o meu passado!”. Frankl responde: “você não pode
mudar o passado, mas pode mudar o sentido que o passado tem para você no presente”.
Uma resposta verdadeiramente libertadora! Mas, o que é mudar o sentido? Você precisa
chegar num outro contexto de significados para poder mudar. Por exemplo, “Eu sou infeliz
porque minha mãe me abandonou”, ou “Eu não vou namorar com outra pessoa porque
minha namorada me deu o fora: minha vida não foi feliz por causa disso”. Em que consiste
mudar o sentido do passado? Consiste, primeiro, em dizer como é que eu estou vivendo
esses fatos passados, como é que coisas que aconteceram, às vezes, há anos atrás,
continuam me afetando como se tivessem acontecido ontem. Começo então a me dar conta
de que parei no tempo, fiquei preso, não deixei a vida prosseguir. Percebo então as
armadilhas de sentido eu mesmo criei, e vou me tornando capaz de re-significar isso.
Exemplo: “Minha mãe me abandonou, mas eu aprendi a viver sozinho, e é por isso que eu
enfrento várias dificuldades e tenho me saído bem”. Então isso já é um outro sentido.
É através de re-significações que você vai atribuindo outros sentidos. Agora vem a
perguntinha difícil: O que é que faz com que eu mude as significações? Não é uma espécie
de fio da meada, que vem lá do fundo de mim e que me faz escolher os sentidos que são
melhores para mim? Quando eu re-significo alguma coisa, eu estou pegando um fio da
meada que já existe dentro de mim. Então não é dizer, a partir de dentro de uma atitude
natural, que o ser humano tem uma finalidade pré-fixada. Mas se você se colocar numa
atitude fenomenológica, você vai descobrir que dentro de você existe um fio condutor que
te orienta nas suas re-significações, que isso está dentro de você; e eu desconfio que você
não pode criar isso à vontade, pois isso já está ai. Só precisamos descobrir isso, e tomar as
decisões em congruência, me parece. Há um fio condutor, que você pode descobrir na
dinâmica das suas re-significações... você não é autor desse fio condutor. Faz sentido para
vocês isso que eu estou falando?
Quero retomar alguns aspectos daquela parte final quando Rogers diz que é preciso
renunciar a querer remediar tudo a qualquer custo, porque tem a ver com isso que acabo de
dizer. Por exemplo, quando uma pessoa diz que está brigada com o pai e conta uma longa
história sobre isso, e você fala que ela deve ir conversar com o pai, você está querendo
remediar. Sempre procuramos uma solução, mas Rogers diz o seguinte; quando você está
nessa atitude de querer remediar, você perde contato com a realidade. Tem um artigo de
Rogers com esse título: Necessitamos de uma realidade? Precisamos de uma realidade?
Que é também a grande conclusão do Husserl: necessitamos de uma realidade! Quer dizer,
ele reencontra o mundo, no único sentido que o mundo pode ter no final de todas as
reduções que ele faz; ele fala de um reencontro com o sentido do mundo.
Considerações finais
Eu também tenho a agradecer vocês, aos organizadores, ao pessoal de apoio, pelo seguinte:
no esforço de me comunicar com vocês, eu falei de coisas, de inquietações minhas. Tive
que repensar essas coisas para mim mesmo, no ato de falar a vocês. Então, do meu ponto de
vista, essa nossa reunião foi bastante produtiva e eu agradeço a vocês também, por ter tido a
oportunidade de estar aqui pensando alto junto com vocês. Obrigado!
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TITULO: A redução fenomenológica praticada por Rogers: um