XXXVI Congresso Brasileiro de Engenharia Agrícola
Bonito - MS, 30-7 a 2-8-2007
APROVEITAMENTO DE RESIDUOS DA MANDIOCA (Manihot esculento Crantz)
PARA GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA
EYDE CRISTIANNE SARAIVA DOS SANTOS1; RUBEM CESAR RODRIGUES SOUZA2,
DANIEL DE MENEZES AZEVEDO3, SHEILA CORDEIRO MOTA4
1
Engenheira Agrônoma, Dra., Pesquisadora, CDEAM/UFAM, Manaus – AM. E-mail: [email protected]
Engenheiro Eletricista, Prof. Dr., Diretor do CDEAM/UFAM, Manaus – AM.. E-mail: [email protected]
3
Engenheiro Agrônomo, Doutorando, ICB/UFAM, Manaus – AM.. E-mail: [email protected]
4
Desenhista Industrial, Mestranda, CDEAM/UFAM, Manaus – AM.. E-mail: [email protected]
2
Apresentado no
XXXVI Congresso Brasileiro de Engenharia Agrícola
30 de julho a 02 de agosto de 2007 – Bonito – MS
RESUMO: A mandioca (Manihot esculento Crantz) é cultivada em todos os municípios do
Amazonas, sendo uma das culturas que mais se destaca pelo seu volume de produção. O objetivo da
pesquisa consistiu em identificar a cultivar, dentre seis, de mandioca mais apropriada para utilização
energética de sua parte aérea, avaliando-se o custo de geração de energia elétrica. Após as análises de
produtividade, verificou-se que a cultivar IM-946 apresentou as melhores características para
produção de tubérculos e de resíduos de biomassa. Considerando que a mandioca é cultivada
amplamente em todo Estado, o uso da parte aérea em processo de gaseificação representa uma grande
oportunidade para suprir as necessidades energéticas de comunidades isoladas.
PALAVRAS–CHAVE: resíduo agrícola, mandioca, energia elétrica.
USE OF CASSAVA (Manihot esculento Crantz) RESIDUES OF GENERATION OF
ELECTRIC ENERGY
ABSTRACT: Cassava (Manihot esculento Crantz) is cultivated in all cities of Amazon and it is a
remarkable culture that distinguishes for its production volume. The objective of this research was to
evaluate the efficiency of cassava root and the aerial part of six cultivars of cassava, aiming to
characterize energetically the most promising varieties to estimate the cost of generating of electric
energy, using the cassava residue as input. After analyzing the productivity issues, it was verified that
IM-946 variety presented the best characteristics for production of tubercles and biomass residues.
Considering that cassava is widely cultivated in Amazon state, the deployment of the aerial part of
cassava in the gasification process represents am important alternative for supplying energetic
requirements of isolated communities.
KEYWORDS: agricultural residue, cassava, electric energy.
INTRODUÇÃO: A mandioca (Manihot esculento Crantz) é a principal fonte de matéria-prima para
produção de alimento dos ribeirinhos e de todos os povos tradicionais da Amazônia. É a fonte de
energia que faz parte da alimentação, principalmente na forma de farinhas, mingaus, bolos etc. É
cultivada em todos os municípios do Amazonas, sendo uma das culturas que mais se destaca pelo seu
volume de produção. O cultivo da mandioca no Brasil é feito, na sua quase totalidade, por um grande
número de pequenos produtores, conferindo-lhe uma situação de cultura de subsistência, que utiliza
um grande volume de mão-de-obra, principalmente de natureza familiar (MATTOS et al.,1981).
Trata-se de um arbusto espigado, de folhas palmadas com cinco a sete lóbulos, de cor verde azulada. A
sua altura varia de 1,5 a 2,40 metros. No Brasil, a produção de mandioca é definida basicamente para o
mercado interno, chegando ao redor de 28.000.000 t/ano, com sua utilização destinada em primeiro
lugar na fabricação de farinha artesanal, com aproximadamente 76,8% deste total; em segundo
destinado a farinheiras, na fabricação de farinhas de mesa (19,6%) e, em terceiro para as fecularias na
extração da fécula de mandioca (3,9%). Observa-se, que as regiões Norte e Nordeste produzem 58,9%
de toda mandioca no país (XAVIER et al., 1999). Considerando o baixo índice de aproveitamento do
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resíduo da mandioca, a grande área plantada em toda a região Amazônica e ainda, a grande inserção na
atividade produtiva domiciliar das populações tradicionais, o presente trabalho objetivou quantificar os
resíduos produzidos pelo cultivo da mandioca e estimar o custo de geração de energia elétrica
utilizando o resíduo da mandioca carbonizado e briquetado como combustível em um gaseificador de
leito fixo.
MATERIAL E MÉTODOS: O experimento foi realizado na Fazenda Experimental da Universidade
Federal do Amazonas, localizada no km 38 da BR-174 Manaus – Boa Vista, no período de 30 de
Março de 2004 a 02 de Fevereiro de 2005. A área experimental foi de aproximadamente um hectare,
sendo dividida em oito partes iguais, onde em cada parte foi plantada uma cultivar diferente
perfazendo oito tratamentos, sendo os seguintes cultivares: Zolhudinha, Embrapa-8, Mãe Joana, IM936, BRS PURUS e IM-946. A área era plana e apresentava-se homogênea consistindo-se de um
latossolo amarelo, onde foi inicialmente arado, calcariado e posteriormente gradeado e sulcado. Foram
feitas duas adubações uma de fundação, 10 dias antes do plantio e outra de cobertura 120 dias após o
plantio, com a formulação 10-10-10 (NPK), sendo colocado 180g em cada adubação por planta,
distribuído em circulo, distante 5 a 10 cm do colo da planta. A forma de plantio utilizado foi a
horizontal em suco, com o tamanho da maniva-semente em torno de 20cm. O espaçamento utilizado
foi 1 x 1m para todas as cultivares. Os parâmetros avaliados foram o peso da raiz e o peso da parte
aérea, sendo o acompanhamento do desenvolvimento dos cultivares levado a efeito através da curva de
crescimento. Esses dados foram avaliados estatisticamente sob o esquema inteiramente casualizado
com 5 repetições, ao nível de 5% de probabilidade, conforme recomendado por (FERREIRA, 2000).
Tanto para a estimativa de produtividade quanto para produção da parte aérea foram colhidas 10
plantas ao acaso por tratamento, separadas e pesadas. Para a curva de crescimento foram feitas
medidas de comprimento (10 plantas) em três datas diferentes aos 102, 224 e 318 dias após o plantio.
Simultaneamente as etapas da pesquisa supra citadas, foram coletadas informações para subsidiarem o
estudo de viabilidade técnico-econômica da exploração comercial do aproveito dos resíduos para
geração de energia elétrica.
RESULTADOS E DISCUSSÃO: Na Tabela 1, são apresentados os dados médios de altura, peso da
parte aérea, peso de raízes e estimativa de produtividade de plantas de mandioca. Com relação ao
crescimento, a cultivar “Embrapa-8” apresentou a maior altura média, e a cultivar “Zolhudinha” a
menor em altura final. Com relação parte aérea a “IM-946” apresentou o maior peso médio por planta,
seguida pela cultivar IM-934, contrastando com a “Zolhudinha” que apresentou o menor peso. O
resultado do peso médio de raízes demonstra que a cultivar IM-946 obteve o maior rendimento, mais
não diferindo estatisticamente da Zolhudinha e BRS-Purus. Observa-se ainda, na Tabela 1, que as
cultivares que apresentaram uma maior altura, também apresentaram uma tendência a ter um menor
rendimento, tal fato revela, que o desenvolvimento da parte aérea, demasiadamente vigoroso, induz
baixos índices de colheitas de raízes. Na estimativa de produtividade obteve-se um aumento de 49%
para cultivar “Zolhudinha” e de 19,2% para “Embrapa-8”, isso revela que as condições
edafoclimáticas do experimento, o material propagativo e os tratos culturais proporcionaram esse
aumento.
Tabela 1. Dados médios sobre altura, peso da parte aérea, peso de raízes e
estimativa de produtividade de plantas de mandioca (Manihot esculenta Crantz).
Parâmetros
Cultivares
Altura
Peso da parte aérea Peso de raízes
Estimativa da
(m)
(kg)
(kg)
produtividade (T/ha)
Embrapa-8
3,066 a
3,10 c
2,98 c
29,8
Zolhudinha
1,816 c
1,80 d
4,92 a
49,2
IM 934
2,672 ab
3,68 b
4,08 b
40,8
BRS-Purus 2,540 abc
2,92 c
4,74 a
47,4
IM 946
2,386 abc
5,95 a
5,16 a
51,6
Mãe Joana 2,246 bc
3,20 bc
3,92 b
39,2
C.V %
13,66
6,43
7,89
Obs: Médias seguidas de pelo menos uma mesma letra não diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey,
ao nível de 5% de probabilidade.
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A tecnologia considera nesse estudo para produção de energia elétrica foi a gaseificação. O
equipamento utilizado foi um gaseificador de leito fixo que exige que o insumo energético seja
previamente carbonizado e que possua uma determinada granulometria. Assim, o insumo energético,
neste caso a parte aérea da mandioca, teve que passar pelo processo de carbonização e briquetagem
para atender as exigências técnicas do equipamento. Considerou-se, para fins do estudo de viabilidade
econômica, que a carbonização estaria sendo feita através de forno tipo rabo-quente. Os dados
assumidos são os constantes da Tabela 2.
Tabela 2. Dados utilizados para determinação do custo de carbonização da parte aérea da mandioca.
Itens de custo e parâmetros
Valor
Custo da biomassa (R$/m3)*
0
Eficiência do forno (%)
0,22
Custo do forno tipo rabo quente (R$)
800,00
Capacidade (m3)
7,07
Vida útil (anos)
2
Taxa mínima de atratividade (%)
0,1
Custo do forno anualizado (R$)
460,95
Número de dias de funcionamento no ano
360
Número de dias para uma carga
3
Produção anual (m3)
186,61
Massa específica aparente (g/cm3)
0,213
Produção anual (kg)
39.747,09
* Admitiu-se que a parte aérea é um resíduo não comercializável ou útil para o produtor.
Fonte: Santos et al (2005).
A partir dos dados da Tabela 2 obtêm-se um custo de R$ 2,47/m3 ou R$ 0,012/kg de material
carbonizado. A etapa seguinte considerada para o processamento da biomassa é a briquetagem. Os
parâmetros utilizados para determinação do custo de produção do briquete foram os constantes da
Tabela 3.
Tabela 3. Dados utilizados para determinação do custo de briquetagem.
Itens de custo e parâmetros
Valor
Custo da biomassa (R$/kg)
0,012
Custo da briquetadeira (R$)
8.000,00
Vida útil (anos)
15
Taxa mínima de atratividade (%)
0,1
Custo da briquetadeira anualizado (R$)
1.051,79
Consumo anual de eletricidade da briquetadeira (kWh)
6712,32
*
Tarifa de eletricidade (R$/kWh)
0
Custo anual com eletricidade (R$)
0
Produtividade da briquetadeira (kg/h)
1
Número de horas de funcionamento no ano
1.920
Rendimento da briquetadeira
0,83
Consumo de carvão por ano (kg)
2.304,00
Custo anual com carvão (R$)
26,72
Custo anual de manutenção (R$)
800,00
Consumo de goma por kg de carvão
0,2592
Quantidade de goma por ano (kg)
597,20
Custo da goma (R$/kg)
0,50
Custo anual com goma (R$)
298,60
Produção de briquetes por ano (kg)
1.920
* Admitiu-se que a eletricidade seria a produzida pelo próprio produtor.
Fonte: Santos et al (2005).
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A partir dos dados da Tabela 3 obteve-se um custo de R$ 1,134/kg para o briquete. Verifica-se,
portanto, que esse processo leva a um aumento do custo da biomassa da ordem de 9.677%. Para a
etapa final do processo, que possibilitará a produção de eletricidade, os parâmetros considerados
foram os constantes da Tabela 4.
Tabela 4. Dados utilizados na etapa de gaseificação para determinação do custo de geração.
Itens de custo e parâmetros
Valor
Custo da biomassa (R$/kg)
1,134
Custo do gaseificador (R$)
20.000,00
Vida útil (anos)
15
Taxa mínima de atratividade (%)
0,1
Custo do gaseificador anualizado (R$)
2.629,48
Potência do gaseificador (kW)
8
Fator de carga
0,6
Quantidade de energia produzida no ano (kWh)
42.048
Consumo de biomassa (kg/kWh)
0,88
Consumo anual de biomassa (kg)
37.002,24
Custo anual com biomassa (R$)
41.957,23
Custo anual de manutenção do gaseificador (R$)
9.200,00
Fonte: Santos et al (2005).
Considerando os valores da Tabela 4, se obtêm um custo de geração da ordem de R$ 1,13/kWh, valor
este bastante superior à tarifa rural atualmente praticada pela Companhia Energética do Amazonas –
CEAM que é de R$ 0,20/kWh. Observando somente o custo de produção de eletricidade obtido se
concluiria errôneamente, que é inviável economicamente a produção de eletricidade através da
gaseificação da parte aérea da mandioca. No entanto, deve ser observado que os resultados foram
substancialmente influenciados pelas restrições da tecnologia utilizada para os testes. Caso o
equipamento de gaseificação utilizado possibilitasse o uso de material com granulometria variada não
haveria necessidade do processo de briquetagem o que levaria a um custo de geração da ordem de R$
0,29/kWh, havendo equipamentos disponíveis no mercado para tal. Tal valor é extremamente
competitivo uma vez que neste não há nenhuma forma de subsídio, diferentemente da geração a diesel
da concessionária que é fortemente subsidiada (aproximadamente 70% do custo de geração).
Outro aspecto importante consiste na disponibilização de toda a capacidade de geração para usos que
não estão associados ao processo de produção de eletricidade, uma vez que a energia utilizada na
carbonização é somente térmica. Outra restrição da tecnologia utilizada consiste na necessidade do
insumo energético ter passado anteriormente pelo processo de carbonização. Caso a tecnologia
permitisse a recuperação do alcatrão, a biomassa in natura poderia ser utilizada diretamente, havendo,
também, tecnologia disponível no mercado para tal. Assim, o custo da energia produzida seria de R$
0,28/kWh.
Do ponto de vista da capacidade de produção de biomassa de modo a dispor de energia elétrica
durante 24 horas por dia o ano inteiro, seria necessário uma área plantada de 1,4 ha para a espécie de
mandioca IM 946, o que é perfeitamente viável para uma família com 5 pessoas sendo 3 com idade
igual ou superior a 15 anos o que é bastante comum nas comunidades amazônicas. Caso admitíssemos
que não fosse necessário o processo de briquetagem a área necessária seria de 0,76 ha. Deve-se
observar que 8 kW, que é a capacidade do equipamento considerada nesse estudo, representa uma
potência instalada elevada para uma família, mesmo que essa venha a utilizar energia elétrica para
irrigação e para processamento da mandioca. Assim, esse equipamento poderia ser utilizado para
suprir, com folga, a necessidade de duas famílias o que facilitaria ainda mais a produção de matériaprima.
CONCLUSÕES: O estudo realizado demonstra que a variedade IM-946 apresentou as melhores
características para produção de tubérculos e de resíduos de biomassa. É necessário dispor de
tecnologia de gaseificação que, pelo menos, possua flexibilidade quanto à granulometria do insumo
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energético para obter custo de eletricidade competitivo com o diesel subsidiado. O uso da parte aérea
da mandioca em processo de gaseificação representa uma grande oportunidade para suprir as
necessidades energéticas de comunidades isoladas na Amazônia.
REFERÊNCIAS
XAVIER, J. J. B. N.; DIAS, C. M.; BARRETO, J.F.B. Cultivar BRS Purus Nova alternativa de
mandioca para terra firme do Amazonas, Comunicado Técnico, Embrapa- Amazônia Ocidental,
Manaus , AM: Embrapa Amazônia Ocidental, Nº 04, 1999. p. 1-4.
MATTOS, P.L.P de.; DANTAS, J.L.L.;SOUTO, G.F. Mandioca: pesquisa, evolução agrícola e
desenvolvimento tecnológico. Centro Nacional de Pesquisa Agropecuária. Cruz das Almas,
BA.Centro Nacional de Pesquisa de Mandioca e Fruticultura. (Documentos, CNPMF No 09), 1981.
103p.
FERREIRA, P.V. Estatística Experimental Aplicada à Agronomia. Universidade Federal de
Alagoas, Maceió. 3. ed. 2000. 422p.
SANTOS, E.C.S.S.; SOUZA, R.C.R.S.; SEYE, O.; MORAIS, M.R,; AZEVEDO, D.M.;
GUIMARÃES, E.S. Produção e uso de biomassa para fins energéticos, Relatório Final,
CDEAM/UFAM, Manaus, 32p. ilust.
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