AMPLIAÇÃO DO ENSINO FUNDAMENTAL PARA NOVE ANOS: O QUE DIZEM OS ESTUDOS MAIS RECENTES QUE CHEGAM AOS PROFESSORES? Jair Ribeiro Maia de Albuquerque Júnior1 Adriano Queiroz da Silva2 Laêda Bezerra Machado3 RESUMO Esta pesquisa analisa como vem sendo tratada a temática da ampliação do Ensino Fundamental para nove anos nas revistas de circulação nacional direcionadas ao professor de Educação Básica. Fizemos um levantamento e analise documental das revistas e informativos que circulam entre os professores e selecionamos 9 artigos de revistas diversas. Para estudo dos artigos lançamos mão análise de conteúdo de Bardin (2004). Os resultados apontam que as informações que chegam ao professor sobre a ampliação do ensino fundamental abordam os seguintes pontos: aspectos estruturais desse ensino; posturas divergentes ou convergentes dos autores frente à ampliação; sugestões para a sua garantia; experiências de implantação; alterações na Educação Infantil devido à ampliação e concepções a respeito da criança que ingressa no fundamental. Nossa análise indica ainda que o material veicula dois tipos de discursos um que é o oficial, de tom mais prescritivo e outro de teor mais crítico, que procura analisar mais a fundo as vantagens e demandas da ampliação. PALAVRAS-CHAVE: Ampliação do Ensino Fundamental – professores artigos. 1 Aluno do nono período de Pedagogia – Centro de Educação – UFPE. Aluno do nono período de Pedagogia – Centro de Educação – UFPE. 3 Profª. do Departamento de Administração Escolar e Planejamento Educacional - Centro de Educação – UFPE. 2 INTRODUÇÃO Ao longo dos anos 90 foram introduzidas inúmeras mudanças no cenário educacional brasileiro.Tais mudanças foram justificadas pela necessidade de o atendimento por parte do poder público da universalização do ensino fundamental. De uma escola para poucos privilegiados nos primeiros séculos de existência do Brasil, passamos, nos últimos anos, a ter uma oferta massificada de escolarização. Nessa conjuntura insere-se uma das medidas de impacto no campo educacional na atualidade: a ampliação do direito à educação. A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional já apontava possibilidades de aumento da escolarização obrigatória quando afirma nas disposições transitórias inciso I, § 3º, artigo 87, que: “Cada município e supletivamente, o Estado e a União, deverá: matricular todos os educandos a partir dos sete anos de idade e, facultativamente, a partir dos seis anos no ensino fundamental”. Essa perspectiva apontada pela LDB vai se tornar concreta com a Lei Complementar nº 11.274 de 06 de Fevereiro de 2006, que considerando o ensino obrigatório já universalizado, amplia essa escolaridade para 9 anos. Nós, graduandos do curso de Pedagogia, motivados pela discussão e debate acerca das políticas públicas de educação, seu cumprimento e sua importância para a efetivação dos direitos sociais dos cidadãos, sobretudo, no decorrer das aulas de Estrutura e Funcionamento do Ensino, nos debruçamos, neste trabalho de conclusão de curso, no estudo sobre a ampliação da escolaridade obrigatória. Nessa perspectiva, centramos nossa preocupação em levantar a produção bibliográfica direcionada ao professor de Educação Básica sobre o assunto nos últimos dois anos na tentativa de melhor compreender como e de que forma o professor vem se apropriando das informações sobre a ampliação desse direito educacional. Consideramos o estudo importante para a nossa formação como futuros profissionais da educação devido ao esclarecimento que nos proporciona, bem como para o contexto educacional brasileiro, tendo em vista as repercussões dessa medida no sistema educacional. A contribuição social deste estudo está na possibilidade de compreender melhor na literatura específica, os argumentos favoráveis e os contrários a essa política. Nossa investigação centra-se, portanto, nas seguintes questões: quais os sentidos da ampliação desse direito educacional? Como e o que circula sobre o tema entre os professores de educação básica? Como eles têm tomado conhecimento dessa ampliação? Nesse sentido nossos objetivos foram: Analisar como vem sendo tratada a temática da ampliação do ensino fundamental para nove anos nas revistas de circulação nacional direcionadas ao professor de Educação Básica; Identificar como artigos, entrevistas ou outros elementos contidos nesses instrumentos de comunicação direcionados ao professor apresentam e discutem a temática da ampliação do direito ao ensino fundamental; Indicar nos instrumentos analisados o quantitativo de artigos, características desses artigos, bem como os conteúdos abordados. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO À EDUCAÇÃO NO BRASIL No Brasil, a preocupação com o direito a educação vem de longe. Já a Constituição de 1824, afirmava: “a instrução primária é gratuita a todos os cidadãos”. Nesta Constituição, porém, verifica-se que a obrigatoriedade é deixada de lado, não oportunizando um modelo educativo universal, ou seja, que atendesse a demanda, pois poucos eram os “cidadãos” naquela época. A esse respeito Oliveira (2002) destaca: “...a grande parcela da população era constituída por escravos, sendo observado nesta camada da população um alto índice de analfabetismos. O Império não se empenhou em desenvolver práticas educativas que oportunizassem uma mudança no atual quadro. “(p.17) A Constituição de 1824 não tinha o objetivo de desenvolver uma política de cunho democrático, pois deixava bem claro que apenas cidadãos teriam o direito de acesso ao ensino primário, deixando de lado a maior parcela da sociedade que era composta por escravos. Desde muito cedo observamos que as leis “maquiam” a realidade, não provocando nenhuma alteração. Subseqüente a este período surge um movimento político-militar e instauração no país da República Federativa em 1889. O antigo regime Monárquico, não resiste, mas também não há euforia popular. Dois anos após a este contexto turbulento da República é promulgada a Constituição de 1891, que em seu art 35º faz as seguintes referências à educação: 2º) animar no País o desenvolvimento das letras, artes e ciências, bem como a imigração, a agricultura, a indústria e comércio, sem privilégios que tolham a ação dos Governos locais; 3º) criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados; 4º) prover a instrução secundária no Distrito Federal. Brandão citado por Cury (1992b) destaca a respeito da omissão dos constituintes da época sobre a obrigatoriedade e gratuidade da educação fazendo o seguinte comentário: ”(...) era explicável, ao menos no âmbito das falas sobre a gratuidade, pelo principio federativo. Já a obrigatoriedade não passou, seja por causa do federalismo, seja e sobretudo pela impregnação do principio liberal de que a individualidade é uma conquista progressiva do indivíduo que desenvolve progressiva e esforçadamente a sua ‘virtus’”. Entendemos que o texto legal não expressa de forma clara o comprometimento do Poder Público em ofertar o ensino elementar, uma vez que animar não é sinônimo de prover. Sendo assim observamos nas entrelinhas o caráter liberal supracitado por Cury e a falta de compromisso do Estado para com a educação elementar. É a partir da Constituição de 1934 que se ensaia no Brasil uma mudança nos seus horizontes para com a educação, sendo a primeira a destacar um capítulo do seu texto para o referido tema, onde é introduzida a obrigatoriedade escolar para o ensino primário. O artigo 149 desta Carta Magna afirma que: A educação é direito de todos e deve ser ministrada pela família e pelos Poderes Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e econômica da Nação, e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da solidariedade humana. Podemos observar um avanço qualitativo desta Constituição, pois ao afirmar a obrigatoriedade o Estado assume para si, em conjunto com a família, a responsabilidade de prover a educação a todos. Lembramos que grande mudança ou avanço posto pela Constituição de 1934 resulta do Manifesto dos Pioneiros da Educação, documento formulado por um grupo de educadores progressistas ou renovadores, que dentre outras coisas, criticava a pouca relevância dada à educação no país até aquele período e os métodos pedagógicos rotineiros em comparação com países da América Latina como: Argentina, Paraguai e Chile. A Constituição de 1934, assimilando parte do que havia sido defendido pelos pioneiros, em seu Artigo 150, afirma que compete à União: “...fixar o plano nacional de educação, compreensivo do ensino de todos os graus e ramos, comuns e especializados; e coordenar e fiscalizar a sua execução, em todo o território do País.” A Carta Constitucional de 1934 aponta para a busca de uma melhora quantitativa e qualitativa na busca por uma nova compreensão e reestruturação da educação, à medida que proclama a necessidade de se fixar o primeiro Plano Nacional da Educação. O Plano era um conjunto de metas quantitativas e qualitativas a serem alcançadas num prazo de 8 anos por municípios e estados.Também no art. 152 desta mesma constituição era afirmado que: “É competência precípua ao Conselho Nacional de Educação, organizado na forma da lei, a elaborar o plano para ser aprovado pelo Poder Legislativo, sugerindo ao Governo as medidas que julgasse necessárias para a melhor solução dos problemas educacionais bem como a distribuição adequada de fundos especiais". Em meio a um conturbado período, a ditadura do Estado Novo, foi imposta ao país a Constituição de 1937, que retrocedia frente às conquistas anteriores, Esta Constituição, em seu art. 130, no que concerne à educação declarava sua gratuidade, embora dando margem a interpretações contraditórias: “O ensino primário é obrigatório e gratuito. A gratuidade, porém, não exclui o dever de solidariedade dos menos para com os mais necessitados; assim, por ocasião da matrícula, será exigido aos que não alegarem, ou notoriamente não puderem alegar escassez de recursos, uma contribuição módica e mensal para a caixa escolar.” A Constituição de 1937 não define de maneira clara quem possui condições para usufruir ou não do ensino gratuito, já que não esboça nenhuma definição para a população denominada mais ou menos necessitada. Conforme Oliveira (2002), a Carta de 1937 foi bastante influenciada no texto polonês de 1926, ficou conhecida como a Polaca. No referido texto constitucional a responsabilidade da educação deveria estar sob a incumbência da família, destacada no art. 125 que proclama: “A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiaria, para facilitar a sua execução ou suprir as deficiências e lacunas da educação particular”. Segundo Foulquié (1957) este texto merece algumas observações visto que aos pais mesmo que a redação aparentemente descreva que é dever e direito natural deles, a estes não é facultado o direito de negar aos seus filhos o acesso à educação, pois tal comportamento será caracterizado, segundo o Código Penal, como abandono intelectual. No Brasil sempre vivemos momentos de democracia e ditadura, novamente no contexto de abertura política, pós Estado Novo, foi elaborada e promulgada uma nova Carta Constitucional. Conforme Romanelli (1987), o retorno à normalidade democrática redundou na promulgação da nova Constituição de cunho liberal democrático. Esta Constituição, em consonância com a abertura democrática, estabelecia: descentralização do ensino, um percentual de recursos a serem investidos na área educacional, concurso público para o provimento de cargos no magistério e, principalmente, que caberia à União legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional. Foi com base nessa prerrogativa estabelecida pela Constituição de 1946, que o então Ministro da Educação na época, Clemente Mariani, constituiu uma comissão de educadores para estudar e propor um anteprojeto de reforma geral da educação nacional. A primeira LDB foi publicada em 20 de dezembro de 1961 pelo Presidente João Goulart, quase trinta anos após ser prevista pela Constituição de 1934. O primeiro projeto de lei foi encaminhado pelo poder executivo ao legislativo em 1948, foram necessários treze anos de debate até o texto final. Na disputa, que durou treze anos, estiveram em embate os ideais de liberais e privatistas no campo educacional. Em consonância com o que pregava a Constituição de 1946 a Lei 4024/61 estabelece que o ensino primário é obrigatório, gratuito e tem duração de 4 a 5 anos. (Título II, Art. 2º e 3º).No ano posterior a promulgação da LDB Nº 4024/61, surgiu o primeiro Plano Nacional da Educação, que não foi proposto na forma de um projeto de lei, mas apenas como uma iniciativa do Ministério da Educação e Cultura, aprovada pelo Conselho Nacional da Educação. Em 1964 foi instaurado o regime militar que refletiu na educação o caráter de sua ideologia de governo, ou seja, antidemocrático. Foram cometidos diversos atos de violência contra educadores e estudantes que se mostrassem contrários a sua forma de governo. Uma das principais instituições educacionais, a União Nacional dos Estudantes, foi proibida de funcionar; o Decreto-Lei 477/69 “calou a boca de alunos e professores”. Em 1964, período bastante conturbado e violento, dar-se início o golpe militar que impede iniciativas de mudanças na educação do Brasil, pois tais mudanças eram qualificadas como comunistas e subversivas. Contudo, a pressão do modelo econômico impulsiona a ampliação da escolarização. A Constituição de 1967, do regime militar, propõe a ampliação do ensino primário tornando obrigatório para todos dos sete aos quatorze anos e gratuito nos estabelecimentos primários oficiais. A Emenda de 1969 destaca a educação como “direito de todos e dever do Estado”. No mesmo período foi imposta ao país a Lei 5.692/1971 conhecida como Reforma do Ensino de e 2º graus em 1971. Esta Lei proclama a obrigatoriedade do ensino e sua extensão para 8 anos. Os ensinos primário e ginasial foram agrupados e receberam a denominação de ensino de 1º grau. Houve na verdade uma fusão do ensino primário com o 1º ciclo ginasial. Com esta Lei eliminou-se um dos maiores pontos de estrangulamento da educação: a passagem do primário para o ginasial. Extinguiu-se, pois, o exame de admissão. Destaca-se principalmente em relação à estrutura o fim do dualismo no ensino médio, tornando obrigatória a profissionalização no 2ºgrau. Freitag (1986) afirma que com esta lei a profissionalização deixou de ser um ramo da escolaridade para tornar-se a meta da escolarização. O processo de transição do Regime Militar para uma ordem democrática, ocorrido no Brasil entre meados da década de 1970 e o ano de 1985, conhecido como o processo de abertura política, tem início a partir do governo Ernesto Geisel entre 1974 e 1979. A crise econômica do país e as dificuldades do regime militar agravam-se. A alta do petróleo e das taxas de juros internacionais desequilibra o balanço brasileiro de pagamentos e estimula a inflação. Nesse quadro de dificuldades, o apoio da sociedade torna-se indispensável. Para consegui-lo, Geisel anuncia uma distensão lenta, gradual e segura do regime autoritário em direção à democracia. O processo de transição democrática é longo e ocorre com avanços e recuos. A comunidade educacional passa então a utilizar vários instrumentos a fim de formular diagnósticos, denúncias e propostas para a educação, contando com: Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Educação (Anped), Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior (Andes), Confederação Nacional de Trabalhadores da Educação (CNTE), Comissão Nacional pela Reformulação dos Cursos de Formação do Educador (CONARCFE), Associação Nacional pela Formação de Profissionais da Educação (ANFOPE), Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), Conferências Brasileiras de Educação (CBE) e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). “Antes mesmo que os constituintes entrassem em ação, a IV Conferência Brasileira de Educação, realizada em Goiânia em agosto de 1986, teve como tema central ‘A educação e a constituinte’. E na reunião de finalização dessa Conferência foi aprovada a ‘Carta Goiânia’ contendo as propostas dos educadores para o capítulo da Constituição referido à educação. Aí se previa a manutenção do artigo que definia como competência da União legislar sobre as diretrizes e bases da educação nacional” (Saviani, 2003, p.35). A transição do regime militar para a redemocratização do Brasil foi marcada pela convocação da Assembléia Nacional Constituinte através da Emenda Constitucional n° 26, de 1985. O DIREITO À EDUCAÇÃO NO CONTEXTO DE DEMOCRATIZAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA Na atual Constituição de 1988, após um efervescente movimento em busca da redemocratização, é evidenciada a obrigatoriedade do ensino e o Estado aparece com o dever de educar. Em seu art. 205 está expresso: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.” O ensino fundamental torna-se direito público e subjetivo do cidadão brasileiro. Segundo Cury in Brandão (2004, p. 27), o direito público subjetivo deve ser entendido como: Direito cujo titular “pode exigir direta e imediatamente do Estado o cumprimento de um direito e de uma obrigação”. Isso significa na prática, “que o titula de um direito público subjetivo tem assegurada a defesa, a proteção e efetivação imediata de um direito, mesmo quando negado”. Outro artigo relevante para a educação é o 227, base para elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): “É dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, á dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” O ECA dedica à educação o capítulo IV – Do Direito à Educação, à Cultura ao Esporte e ao Lazer, que, conforme Artigo 53, estabelece: “A criança e o adolescente têm direito a educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I. Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II. Direito de ser respeitado por seus educadores; III. Direito de contestar critérios avaliativos podendo recorrer às instâncias escolares superiores; IV. Direito de organização e participação em atividades estudantis; V. Acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência § Único: É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais” A partir dos anos 90 novos rumos vão sendo definidos para a sociedade brasileira. Com a promulgação da Constituição de 1988, tornaram-se obsoletas as leis de diretrizes e bases anteriores (1961; 1968; 1971), pois as demandas de formação e escolaridade da população passaram a ser diferentes. A partir desse fato, no mesmo ano de 1988, houve amplo e longo processo de debate em torno das prioridades educacionais a constarem em Lei, que acabou resultando na LDB 9394/96, promulgada pelo presidente da República em dezembro de 1996. A LDB atual é resultado de um longo embate, que durou cerca de oito anos, em meio a propostas e discussões de forças distintas. Trata-se de uma lei de fundo democrático, revelando as contradições e interesses de diversas parcelas da sociedade civil. Baseada no princípio do direito universal à educação para todos, traz avanços com relação à lei anterior no que concerne a educação básica, como nos apresentam Pereira e Teixeira (2003): “...o alargamento da concepção de educação básica é a ampliação do número de anos e etapas de escolarização. Nas leis de educação anteriores, a prevalência da prática habitual de limitá-la ao domínio da habilidade de ler, escrever e contar tornou restritiva a sua oferta, cingindoa, na primeira LDB, ao antigo ensino primário, e, posteriormente, na lei nº 5.692/71, estendendo aos oitos anos de escolarização do primeiro grau. A atual lei, entretanto, com base em outros parâmetros, define uma concepção unificada de educação básica que abrange a formação do indivíduo desde zero ano de idade até o final do ensino médio, em três etapas consecutivas: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio”. ( pág. 90) Em relação a educação infantil a atual LDB rompe com antigos paradigmas de concepção acerca desta fase de aprendizagem e atribui um alto grau de valor a este período de formação da criança como novamente expressa Pereira e Teixeira (2003, pág. 91): “A especificidade atribuída a essa etapa de escolarização opõe-se radicalmente à visão da pré-escola com base na noção de privação ou carência cultural, tão em voga no passado ainda recente, segundo a qual o papel da pré-escola seria o de suprir as “deficiências” das crianças, especialmente as oriundas das classes populares, por intermédio de programas de educação compensatória, para, assim preparadas, ingressarem nas escolas “regular”. O papel da pré-escola seria apenas de “salvar” a escola... “ Outro aspecto relevante evidenciado na atual LDB, visando a ampliação da qualidade do ensino foi o acréscimo de horas nos dias letivos oportunizando assim uma tentativa de avanço na busca para a realização de um trabalho pedagógico eficiente e eficaz. Pereira e Texeira (2003) acerca de tal aspecto tecem o seguinte comentário: “... a ampliação da carga horária mínima anual para oitocentas horas ou para um mínimo de duzentos dias de efetivo trabalho escolar nos níveis fundamental e médio (art 24, I), se constitui em um aspecto essencial na garantia da qualidade. Atualmente a legislação fixa o mínimo de 720 horas ou cento e oitenta dias letivos. Com esse acréscimo o Brasil deixa de ser o país onde o ano escolar era um dos menores. Em relação ao tempo de permanência do aluno na escola a ainda uma exigência de uma jornada diária de quatro horas de trabalho efetivo em sala de aula, jornada essa a ser progressivamente ampliada, no ensino fundamental, até chegar a tempo integral (art. 34)”. (pág. 100): Respondendo ao que está posto na LDB e com o objetivo de traçar metas para a melhoria do sistema educacional brasileiro e tentar por em prática os modernos artigos da atual LDB foi lançado o Plano Nacional da Educação (Lei Nº 1072 de 09 de janeiro de 2001), que, dentre outras coisas, no âmbito do ensino fundamental propõe: • Ampliar a duração do ensino fundamental para nove anos, com inicio aos seis anos de idade; Em relação ao direito à educação à LDB em seu Art. 2º afirma: “a educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Ainda no que concerne ao Ensino Fundamental a referida lei Art. 32 proclama que “o Ensino Fundamental, com duração mínima de oito anos, obrigatório e gratuito na escola pública, terá por objetivo a formação básica do cidadão”. Machado (2007) acrescenta que: “sua função é formar o cidadão considerando: desenvolvimento da capacidade de aprender tendo como meios básicos o domínio da leitura, da escrita e do cálculo; compreensão meio ambiente natural e social, sistema político, da tecnologia, das artes e dos valores em que se fundamentam a sociedade; aquisição de conhecimentos e habilidades, formação de hábitos e valores, dentre outros.” (p.27) A atual LDB sofreu novas alterações e teve os artigos 6º, 30º, 32º e 87º modificados pela Lei Federal nº. 11.114, de maio de 2005, tornando obrigatória a matrícula de crianças a partir de seis anos de idade no ensino fundamental. Já a Lei nº 11.274/06 manteve a obrigatoriedade da matrícula no ensino fundamental aos seis anos de idade e tornou obrigatória a duração de nove anos para este nível de ensino. Esta ampliação será tratada de forma mais detalhada no tópico a seguir. A AMPLIAÇÃO DA ESCOLARIDADE OBRIGATÓRIA PARA NOVE ANOS Anterior a edição da Lei n.º 11.274/06, a Resolução do Conselho Nacional de Educação CNE/CEB 18, de 15 de setembro de 2005, já expressava a preocupação do CNE com o ingresso da criança aos 6 (seis) no ensino fundamental.Tal Resolução previa, dentre outras coisas: • Garantir às crianças que ingressam aos 6 (seis) anos no Ensino Fundamental pelo menos 9 (nove) anos de estudo. • Os sistemas de ensino devem ampliar a duração do Ensino Fundamental para 9 (nove) anos, administrando a convivência dos planos curriculares de Ensino Fundamental de 8 (oito) anos, para as crianças de 7 (sete) anos que ingressarem em 2006 e as turmas ingressantes nos anos anteriores e de 09 (nove) anos para as turmas de crianças de 6 anos de idade que ingressam a partir do ano letivo de 2006. • Promover no âmbito de cada sistema de ensino, a adequação do projeto pedagógico escolar de modo a permitir a matrícula das crianças de 6 (seis) anos de idade na instituição e o seu desenvolvimento para alcançar os objetivos do Ensino Fundamental, em 09 (nove) anos; • Definir se o primeiro ano ou os primeiros anos de estudo/série se destina(m) ou não à alfabetização dos alunos e estabelecendo a nova organização dos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos termos das possibilidades dos Art. 23 e 24 da LDB. De acordo com Silva (2006) a ampliação do ensino fundamental para nove anos tornou-se obrigatória a partir da lei 11.274/2006. Após a publicação da lei da ampliação do ensino fundamental, começaram a surgir uma série de discussões sobre como se daria essa ampliação nos diversos municípios que compõem o Brasil. Porém, dados da SEB (Secretaria de Educação Básica 2005) revelam que a ampliação para nove anos de ensino não é uma novidade, pois já vinha sendo implantada em 22 Estados e no Distrito Federal. A Lei n.º 11.274/06 atribui ao art. 87, §3º, inc. I, da LDB, redação que determina ao Poder Público a obrigação de matricular todos os educandos a partir dos 6 (seis) anos de idade no ensino fundamental. No entanto, entendemos que fica garantido o prazo para que os sistemas de ensino providenciem o cumprimento do que dispõe a Lei de Diretrizes e Bases. Segundo Collat (2006), “a Lei n.º 11.274/06 garante ao Poder Público um prazo até 2010 para implementação do ensino fundamental nos termos exigidos pela legislação”. Uma análise medida da ampliação do ensino fundamental implica em reflexão sobre as condições que o governo dispõe pra efetivar um trabalho de qualidade e eqüidade, garantindo o que afirmam os artigos 205 ao 208 da CF. A esse respeito Arelaro (2005), por exemplo, indica que a gratuidade do ensino nos estabelecimentos oficiais (IV, art. 206 da CF) deve ser entendida não só como a matrícula “potencial”, ou seja, a vaga em alguma escola, mas como a tradução do oferecimento das condições plenas que permitam a todos os alunos a sua freqüência regular à escola, o que exige por parte das esferas públicas recursos materiais e financeiros compensatórios, colocados à disposição para que a igualdade-desigualdade seja estabelecida e a permanência dos mais pobres e marginalizados seja possível, com mínimas, mas insubstituíveis condições de igualdade pedagógica e social. Arelaro (2005) alerta, ainda, que o primeiro impasse do ensino fundamental público no Brasil diz respeito à necessidade de se criar um novo modelo de referência de “qualidade escolar”, em que o ensino para todos possa significar, genuinamente, “ensino de qualidade para todos”. A visão da autora deixa notório que o grande impasse das políticas públicas de educação no Brasil é de que a quantidade está quase sempre acima da qualidade do que está sendo proposto, então não basta ampliar o ensino fundamental sem ter condições de atender as reais necessidades da camada mais pobre da população escolar, visto que as estruturas físicas dos prédios, as propostas pedagógicas, a capacitação dos docentes, enfim todos os requisitos que necessários para se ter uma educação de qualidade, permitindo assim que os alunos, professores e a comunidade se sintam amparados e valorizados como integrantes da escola. Esse aspecto parece ser simples de efetivar, mas quando são levadas em conta as desigualdades do Brasil fica explícito o grau de dificuldade que deve ser superado para que se possam alcançar índices de qualidade do ensino público e não números de matriculados nas redes de ensino. Diante do que expomos reiteramos nossa intenção em saber o que chega e de que modo o professor tem acesso a essas informações acerca da ampliação do ensino fundamental proposta pela Lei 11.274/2006, que a nosso ver influenciou e modificou a dinâmica educacional brasileira, pois apesar de considerar que muitos sistemas já o tinham ampliado, para muitos a ampliação constitui-se como uma novidade. O PERCURSO METODOLOGICO Nossa pesquisa, de natureza qualitativa, tem como objetivo geral analisar como vem sendo tratada a temática da ampliação do ensino fundamental para nove anos nas revistas direcionadas ao professor de Educação Básica. Para concretização do nosso estudo inicialmente fizemos um levantamento das revistas periódicos e informativos que circulam mais intensamente entre os professores de educação básica das escolas públicas. Após identificarmos esse material faremos uma seleção das publicações dos últimos dois anos para localizarmos nelas matérias diversas relacionadas à temática ampliação do ensino fundamental. Selecionamos 9 artigos encontrados em revistas que tratam de educação de maneira geral e circulam com mais facilidade entre os professores. Foram então selecionadas: Nova Escola (Editora Abril), Criança (Secretaria de Brasília-MEC e direcionada a professores de Educação Infantil), e Pátio (Editora Artmed). Lembramos que procedemos a busca dos artigos por duas vias. A primeira através de pesquisa nos respectivos sites das revistas e também através dos de busca como o google e no contato direto com os artigos impressos. Nessa procura pelos artigos relacionados ao tema por nós abordado, encontramos uma série de dificuldades. Entre elas destacamos a falta de exemplares das revistas supracitadas na biblioteca do Centro de Educação da UFPE, o que, além de limitar o nosso acesso a um diversificado acervo de conteúdo educacional, gera custos adicionais na aquisição deste material, seja na mídia impressa ou on-line. Certamente por termos optado por uma temática nova, não encontramos uma grande quantidade de material, o que não nos causou surpresa, no entanto, nos levou a não ter muitas escolhas e centrar nosso estudo no pouco acervo disponível. Contudo, a pouca quantidade de material já é para nós um indício de como leva um certo tempo para que os meios de comunicação impressos, que circulam entre os professores tratem as matérias em pauta. Para análise do material lançamos mão da análise documental. Segundo Oliveira (2005) este procedimento consiste na investigação de informações em documentos que não receberam nenhum tratamento científico como reportagens de jornais, artigos de revistas, entre outros. Entendemos que este é o procedimento mais adequado à natureza de nosso objeto nos de pesquisa. Acrescentamos que, de acordo com Oliveira (2005): “...o acesso a documentos escritos – seja em forma de relatórios, artigos, jornais, revistas ou mesmo em livros e documentos eletrônicos – em muito contribuem para um conhecimento mais aprofundado da realidade”. ( p.98) Assim, foram analisados neste trabalho os artigos que compõem o Quadro a seguir: Nº do Texto 1 2 3 Título do artigo Fonte A criança de 6 anos no Ensino Revista Criança, Nº 24 Obrigatório: um avanço social. 2006, pág. 10 A criança de 6 Revista Criança,, Nº 24 anos no Ensino Fundamental 2006, pág. 12-15 Desafios de um novo tempo. Revista Criança,, Nº 24 2006, pág. 8 e 9 4 Mais tempo para alfabetizar Revista Nova Escola, Reportagem On-line 04/05/2007. 5 Entre os brinquedos e o estudo Revista Pátio, Nº 41, 2007, pág. 34-37 6 Nove anos de escolaridade um Revista Nova Escola, Nº avanço para o Brasil 7 A transição para 176, 2007, Encarte Escola. o Ensino Revista Nova Escola, Fundamental de Nove Anos 8 Nº198, 2007, pág. 34 e 35 O ensino obrigatório aos 6 anos Revista Pátio Fev/Abr das Chagas Pátio Fev/Abr e sua ampliação para 9 anos 2006. trará vantagens ou não para os Francisco alunos? 9 Fernandes. O ensino obrigatório aos 6 anos Revista e sua ampliação para 9 anos 2006. trará vantagens ou não para os Maria alunos? Carmen Silveira Barbosa. Quadro 1: Artigos sobre ampliação do ensino fundamental para 9 anos analisados nesta pesquisa Para sabermos que informações chegam ao professor sobre a temática em tela o conteúdo dos artigos foi organizado em categorias temáticas para isso utilizamos análise de conteúdo de Bardin (2004). Lembramos que adotar esse suporte analítico implica em buscar interpretar as informações captando e refinando seus sentidos e significados. Conforme Bardin (2004, p.37) análise de conteúdo significa: “um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição de conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.” Após a leitura exaustiva de cada um dos artigos e com essa compreensão procedemos a análise dos textos para a chegarmos codificação a categorização dos mesmos. Para fazer emergir as categorias à medida que íamos nos apropriando do conteúdo dos artigos, fomos elaborando questionamentos que nos ajudassem a identificar temáticas recorrentes. Inicialmente elaboramos um grande quantitativo de questões, mas à medida que íamos estudando os artigos fomos enxugando-as e vendo que umas estavam contidas em outras. A seguir apresentamos os questionamentos, que nos ajudaram a fazer as inferências e chegar às categorias: 1. O artigo aborda aspectos estruturais do ensino fundamental como: estrutura física da escola, formação do professor, aspectos pedagógicos como: reorganização do tempo, formas de ensinar/aprender? 2. Como os autores se posicionam em relação à ampliação do Ensino Fundamental, se de forma positiva, negativa ou se são imparciais? 3. O artigo apresenta sugestões de como deve ser feito para garantir o direito proclamado da ampliação ou não? 4. O artigo apresenta exemplos de como vem ocorrendo a ampliação em outros estados ou municípios brasileiros? 5. O artigo faz referências às alterações que precisam ocorrer na educação infantil devido a ampliação ou não? 6. O artigo destaca concepções/visões de criança ? RESULTADOS E DISCUSSÃO De nossa análise emergiram seis categorias, a saber: aspectos estruturais do ensino fundamental; posturas dos autores consultados frente à ampliação do Ensino Fundamental; sugestões para garantir a ampliação; experiências de implantação do ensino fundamental; alterações na Educação Infantil devido à ampliação e concepções de criança. Aspectos estruturais do ensino fundamental Esta categoria envolve os elementos relacionados à estrutura física da escola, organização dos tempos, dos espaços, metodologias de ensino, aprendizagens e avaliação destes, bem como o currículo e a formação inicial e continuada dos profissionais da educação. Dos 9 textos consultados todos fazem referência a estes aspectos. A ampliação do ensino fundamental para 9 anos nos textos direcionados para os professores, aparece vinculada à garantia de mais tempo para a criança aprender. Por exemplo, no texto 1 encontramos a seguinte referência ao assunto: “[...] faz-se necessário políticas introdutórias de transformações significativas na estrutura da escola; na reorganização dos tempos e espaços escolares; nas formas de ensinar, aprender, avaliar, organizar e desenvolver o currículo, nas carreiras profissionais e na formação inicial e continuada dos profissionais da docência.” (p. 10) Outro aspecto não salientado com tanta ênfase, porém não menos importante é a reestruturação dos currículos. Pois, como é exemplificado no texto 4: “será necessária uma reestruturação na grade curricular das escolas brasileiras. O conteúdo dessa nova série não pode ser o mesmo do último ano da Educação Infantil, tampouco uma extensão da 1ª série – o que ainda confunde algumas instituições.” (reportagem on-line, Revista Nova escola, 04/05/2007). Ou seja, é necessário a existência de clareza acerca do aproveitamento deste tempo adicional, utilizando-se uma grade curricular coerente com a proposta de ampliação e que esta contemple os objetivos de aprendizagens destas crianças. Em relação à estrutura arquitetônica e modificações necessárias para o desenvolvimento de um processo pedagógico possível e satisfatório os artigos não demonstram tanta preocupação. Dos 9 artigos selecionados apenas o texto nº 6 faz referência a tal aspecto quando afirma que: “A Escola Estadual Bueno Brandão, em Belo Horizonte, adquiriu móveis menores e coloridos e usou as salas que davam para uma área externa para receber os pequenos. Em cada uma foi instalada uma brinquedoteca e um espelho.”(Rev 176 Encarte Escola). A preocupação da referida escola deve ser observada de maneira positiva, pois encara a ampliação do Ensino Fundamental com bastante seriedade e coerência com a proposta do MEC, buscando adaptar a estrutura atual as novas peculiaridades deste novo público. Posturas dos autores consultados frente à ampliação do Ensino Fundamental Esta categoria agrega depoimentos claramente favoráveis, posicionamentos que não são tão explicitamente favoráveis, mas deixam entrever o caráter positivo da ampliação e posicionamentos contrários à ampliação. Ao se posicionarem de maneira positiva o que os autores dos artigos evidenciam como beneficio é a oportunidade de obter o sucesso na vida acadêmica e, por conseguinte, a inclusão de maneira eqüitativa na sociedade, ou seja, incluir a parcela menos favorecida de modo que ela ocupe um espaço digno na esfera social. Dos 9 artigos selecionados, 7 encaram como positivo a ampliação do Ensino Fundamental, é o que expressa o texto nº 8 quando afirma que: “Essa ampliação do ensino fundamental constitui uma política nitidamente comprometida com a inclusão e a eqüidade. Crianças oriundas de segmentos mais desfavorecidos da sociedade são as que, em geral, têm maior dificuldade de acesso ao processo de escolarização na faixa etária de 6 anos.” (p.52). Há alguns autores que enxergam de forma negativa a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, pois consideram que tal medida caracteriza um roubo a infância. Esta fase da vida que através dos estudos de várias ciências como, por exemplo, neurológicas, psicanalíticas vem sido mais bem compreendida, quanto a sua concepção e desenvolvimento, está sendo ceifada de forma abrupta, de modo que sejam atendidas as demandas sociais da sociedade contemporânea. É o que diz o texto nº9 quando afirma: “Estamos vivendo em sociedade longevas, mas parece que dedicar 10% do tempo total de vida para a pequena infância é visto como tempo perdido. As decisões políticas e as tendências culturais apontam para que as crianças tornem-se adolescentes cada vez mais cedo e, de acordo com a classe social, exigem que elas sejam economicamente produtivas, precoces em suas aprendizagens, competitivas, erotizadas”. (p. 50) Ambos os posicionamentos carregam em suas concepções acerca da ampliação do Ensino Fundamental questões verídicas e demasiadamente polêmicas, pois tratam de aspectos inerentes a vivência social e individual dos indivíduos o que de certa forma implica reflexões e análises sobre os sentidos da alteração deste nível de ensino. Sugestões para garantir a ampliação Dos 9 textos consultados apenas 4 deles apresentam sugestões de como na prática viabilizar o direito à ampliação oficialmente garantida. Essas sugestões são mais no sentido de mobilizar os profissionais da escola, as famílias e a comunidade para essa nova realidade. É o que está posto no texto 4: “Devem estar assegurados por meio de debates democráticos, propostos pela instituição, envolvendo a comunidade, as crianças, os professores, a coordenação pedagógica, os gestores e os funcionários da instituição e as famílias.” (reportagem on-line, Revista Nova escola, 04/05/2007) Além disso, tendo clareza de que inicialmente as escolas e crianças viverão essa etapa de transição onde concomitantemente será oferecido na escola o ensino de 8 e de 9 anos. No texto 8 é destacado que” a legislação assegura a compatibilidade entre o ensino fundamental de 8 anos e o de 9 anos, sendo previsto um período de transição, no qual as duas formas de organização do ensino fundamental deverão coexistir”. A garantia dessa nova proposta vai exigir uma reestruturação tanto de recursos materiais quanto humanos, visto que será necessária uma adaptação das escolas e professores para lidar com a ampliação do Ensino Fundamental. O texto 1 traz uma sugestão quando afirma que para legitimar e efetivar o direito a essa política educacional vai ser imprescindível “... ações formativas da opinião pública, condições pedagógicas, administrativas, materiais e de recursos humanos, bem como acompanhamento e avaliação, em todos os níveis da gestão educacional.” (p. 10) Uma das preocupações dos gestores de educação é desenvolver um trabalho que esteja de acordo com a proposta do MEC, focando as diretrizes da ampliação do ensino fundamental. O texto 3 enfatiza esta idéia quando afirma a importância do poder público como mobilizador: “... o papel do poder público como promotor de debates e mobilizações nos sistemas de ensino. Com a participação de todos os atores sociais envolvidos, devem ser elaboradas diretrizes, metas e objetivos, em consonância com a legislação vigente e com os documentos oficiais orientadores”.(p.8) Experiências de implantação do ensino fundamental Esta categoria levanta o número de experiências de implantação do ensino fundamental de 9 anos em Municípios e Estados do Brasil, possibilitando ter uma compreensão mesmo que parcial do que tem ocorrido logo após a implantação das Leis n.ºs 11.114/05 e 11.274/06. Dentre os 9 artigos analisados 6 deles trazem referências à adesão da proposta de ampliação, sendo mostrado que muitos municípios já conseguiram até o momento aderir os requisitos legais mesmo tendo um prazo até 2010 para se adequar às novas exigências. O texto 4 traz dados que mostram justamente o avanço quanto a implantação do ensino fundamental de 9 anos em alguns Municípios e Estados brasileiros quando relata: “Apesar de as instituições de ensino, tanto públicas quanto particulares, terem prazo até 2010 para se adequarem à nova lei, alguns estados como Alagoas, Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Espírito Santo, além de mais de mil municípios brasileiros já adotaram a prática. De acordo com o Censo Escolar de 2005 do (INEP/MEC), 8,13 milhões de crianças (cerca de 24% de estudantes) já estavam inseridas no sistema de 9 anos.” (reportagem on-line, Revista Nova escola, 04/05/2007) Praticamente toda a rede privada de ensino do país já adotou a ampliação do ensino fundamental, o mesmo ainda não ocorreu na rede pública, porém existem Estados como Minas Gerais que foi pioneiro na adesão e já conseguiu ter todos seus Municípios com o ensino fundamental de nove anos. O texto 5 traz exatamente o que vem ocorrendo no Brasil quanto a evolução das implantações: “Se na rede privada a adesão é praticamente total, o mesmo não ocorre na pública. Aderiram à lei os estados do Amazonas, Tocantins, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Alagoas, Minas gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Goiás e Distrito Federal. Há ainda 7293 prefeituras incluídas”. (p.35) Alterações na Educação Infantil devido à ampliação Esta categoria levanta às mudanças que devem ser feitas para atender as reais necessidades desse novo público alvo. Dentre os 9 artigos, apenas 3 relatam propostas quanto a mudanças a serem feitas na educação infantil. Conforme estes artigos, através da ampliação do ensino fundamental muitas crianças que não tiveram contato com o mundo escolar irão se deparar com uma realidade diferente daquela que estavam inseridas, visto que o primeiro ano do ensino fundamental deverá articular procedimentos da última etapa da educação infantil com os trabalhos pedagógicos da antiga primeira série. No texto 6, Sérgio Leite, professor de Psicologia da Universidade Estadual de Campinas, afirma ser necessário um trabalho cooperativo entre os docentes de ambos os níveis: "Precisamos acabar com a ruptura que existe entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, quando em boa parte das escolas as brincadeiras são deixadas de lado para que os alunos trabalhem individualmente em carteiras enfileiradas. Acabar com a ruptura significa não apenas incorporar brincadeiras de pré-escola na 1ª série, mas também trazer o trabalho pedagógico estruturado para crianças que antes estariam apenas brincando”. (Rev 176 Encarte Escola) No texto 3 o autor também enfatiza a importância de haver uma cooperação entre os docentes da educação infantil e ensino fundamental, pois a aprovação da lei 11.274/06 trouxe a necessidade de adequação de salas, jogos pedagógicos e professores específicos para que as crianças consigam adaptar-se, como também desenvolver sua capacidade cognitiva. Afirma: “Pode-se destacar a cooperação mútua entre os professores da Educação Infantil e os do Ensino Fundamental, bem como a nova organização da Educação Infantil que passa a atender crianças com até 6 anos. Desta forma, os sistemas de ensino garantem maior aproximação entre a Educação Infantil e o ensino Fundamental, caracterizando uma continuidade e não ruptura.”(p. 9) Concepções de criança Esta categoria traz elementos acerca da concepção de criança e seu desenvolvimento, levando em consideração as variáveis que giram em torno de sua relação consigo mesma e com o meio no qual está inserida. Dos 9 textos selecionados 5 fazem menção a importância, como por exemplo, é citado no texto de nº3: “É necessário considerar quem é esta criança, quais são as suas formas de aprender, como se dá sua inserção na cultura, a importância das interações para o seu desenvolvimento e aprendizagem e, sobretudo, o valor do brincar como forma primordial da criança ser e de estar no mundo.” (p.8 ). Reflexões acerca de quem é esta criança e as estratégias utilizadas por ela para desenvolver suas faculdades intelectuais e relacionais a partir de práticas objetivas e desafiadoras, como é o caso das brincadeiras, constitui um pontapé inicial na busca dos objetivos traçados. Uma outra questão, levantada pelos autores, que também merece destaque refere-se ao fato de que apesar dos grandes desafios e responsabilidades contidos na formação da criança, este indivíduo ainda tem que ser encarado como tal, ou seja, no binômio criança-aluno, o último termo não pode sobrepujar o primeiro. É o que afirma o texto nº 9 quando expressa que: “Assim, ao chegar às escolas, as crianças são vistas muito mais como alunos do que como crianças; como pessoas que precisam consolidar aprendizagens concretas e construir um pensamento simbólico.”(p.52). Tal fase da aprendizagem e da vida deve ser desenvolvida de modo natural e serem respeitados os limites e peculiaridades que as crianças carregam em suas estruturas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste artigo analisamos como vem sendo tratada a temática da ampliação do Ensino Fundamental para nove anos nas revistas de circulação nacional direcionadas ao professor de Educação Básica. Em nossas análises percebemos que o material direcionado aos professores veicula dois tipos de discursos um que é o oficial, de tom mais prescritivo - do como por em prática a nova lei - e outro de teor mais crítico, que procura analisar mais a fundo as vantagens e demandas da ampliação. O primeiro, cujo protagonista é O MEC (suportes da mídia e revistas educacionais), centra-se na tentativa de tornar público a proposta de mudança e os elementos que giram em sua órbita. Esses artigos não aprofundam as reflexões e discussões sobre o tema pesquisado e têm em comum o gênero relato de experiências de implantação da ampliação do ensino fundamental em escolas de várias localidades do Brasil. Atêm-se de modo geral a relatar as práticas, necessidades e dificuldades relacionadas a implantação. Não podemos, porém negar essas que as experiências relatadas favorecem uma compreensão do que está dando certo e do que precisa melhorar para alcançar as metas proposta pelo MEC. Quanto ao acesso aos artigos tivemos dificuldades com relação à aquisição de exemplares das revistas vistos que tanto na Biblioteca do Centro de Educação, quanto em algumas unidades escolares, estas não dispunham de uma variedade que possibilitasse um trabalho de qualidade, então fomos buscar via internet, nos sites das revistas Nova Escola, Pátio, Construir e alguns endereços relacionados ao MEC. A maior dificuldade foi na aquisição dos artigos da revista Pátio, pois só eram disponibilizados para assinantes, então a solução era ir à busca de exemplares em unidades escolares, bancas de revista ou fazer a devida assinatura, porém no site da revista Nova Escola o acesso foi mais fácil e conseguimos encontrar a maioria dos conteúdos trabalhados. Os artigos da Nova Escola tratam do conteúdo como um roteiro a ser seguido, parecendo que não há exceções, mostrando-se preocupado em atender as exigências sem fazer uma crítica mais construtiva. Este trabalho foi um pontapé inicial para compreender uma pesquisa, em sua totalidade, principalmente a experiência e tarefa de análise de dados constitui-se para nós com desafiante. Assim, podemos dizer com certa segurança que o trabalho permitiu se ter uma noção de como os professores estão se apropriando do conteúdo da ampliação do ensino fundamental, bem como termos uma idéia das dificuldades vivenciadas pelos professores para o acesso ao material. Mais adiante pretendemos em estudos de pós graduação aprofundar nossos estudos sobre a temática quem analisando textos científicos/acadêmicos sobre a ampliação do direito a educação, bem como analisar a relação entre o discurso oficial sobre o assunto e as práticas na escola. REFERÊNCIAS ADRIÃO, Theresa & OLIVEIRA, Romualdo P. de (orgs.). Gestão, financiamento e direito à educação: análise da LDB e da Constituição Federal. São Paulo: Xamã, 2001. ARELARO, G. O Ensino Fundamental no Brasil: avanços, perplexidades e tendências. 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