1101108 Estrutura da Matéria II
Semana 01b – Spin e Estrutura fina e hiperfina
Jason A.C. Gallas
Departamento de Fı́sica da UFPB, 58051-970 João Pessoa,PB
http://www.fisica.ufpb.br/∼jgallas
Resumo e Motivação
Nosso objetivo aqui é estudar o momento angular de spin. Para tanto, iniciamos com uma
revisão sobre o momento de dipolo e sua relação com o momento angular orbital.
A seguir, usamos o momento de dipolo para estuar interações “menores” no átomo, que
aparecem devido a efeitos magnéticos. Neste capı́tulo, consideraremos apenas efeitos causados por campos magnéticos internos, deixando a discussão dos efeitos por campos externos para o próximo capı́tulo. Os campos internos dos átomos são a causa da estrutura
fina do espectro atômico. No final do capı́tulo iremos considerar brevemente a estrutura
hiperfina, que é um efeito semelhante, porém menor, devido às interações magnéticas entre
o núcleo e os elétrons.
1
Dipolos magnéticos orbitais
Os números quânticos n e ` foram introduzidos pela primeira vez na teoria quântica velha de Bohr
e Sommerfeld. O número quântico principal n foi introduzido no modelo de Bohr como um postulado fundamental referente à quantização do momentum angular, enquanto que o número quântico
orbital ` foi introduzido alguns anos mais tarde por Sommerfeld como um complemento para levar em
consideração a possibilidade de que as órbitas atômicas pudessem ser elı́pticas em vez de apenas circulares. Já vimos que estes dois números quânticos reaparecem no tratamento quântico completo do átomo
de hidrogênio. Depois, vimos como que tais números também servem para tratar de átomos com muitos
elétrons.
Dois resultados chave que resultam da mecânica quântica dos átomos são:
• A magnitude L do momentum angular orbital de um elétron é dada por
p
L = `(` + 1) ~
(1)
onde ` pode assumir valores inteiros até n − 1.
• A componente do momentum angular ao longo dum eixo particular (normalmente escolhido como
o eixo z) é quantizada em unidades de ~, sendo seu valor dado por
Lz = m` ~,
(2)
onde o número quântico magnético m` pode assumir valores inteiros desde −` até +`.
Esta duas relações dão origem ao modelo de momentum angular ilustrado na Fig. 1.
O movimento orbital do elétron faz com que ele tenha um momento magnético. Consideremos
primeiramente um elétron numa órbita circular de Bohr, como ilustrado na Fig. 1a. A órbita do elétron é
equivalente a um laço de corrente, e sabemos do eletromagnetismo que laços de correntes comportam-se
como ı́mans. O elétron na órbita de Bohr é equivalente a um pequeno ı́mã com um momento de dipolo
magnético µ dado por
−e
× πr2 ,
(3)
µ = i × Área =
T
(1
Dipolos magnéticos orbitais)
Figura 1: (a) O movimento orbital do elétron em torno do núcleo numa órbita circular de Bohr é equivalente a um laço de
corrente, que gera um momento de dipolo magnético. (b) Momento de dipolo magnético de um elétron numa órbita nãocircular.
onde T é o perı́odo da órbita e r o seu raio. Como T = 2πr/v, onde v é a velocidade orbital, obtemos
µ=−
ev
e
e
πr2 = −
me vr = −
L,
2πr
2me
2me
(4)
onde escrevemos L no lugar do momentum angular orbital me vr.
Esta relação pode ser facilmente generalizada para o caso de elétrons em órbitas não-circulares.
Considere um elétron com vetor posição r numa órbita não-circular com origem O. O momento de
dipolo magnético é dado por:
I
µ=
i dA,
(5)
onde i é a corrente no laço e dA é a área infinitesimal varrida pelo elétron ao mover-se na órbita. A área
infinitesimal dA está relacionada com o elemento de caminho du pela relação [veja a Fig. 1b]
dA = 21 r × du,
(6)
de modo que a Eq. (5) fica sendo
µ=
1
2
I
ir × dA,
(7)
Substitutindo a corrente pela carga, i = dq/dt, onde q é a carga, implica em
I
dq
1
µ = 2
r × du,
I dt
du
= 12 dqr ×
,
dt
I
1
2
dqr × v,
I
1
dqr × p,
2me
=
=
(8)
onde v é a velocidade e p o momentum. O momentum angular é definido por
L = r × p,
(9)
de modo que obtemos, finalmente,
µ=
1
2me
I
Ldq =
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1
2me L
I
dq =
1
2me L(−e),
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(10)
2/18
(2
Magnetismo do spin)
como na Eq. (4). Note que o resultado pode ser obtido porque o momentum angular L é uma constante
de movimento, e pode ser tirado para fora da integral. De uma perspectiva clássica, L é constante porque
a força F é radial. Temos, portanto:
dL
= Γ = r × F = 0,
dt
(11)
onde Γ é o torque. É por isto que o momentum angular acaba sendo quantizado com valores constantes
bem definidos quando consideramos a mecânica quântica do átomo1
Equação (4) nos mostra que o momentum angular orbital está diretamente relacionado ao momento de dipolo atômico. A quantidade e/(2me ) que aparece nela é chamada de razão giromagnética.
Ela especifica a constante de proporcionalidade entre o momentum angular do elétron e seu momento
magnético. Ve-se da Eq. (1) que |L| ∼ ~, e, portanto, que a magnitude dos momentos de dipolo
magnéticos é dada por
e
|µ| ∼
~ = µB ,
(12)
2me
onde µB é o magneton de Bohr definido por:
µB =
2
e~
= 9.27 × 10−24 JT−1 .
2me
(13)
Magnetismo do spin
No experimento de Stern-Gerlach, um feixe de elétrons é defletido por um campo magnético nãouniforme. A força num dipolo magnético num campo magnético não-uniforme é dada por2 :
Fz = µz
dB
,
dz
(14)
onde dB/dz é o gradiente do campo, que supomos apontar ao longo da direção z. Os experimentos
originais de Stern-Gerlach foram executados com átomos de prata, cujo estado fundamental tem uma
configuração eletrônica dada por [Kr] 4d10 5s1 . Camadas preenchidas não possuem momentum angular
lı́quido, pois contém tantos estados ocupados m` positivos quanto negativos. Além disto, elétrons em
camadas s tem ` = 0 e, portanto L = 0. O momentum angular orbital total (e portanto o momento de
dipolo magnético orbital) do átomo é zero, de modo que esperariamos nenhuma deflexão. Entretanto os
experimentos mostraram que os átomos eram defletidos ou para cima ou para baixo.
Para poder explicar a deflexão para cima e para baixo dos átomos com L = 0, precisamos supor
que cada elétron possua um tipo adicional de momento de dipolo magnético. Tal dipolo magnético é
atribuido a um tipo adicional novo de momentum angular chamado spin. Analogamente ao momentum
angular orbital, o momentum angular de spin é descrito por dois números quânticos s e ms , com ms
variando por números inteiros de −s até +s. A magnitude do momentum angular de spin é dada por
p
|s| = s(s + 1) ~,
(15)
1
Note que para o momentum angular ser constante a força tem que ser radial. Num átomo com muitos elétrons, esta
aproximação é válida apenas no limite do campo central. A inclusão de forças não-centrais através da interação eletrostática
residual (vista no capı́tulo anterior) significaria que os estados do momentum angular não são puros, mas um pouco misturados
uns com os outros. Isto pode explicar porque transições aparentemente proibidas pelas regras de seleção possam ser por vezes
observadas, embora com baixas probabilidades de transição. Não trataremos deste ponto neste curso.
2
Note que necessitamos dum campo não-uniforme para defletir um dipolo magnético. Um campo magnético uniforme
meramente exerce um torque, não uma força. Podemos entender isto através duma analogia com a eletrostática. Monopolos
elétricos (i.e. cargas livres) podem ser movidas aplicando-se campos elétricos, porém dipolos elétricos não sentem força lı́quida
resultante pois um campo uniforme faz com que as forças nas cargas positiva e negativa cancelem-se. Se desejarmos aplicar
uma força num dipolo elétrico necessitamos, portanto, dum campo não-uniforme, de modo que as forças nas duas cargas sejam
diferentes. Monopolos magnéticos não existem (tanto quanto se saiba hoje . . . ) e, portanto, todos ı́mans atômicos são dipolos.
Portanto é necessário aplicar um campo magnético não-uniforme para exercer uma força magnética num átomo.
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(3
Acoplamento spin-órbita)
e a componente ao longo do eixo z é dada por
sz = ms ~.
(16)
A deflexão para cima e para baixo observada experimentalmente em átomos com um único elétron com
L = 0 é consistente com os seguintes valores de s e ms :
s =
ms =
1
2,
(17)
± 12 .
(18)
As deflexões medidas no experimento de Stern-Gerlach permitiram que a magnitude do momento
magnético devido ao momentum angular de spin pudesse ser determinada. A componente ao longo do
eixo z foi determinada como obedecendo a relação
µz = −gs µB ms ,
(19)
onde gs é o valor g do elétron. O valor experimental de gs foi determinado com sendo perto de 2.
A equação de Dirac prediz que gs deve ser exatamente igual a 2 e cálculos mais recentes baseados na
eletrodinâmica quântica (QED) dão um valor de 2.0023192, que concorda muito bem com os dados
experimentais mais precisos disponı́veis [olhe no Google...].
Na próxima secção iremos começar a discutir as interações entre o movimento orbital e o spin
dos elétrons. Iremos ver que isto causa a estrutura fina do espectro atômico, que somente pode ser
explicada postulando-se que os elétrons possuam spin. Antes de faze-lo, é útil listar algumas evidências
experimentai adicionais que indicam que elétrons possuem spin.
• A tabela periódica dos elementos, que é o fundamento de toda a quı́mica, não pode ser explicada
a menos que suponhamos que os elétrons possuam spin.
• Se ignorarmos o spin, deveriamos observar o efeito Zeeman normal quando um átomo for colocado
num campo magnético externo. Entretanto, como veremos no próximo capı́tulo, a maioria dos
átomos apresenta um efeito Zeeman anômalo, que é uma conseqüência do spin.
• Podemos medir a razão giromagnética diretamente de diversos modos. Em 1915, Einstein e de
Haas mediram a razão giromagnética do ferro obtendo valores duas vezes maiores que o esperado.
Eles rejeitaram tal resultado, atribuindo-o a erros experimentais. Entretanto, hoje sabemos que o
magnetismo do ferro é causado pelo spin, não pelo momentum angular orbital e, portanto, o valor
experimental de duas vezes e/(2me ) estava correto devido ao fator giromagnético do elétron. Isto
é uma lição salutar da história pois mesmo grandes fı́sicos como Einstein e de Haas podem fazer
uma análise de erros incorreta.
3
Acoplamento spin-órbita
Nas duas secções anteriores vimos que elétrons em átomos possuem tanto momentum angular orbital
quanto de spin. Ambos tipos de momentum angular produzem dipolos magnéticos, e isto conduz a um
novo termo de interação no Hamiltoniano do átomo. Tal interação entre os momentos angulares orbital
e de spin é chamada de acoplamento spin-órbita.
Teorias sofisticadas do acoplamente spin-órbita (e.g. teorias baseadas na equação de Dirac) mostram que tal acoplamente é um efeito relativı́stico3 . Nesta altura é mais conveniente considerar o acoplamento spin-órbita de um modo mais intuitivo como a interação entre o campo magnético devido ao
movimento orbital do elétron e o momento magnético devido ao seu spin. Este é o procedimento que
adotaremos aqui. Começaremos fornecendo uma simples estimativa da ordem de magnitude baseada no
modelo semi-clássico de Bohr, para posteriormente apresentar um método mais geral que funciona no
referencial abrangente da mecânica quântica.
3
Esta afirmativa parece ser uma lenda! Veja o que diz A. Halprin, Pedagogy of spin in nonrelativistic quantum mechanics,
Am. J. Phys. 46, 768 (1974).
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3.1
Acoplamento spin-órbita no modelo de Bohr
3.1
Acoplamento spin-órbita no modelo de Bohr
(3
Acoplamento spin-órbita)
Figura 2: Um elétron movendo-se com velocidade v através do campo elétrico E do núcleo sente um campo magnético igual a
(E × v)/c2 . O campo magnético pode ser entendido deslocando-se a origem para o elétron e calculando-se o campo magnético
devido ao movimento orbital do núcleo em volta do elétron. A velocidade do núcleo neste referencial é igual a −v.
A maneira mais fácil de entender o acoplamento spin-órbita é considerar o elétron único do átomo
de hidrogênio numa órbita circular à-la Bohr em torno do núcleo, e então mudar a origem das coordenadas para o elétron, como indicado na Fig. 2. Neste referencial, o elétron é estacionaário e o núcleo
move-se numa órbita circular de raio rn . A órbita do núcleo é equivalente a um laço de corrente, que
produz um campo magnético na origem. O campo magnético produzido por um laço circular de raio r
carregando uma corrente i é dado por:
µ0 i
Bz =
,
(20)
2r
onde z foi escolhida como sendo a direção perpendicular ao laço. Como na Secção 1, a corrente i é dada
pela carga Ze dividida pelo perı́odo T = 2πr/v. Substituindo-se a velocidade e o raio fornecidos pelo
modelo de Bohr (veja as notas anteriores!) encontramos:
µ0 Zevn Z 4 µ0 αce
Bz =
=
,
(21)
4πrn2
n5 4πa20
onde α ' 1/137 é a constante de estrutura fina (veja as notas anteriores). Para o hidrogênio, com
Z = n = 1, a fórmula fornece Bz ≈ 12 Tesla, que é um campo bastante forte.
O elétron na origem sente este campo orbital e, portanto, temos uma energia de interação da forma
∆Eso = −µs · Borbital ,
(22)
∆Eso = gs µB ms Bz = ±µB Bz ,
(23)
que, com a Eq. (19), fica
onde usamos gs = 2 na última igualdade. Substituindo-se Bz da Eq. (21) e µB da Eq. (13), encontramos:
Z 4 µ αce~
2
0
2Z
|∆Eso | =
≡
α
|En |,
(24)
n5 8πme a20
n3
onde En é a energia quantizada do átomo de hidrogênio (veja as notas anteriores). Para a órbita n = 1
do hidrogênio, ela fornece:
|∆Eso | = α2 RH = 13.6 eV/1372 = 0.7 meV ≡ 6 cm−1 .
(25)
Este valor mostra que a interação spin-órbita é da ordem de 104 vezes menor do que a estrutura grossa
no hidrogênio. Note que a magnitude relativa da interação spin-órbita cresce com Z 2 , de modo que os
efeitos spin-órbita são esperados tornarem-se mais importantes em átomos mais pesados, o que de fato é
o caso. Note também que a Eq. (24) pode ser re-escrita como
v 2 |E |
n
,
(26)
|∆Eso | = n
c
n
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3.2
Acoplamento spin-órbita posteriormente ao modelo de Bohr
(3
Acoplamento spin-órbita)
Figura 3: O campo magnético na origem O devida a um laço de
corrente carregando uma corrente i é calculada pela lei de BiotSavart dada na Eq. (27). O campo aponta para fora da página.
o que mostra que a energia da interação spin-órbita é da mesma magnitude que as correções relativı́sticas
que seriam esperadas para o modelo de Bohr. Isto dificilmente é uma surpresa, dado que Dirac4 nos diz
que na realidade devemos pensar o acoplamente spin-órbita como sendo um efeito relativı́stico.
3.2
Acoplamento spin-órbita posteriormente ao modelo de Bohr
Nesta subsecção repetimos o cálculo da energia de interação spin-órbita porém sem fazer uso dos resultados semi-clássicos do modelo de Bohr. Os elétrons num átomo sentem um campo magnético a medida
que se movem através do campo elétrico do núcleo. Se a velocidade do elétron for v, ele verá o núcleo
orbitando-o com uma velocidade −v, como mostrado na Fig. 2. Como mostrado na Fig. 3, o campo
magnético gerado no elétron pode ser calculado pela lei de Biot-Savart. Ela fornece o campo magnético
na origem de um laço carregando uma corrente i como sendo:
I
du × r
µ0
i
,
(27)
B=
4π laço
r3
onde du é um caminho orbital elementar. Por simplicidade, consideramos o caso com r constante,
quando então temos:
I
I
dq
du
idu =
du = Ze
= Ze(−v).
(28)
dt
dt
Portanto,
µ0 Ze
µ0 Ze
v×r=
r × v.
3
4π r
4π r3
Para um campo Coulombiano o campo elétrico E é dado por
B=−
E=
Ze
Ze
b
r=
r,
2
4π0 r
4π0 r3
(29)
(30)
onde o “chapéu” em b
r indica que ele é um vetor unitário. Combinando as Eqs. (29) e (30) obtemos
B = µ0 0 E × v.
(31)
Sabemos das equações de Maxwell que µ0 0 = 1/c2 , de modo que podemos escrever a expressão acima
como
1
(32)
B = 2 E × v.
c
Esta mesma fórmula pode ser derivada para o caso mais geral de órbitas não-circulares e campos nãoCoulombianos tais como os encontrados em átomos com muitos elétrons.
4
P.A.M. Dirac, The quantum theory of the electron, Proc. Royal Soc. London A 117, 610-624 (1928).
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3.2
Acoplamento spin-órbita posteriormente ao modelo de Bohr
(3
Acoplamento spin-órbita)
A energia de interação spin-órbita é dada por
∆Eso = −µs · Borbital ,
(33)
onde µs é o momento magnético devido ao spin, que é dado por
µs = −gs
|e|
µB
s = −gs
s.
2me
~
(34)
Substituindo-se as Eqs. (32) e (34) na Eq. (33), obtemos
∆Eso =
gs µB
s · (E × v).
~c2
(35)
Se tivermos um campo central (i.e. um potencial V que dependa apenas de r), podemos escrever5 :
E=
1 r dV
.
e r dr
(36)
Usando-se isto, a energia de interação spin-órbita fica:
gs µB 1 dV ∆Eso = 2
s · (r × p),
~c eme r dr
(37)
onde substituimos v = p/me . Lembrando que o momentum angular l é definido como r × p, temos:
∆Eso =
gs µB 1 dV s · l.
~c2 eme r dr
(38)
Este cálculo de ∆Eso não leva os efeitos relativı́sticos devidamente em consideração. Em particular, movemos a origem do núcleo para o elétron, o que não é de fato permitido pois o elétron está
acelerando todo o tempo e, portanto, não é um referencial inercial. A translação para o refrencial girante
dá origem a um efeito extra chamado precessão de Thomas que reduz a energia por uma fator de 2
(veja Eisberg e Resnick, Apêndice O). Levando-se a precessão de Thomas em conta, e relembrando que
µB = e~/(2me ), obtemos o resultado final:
∆Eso =
gs 1 1 dV s · l.
2 2c2 m2e r dr
(39)
Este é o mesmo resultado fornecido pela equação de Dirac, exceto que gs é exatamente igual a 2 na teoria
de Dirac. A Eq. (39) mostra que o spin e o momentum angular estão intrinsecamente acoplados. Para
um simples campo Coulombiano tomamos gs = 2 e encontramos
∆Eso =
Ze2 1 s · l.
8π0 c2 m2e r3
(40)
Podemos usar esta fórmulas para átomos hidrogenóides, enquanto que a Eq. (39) serve para átomos multieletrônicos mais complicados, onde o potencial irá diferir da dependência Coulombiana 1/r, devido à
repulsão entre os elétrons.
5
É fácil verificar que isto funciona para um campo Coulombiano V = −Ze2 /(4π0 r) e para E dado pela Eq. (30).
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(4
Momentum angular orbital total)
Figura 4: (a) Modelo vetorial de um átomo. A interação spin-órbita acopla l e s de modo a formar a resultante j. As magnitudes
p
p
p
dos vetores são dadas por: |j| = j(j + 1)~, |l| = l(l + 1)~, |s| = s(s + 1)~. (b) Adição vetorial de dois vetores
momentum angular A e B formando a resultante C.
4
Momentum angular orbital total
O momentum angular orbital e de spin do elétron acoplam-se através da interação spin-órbita para formar
uma resultante, conforme ilustrado6 . na Fig. 4. O momentum angular resultante j é definido pela soma:
j = l + s.
(41)
O momentum angular total j é descrito pelos números quânticos j e mj de acordo com as regras usuais
para momentos angulares, a saber
p
|j| = j(j + 1)~,
(42)
e
jz = mj ~,
(43)
onde mj assume valores j, (j − 1), · · · , −j.
Podemos encontrar os valores que j assume aplicando as regras para a adição de momentum
angulares. Suponhamos que C é a resultante de dois momentos angulares A e B como mostrado na
Fig. 4b, de modo que
C = A + B.
(44)
Por simplicitade, supomos que |A| > |B|. (O argumento não é afetado se |A| < |B|.) Definimos θ
como sendo o ângulo entre os dois vetores, como mostrado na Fig. 4b.
Na fı́sica clássica o ângulo θ pode assumir qualquer valor de 0o a 180o . Portanto, |C| pode assumir
qualquer valor entre |A| + |B| e |A| − |B|. Entretanto isto não acontece em mecânica quântica, pois os
comprimentos dos vetores momentum angular devem ser quantizados de acordo com
p
|A| = pA(A + 1) ~,
|B| = pB(B + 1) ~,
|C| =
C(C + 1) ~,
(45)
onde A, B e C são os números quânticos. A regra é:
C pode assumir todos valores em passos inteiros de A + B até |A − B|.
(46)
Isto significa que θ pode assumir apenas valores especı́ficos, não um contı́nuo de valores.
Ao aplicar-se esta regra para a resultante j definida na Eq. (41), estamos considerando um elétron
único com número quântico orbital l e número quântico de spin s = 1/2. Encontramos portanto que
j = (l + 1/2) ou j = (l − 1/2), exceto quando l = 0, caso em que apenas podemos ter j = 1/2.
Eis aqui alguns exemplos adicionais da aplicação da regra da Eq. (46)
6
Representações gráficas do tipo mostrado na Fig. 4 são chamadas modelos vetoriais. Iremos encontrar modelos vetoriais
novamente ao estudar o efeito Zeeman, na semana seguinte.
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8/18
(5
Cálculo da energia de spin-órbita para o hidrogênio)
• J = L + S, para L = 3, S = 1:
L + S = 4, |L − S| = 2, portanto J = 4, 3, 2.
• L = l1 + l2 , para l1 = 2, l2 = 0:
l1 + l2 = 2, |l1 − l2 | = 2, portanto L = 2.
• S = s1 + s2 , para s1 = 1/2, s2 = 1/2:
s1 + s2 = 1, |s1 − s2 | = 0, portanto S = 1, 0.
• J = j1 + j2 , para j1 = 5/2, j2 = 3/2:
j1 + j2 = 4, |j1 − j2 | = 1, portanto J = 4, 3, 2, 1.
5
Cálculo da energia de spin-órbita para o hidrogênio
A magnitude da energia de spin-órbita pode ser calculada da Eq. (39) como
1 D 1 dV E
∆Eso = 2 2
hs · li,
2c me r dr
onde tomamos g2 = 2, e, como é usual, a notação h· · · i indica o cálculo de valores esperados:
D 1 dV E Z Z Z
1 dV ∗
=
ψnlm r2 sin θdrdθdφ.
ψnlm
r dr
r dr
(47)
(48)
A função (dV /dr)/r depende apenas de r, de modo que temos que calcular apenas a integral sobre r:
1 dV D 1 dV E Z ∞
=
|Rnl (r)|2
r2 dr,
(49)
r dr
r dr
0
onde Rnl (r) é a função de onda radial. Esta integral pode ser calculada exatamente no caso do campo
Coulombiano num átomo de hidrogênio onde (dV /dr)/r ∝ 1/r3 , e as funções de onda radiais são
conhecidas exatamente (conforme vimos da revisão do átomo de hidrogênio; livro do Foot!). Neste caso,
temos7 para l ≥ 1:
D 1 dV E D 1 E
Z3
∝ 3 = 3 3
.
(50)
r dr
r
a0 n l(l + 12 )(l + 1)
Isto mostra que podemos re-escrever a Eq. (47) na forma
∆Eso = Cnl hs · li,
(51)
onde Cnl é uma constante que depende apenas de n e l.
Para calcular hs · li basta usarmos a Eq. (41) para ver que
j2 = (l + s)2 = l2 + s2 + 2 s · l.
(52)
Isto implica termos
hs · li =
D
1 2
2 (j
E ~2 − l2 − s2 ) =
j(j + 1) − l(l + 1) − s(s + 1) .
2
(53)
Portanto, encontramos
0
∆Eso = Cnl
j(j + 1) − l(l + 1) − s(s + 1) ,
(54)
0 = C ~2 /2. Usando a Eq. (50) obtemos o resultado final para l ≥ 1:
onde Cnl
nl
∆Eso = −
n
α2 Z 2
En
j(j + 1) − l(l + 1) − s(s + 1) ,
1
2
2n
l(l + 2 )(l + 1)
(55)
7
Para detalhes destes cálculos consulte o excelente livro de Hans A. Bethe e Edwin E. Salpeter, Quantum Mechanics of
One- and Two-Electron Atoms, Dover Publications, 2008, reprint do original no Hanbuch der Physisk. Este livro é uma jóia
rara! Custa 14 dólares na A MAZON.
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(6
Efeitos de spin-órbita em átomos com muitos elétrons)
onde α ≈ 1/137 é a constante de estrutura fina, e En = −RH Z 2 /n2 é igual a energia grossa. Para
estados com l = 0 ve-se da Eq. (47) que ∆Eso = 0.
O fato de j assumir valores de l + 1/2 até l − 1/2 para l ≥ 1 significa que a interação spin-órbita
“esplita” (= levanta a degenerescência) de dois estados j como o mesmo valor de l. Portanto esperamos
que os estados eletrônicos do hidrogênio com l ≥ 1 se separem em dubletes. Porém, a estrutura fina real
do hidrogênio é mais complicada por duas razões:
Figura 5:
Estrutura
fina do nı́vel n = 2 do
átomo de hidrogênio.
1. Estados com mesmo n mas l diferentes são degenerados.
2. A interação spin-órbita é pequena.
O primeiro item é uma propriedade geral de sistemas contendo apenas um elétron, e o segundo segue
do escalamento de ∆Eso /En com Z 2 . Uma conseqüência do segundo item é que outros efeitos relativı́sticos que desprezamos até aqui tem magnitude semelhante ao acoplamento spin-órbita. Em átomos
com valores de Z mais elevados o acoplamento spin-órbita é a correção relativı́stica dominante, e podemos desprezar os demais efeitos.
A estrutura fina do nı́vel n = 2 no hidrogênio é illustrada na Fig. 5. A teoria relativı́stica de Dirac
prediz que estados com o mesmo j são degenerados. A degenerescência dos dois estados j = 1/2 é
levantada por um efeito da eletrodinâmica quântica (QED) chamado de “deslocamento de Lamb” (Lamb
shift). As complicações da estrutura fina do hidrogênio devidas a outros efeitos relativisticos e efeitos da
QED significam que o hidrogênio não é um bom paradigma para se entender os efeitos de spin-órbita.
Na verdade, os efeitos de spin-órbita são bem mais simples de se entender nos álcalis [considerados mais
adiante, na Secção 9, pág. 13].
6
Efeitos de spin-órbita em átomos com muitos elétrons
O Hamiltoniano dum átomo com N elétrons com o acoplamento spin-órbita incluido pode ser escrito na
forma
b =H
b0 + H
b1 + H
b2,
H
(56)
onde
b0 =
H
b1 =
H
N X
i=1
N
X
i>j
b2 =
H
N
X
−
~2 2
Ze2
∇i −
+ Vcentral (ri ) ,
2m
4π0 ri
(57)
N
X
e2
−
Vcentral (ri ),
4π0 |ri − rj |
(58)
ξi `i · si .
(59)
i=1
i=1
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(7
Acoplamento LS)
b 1 é o potencial eletrostático
b 0 é o Hamiltoniano de campo central e H
Como vimos na semana anterior, H
b
residual. O termo H2 é a interação de spin-órbita somada sobre os elétrons do átomo [veja Eq. (39),
pág. 7].
No roteiro da semana anterior (“Modelo de camadas e o espectro de alcalinos”) desprezamos
b1 e H
b 2 , concentrando-nos apenas em H
b 0 . Isto levou à conclusão de que cada elétron ocupa
ambos H
um estado numa camada definida pelos números quânticos (n, l, ml , ms ). A energia destas camadas
b 1 é que as forças não-radiais
depende majoritariamente em n e l. A razão de termos então desprezado H
b 2 foi desprezado
devidas à repulsão elétron-elétron são menores do que as forças radiais, enquanto que H
porque os efeitos spin-órbita são muito menores do que os efeitos principais no Hamiltoniano. Chegou
b1 e H
b 2 , são ambos incluidos. Ao faze-lo,
a hora de estudar o que acontece quando estes dois termos, H
8
existem dois limites óbvios :
b1 H
b 2 . Este limite ocorre principalmnete em átomos com Z pequenos e
• acoplamento LS: H
médio.
b1 H
b 2 . Este limite ocorre em alguns átomos com Z grande.
• acoplamento jj: H
Começamos considerando o limite mais comum, do acoplamento LS, deixando o acoplamento jj para
depois, na Secção 11, pág. 16.
7
Acoplamento LS
No limite do acoplamento LS (também conhecido como acoplamento de Russell-Saunders), a interação eletrostática residual é muito mais forte que a interação spin-órbita. Portanto, lidaremos primeiramente com a interação eletrostática residual, considerando posteriormente a interação spin-órbita como
uma perturbação. O regime de acoplamento LS vale para a maior parte dos átomos com números
atômicos pequenos e médios.
Primeiramente discutimos algumas questões de notação. Necessitaremos distingüir entre os números quânticos que se referem aos elétrons individuais dentro dum átomo e aos do estado do átomo
como um todo. A convenção é a seguinte:
• Números quânticos minúsculos (j, l, s) referem-se a elétrons individuais dentro de átomos.
• Números quânticos maiúsculos (J, L, S) referem-se aos estados de momentum angular do átomo
todo.
Para átomos com um único elétron como o hidrogênio, não há diferenças. Entretanto, átomos multielétrons existe uma diferença real porque precisamos distingüir entre estados de momentum angular dos
elétrons individuais e as resultantes que dão os estados de momento angular de todo átomo.
Podemos usar esta notação para os estados de momentum angular o acoplamento LS produz. A
interação eletrostática residual tem o efeito de acoplar o momentum angular orbital e de spin dos elétrons
individuais, de modo que a resultante é encontrada de acordo com:
X
L=
li ,
(60)
i
S=
X
si .
(61)
i
Camadas preenchidas de elétrons não possuem momentum angular resultante e, assim sendo, os somatórios acima precisam ser feitos apenas sobre os elétrons de valência. Em átomos com muitos elétrons,
as regras de adição para momentum angulares quânticos (Secção 4, pág. 8), usualmente fornecem vários
valores para os números quânticos L e S para uma dada configuração eletrônica. Suas energias irão
diferir graças à interação eletrostática residual. Os estados atômicos definidos pelos valores de L e S são
chamados de termos.
8
Em alguns átomos com valores médio-grandes de Z (e.g. germânio, Z = 32) encontramo-nos na situação desconfortável
em que nenhum dos dois limites se aplica. Temos então acoplamentos intermediários cujo comportamente é bem mais difı́cil
de se descrever.
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(7
Acoplamento LS)
Figura 6: Separações dos nı́veis de energia para
a configuração (3s, 3p) do magnésio no regime
de acoplamento LS.
Para cada termo atômico, podemos encontrar o momentum angular total do átomo todo via
J = L + S.
(62)
Os valores de J, o número quântico correspondente a J, são encontrados de acordo com as regras da
mecânica quântica para a adição de momentos angulares dadas (Secção 4). Os nı́veis dos diferentes J
correspondentes aos valores particulares de L e S terão energias diferentes devido à interação spin-órbita.
A interação spin-órbita tem agora a forma
· Bátomo
∆Eso ∝ −µátomo
s
orbital ∝ L · S,
(63)
onde “átomo” indica que tomamos os valores resultantes para todo o átomo. Seguindo método análogo
ao da Secção 5, encontramos que
∆Eso = CLS J(J + 1) − L(L + 1) − S(S + 1) .
(64)
Isto implica que os nı́veis com mesmo L e S mas diferentes J estão separados por uma energia que é
proporcional a J.
É conveniente introduzir uma notação abreviada para rotular os nı́veis de energia que ocorrem no
regime de acoplamento LS. Cada nı́vel é rotulado pelos números quânticos J, L e S, sendo representados
na seguinte forma:
2S+1
LJ .
(65)
Os fatores (2S +1) e J aparecem como números, enquanto que L é representado por uma letra que segue
a seguinte ordem (“histórica”)
• S para L = 0,
• P para L = 1,
• D para L = 2,
• F para L = 3, etc
Assim, por exemplo, um termo 2 P1/2 corresponde ao nı́vel de energia com números quânticos S =
1/2, L = 1, e J = 1/2, enquanto que 3 D3 tem S = 1, L = 2 e J = 3. O fator (2S + 1) no canto
superior esquerdo é chamado de multiplicidade. Ele indica a degenerescência do nı́vel devida ao spin:
i.e. o número de estados MS disponı́veis. Se S = 0 a multiplicidade é 1, e os termos respectivos são
chamados de singletes. Se S = 1/2, a multiplicidade é 2 e temos então os dubletes. Se S = 1 temos
tripletes, etc.
A Fig. 6 ilustra os pontos principais que estivemos considerando nesta Secção para a configuração
eletrônica (3s, 3p) do magnésio. Os detalhes dos nı́veis de energia não nos devem preocupar nesta
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(9
Acoplamento spin-órbita em átomos alcalinos)
altura. O ponto principal é perceber o modo geral como os estados tem suas energias separadas a medida
que levamos interações adicionais em consideração bem como a terminologia usada para designar tais
estados.
8
Regras de seleção dipolares no limite LS
Quando consideramos transições de dipolo elétrico entre os estados dos átomos com muitos elétrons que
tem acoplamento LS, um único elétron pula de uma camada atômica para uma nova camada. As regras
que se aplicam a tal elétron são as mesmas discutidas nas notas sobre “Transiçőes radiativas”. Porém,
precisamos pensar também no estado de momentum angular do átomo todo, conforme especificado pelos
números quânticos (L, S, J). As regras que emergem são as seguintes:
1.
2.
3.
4.
5.
A paridade da função de onda tem que mudar.
∆l = ±1 para um elétron que pula entre camadas.
∆L = 0, ±1, porém L = 0 → 0 é proibida.
∆J = 0, ±1, porém J = 0 → 0 é proibida.
∆S = 0.
A regra 1 é conseqüência da paridade ı́mpar do operador momento de dipolo. A regra 2 aplica a regra de
elétron único ao elétron individual que faz o pulo na transição, e a regra 3 aplica tal regra ao átomo todo9 .
A regra 4 segue do fato que o momentum angular total deve ser conservado na transição, permitindo-nos
escrever
Jinicial = Jfinal + Jfóton .
(66)
O fóton tem uma unidade de momentum angular e assim, aplicando as regras da Secção 4, concluimos
que ∆J = −1, 0 ou +1. Entretanto, a regra não pode ser aplicada para transições ∆J = 0 → 0 pois não
é possı́vel satisfazer a Eq. (66) nestas circunstâncias. Finalmente, a regra 5 é uma conseqüência do fato
que o fóton não interage com o spin10
9
Acoplamento spin-órbita em átomos alcalinos
Podemos aplicar o resultado na Eq. (64) aos metais alcalinos, que são átomos quase um-elétron. Com
apenas um elétron de valência, a distinção entre acoplamento LS e jj é supérflua. Se o elétron único
de valência estiver na camada nl, temos L = l, S = s = 1/2 e J = j, onde j = l ± 1/2 para l ≥ 1 e
j = 1/2 para l = 0.
O caso mais simples de se considerar é quando o elétron está numa camada s. Então teremos
L = 0, S = 1/2 e J = 1/2, de modo que L · S = 0. Portanto a energia spin-órbita dum elétron s é zero.
Consideremos agora o caso quando o elétron de valência está numa camada com l 6= 0. Temos
então L = l e S = 1/2, de modo que L · S 6= 0. J tem dois valores possı́veis, a saber (L + 1/2) e
(L − 1/2). A energia spin-órbita do estado J = L + 1/2 é dada pela Eq. (64) como
∆Eso = C (L + 12 )(L + 23 ) − L(L + 1) − 12 · 32 = +CL,
(67)
enquanto que para o nı́vel J = L − 1/2 temos
∆Eso = C (L − 12 )(L + 21 ) − L(L + 1) −
1
2
·
3
2
= −C(L + 1).
(68)
9
Transições com ∆L = 0 são obviamente proibidas em átomos com um elétron, pois L = l e l devem mudar. Entretanto,
em átomos com mais de um elétron de valência, é possı́vel ter-se transições entre diferentes configurações que satisfaçam a
regra 2, mas tem o mesmo valor de L: e.g. 3p4p 3 P1 → 3p4s 3 P1 .
10
Transições com ∆S 6= 0 podem ser fracamente permitidas quando o acoplamento spin-órbita é forte, pois o spin estará
então misturado com o movimento orbital.
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(9
Acoplamento spin-órbita em átomos alcalinos)
Figura 7:
Interações spin-
órbita em átomos alcalinos.
(a) A interação spin-órbita
separa os estados nl num
dublete se l 6= 0. (b) Estrutura fina das linhas amarelas
D do sódio.
Elemento
Lı́tio
Sódio
Potássio
Rubı́dio
Césio
Z
3
11
19
37
55
Estado fundam.
[He] 2s1
[Ne] 3s1
[Ar] 4s1
[Kr] 5s1
[Xe] 6s1
1o estado excit.
2p
3p
4p
5p
6p
Transição
2p→2s
3p→3s
4p→4s
5p→5s
6p→6s
∆E (cm−1 )
0.33
17
58
238
554
∆E/Z 2
0.03666
0.14049
0.16066
0.17384
0.18314
Tabela 1: Esplitamento spin-órbita ∆E das linhas D dos elementos alcalinos. O esplitamento de energia é igual à diferença das
energias dos nı́veis J = 3/2 e J = 1/2 do primeiro estado excitado.
Portanto, o termo definido pelos números quânticos n e l é separado (“esplitado”) pelo acoplamento spinórbita em dois novos estados, como ilustrado na Fig. 7a. Isto dá origem ao aparecimento de dubletes no
espectro atômico. O mais conhecido destes, a saber o dublete amarelo da linha D do sódio, é discutido
abaixo. A magnitude da separação é menor que a energia grossa por um fator ∼ α2 = 1/1372 =
0.5 × 10−4 , veja Eq. (55). É por esta razão que todos estes efeitos são chamados de “estrutura fina”, α
sendo então chamada de “constante de estrutura fina”, como já sabemos.
Exemplo: As linhas D do sódio
O sódio tem 11 elétrons, com um elétron de valência na camada externa 3s, localizada fora das camadas
preenchidas 1s, 2s, e 2p. Ele pode portanto ser tratado como um sistema com um elétron, desde que nos
lembremos que isto é apenas uma aproximação. Uma conseqüência imediata é que os diferentes estados
l provenientes do mesmo n não são degenerados como o são para o hidrogênio. As linhas D amarelas
fortes do sódio correspondem à transição 3p → 3s.
É bem sabido que as linhas D são na verdade um dublete, como mostrado na Fig. 7b. O dublete
aparece por causa do acoplamento spin-órbita. O estado fundamental é um nı́vel 2 S1/2 com esplitamento
spin-órbita zero. O estado excitado é esplitado em dois nı́veis provindos de diferentes valores de J para
L = 1 e S = 1/2, a saber os nı́veis 2 P3/2 e 2 P1/2 . As duas transições do dublete são portanto:
2
P3/2 →2 S1/2
(69)
P1/2 →2 S1/2 .
(70)
e
2
A diferença de energia de 17 cm−1 entre eles vem do esplitamento spin-órbita dos dois estados J do
termo 2 P.
Argumentos semelhantes podem ser aplicados aos outros álcalis. Os esplitamentos da energia
spin-órbita dos seus primeiros estados excitados estão tabulados na Tabela 1. Note que o esplitamento
cresce com Z, e que o esplitamento da energia é aproximadamente proporciomal a Z 2 , como mostrado
na Fig. 8. Isto é um exemplo do fato que as interações spin-órbita geralmente crescem com o número
atômico, de modo que o acoplamento spin-órbita é bem mais forte nos átomos mais pesados.
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(10
Regras de Hund)
Figura 8: Esplitamento spin-órbita dos primeiros estados excitados dos átomos alcalinos versus Z 2 , conforme determinado pelo esplitamento da estrutura fina
das linhas D. Veja Tabela 1.
10
Regras de Hund
Vimos acima que existem muitos termos no espectro de energia dum átomo com muitos elétrons. Destes,
um deles terá a energia mais baixa, constituindo-se no estado fundamental. Todos os outros são estados
excitados. Cada átomo tem um estado fundamental único, que é determinado minimizando a energia dos
seus elétrons de valência, incluindo as interações eletrostática residual e spin-órbita. Em princı́pio, este é
um cálculo bem complicado. Afortunadamente, entretanto, as regras de Hund nos permitem determinar
qual nı́vel é o estado fundamental sem cálculos longos. As regras são as seguintes:
P
1. Maximize o número quântico MS = ms , e tome S = |MS |.
P
2. Maximize ML =
ml sujeito à regra 1, e tome L = |ML |.
3. J = |L − S| se a camada estiver menos da metade cheia, caso contrário J = |L + S|.
A primeira destas regras nos diz basicamente que os elétrons tentam alinhar-se com seus spins paralelos.
A causa disto é a interação de troca (a ser vista mais adiante), que é a origem do ferromagnetismo. Note
que estas regras não podem ser usadas para obter o ordenamento em energia dos estados excitados.
Vejamos o carbono, a tı́tulo de exemplo. Carbono tem número atômico Z = 10 com dois elétrons
de valência na camada mais externa 2p. Cada elétron tem portanto l = 1 e s = 1/2. Considere
primeiramente a configuração (2p,np) do estado excitado com um elétron na camada 2p e outro na
camada np, com n ≥ 3. Pelas regras de adição de momentum angular, podemos ter L igual a 0, 1 e 2, e
S igual a 0 ou 1. Isto dá origem a três termos singletes,
1
S0 ,
1
P1 ,
1
P1 ,
3
P2 ,
3
D2 ,
e sete tripletes,
3
S1 ,
3
P0 ,
3
D1 ,
3
D2 ,
3
D2 .
Temos portanto um conjunto confuso de dez termos no espectro de energia para a configuração (2p,np).
A situação na configuração (2p,2p) do estado fundamental é simplificada pelo fato que ambos
elétrons estão na mesma camada. O princı́pio de exclusão de Pauli proibe a possibilidade de dois ou
mais elétrons terem o mesmo conjunto de números quânticos. Isto significa que apenas cinco dos dez
termos listados acima são admissı́veis, a saber aqueles que tem L + S igual a um número par, isto é11 :
1
S0 ,
1
D2 ,
3
P0 ,
3
P1 ,
3
P2 .
Podemos aplicar as regras de Hund para determinar qual destes estados é o estado fundamental. Os dois
elétrons podem ir para seis possı́veis sub-nı́veis (ms , ml ) da camada 2p.
11
Não existe explicação simples do porque L + S deve ser par para elétrons equivalentes. A derivação dos estados permitidos
para a configuração (np, np) dum átomo do grupo IV é considerada, por exemplo, por G.K. Woodgate, Elementary Atomic
Structure, 2nd Edition, Oxford University Press, Oxford, 1980, Section 7.2.
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(11
ms
+1/2
−1/2
Acoplamento jj)
ml
−1 0 +1
↑ ↑
Tabela 2: Distribuição dos dois elétrons de valência do estado fundamental do carbono nos estados ms e ml da camada 2p.
Z
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
Elemento
H
He
Li
Be
B
C
N
O
F
Ne
Na
Configuração
1s1
1s2
1s2 2s1
1s2 2s2
1s2 2s2 2p1
1s2 2s2 2p2
1s2 2s2 2p3
1s2 2s2 2p4
1s2 2s2 2p5
1s2 2s2 2p6
1s2 2s2 2p6 3s1
Estado fundamental
2S
1/2
1S
0
2S
1/2
1S
0
2P
1/2
3P
0
4S
3/2
3P
2
2P
3/2
1S
0
2S
1/2
Tabela 3: Configurações eletrônicas e termos do estado fundamental para os 11 primeiros elementos da Tabela Periódica.
1. Para obter o maior valor de MS devemos ter os spins de ambos elétrons alinhados com ms =
+1/2. Isto fornece MS = 1 e, portanto, S = 1.
2. Tendo colocado ambos elétrons em estados com spin para cima, não podemos coloca-los em estados ml = +1 por causa do princı́pio de exclusão de Pauli. O melhor que podemos fazer é colocar
um num estado ml = 1 e o outro no estado ml = 0, como ilustrado na Tabela 2. Isto dá ML = 1
e, portanto, L = 1.
3. A camada está menos da metade cheia, de modo que temos J = |L + S| = 0.
O estado fundamental é portanto o termo 3 P0 . Todos os outros são estados excitados.
Os termos do estado fundamental dos primeiros 11 elementos estão listados na Tabela 3. Note que
camadas cheias sempre dão termos 1 S0 , sem momentum angular lı́quido: S = L = J = 0.
11
Acoplamento jj
A interação spin-órbita aumenta quando Z cresce. Veja, por exemplo a Eq. (55). Isto significa que em
alguns átomos com Z grande (e.g. estanho com Z = 50) podemos ter uma situação na qual a interação
spin-órbita é muito mais forte que a interação eletrostática residual. Neste regime, ocorre o acoplamento
jj. A interação spin-órbita acopla primeiramente os momentos angulares de spin e orbital dos elétrons
individuais, determinando-se então a resultante J para todo o átomo através da adição dos ji individuais:
ji = li + si
N
X
J =
ji .
(71)
i=1
Estes estados J são separados pelo fraco potencial eletrostático residual que atua como uma perturbação.
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(12
12
Efeitos nucleares em átomos)
Efeitos nucleares em átomos
Na maior parte das vezes, em fı́sica atômica consideramos o núcleo como sendo uma partı́cula carregada
pesada localizada no centro do átomo. Entretanto, uma análise cuidadosa das linhas espectrais revela
pequenos efeitos que podem nos fornecer informação direta sobre o núcleo. Os efeitos principais que
se podem observar caem geralmente em duas categorias, a saber deslocamentos isotópicos e estrutura
hiperfina.
12.1
Deslocamento isotópico
Existem dois processos principais que podem dar origem a deslocamentos isotópicos em átomos, a saber,
efeitos de massa e efeitos de campo.
Efeitos de massa: A massa m que entra na equação de Schrödinger é a massa reduzida, não a massa
pura me do elétron. Mudanças na massa nuclear irão, portanto, provocar pequenas alterações em m e,
conseqüentemente, nas energias atômicas.
Efeitos de campo: Elétrons em camadas s tem uma probabilidade finita de penetrar no núcleo e são,
portanto, sensı́veis à distribuição de carga.
Ambos efeitos causam pequenos deslocamentos nos comprimentos de onda das linhas espectrais
dos diferentes isótopos dum mesmo elemento. O isótopo pesado do hidrogênio, o deutério, foi descoberto
deste modo, através do seu efeito de massa.
12.2
Estrutura hiperfina
Em espectroscopia de alta resolução, é necessário considerar efeitos relacionados à interação magnética
entre o momentum angular J do elétron e o spin nuclear I. O momentum angular dos elétrons cria um
campo magnético proporcional a I no núcleo e que, portanto, tem um termo de energia de interação da
forma:
∆Ehiperfina = −µnúcleo · Belétron ∝ hI · Ji.
(72)
Este termo dá origem a esplitamentos hiperfinos nos termos atômicos. A magnitude dos esplitamentos é
muito pequena porque o dipolo nuclear é da ordem de 2000 vezes menor que o dos elétrons. Isto é uma
conseqüência da pequena razão giromagética do núcleo, que é inversamente proporcional a sua massa.
Veja a Eq. (4) na pág. 2. Os esplitamentos são portanto três ordens de magnitude menores do que os
esplitamentos da estrutura fina: portanto o nome “hiperfino”.
Estados hiperfinos são rotulados pelo momentum angular total F de todo o átomo (i.e. núcleo mais
átomos), onde
F = I + J.
(73)
Analogamente aos estados |LSJi da estrutura fina, a regra de transição para dipólo elétrico entre estados
hiperfinos é
∆F = 0, ±1,
(74)
com a exceção que transições F = 0 → 0 são proibidas. Consideremos dois exemplos para ver como
isto funciona.
A linha de 21 cm do hidrogênio
Considere o estado fundamental do hidrogênio. O núcleo consiste de apenas um único próton e, portanto,
temos I = 1/2. O estado fundamental do hidrogênio é o termo 1s 2 S1/2 , que tem J = 1/2. Os spins do
elétron e do núcleo podem ser alinhados em paralelo (F = 1) ou anti-paralelos (F = 0), com diferentes
energias hiperfinas. Estes dois nı́veis hiperfinos estão separados por 0.0475 cm−1 (5.9 × 10−6 eV). Veja
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17/18
12.2
Estrutura hiperfina
(12
Efeitos nucleares em átomos)
Figura 9: (a) Estrutura hiperfina do estado fundamental do hidrogênio. As flechas indicam as direções relativas dos spins do
elétron e do núcleo. (b) Transições hiperfinas para a linha D1 do sódio. (c) Transições hiperfinas para a linha D2 do sódio. Note
que os esplitamentos hiperfinos não estão desenhados em escala. Os esplitamentos dos nı́veis do sódio são os seguintes: 2 S1/2 ,
1772 MHz; 2 P1/2 , 190 MHz; 2 P1/2 (3 → 2), 59 MHz; 2 P3/2 (2 → 1), 34 MHz; 2 P3/2 (1 → 0), 16 MHz.
a Fig. 9a. Transições entre estes nı́veis ocorrem em 1420 MHz (λ = 21 cm), e são muito importantes em
radio astronomia. Transições de radiofreqüência tais como estas são também rotineiramente exploradas
em espectroscopia de ressonância nuclear magnética (NMR).
Estrutura hiperfina das linhas D do sódio
As linhas D do sódio originam-se de transições 3p → 3s. Conforme discutido na Secção 9, pág. 13,
existem duas linhas com energias separadas pelo acoplamente spin-órbita, como indicado na Fig. 7b.
Considere primeiramente a linha D1 com energia mais baixa, que origina-se da transição 2 P1/2 →
1/2 . O núcleo do sódio tem I = 3/2 e, portanto, temos estados F = 1 e F = 2 para ambos estados,
superiores e inferiores, da transição, como mostrado na Fig. 9b. Note que os esplitamentos não estão
desenhados em escala, sendo 190 MHz e 1772 MHz para os nı́veis superiores e inferiores, respectivamente. Todas as quatro transições são permitidas pelas regras de seleção, e assim observamos quatro
linhas. Como os esplitamentos dos nı́veis superior e inferior são tão diferentes, obtemos dois dubletes
com freqüências relativas de (0, 190) MHz e (1772, 1962) MHz. Estes esplitamentos devem ser comparados com o esplitamento muito mais largo (∼ 5 × 1011 Hz) entre os dois estados J causado pela
interação spin-órbita. Como os esplitamentos hiperfinos são muito menores, não são rotineiramente observados no espectro óptico, e técnicas especiais usando lasers de bandas estreitas são usadas tipicamente
hoje em dia para ve-los.
2S
Considere agora a linha D2 mais alta, que é a transição 2 P3/2 → 2 S1/2 . Com I = 3/2 e J = 3/2,
temos agora quatro estados hiperfinos para o nı́vel superior com F = 3, 2, 1 ou 0, como mostrado na
Fig. 9c. Os esplitamentos entre estes estados não são os mesmos, e são muito menores que os do nı́vel
2S
1/2 . Seis transições são permitidas pelas regras de seleção. Temos portanto seis linhas hiperfinas, que
esplitam-se em dois tripletes nas freqüências relativas de (0, 34, 59) MHz e (1756, 1772, 1806) MHz.
Prof. Dr. Jason Gallas – Dep. Fı́sica da UFPB,
22 de Dezembro de 2012, às 12:36
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