"Um almoço às cegas, sem ver o que estou a comer! Quando e por onde começo?" Manter as mãos sempre rentes à mesa é o principal conselho de quem não vê os que se propõem fazer uma refeição às escuras. Proposta da Sabor do Ano e daACAPO para sensibilizar indústria para os direitos dos invisuais, nomeadamente a saber o que comem no dia a dia Mãos sempre rentes à mesa, tateando tudo o que está na frente para perceber onde estão o prato e os talheres. Também os copos devem ser encontrados pela base para evitar água e vinhos entornados. Como distinguir os talheres do peixe e da carne? Claro, têm formas diferentes, mas não sabia que os dentes do garfo do peixe fazem uma curva maior do que os da carne. E quando começo a comer? Espero pelo barulho dos talheres ou alguém grita: "Bom apetite!" O que é fundamental se quero cumprir as regras de etiqueta. Ou não há regras? A proposta deste almoço é fazer uma refeição às cegas. E, num grupo de cerca de 20 pessoas, apenas dois não fogem à rotina diária: Pedro Velhinho e Rúben Portinha, ambos vêem muito pouco e são membros da Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal (ACAPO) . Todos aceitaram colocar uma venda nos olhos. Rúben Portinha, ao meu lado direito, diz "bom apetite", mas já outras pessoas meteram o garfo à boca antecipando-se na descoberta da entrada: bacalhau com couve-flor. Há dúvidas quanto ao terceiro elemento. Cenoura? Também há quem tenha mexido na comida com as mãos, bebido água do copo do lado, o mesmo fazendo com o pão do vizinho, desconhecendo outra regra de etiqueta que manda colocar o pão do lado esquerdo. E fazem questão de o divulgar. Estamos todos a falar muito alto. OK, vamos relembrar os conselho do Pedro e do Rúben: mãos rentes à mesa, garfadas pequenas, gestos lentos. E vou comer sem ver o que estáno prato? Se tem bom aspeto? "Às vezes vamos completamente às cegas, às vezes baseamo-nos em experiências anteriores e, às vezes, somos enganados", completamente avisa Pedro Velhinho. Acho que comi a entrada toda, seguindo um outro conselho e que talheres de fo passapordeslizaros ra para o centro do prato à procura dos restos de comida. No segundo prato muitas vezes levei o garfo à boca sem um bago de arroz ou grelos (?) . Só um pedaço de carne foi parar ao meu colo. Boa! Ingerir a sobremesa é que foi um bico de obra. Colocar gelado de limão e doce de abóbora (ao meu lado dizem que é ameixa) num prato raso revelou-se um erro tremendo numa refeição de quem não vê. "Deveria servir-se numa taça." O almoço chegou ao fim, mas com alguma dificuldade e muito desconforto. Foi o que quis provar aACAPO ao associar-se aos organizadores do Sabor do Ano, que ontem lançaram o seu selo em braile. Não é para ficar, avisa Débora Silva, uma das responsáveis: "Seria fantástico que os produtos certificados CÉU NEVES Jornalista estivessem em braile, significaria que todos os problemas estão resolvidos e há um longo caminho a percorrer. Pretendemos sensibilizar a indústria para as dificuldades dos consumidores invisuais." São 120 milpessoas no País, 400 mil se contarmos com os idosos, que lutam pela existência de rótulos que possam ler. Nada foi legislado em produtos de grande consumo, mas é obrigatório no medicamentos. "A maioria não cumpre", denuncia Rúben Portinha. CERTIFICAÇÃO 40 produtos têm selo de sabor do ano As inscrições para a certificação dos produtos Sabor do Ano 2013 estão abertas até > setembro. Premeia a qualidade gustativa dos produtos agroalimentares no mercado nacional, através de testes em que os consumidores ingerem os alimentos sem conhecerem as marcas, daí lhe chamarem "prova cega". Mas os provadores vêem os produtos, o que faz diferença, reconhece Marta Carvalho, da Fullsense, empresa que faz os testes laboratoriais. Em cada segmento de produto vence um fabricante, sendo que o ano passado 40 gamas foram certificadas com o selo Sabor do Ano. Foi criado em França há 1 5 anos e existe em Portugal desde 2008.