ANAIS ANÁLISE DO MODELO DE CONCESSÃO RODOVIÁRIA NO BRASIL NA PERCEPÇÃO DOS USUÁRIOS PAULO TARSO VILELA DE RESENDE ( [email protected] ) FUNDAÇÃO DOM CABRAL PAULO RENATO DE SOUSA ( [email protected] ) FUNDAÇÃO DOM CABRAL JOÃO VICTOR RODRIGUES SILVA ( [email protected] ) FUNDAÇÃO DOM CABRAL Resumo O modal rodoviário é o maior responsável pelo transporte de cargas e pessoas no Brasil. Um bom sistema de transporte rodoviário é de extrema importância para o desenvolvimento do país. O artigo tem com objetivo demonstrar o modelo de concessão rodoviário no país, na perspectiva de empresas usuárias das vias pedagiadas através de uma pesquisa de natureza quantitativa e qualitativa, com revisão bibliográfica e entrevistas. Seu principal objetivo foi atingido, pesquisar aspectos do modelo privado de concessões rodoviárias adotado no Brasil no que diz respeito a condições operacionais, sinalização, policiamento e fiscalização, custos e expectativa geral. Palavras-chave: Concessão rodoviária, Pedágio, Satisfação dos usuários 1. Introdução O setor público brasileiro, sobretudo o governo federal, vem sendo pressionado a investir pesadamente em rodovias, como forma de aliviar os altos custos operacionais impostos às empresas que trafegam em uma malha cada vez mais deteriorada. Intervenções paliativas, como as operações tapa-buracos, já não conquistam a opinião pública, que exige investimentos mais robustos, que garantam uma solução definitiva para o problema. No Brasil, esse ciclo de falta de investimento e demanda continuada se repete há quase 25 anos. Se esses investimentos forem realizados como se espera, devem incluir obras de duplicação de pistas, sofisticados sistemas de engenharia (pontes, viadutos, túneis etc.), contenção de encostas e cortes de vulto, canteiros centrais como área de escape e drenagem, enfim vários outros itens que caracterizam uma boa rodovia. Tudo isso e a manutenção do que foi construído custam muito caro. É quando as despesas governamentais começam a sofrer os primeiros choques. Quando se tem um malha rodoviária ruim, é natural supor que as despesas de manutenção são menores do que quando existe uma malha com sistemas eficientes de fluxos de produtos, serviços e pessoas. Daí a constatação de que investir na melhoria das rodovias pode significar, no futuro, um acúmulo de despesas que pesariam no orçamento público, podendo até comprometer o equilíbrio das contas governamentais. Argumentos dessa natureza podem até ser considerados politicamente incorretos, mas não deixam de ser uma realidade. Nesse sentido, algumas vezes, investimentos podem ser considerados como muito ruins para o governo e pode-se até pensar que essas ideias estão presentes implicitamente nas agendas de desenvolvimentistas e monetaristas do poder público. 1/16 ANAIS Nesse contexto, a aceleração dos processos de concessão de rodovias para a exploração das empresas privadas passa a ser considerada como uma alternativa importante para o dilema do investimento. Primeiro, porque o poder público investe na melhoria, mas não acumula despesas futuras no orçamento, justamente pela desobrigação da manutenção. Segundo, porque se espera que a empresa concessionária tenha capital para investimentos permanentes na manutenção e no aprimoramento do sistema viário concedido. É uma via de mão dupla com ganhos para ambos os lados. Logo, privatizar é desonerar o governo e garantir bons serviços à população. Basicamente, após esta breve introdução, o estudo está dividido em quatro seções principais. Na seção 2, com base na revisão bibliográfica, os principais conceitos relacionados com a concessão rodoviária são abordados; na seção 3, referente à metodologia, os procedimentos de coleta, tratamento dos dados e caracterização da amostra são apresentados; na seção 4, resultados e análises são apresentados em três subseções: I) Perguntas sobre a ANTT e as associações de classe; II) Percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias nas rodovias e III) Serviços; finalmente, na quinta e última seção, são apresentadas as discussões e considerações finais, bem como algumas limitações do estudo. 2. Revisão bibliográfica A noção de rede viária surgiu na antiguidade, com o entendimento da importância das estradas no transporte de exércitos e riquezas. Estradas e pontes foram construídas através da evolução dos processos técnicos de construção, utilizando-se, sobretudo, materiais acessíveis nas localidades próximas. Os problemas de financiamento das rodovias são antigos, assim como a cobrança do pedágio como fonte de financiamento. Indícios históricos registram a cobrança nas estradas entre Síria e Babilônia há mais de 4 mil anos. No império Romano, o chamado portorium era uma tarifa obrigatória sobre diversas atividades, entre elas o trânsito de bens em estradas romanas, sendo o valor diretamente proporcional à quantidade de mercadorias que pela estrada passassem (MACHADO, 2005). A origem do termo pedágio em português deriva do francês peáge, sendo prática comum no continente europeu, já no século XI, pela cobrança da utilização de pontes e locais de tráfego. A utilização dos recursos oriundos da cobrança do pedágio na manutenção e financiamento de obras públicas teve seu início na Inglaterra no período de transição do século XVII ao XVIII, quando uma série de leis o legitimaram. Diante da economia em expansão e da maior oferta de moedas, governos passaram a utilizar recursos para financiar a construção de rodovias. Na Roma Antiga, por exemplo, as receitas eram tão abundantes que acompanharam o aumento do comércio. Como resultado, as taxas de juros caíram, o que possibilitou a criação de um programa suntuoso de obras públicas que angariou reformas de todas as rodovias do império, assim como a construção e restauração de diversos templos, aquedutos, banhos públicos e prédios públicos. Por outro lado, o transporte rodoviário, de acordo com Senna e Michel (2007), apresentou grande crescimento após a Segunda Grande Guerra Mundial e é hoje a forma predominante de transporte em todo o mundo, com muitos países confiando e dependendo dele para transportes de passageiros e cargas. Com a crescente dependência, são necessários investimentos regulares que garantam sustentabilidade econômica e a confiança dos usuários no trânsito pelas vias (MACHADO, 2005; YESCOMBE, 2007; MURPHY; WOOD, 2008; COYLE; BARDI; NOVACK, 2006). Para que um país possa atingir um nível de competitividade, é fundamental que os sistemas de infraestrutura possam contribuir para um melhor desempenho das relações comerciais e industriais. Os investimentos na melhoria da infraestrutura são hoje vistos como o maior 2/16 ANAIS desafio que a maioria dos grandes países em desenvolvimento e algumas nações desenvolvidas enfrentam. Na opinião de Guasch (2004), a infraestrutura de uma nação constitui-se uma questão crítica para a operação e eficiência das economias modernas. A infraestrutura, em particular a rodoviária, é um importante elemento ligado a produtividade, custos e competitividade de uma sociedade. Quando um país possui um sistema de transporte ineficiente, há um alto custo a ser pago, o que significa um entrave ao seu desenvolvimento (CAIXETA-FILHO; MARTINS, 2001; SCHMITZ, 2001). Observa-se que, em países desenvolvidos, há uma maior eficiência no sistema de movimentação de pessoas e cargas, o que demonstra que o tamanho do PIB está relacionado à qualidade do sistema de transporte, conforme demonstra o GRÁF. 1. Gráfico 1: Correlação de crescimento de transporte de cargas versus crescimento do PIB na Europa Fonte: EEA, 2006. Para que uma nação possa trilhar o caminho do desenvolvimento, é necessário, além de planejamento, que a construção e manutenção periódica das estradas ocorram (VALENTE, 2008; MURPHY; WOOD, 2008). Por outro lado, a falta de manutenção aumenta em longo prazo os custos totais de produtos e serviços, e o valor presente dos custos futuros. Instalações precárias de transporte restringem as possibilidades de ganho pelo comércio. Em muitos países desenvolvidos e industrializados, serviços de infraestrutura envolvem investimentos expressivos, tradicionalmente empreendidos pelos governos. Porém os governos nem sempre conseguem oferecer serviço eficiente e recursos necessários para tal. Nas últimas décadas, o trânsito gratuito pelas rodovias tem sido substituído pela cobrança de pedágio. Assim, a iniciativa privada passa então a empreender a construção e exploração de rodovias por meio das concessionárias. A participação das empresas privadas na infraestrutura tem sido direcionada pela urgente necessidade de grandes investimentos. Para melhorar o desempenho da infraestrutura e cobertura, muitos governos demandam novos financiamentos significativos. Devido aos escassos recursos públicos e à preferência pelos investimentos nos setores sociais, muitos países têm optado por transferir o fornecimento de serviços de infraestrutura para o setor privado. Essa opção parece ser a mais atrativa do ponto de vista do desenvolvimento econômico e fiscal pelos governos (YESCOMBE, 2007; COYLE; BARDI; NOVACK, 2006). A participação privada pode ter uma variedade de formas, passando por contratos de gerenciamento, pela concessão, até a privatização completa. Quando corretamente nomeadas e implementadas, todas essas formas demonstraram sucesso significativo. Segundo Serman (2008), as concessões rodoviárias surgiram diante da necessidade de aporte de investimentos 3/16 ANAIS para se garantir a construção, recuperação, conservação, manutenção e melhoramento da infraestrutura, assim como de busca de eficiência e modernidade na prestação de serviços essenciais à sociedade. De acordo com Machado (2005), a análise da viabilidade financeira de uma concessão deve considerar os custos da sua implementação e as receitas com sua exploração. Alguns projetos de concessões apresentam um alto potencial de rentabilidade financeira, por apresentarem um grande número de beneficiados com os investimentos. A partir dessa relação de potencial de rentabilidade financeira e benefícios de investimentos, são apresentados no QUADRO 1 os critérios de classificação de concessões adotados por Lastran (apud MACHADO, 2005): Concessões Subsidiadas São aquelas financeiramente inviáveis, em que o poder concedente introduz facilidades financeiras sob a forma de subsídios às concessionárias para a viabilização, reduzindo o aporte necessário de recursos privados a níveis tais que as receitas decorrentes dos empreendimentos tornem os investimentos privados atrativos. Os subsídios governamentais são feitos pelo pagamento de contraprestações periódicas associada à execução de obras e serviços. Uma das formas de subsídio governamental pode ser constituída por pagamentos diretos à concessionária contra a prestação de serviços compreendidos no âmbito das concessões. Compreendem as concessões de rodovias que, sem a participação de recursos públicos, envolvem aportes de recursos privados e valores de receitas de exploração tais que o empreendimento resulta suficientemente viável do ponto de vista financeiro, para que haja interesse da iniciativa privada em sua implantação. Do ponto de vista teórico, as concessões gratuitas apenas ocorreriam em Concessões Gratuitas casos ideais, em que as receitas decorrentes da exploração de rodovias coincidissem exatamente com aquelas necessárias ao financiamento das respectivas concessões, que poderiam ser implementadas sem necessidade de subsídios governamentais, e, concomitantemente, sem excessos de receitas repassadas ao governo. Compreendem os casos que envolvem empreendimentos cuja rentabilidade financeira para a iniciativa privada é grande o bastante para que o poder público (concedente) possa promover as concessões, exigindo pagamentos e/ou auferindo parcelas das receitas decorrentes das explorações das rodovias. Esse tipo de concessão está vinculado a empreendimentos rodoviários com Concessões Onerosas níveis de rentabilidade financeira capazes de gerar valores de receitas excedentes em relação àqueles estritamente suficientes para financiar, remunerando adequadamente as respectivas concessões, sem contar com subsídios do governo. O poder concedente pode exigir adicionalmente das concessionárias que assumam obrigações, passivos pecuniários, recolhimento de valores a título de ônus ou pagamentos pelos direitos de exploração das facilidades rodoviárias, cedidos temporariamente pelo poder público. Quadro 1: Critério de classificação das concessões Fonte: LASTRAN apud MACHADO, 2005, p. 51. 2.1 Concessões rodoviárias no Brasil Cavalcanti (2002) discute que a reforma do setor de transporte no Brasil se deu pela crise fiscal e a redefinição do papel do Estado na economia. O Brasil, seguindo a tendência de outros países do mundo, fez com que a regulação entrasse na agenda política, incentivando a entrada da iniciativa privada na execução de políticas públicas em áreas cruciais de infraestrutura, como a de transportes. O país possui uma estrutura de transporte de cargas pelo sistema rodoviário, principal modal nacional, responsável por 58% do transporte de produtos primários (ANTT, 2009). Segundo Senna e Michel (2007), o sistema de transporte brasileiro apresenta diversos problemas para suportar as necessidades de uma economia dinâmica, diante do crescimento do país e da posição que ele pretende ocupar na economia global. O financiamento da infraestrutura rodoviária no Brasil tradicionalmente partiu de recursos públicos originados de impostos vinculados ou de repasses do Tesouro, previstos nos orçamentos anuais dos estados e da União. Nos últimos anos, com a carência de recursos estatais para o investimento na melhoria da infraestrutura viária, iniciaram-se as concessões de rodovias à iniciativa privada. A discussão no Brasil sobre a implantação de um sistema de concessão rodoviária à iniciativa privada iniciou-se em 1993, com a publicação de editais do DNER de cinco trechos rodoviários federais que haviam sido objeto de cobrança de pedágio e serviram como modelo. No mesmo ano, iniciou-se o Programa de Concessões de Rodovias Federais (Procofe), com o 4/16 ANAIS objetivo de transferir a exploração comercial de rodovias federais ao setor privado (KARAM, 2005). São apresentadas no QUADRO 2 as principais características da primeira etapa do Procofe (SERMAN, 2008). Objeto Recuperação, reforço, monitoração, melhoramento, manutenção, conservação, operação e exploração da infraestrutura concedida. Tipo de Concessão Gratuito, não sendo cogitado, em princípio, qualquer aporte financeiro por parte do governo. No entanto, os contratos permitem a execução de obras pelo Poder Concedente com vistas a não pressionar o valor da tarifa de pedágio. A isenção de impostos não foi contemplada. Modelo de licitação Prazo Pagamento pela Concessionária Concorrência Pública com as seguintes fases: Apresentação da proposta técnica e proposta de menor valor. Apresentação da metodologia de execução de atividades. Apresentação de valores tarifários, vencendo a proponente da menor tarifa. Entre 20 e 25 anos. Deve pagar garantias (cauções) de execução do contrato, seguros e uma verba destinada a cobrir as despesas de fiscalização. Receita da Concessionária Cobrança de pedágio e da aplicação financeira das receitas oriundas da cobrança do pedágio. Tarifa de Pedágio Tarifas são diferenciadas por categorias de veículos. O valor a ser pago por cada categoria corresponde à tarifa paga pela categoria 1 (automóveis, camioneta e furgão), denominada TBP, Tarifa Básica de Pedágio, multiplicada por um índice que tenta refletir os custos da concessão impostos pelas características de cada veículos. Reajuste Tarifário São anuais e definidos a partir de fórmulas paramétricas estabelecidas nos contratos de concessões. Os índices setoriais de reajuste correspondem a uma cesta de itens, como pavimentação, terraplenagem, obras de arte especiais e consultoria, e são calculados e publicados pela FGV. Alteração Contratual Receitas Alternativas Alocação dos Riscos Permitido explorar fontes alternativas de receita (propagandas ou implantação tubulações). Desempenho Operacional As obrigações das concessionárias estão estabelecidas numa espécie de caderno de encargos, denominado Programa de Exploração da Rodovia – PER, que define as metas a serem seguidas, como qualidade do pavimento, etc. e as obras e serviços ao longo de todo o período de concessão. Equilíbrio EconômicoFinanceiro Realizado com base na TIR (Taxa interna de retorno), estabelecida por ocasião da apresentação da proposta de tarifa, feita pela licitante vencedora. Sistema De acordo com Serman (2008), quase todas as concessões se enquadram no sistema LDO, em que o Estado concede um ativo existente ao setor privado, exige a realização de melhorias e investimentos, em geral de recuperação, e faz um contrato de operação privada. É permitida nos casos de modificação unilateral por parte do poder concedente. Quase todos são atribuídos às concessionárias. Quadro 2: Principais características da primeira etapa do Procofe Fonte: SERMAN, 2008, p. 63. Foram então selecionados 17.247 km e, desse total, 10.379 km foram considerados viáveis para concessão de serviços de recuperação e ampliação. O restante foi considerado alvo para serviços de manutenção, em face da inexistência de demanda suficiente para tornar a concessão de serviços de recuperação e/ou ampliação sustentáveis nesses trechos (DNER, 2001). Devido ao fato de a concessão envolver vias preexistentes, não desenhadas para um sistema de cobrança tarifária, houve proliferação de outros pontos de acesso, como interseções com outras rodovias e acessos a centros urbanos. Assim, adotou-se um sistema de cobrança de 5/16 ANAIS tarifas em que os usuários pagariam apenas pelo trecho percorrido da rodovia. Tal sistema, posteriormente, demonstrou ser operacionalmente inviável por parte das concessionárias. Diante dessas características, optou-se pela cobrança em praças de pedágio instaladas a intervalos regulares ao longo das rodovias (SERMAN, 2008). Senna e Michel (2007) apontam que o Brasil teve uma das experiências mais diversificadas em termos de concessões rodoviárias no mundo. O programa envolveu governos federal, estadual e municipal e diferentes tipos de concessões, que, no decorrer dos anos, sofreram diversas interrupções em seus processos, por oposições políticas. De acordo com Machado (2005), alguns projetos de concessões apresentam um alto potencial de rentabilidade financeira, por apresentarem um grande número de beneficiados com os investimentos. Porém, segundo Senna e Michel (2007), os pedágios podem se constituir uma forma relativamente cara de aumentar a receita. A construção de praças de pedágio e acessos controlados implica elevados custos de capital e operacionais. Os sistemas de pedagiamento podem reduzir os benefícios econômicos das instalações, pela minimização dos pontos de entrada e saída que acabam criando atrasos nas pistas e fazendo com que o tráfego seja desviado para outras rodovias paralelas, com maiores custos operacionais. Segundo os autores, os sistemas eletrônicos recentemente têm reduzido substancialmente os custos de operação das praças de pedagiamento. Lee (1996) chama a atenção para o fato de que a fixação do preço pelo custo marginal, como forma muitas vezes adotada pelos modelos de concessão, pode chegar a arrecadar mais do que o necessário para a manutenção da rodovia e cobrir investimentos previamente realizados. Já Senna e Michel (2007) apontam também que, nos casos de países em desenvolvimento, há o risco de uma cobrança elevada dos valores de pedágios e cabe aos governos verificar a equidade em relação ao perfil dos usuários atendidos, através de um maior conhecimento sobre a disposição em pagar, a disponibilidade de pagamento e usuários potenciais. Além disso, pode haver injustiça na cobrança de taxas, já que gastos em impostos deveriam cobrir a construção de novas estradas e manutenção, onerando pessoas que não possuem condições econômicas de arcar frequentemente com gastos em pedágio. Outro ponto que Senna e Michel (2007) abordam diz respeito a uma possível visão de punição de uma área e não de outras, que continuam gratuitas, principalmente em áreas e vias que se encontram próximas. Torna-se, portanto, necessário que o poder concedente deixe claras as regras que guiam o sistema de escolhas, pesando forças com maior equidade. Soares e Neto (2006) opinam positivamente em relação à concessão de rodovias no Brasil e em relação à maior agilidade nos deslocamentos, através de melhores condições de estradas e rápida liberação das pistas que, em caso de acidentes, contribuem para que o usuário regular tenha maior segurança, além de reduzir custos de manutenção. Segundo Machado (2005), o balanço social e econômico após a primeira década das concessões rodoviárias é muito positivo. Segundo o autor, o número de acidentes diminuiu, assim como o consumo de combustíveis, o desgaste dos veículos, a poluição e o tempo de viagem. Todas as melhorias proporcionaram um aumento na satisfação dos clientes. O autor cita um estudo da CNT (2009) que diz que os dez melhores trechos da malha nacional, em 109 trechos analisados, se encontram em rodovias pedagiadas. A concessão de rodovias tornou-se uma tendência mundial a partir da flexibilidade, agilidade e sustentabilidade que demonstrou em todos os países. Com processos menos burocráticos para a solução de problemas, elas podem efetuar investimentos e contratações com a rapidez que o mercado exige, respondendo prontamente a todo tipo de emergência. Caixeta-Filho e Martins (2001) corroboram esse ponto de vista afirmando que, com um sistema de transporte de baixo custo, confiável e rápido, disponibilizam-se mercadorias para grandes mercados com um preço competitivo. 6/16 ANAIS Conforme a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR, 2005), o Programa Brasileiro de Rodovias comprova que a decisão de transferir para a iniciativa privada a administração dos trechos selecionados configurou-se correta. O modelo adotado no Brasil demonstrou ser importante para o desenvolvimento do país na garantia de recursos para a infraestrutura. Na próxima seção, a metodologia utilizada neste estudo é apresentada como meio para analisar o modelo de concessão de sistemas de transporte no Brasil, na opinião dos usuários. 3. Metodologia A metodologia adotada no trabalho foi do tipo survey, por ser constituído de um questionário estruturado dado a uma população e destinado a provocar informações específicas dos entrevistados. A pesquisa do tipo survey é o meio mais flexível de obtenção de dados de entrevistados, pois se baseia no interrogatório dos participantes, aos quais se fazem diversas perguntas sobre o seu comportamento, intenções e percepções (MALHOTRA, 2001). A partir dos dados coletados, pode ser possível comparar as diferenças entre os grupos, os efeitos de variáveis independentes ou se prever o comportamento futuro. A estruturação do questionário de pesquisa visou incluir itens de análise que proporcionem uma avaliação da percepção dos usuários sobre a situação atual das condições operacionais nas rodovias brasileiras, os custos operacionais, as expectativas gerais e a realidade do modelo de concessão adotado no Brasil. Para a confecção do questionário, foram realizados dois pré-testes. Após os ajustes necessários e a aprovação final, a coleta de dados foi realizada por meio de questionários enviados, via e-mails, a 309 usuários de rodovias em todo o Brasil retirados da Revista Maiores & Melhores do Transporte e Logística de novembro de 2008, assim distribuídos: matérias-primas e insumos (43 empresas); fretamento e turismo (23 empresas); rodoviário de passageiros (45 empresas); rodoviário de carga (100 empresas); transporte de carga e serviço (9 empresas) e operador logístico (89 empresas). Inicialmente, obteve-se uma amostra de 132 respondentes. De acordo com Hair et al. (2005), devem-se eliminar os formulários e/ou variáveis problemáticos, ou seja, aqueles que apresentam muitos dados ausentes. Ao final desse procedimento, restaram 100 respondentes válidos para análise de dados. A amostra foi considerada significativa em função da reprodução de dados similares nos questionários aplicados. Na primeira parte do estudo, os respondentes informaram dados gerais sobre a empresa, buscando identificar, principalmente, estado de origem e setor econômico. Os estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul são os que mais possuem empresas entrevistadas, chegando a 70% do total. A grande maioria das empresas da amostra está sediada no Estado de São Paulo (36%). As concessões no Brasil estão, em sua maioria, nas rodovias de maior fluxo de tráfego e requerem investimentos consideráveis em expansão e capacidade. Os setores pesquisados se enquadram, majoritariamente, com 56% das empresas da amostra, nas atividades de rodoviário de carga e operador logístico. Na segunda parte do estudo, os respondentes foram orientados a classificar, de acordo com uma escala Likert de 1 a 5, a participação da ANTT e das associações de classes do sistema rodoviário no Brasil, sendo o valor 1 da escala indicador de baixa influência e o 5, de grande influência. Ao todo, foram quatro as instituições pesquisadas: Agência Nacional de Transporte Terrestres (ANTT), Confederação Nacional de Transporte (CNT), Associação Nacional dos Usuários de Transporte de Cargas (Anut) e Associação Brasileira de Logística e Transporte de Carga (ABTC). O objetivo dessa análise inicial foi o de traçar um paralelo entre 7/16 ANAIS o entendimento dos usuários acerca da participação da principal agência que regulamenta o transporte rodoviário e das associações de classe no Brasil. Na seção seguinte, terceira parte, os respondentes foram orientados a classificar, também de acordo com uma escala Likert de 1 a 5, os fatores mais influentes sobre o trabalho realizado pelas concessionárias rodoviárias. Ao todo, foram cinco os itens de avaliação propostos, quais sejam: condições operacionais, sinalização, policiamento e fiscalização, custos e expectativa geral. Essa análise teve como objetivo traçar as expectativas dos usuários em relação às concessionárias, no que tange ao modelo utilizado no Brasil. Os resultados apresentam-se com base na média e no desvio-padrão alcançados em cada variável de análise. A dispersão padrão é pequena, se os dados estão concentrados em torno da média, e grande, se os dados estão mais distantes em relação à média, indicando um menor consenso de respostas. Foram feitos testes de correlação entre a qualidade dos serviços prestados pelas concessionárias com a sinalização nas curvas, a qualidade da manutenção da pista e a capacidade dos trechos pedagiados para compreender melhor a relação entre eles. Na quarta e última parte do estudo, os respondentes foram questionados sobre os serviços prestados pelas concessionárias e sobre quem deveria ser o responsável pela gestão e expansão das rodovias. Os respondentes das empresas também foram questionados sobre o interesse na utilização de uma central logística (HUB) que estaria localizada no trecho concessionado e sobre quais serviços possivelmente a empresa estaria interessada em utilizar. Os nomes das empresas e entrevistados foram omitidos para se resguardarem a privacidade e os interesses comerciais dos envolvidos. Para a análise estatística dos resultados, foram utilizados os softwares SPSS 17.0 for Windows. Tendo-se apresentado a metodologia de coleta de dados e a caracterização da amostra, na seção seguinte são descritos os resultados descritivos realizados com base em um banco de dados constituído a partir dos procedimentos acima detalhados. 4 Análise dos resultados Basicamente, os resultados estão divididos em três subseções principais. Na subseção 4.1, questões sobre a ANTT e as associações de classe (CNT, Anut e ABTC). Com essas duas questões, buscou-se identificar a percepção dos usuários de rodovias sobre o grau de entendimento da missão da ANTT e das associações de classes. Na subseção 4.2, a percepção dos usuários sobre as condições operacionais, sinalização, policiamento e fiscalização, custos e expectativa geral é discutida. E, na subseção 4.3, apresenta-se a opinião dos usuários sobre os serviços. 4.1 Perguntas sobre a ANTT e as associações de classe Os respondentes, de acordo com sua percepção, foram orientados a classificar, em uma escala Likert de 1 a 5 (1 - Não atende a missão em nenhum ponto; 5 - Atende plenamente sua missão), o papel exercido pela ANTT e pelas associações de classe e suas respectivas missões. A ANTT foi criada em 2001. Vinculada ao Ministério dos Transportes, é responsável por promover estudos e levantamentos relativos à frota de caminhões, empresas constituídas e operadores autônomos, bem como organizar e manter um registro nacional de transportadores rodoviários de carga. Essa Agência tem uma tarefa bastante complexa de regular e fiscalizar os aspectos técnicos da exploração da infraestrutura de transporte e da prestação de serviços. Uma outra atribuição sua envolve ouvir a voz dos usuários e medir seu nível de satisfação. Apesar de ter as 8/16 ANAIS responsabilidades claras como órgão fiscalizador para atender a tantas questões, é necessária uma reavaliação de equilíbrio entre interesses muitas vezes antagônicos. Talvez essa tarefa complexa justifique a nota média 3,121 que os usuários deram à ANTT, conforme ilustrado na TAB. 1. Para Miorando (2005), é necessário resguardar o interesse dos usuários quanto à confiabilidade, à continuidade, à segurança do serviço e ao preço adequado das empresas concessionárias, que esperam retorno financeiro atraente, que justifique os investimentos realizados. Tabela 1 Atendimento da missão – ANTT Contagem Média Grau de atendimento da missão Missão ANTT - Agência Nacional de Transporte Terrestres (Missão: regular e fiscalizar a prestação dos serviços de transportes terrestres, com eficiência e imparcialidade, buscando a harmonização dos interesses dos agentes do setor) 99 Desvio padrão 3,121 1,19 Fonte: Dados da pesquisa. A missão deve esclarecer o compromisso e o dever da empresa para com a sociedade. Observa-se, de acordo com os resultados apresentados na TAB. 2, que o grau de entendimento da missão CNT, Anut e ABTC apresentou a menor média. Ressalte-se a importância e relevância das associações de classe no cenário brasileiro, que merecem destaque e precisam ser mais bem trabalhadas, divulgadas e esclarecidas entre os usuários das rodovias. Tabela 2 Atendimento da missão – associações de classe Contagem Média Grau de atendimento da missão Missão CNT - Confederação Nacional do Transporte (Missão: promover o desenvolvimento e a defesa dos transportadores e do setor de transporte) Desvio padrão 99 2,768 1,007 ANUT - Associação Nacional dos Usuários de Transporte de Carga (Missão: garantir a confiabilidade, segurança, qualidade, presteza, velocidade e adequado custo dos serviços de transporte em todos os modais, contribuindo para elevar a competitividade logística das associadas) 98 2,52 1,203 ABTC - Associação Brasileira de Logística e Transporte de Carga (Missão: defender os legítimos interesses do segmento de logística e transporte de cargas, em todos os seus modais, visando ao aperfeiçoamento e ao crescimento dessas atividades, tornando-as instrumentos de sustentação da economia do País) 97 2,443 1,127 Fonte: Dados da pesquisa. 4.2 Percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias nas rodovias Inicialmente, buscaram-se informações a respeito das condições operacionais dos trechos pedagiados. O programa de concessões de rodovias no Brasil alavancou a modernização e o acréscimo da infraestrutura viária, conforme demonstrado no GRÁF. 2. Houve também melhorias significativas, como duplicações, trechos novos, terceiras faixas, entroncamentos e diversos serviços de apoio aos usuários, tornando as viagens dos usuários mais confortáveis e seguras. 9/16 ANAIS 5 4,5 Média 4 3,636 3,57 3,56 3,5 3,162 3 2,5 2 Desvio-padrão 1,5 0,998 1 1,102 1,027 1,235 0,5 0 Fluidez do tráfego Aderência do pavimento. 1 2 Condições do pavimento (buracos Condições do pavimento em dias e ondulações) de chuva. 3 4 Gráfico 2: Condições operacionais Fonte: Dados da pesquisa. Dando prosseguimento às análises, investigou-se a sinalização dos trechos pedagiados, questionando-se as condições de pintura do pavimento, sinalização das curvas e visibilidade noturna de toda a sinalização. “A sinalização é o item da infraestrutura viária que serve para regulamentar as regras de conduta da via, para advertir sobre trechos da via com significativa periculosidade e para informar ao usuário: locais, acessos ou distâncias.” (CNT, 2009). Esse é um dos elementos essenciais para a avaliação das condições de segurança oferecida pelas concessionárias aos usuários. As informações contidas no GRÁF. 3 indicam que os usuários consideram a sinalização da malha rodoviária concedida como boa. Conforme dados da ABCR (2005), nos últimos anos foram instaladas, em média, 32 mil placas ao ano nos trechos sob concessão, o que justifica a percepção demonstrada pelos usuários. 5 4,5 4 3,5 3 2,5 2 1,5 1 0,5 0 3,206 3,51 3,49 1,105 1,02 1,233 Média Desvio-pa drã o Condição da pintura do pavimento. Sinalizaçã o nas curva s. Visibilidade noturna de toda a sinalização. 5 6 7 Gráfico 3: Sinalização Fonte: Dados da pesquisa. Procurou-se investigar também a opinião dos usuários pesquisados sobre o patrulhamento policial: controle de motoristas infratores e prevenção de assaltos. A TAB. 3 apresenta a média e o desvio-padrão obtidos. Uma das vantagens do pagamento do pedágio está no aumento da segurança para todos os usuários nos trechos pedagiados com uma fiscalização mais intensiva. Sem a cobrança, é praticamente impossível oferecer tais benefícios. Mas, ao serem questionados sobre o patrulhamento policial, a média geral ficou baixa, demonstrando que provavelmente muitos usuários desconhecem o trabalho de melhoria que as concessionárias têm feito nos trechos pedagiados. 10/16 ANAIS Tabela 3 Policiamento e fiscalização Código 8 9 Perguntas Contagem Média Desvio padrão 92 88 2,761 2,341 1,042 1,06 Patrulhamento policial: controle de motoristas infratores. Patrulhamento policial: prevenção de assaltos. Fonte: Dados da pesquisa. Neste bloco de perguntas, procurou-se investigar as questões referentes aos custos. De forma geral, conforme demonstra o GRÁF. 4, as médias para o código 10 – Preço do pedágio – e o código 11 – Custos com segurança e com perdas por roubos – tiveram desvio-padrão relativamente elevado, indicando que se trata de um tema polêmico, sobre o qual não há consenso em relação aos custos. Pesquisas recentes da ABCR (2009) indicam que, mesmo com uma alta insatisfação da maioria dos usuários sobre o valor cobrado pelo pedágio, a grande parte dos usuários é favorável às concessões das rodovias para a iniciativa privada, e considera o desempenho das concessionárias melhor do que o da administração anterior, indicando melhorias evidentes trazidas no processo de concessão de rodovias atualmente adotado no Brasil. Muitos usuários desconhecem o destino do dinheiro arrecadado nos pedágios, pois o valor cobrado é revertido para os próprios motoristas, na forma de sinalização, monitoramento, recuperação, entre outras melhorias. Quando questionados sobre os custos, percebe-se um destaque para o código 13 – Impacto no preço do produto. Pela análise das respostas, vê-se que a proporção do custo do frete, considerando-se o preço final do produto, é pequena. Tal fato pode ser explicado pelas melhorias na rodovias pedagiadas, pois se observa um aumento na velocidade média, redução nos desgastes dos veículos, economia na manutenção e no consumo de combustíveis, o que representa também redução no preço final do produto. 14 13 Impacto no preço do produto. Qual o impacto do custo do frete no preço final do produto? 12 1,216 As tarifas estão de acordo com o serviço prestado. Custos operacionais por Km (combustível e manutenção). 3 1,18 3,32 1,269 Desvio-padrão 3,08 Média 11 10 1,332 Custos com segurança e com perdas por roubos. Preço do pedágio. 2,889 1,478 3,02 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 4,5 5 Gráfico 4: Custos Fonte: Dados da pesquisa. Investigou-se, em seguida, a expectativa geral dos usuários sobre os trechos pedagiados. Foram apresentadas quatro questões aos usuários, de forma que, estes, numa escala Likert de 1 a 5, expressassem a expectativa em relação a manutenção do trecho após a concessão, qualidade da manutenção e capacidade dos trechos pedagiados e qualidade dos serviços prestados no trecho. A nota 5 indica que a afirmação se aplicava perfeitamente às perguntas realizadas, e a nota 1 indica uma alta incoerência entre as mesmas. Os resultados encontram11/16 ANAIS se representados no GRÁF. 5. Observa-se que, no geral, as médias foram altas. Conforme dados da ABCR (2005), em 1996, quando o programa de concessões teve início, a maior parte das principais rodovias brasileiras estava deteriorada por falta de manutenção. Em situação igual encontram-se as rodovias atuais que não foram concedidas. Após o programa de concessão, as melhorias são significativas, com destaque para os fatores segurança, redução de acidentes, colocação de passarelas, aumento da velocidade média nos trechos, entre outros. 5 4,5 4 3,72 3,64 3,657 3,582 3,5 3 2,5 Média 2 Desvio padrão 1,049 1,092 1,5 0,952 0,905 1 0,5 0 Manutenção do trecho após a concessão. Qualidade da manutenção dos trechos pedagiados. Capacidade dos trechos pedagiados. Qualidade dos serviços prestados no trecho. 15 16 17 18 Gráfico 5: Expectativa geral Fonte: Dados da pesquisa. 4.3 Serviços Um grande percentual de respondentes (80%) da pesquisa manifestou-se no sentido de concordar com fato de que as concessionárias deveriam ser responsáveis pela gestão das rodovias. De acordo com a CNT (2009), o setor rodoviário brasileiro é responsável por aproximadamente 58% do transporte de carga do país. Os custos operacionais dos transportadores estão diretamente ligados aos gastos com combustíveis, pneumáticos, manutenção do veículo e prazo de entrega. Esse fator talvez explique a alta incidência de respondentes que informaram que as concessionárias deveriam ser responsáveis pela gestão das rodovias. O governo brasileiro demonstrou ser incapaz de gerenciar com qualidade as rodovias federais. A regulamentação do setor de transportes, em termos qualitativos (tamanho e peso dos veículos, segurança, ruídos, emissão de poluentes etc.) e quantitativos (frequência, acessibilidade às atividades urbanas etc.), é de incumbência do governo. Já quando questionados sobre quem deveria ser o responsável pelo investimento na expansão, os usuários se dividiram de maneira equilibrada: 51% dos respondentes acham que é responsabilidade das concessionárias e 49% do governo. Outra questão bastante discutida no modelo atual das concessões rodoviárias no país é o papel do governo, o que se reflete nos ganhos do poder público com essas concessões. No formato atual, o governo acaba ganhando tanto na concessão em si, pelo fato de se livrar dos imensos investimentos para a manutenção das rodovias, como na cobrança de impostos sobre os pedágios, que são controlados pelas empresas concessionárias. Essas empresas recolhem quantidades enormes de impostos, os quais não são revertidos para a infraestrutura que os gera. Os impostos, junto aos altíssimos gastos iniciais quando se obtém uma concessão, acabam se refletindo nos preços pagos pelos usuários e, como consequência, no custo dos transportes e no preço dos produtos que vão ao consumidor final. 12/16 ANAIS Buscando compreender melhor a relação entre a qualidade dos serviços prestados pelas concessionárias com a sinalização nas curvas, a qualidade da manutenção da pista e a capacidade dos trechos pedagiados, foram feitos testes de correlação entre as variáveis, como descrito nas TAB. 4 – Correlações –, 5 – Sumário do Modelo –, 6 – Coeficiente (a) – e 7 – Variáveis Excluídas (c), a seguir. As estatísticas utilizaram-se das respostas de 100 empresas que compõem a amostra. Tabela 4 Correlações Qualidade dos serviços prestados Correlação Pearson Sig. (1-tailed) Qualidade dos serviços prestados Sinalização nas curvas Qualidade da manutenção Capacidade dos trechos pedagiados Qualidade dos serviços prestados Sinalização nas curvas Qualidade da manutenção Capacidade dos trechos pedagiados Sinalização nas curvas Qualidade da manutenção Capacidade dos trechos pedagiados 1,000 0,476 0,756 0,776 0,476 0,756 1,000 0,579 0,579 1,000 0,426 0,689 0,776 0,426 0,689 1,000 , 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 , 0,000 0,000 , 0,000 0,000 0,000 0,000 0,000 , Tabela 5 Sumário do Modelo Modelo 1 2 R 0,776 0,834 R² 0,602 0,695 R² ajustado 0,598 0,688 Erro padrão do estimador 0,572 0,503 a) Predictors: (Constant), capacidade dos trechos pedagiados b) Predictors: (Constant), capacidade dos trechos pedagiados, qualidade manutenção Tabela 6 Coeficiente (a) Modelo 1 2 (Constant) Capacidade dos trechos pedagiados (Constant) Capacidade dos trechos pedagiados Qualidade da manutenção Unstandardized coefficients B Std. Error 1,003 0,226 0,742 0,061 Standardized coefficients Beta t Sig. 0,776 4,448 12,175 0,000 0,000 0,681 0,465 0,207 0,074 0,486 3,288 6,275 0,001 0,000 0,361 0,067 0,420 5,429 0,000 a) Dependent variable: Qualidade dos serviços prestados Os resultados evidenciam uma alta correlação entre as variáveis selecionadas com a qualidade dos serviços prestados, com destaque para as variáveis qualidade da manutenção e capacidade dos trechos pedagiados, que apresentaram índices de correlação iguais a 0,756 e 0,776, 13/16 ANAIS respectivamente. Os valores mostraram-se significativos (todas as variáveis obtendo p-valor < 0,001). Também foi utilizada a análise de regressão linear, na tentativa de se definir a atuação das variáveis na qualidade dos serviços prestados como um todo. O método Stepwise foi utilizado com critérios de inserção para entrada e retirada de variável no modelo. As probabilidades foram de F<=0,5, para entrada de variável, e de F<=0,10, para retirada de variável. De acordo com os resultados, fica evidenciado o impacto da capacidade do trecho pedagiado e da qualidade da manutenção na qualidade dos serviços das concessionárias. No primeiro modelo, somente com a variável capacidade do trecho pedagiado, este pode ser explicado em 60% pelas variáveis em questão. E, quando adicionada a qualidade da manutenção, o modelo passa a explicar 70% do comportamento da variável qualidade dos serviços. Tabela 7 Variáveis excluídas (c) Modelo 1 2 Beta In Sinalização 0,178 nas curvas Qualidade de 0,420 manutenção Sinalização 0,038 nas curvas t Sig. Correlação parcial Estatística de colinearidade Tolerance 2,593 0,011 0,255 0,818 5,429 0,000 0,483 0,525 0,555 0,580 0,057 0,663 a) Predictors in the model: (Constant), capacidade dos trechos pedagiados b) Predictors in the model: (Constant), capacidade dos trechos pedagiados, qualidade da manutenção c) Dependent variable: Qualidade dos serviços prestados Essa análise se torna uma ferramenta importante para empresas do setor de concessão rodoviária e para o governo, como instrumento de direção dos investimentos nas estradas visando satisfazer os desejos dos motoristas que dirigem nas estradas. Este trabalho permite ainda a descrição de quais variáveis exercem maior influência na percepção da qualidade dos serviços prestados pelas concessionárias. E ainda demonstra a magnitude desses impactos provenientes das variáveis. A próxima seção sumariza os principais resultados e apresenta as conclusões finais da pesquisa. 5. Conclusão Transporte é um componente crítico da cadeia de suprimentos. Ele cria valor, fornecendo tempo e espaço, e garante que o produto ou serviço esteja disponível quando e onde solicitado pelo cliente. Os serviços de transporte constituem um fator crucial para a promoção do desenvolvimento econômico de um país. Para tal, torna-se indispensável o provimento de uma rede bem estruturada de transportes para uma maior integração intersetorial e regional em toda a estrutura produtiva (MACHADO, 2005). Os baixos investimentos em infraestrutura nos últimos anos vêm deixando o Brasil em uma situação arriscada. Apesar da alta tributação, o setor público permanece incapaz de financiar a construção, manutenção e ampliação das rodovias. 14/16 ANAIS O processo de concessão de rodovias vem-se apresentando como uma boa alternativa para a melhoria da infraestrutura de transporte no Brasil. Diante da realidade do mercado global, a necessidade de acesso fácil, rápido e de baixo custo entre os fluxos de mercados e cargas na cadeia de suprimentos contribui para o aumento da competitividade do país. Este trabalho apresentou as principais conclusões de uma pesquisa realizada com 100 empresas usuárias de rodovias pedagiadas no Brasil. A partir do modelo de concessão rodoviário adotado no país, a percepção sobre o trabalho realizado pelas concessionárias é boa, recebendo especial destaque na pesquisa as condições operacionais, a sinalização e as expectativas gerais. Percebe-se que o poder público realizou as concessões de forma bastante eficiente, criando as agências reguladoras e ficando livre das responsabilidades da concessão. Isso possibilitou que se criassem rodovias com um alto grau de qualidade, quando se consideram fatores como pavimento e a sinalização, conforme demonstrado nos resultados obtidos a partir das entrevistas com os usuários. Existem diferentes opiniões sobre o modelo utilizado para a realização das concessões no Brasil. Há os que entendem as concessões como um avanço para o país, pelo fato de possibilitarem os investimentos do setor privado na melhoria da infraestrutura, a qual há algum tempo era toda assumida pelo próprio governo. Em contrapartida, existem os que defendem a ideia de que foi um modelo que surgiu de uma falência do Estado, o que acabou ocorrendo de forma errada, privatizando-se as rodovias já existentes por falta de opção. É evidente que ainda existe um longo caminho a ser percorrido. Conforme argumenta Moacyr Duarte, da ABCR: “um dos grandes desafios”, ainda que pareça simples, “é o fato de as concessionárias se perceberem prestadoras de serviços públicos”. Dessa forma, aumentaria então a percepção do que é que realmente deve ser atendido do ponto de vista das necessidades dos usuários, bem como da sociedade como um todo. Fica claro também, a partir deste estudo, que toda essa iniciativa foi bastante favorável para os atores envolvidos, necessitando de melhorias, principalmente no que diz respeito ao relacionamento com os usuários, nas questões das tarifas cobradas e até no aumento da oferta de serviços. Por outro lado, observa-se que o governo foi um dos grandes ganhadores das concessões, principalmente pelo salto que deu o transporte de cargas no país nos últimos dez anos. As concessionárias, por sua vez, também foram beneficiadas, tendo uma chance de mostrar a eficiência do setor privado e a importância da atuação não governamental em algumas atividades econômicas. Ao final, este estudo, por se basear nas percepções das empresas usuárias do transporte rodoviário no Brasil, não pode ser generalizado para toda a população. Nesse sentido, torna-se pertinente propor futuros estudos que capturem também as percepções daqueles usuários, pessoas físicas, bem como identificar os impactos gerados nas populações ribeirinhas, considerando-se a responsabilidade social atinente às empresas concessionárias. Referências ABCR. Associação Brasileira de Concessão Rodoviária. Disponível em: <http://www.abcr.org.br>. Acesso em: jan. 2009. ABCR. Associação Brasileira de Concessão Rodoviária. Relatório Anual 2005. Uma década de concessões de rodovias no Brasil. Disponível em: <http://www.abcr.org.br>. Acesso em: jan. 2009. ANTT. Agência Nacional de Transporte Terrestre. Banco de dados. Disponível em <http://www.antt.gov.br>. Acesso em: jan. 2009. 15/16 ANAIS CAIXETA-FILHO, José Ricardo; MARTINS, Ricardo Silveira. Evolução histórica da gestão logística do transporte de cargas. In: Gestão logística do transporte de cargas. São Paulo: Atlas, 2001. CAVALCANTI, Bianor Scelza. 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