Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 591.842 - RS (2003/0163002-2) RELATORA RECORRENTE ADVOGADO RECORRIDO ADVOGADO : : : : : MINISTRA ELIANA CALMON WEIAND FACTORING LTDA ÂNGELO ARRUDA MUNICÍPIO DE LAJEADO VENÂNCIO EUGÊNIO DIERSMANN EMENTA TRIBUTÁRIO – ISS – COMPRA E VENDA DE DIREITOS CREDITÓRIOS. 1. A atividade de factoring figura na lista de serviços anexa à LC 56/87, sendo tributada como o ISS e identificada como atividade comercial mista e atípica. 2. A intermediação financeira de recursos, dentre as quais a aquisição de direitos creditórios, é operação tipicamente bancária, nada tendo a ver com a atividade de factoring . 3. Não-incidência do ISS por não figurar a atividade específica na lista dos serviços. 4. Recurso especial parcialmente provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, "Prosseguindo-se no julgamento, a Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora."Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Castro Meira e Francisco Peçanha Martins votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília-DF, 13 de dezembro de 2005 (Data do Julgamento) MINISTRA ELIANA CALMON Relatora Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 1 de 8 Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 591.842 - RS (2003/0163002-2) RECORRENTE ADVOGADO RECORRIDO ADVOGADO : : : : WEIAND FACTORING LTDA ÂNGELO ARRUDA MUNICÍPIO DE LAJEADO VENÂNCIO EUGÊNIO DIERSMANN RELATÓRIO EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON: - WEIAND FACTORING LTDA interpõe recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, proferido nos autos de execução fiscal para cobrança do ISS sobre atividade de factoring . O Tribunal a quo, manteve a sentença de primeiro grau que julgou improcedentes os embargos da empresa executada, restando o acórdão assim ementado: TRIBUTÁRIO – ISS – ATIVIDADE DE FACTORING – INCIDÊNCIA SOBRE O SERVIÇO DE COMPRA DE DIREITOS CREDITÓRIOS. É devido ISS sobre a atividade de factoring , mesmo aquela resultante da compra de direitos creditórios. Primeiro, porque expressamente capitulada no item 48 da Lista de Serviços. Segundo, porque a compra de direitos creditórios se ajusta, na atividade de factoring , como efetivo serviço prestado, assim, inclusive, definido em lei. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Correta a fixação da verba honorária, tendo em conta, exclusivamente, a ação de embargos do devedor, porquanto, para a execução, já havia sido fixada anteriormente. Condigna remuneração do profissional pelo serviço prestado. APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO NÃO PROVIDOS. (fls. 84) Além do dissídio jurisprudencial, a recorrente aponta como violados os seguintes dispositivos legais: a) art. 535, II, do CPC, ante a recusa do Tribunal de origem ao não se pronunciar sobre a aplicação do art. 156, II, da Constituição Federal; b) art. 20 do CPC, devendo ser afastada a cumulação de honorários na execução e nos embargos do devedor para que prevaleça a verba fixada na sentença; c) art. 8º do Decreto-lei 406/68, pois não incide o ISS sobre a compra de direitos creditórios; d) art. 110 do CTN, na medida em que o Colegiado de origem interpretou equivocadamente a norma tributária para definir a atividade de factoring . Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 2 de 8 Superior Tribunal de Justiça Contra-arrazoado, o recurso subiu a esta Corte por força de agravo a que dei provimento. É o relatório. Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 3 de 8 Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 591.842 - RS (2003/0163002-2) RELATORA RECORRENTE ADVOGADO RECORRIDO ADVOGADO : : : : : MINISTRA ELIANA CALMON WEIAND FACTORING LTDA ÂNGELO ARRUDA MUNICÍPIO DE LAJEADO VENÂNCIO EUGÊNIO DIERSMANN VOTO EXMA. SRA. MINISTRA ELIANA CALMON (RELATORA): - No que pertine à violação do art. 535, II, do CPC, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, para satisfazer-se o requisito do prequestionamento, é necessário que o Tribunal a quo tenha emitido juízo de valor a respeito da tese defendida no recurso especial. Assim, se a violação de dispositivo infraconstitucional ocorrer com o julgamento na Segunda Instância, devem ser interpostos embargos de declaração para que o Tribunal se manifeste a respeito. Recusando-se o Tribunal a fazê-lo, a orientação desta Corte é no sentido de que o recurso especial deve indicar como violado o art. 535 do CPC, sob pena de aplicação da Súmula 211/STJ. O Supremo Tribunal Federal, diferentemente, no julgamento do RE 219.934/SP, prestigiando a Súmula 356/STF, sedimentou entendimento no sentido de considerar prequestionada a matéria pela simples interposição de embargos declaratórios, ainda que restem eles rejeitados sem o exame da tese constitucional, desde que tenha ela sido devolvida por ocasião do julgamento da apelação. E isto porque, segundo o julgado, se a parte cumpriu com o que lhe incumbia, suscitando oportunamente a questão, não pode ela ser prejudicada, se o Tribunal se recusa a prestar devidamente a jurisdição. Desta forma, a Suprema Corte opta por admitir de logo o recurso, a reconhecer que houve negativa de prestação jurisdicional e determinar o retorno dos autos ao Tribunal a quo, a não ser que a parte prejudicada, expressamente, alegue violação do art. 5º, XXXV, da CF. Tais considerações são necessárias para constatar-se que o STJ e o STF, neste particular, procedem de maneira diversa, o que vem sendo consagrado no direito aplicado, como decidiu a Primeira Seção, no EREsp 162.765/PR. Com efeito, embora seja da competência do STJ examinar possível violação do art. 535 do CPC, quando a omissão for de questão constitucional, tendo em vista o entendimento do STF, melhor será que esta Corte reconheça que inexiste interesse de recorrer neste aspecto, Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 4 de 8 Superior Tribunal de Justiça deixando o Supremo dar a última palavra sobre a admissibilidade do recurso extraordinário. Esta é a atual posição desta Segunda Turma. Quanto à questão atinente à incidência do ISS sobre a atividade de compra de direitos creditórios, verifica-se que a controvérsia está em torno do entendimento do Tribunal quanto à natureza jurídica desse serviço. É certo que a lei incluiu expressamente a atividade de factoring na lista de serviços tributados pelo ISS. Nesse sentido, confira-se a redação do art. 48 da lista anexa à LC 56/87: (...) 48. Agenciamento, corretagem ou intermediação de contratos de franquia (franchise ) e de faturação (factoring ) (excetuam-se os serviços prestados por instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central); Factoring pode ser identificada como atividade comercial mista e atípica, envolvendo serviços e compra de créditos resultantes de vendas mercantis. O ciclo das atividades de uma factoring tem início com a prestação de múltiplos serviços de apoio ao cliente, tais como: ajuda na compra de materiais, organização da contabilidade, controle do fluxo de caixa, acompanhamento das contas a receber e a pagar, de busca de novos clientes, etc., tudo com vista à facilitação das vendas mercantis. Os serviços prestados de forma continuada têm com eles conectada outra atividade também prestada pela factoring, que é a compra de créditos ou ativos gerados pelas vendas mercantis a prazo, efetuadas pelas empresas-clientes, atividade que não se esgota com a compra dos recibáveis comerciais. A esta altura, cabe a indagação: é caracterizada como atividade peculiar ao factoring toda e qualquer compra de direitos creditórios? Responde o Dr. Luiz Lemos Leite, em publicação de sua autoria "Factoring no Brasil": A operação de factoring não se insere no contexto da operação financeira praticada pelos bancos. Banco capta dinheiro e empresta dinheiro, com garantia e fixação de taxa de juros. ............................................................................................................................ A intermediação financeira de recursos é atividade que caracteriza basicamente uma instituição financeira. A captação de recursos de terceiros resulta em ganhos econômicos decorrentes de sua transformação em investimentos produtivos, possibilitando maior eficiência alocativa para a economia do País. ............................................................................................................................ Banco e instituições financeiras captam recursos junto ao público; são intermediários do crédito, com estrutura própria e sujeitos à lei bancária específica, porque para funcionar necessitam de autorização das autoridades monetárias. O empresário do factoring, utilizando seus recursos, responde, por si, pelos prejuízos dos seus negócios, não colocando em risco a poupança do público. Acresce, ainda, a circunstância de que os negócios de factoring não se consubstanciam em adiantamentos ou antecipações de recursos ao cliente (cedente-endossante), como se fosse um financiamento.Trata-se de outro equívoco Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 5 de 8 Superior Tribunal de Justiça comum de pessoas pouco familiarizadas com os negócios do factoring. A empresa cliente não restitui o dinheiro recebido como antecipações, porque a empresa do factoring não o adiantou, mas adquiriu os direitos oriundos das vendas, a vista, em dinheiro. Ocorre, com efeito, que o cliente realizou, de fato, a venda de sua produção. Como, do ponto de vista físico, é impraticável, ele negocia os direitos gerados com as vendas efetuadas, representados em 80% dos negócios no Brasil pela duplicata. Mesmo no factoring convencional, o que existe é uma transação a vista de venda e compra de direitos, mediante ato jurídico perfeito e acabado, lastreado no contrato de fomento mercantil. A cessão importa alienação de um direito ou de um crédito - crédito no sentido jurídico. O cedente, titular de um direito, pode mobilizar recursos de que necessita, transferindo-os a outro (cessionário) mediante um preço entre eles ajustado. Não se tratando de um crédito mercantil, representado por um título cambiário, verifica-se a cessão civil de acordo, por conseguinte, com o objeto da transação. Portanto, no caso de fomento mercantil, há uma transação de venda e compra de um bem móvel representado por um título de crédito que nada tem a ver com uma operação de crédito, de mútuo, privativa de banco ou instituição financeira, que faz empréstimo, cuja remuneração é o juro cobrado pelo tempo de utilização dos recursos mutuados, que, no vencimento, são restituídos para quem os emprestou." (Fls. 298/300 - Obra citada). Dentro desse quadro, verifica-se que o acórdão merece reparo, por não se caracterizar como operação de factoring a compra de direitos creditórios. Trata-se de operação tipicamente bancária, não inserida na lista de serviços. Quanto aos honorários advocatícios, razão não assiste à recorrente, uma vez que a jurisprudência desta Corte tem entendido ser cabível a fixação de honorários advocatícios nos embargos do devedor, na forma do art. 20, § 4º, do CPC, independentemente daqueles arbitrados na ação de execução, haja vista que os embargos constituem ação de conhecimento autônoma. Confira-se, dentre outros, os seguintes precedentes: EREsp 81.755/SC, DJ 02/04/2001, Rel. Min. Min. Waldemar Zveiter; REsp 237.807/RS, DJ, 01/12/2003, Rel Min. Francisco Peçanha Martins; REsp 236.734/AL, DJ 14/03/2005, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros; REsp 506.889/MT, DJ 06/09/2004, Rel. Min. Castro Filho. Com essas considerações, conheço do recurso especial pela alínea "a" do permissivo constitucional, dando-lhe parcial provimento, para julgar procedentes os embargos à execução, declarando não incidente o ISS sobre a compra de direitos creditórios, invertida a sucumbência. É o voto. Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 6 de 8 Superior Tribunal de Justiça CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEGUNDA TURMA REsp 591842 / RS Número Registro: 2003/0163002-2 Números Origem: 200201771438 53897 56313 70002396018 70003423886 PAUTA: 06/09/2005 JULGADO: 13/09/2005 Relatora Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. JOSÉ FLAUBERT MACHADO ARAÚJO Secretária Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI AUTUAÇÃO RECORRENTE ADVOGADO RECORRIDO ADVOGADO : : : : WEIAND FACTORING LTDA ÂNGELO ARRUDA MUNICÍPIO DE LAJEADO VENÂNCIO EUGÊNIO DIERSMANN ASSUNTO: Tributário - ISS - Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza CERTIDÃO Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: "Após o voto da Sra. Ministra-Relatora, dando parcial provimento ao recurso, pediu vista dos autos o Sr. Ministro Franciulli Netto." Aguardam os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Castro Meira e Francisco Peçanha Martins. Brasília, 13 de setembro de 2005 VALÉRIA ALVIM DUSI Secretária Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 7 de 8 Superior Tribunal de Justiça CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEGUNDA TURMA REsp 591842 / RS Número Registro: 2003/0163002-2 Números Origem: 200201771438 53897 56313 70002396018 70003423886 PAUTA: 13/12/2005 JULGADO: 13/12/2005 Relatora Exma. Sra. Ministra ELIANA CALMON Presidente da Sessão Exmo. Sr. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA Subprocurador-Geral da República Exmo. Sr. Dr. JOÃO FRANCISCO SOBRINHO Secretária Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI AUTUAÇÃO RECORRENTE ADVOGADO RECORRIDO ADVOGADO : : : : WEIAND FACTORING LTDA ÂNGELO ARRUDA MUNICÍPIO DE LAJEADO VENÂNCIO EUGÊNIO DIERSMANN ASSUNTO: Tributário - ISS - Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza CERTIDÃO Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: "Prosseguindo-se no julgamento, a Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora." Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Castro Meira e Francisco Peçanha Martins votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília, 13 de dezembro de 2005 VALÉRIA ALVIM DUSI Secretária Documento: 577920 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 06/03/2006 Página 8 de 8