! ESCOLA: ESPAÇO DE FORMAÇÃO DO SUJEITO OU DE LIMITAÇÃO? Magda Marques Trevisan Denise Maria Alves ! RESUMO ! Este artigo foi elaborado tomando-se como base a prática de estágio de Psicologia desenvolvido junto a Faculdade da Alta Paulista FADAP/FAP, no município de Tupã/SP. A atuação deu-se com crianças, que apresentavam queixas escolares de dificuldade de aprendizagem, incluídas em uma escola municipal de educação fundamental localizada na região da Alta Paulista, oeste do Estado de São Paulo. Na prática de estágio foi utilizada a observação em sala de aula para detectarmos os alunos que realmente apresentavam dificuldades de aprendizagem, além de um levantamento bibliográfico pertinente ao tema em questão, seguido de sua revisão e, por fim, entrevistas com pais das crianças identificadas como possuidoras de dificuldade de aprendizagem. Partindo desta prática, definiu-se que seria de vital importância identificar qual a percepção que os profissionais relacionados à direção da instituição de ensino possuíam sobre a dificuldade de aprendizagem, constatando-se que para estes profissionais a dificuldade de aprendizagem estava relacionada à indisciplina. Concluiu-se que a dificuldade de aprendizagem é associada a indisciplina, como se a criança que não consegue se adequar as normas estabelecidas pela escola possuísse dificuldade de aprender o conteúdo ministrado, o que não corresponde a realidade. Muitas vezes a criança apesar de “indisciplinada” não tem dificuldades de aprendizagem. Aliás, a própria indisciplina pode ser vista como expressão de outras realidades vivenciadas pela criança, dentre as quais podemos destacar a rejeição as regras e normas elaboradas sem sua participação de forma possivelmente autoritária pelos espaços escolares ou inadequação do espaço escolar a realidade vivenciada pela criança. ! Palavras-Chave: dificuldade de aprendizagem, indisciplina, percepção profissional. ! ABSTRACT ! SCHOOL: SPACE OF FORMATION OF THE SUBJECT OF LIMITATION? ! This article was elaborated being overcome as practical base of period of training of Psychology developed next to Faculdade da Alta Paulista FADAP/FAP, in the city of Tupã/SP. The performance was given with children, who presented pertaining to school complaints of learning difficulty, enclosed in a school of basic education. In the practical one of period of training the comment in classroom was used to detect the students who really presented learning difficulties, beyond pertinent a bibliographical survey to the subject in question, followed of its revision and, finally, interviews with parents of the identified children as possessing learning difficulty. Leaving of this practical, it was defined that it would be of vital importance to identify which perception the professionals related to the direction of the education institution had on the learning difficulty, evidencing itself that for these professionals the learning difficulty was related to the indiscipline. It was concluded that the learning difficulty is associated the indiscipline, as if the child that doesn’t obtain to adjust the norms established for the school possessed difficulty to learn the given content, what it doesn’t correspond the reality. Many times the child although “indiscipline”, doesn’t have learning difficulties. By the way, the proper indiscipline can be seen as expression of other realities lived deeply for the child, amongst which we can detach the rejection the rules and norms elaborated without its participation of possibly authoritarian form for the pertaining or inadequacies of the school spaces the reality lived deeply for the child. ! Word-Key: difficulty of learning, indiscipline, professional perception. ! ESCOLA: ESPAÇO DE FORMAÇÃO DO SUJEITO OU DE LIMITAÇÃO? ! Introdução O presente artigo é resultado de um trabalho de campo, estágio, realizado em uma escola estadual de ensino fundamental, mas especificamente em uma sala de 2ª série do ensino fundamental. Gostaríamos de iniciar nosso texto destacando um trecho da fala da diretora da escola no momento em que nos apresentou aos alunos da 2º série: “... atenção crianças, essas pessoas vão observar o comportamento de vocês...", é sabido que os estagiários de psicologia estariam observando as crianças, não no intuito de fiscalizá-las, mas, para levantarem os sujeitos que realmente apresentassem dificuldade de aprendizagem ou que confirmassem os nomes já destacados. Tais nomes haviam sido listados e entregues previamente pela direção à coordenação do estágio. Estágio esse que tem como objetivo o desenvolvimento da prática à formação do profissional de psicologia, e também o cumprimento da disciplina de Psicologia das Instituições e Processos de Gestão, ênfase um, numa perspectiva psicopedagógica. Partindo da referida fala foi possível atentarmos, também, para a estrutura da instituição e de suas técnicas pedagógicas, sobretudo no que se diz respeito à questão da dificuldade de aprendizagem. Assim sendo, este estudo foi elaborado focando-se a fala do profissional de educação sobre o tema em voga. Logo os vários aspectos possíveis de se analisar esta questão, a prática de estágio, acabou direcionando o nosso interesse para o aspecto do discurso do profissional. Para direcionar a elaboração deste artigo, destacamos trechos de falas de profissionais da educação, que foram previamente anotadas em diário de campo. Além disso, foram acrescentadas a essa análise dados obtidos por meio da observação do cotidiano escolar, que tendem a expressar as concepções veiculadas nesse espaço sobre a questão da dificuldade de aprendizagem. Sempre buscando nos aproximar o máximo possível da neutralidade cientifica, mesmo sabendo da impossibilidade total da neutralidade. Sendo assim é preciso, esclarecer os dados sociais do problema, sem tentarmos estabelecer a sociologia da formação familiar e do surgimento da escola, mas nos restringirmos ao indispensável. O que dispara no indivíduo e como deve atuar. Para a realização desse estudo foi adotado como base teórica os conceitos de Piaget (1896-1980) e Ferreiro (1937-) levando em conta sua importância para a educação. Posteriormente foi feita uma análise dos principais propósitos da instituição e sua demanda, enfatizando: a natureza dos direitos humanos e as contradições que essa fórmula pode acarretar em educadores, educandos e até mesmo na sociedade; visto que a escola é um dos lugares onde se deva a formação do indivíduo, portanto, o modo que as escolas têm pensado essa prática educacional torna-se relevante. Durante duas semanas permanecemos em observação na sala de aula, pudemos nesse momento verificar que algumas crianças cujos nomes estavam na lista, não apresentavam dificuldade de aprendizagem e sim indisciplina. E nesse momento percebemos que alunos considerados problemas não pertenciam à escola, pois já havia evadido ou transferido. Outra parte dos alunos contidos na lista da direção apresentava indisciplina. E uma minoria dos alunos dessa lista demonstrou alguma dificuldade intelectual. O que nos chocou durante essa observação foi perceber que duas meninas muito quietas, cujos nomes não estavam na lista, não sabiam ler e escrever. Verificamos que os educandos “indisciplinados”, dessa série, eram tidos como alunos com dificuldade de aprendizagem. Destarte a prática pedagógica que observamos demonstrou a não existência de preocupação em oferecer um ensino seqüenciado e que se detivesse em aspectos relacionados à formação intelectual, afetiva e moral/ética das crianças pertencentes a essa instituição socializadora. ! 1. Aspectos teóricos em relação à aprendizagem e a dificuldade de aprendizagem: o que nos diz a teoria psicogenética? ! Segundo Ferreiro e Teberowsky (1985), antes de iniciar o processo formal de aprendizagem da leitura e escrita, as crianças constroem hipóteses sobre o objeto de conhecimento, a grande maioria das crianças, na faixa dos seis anos, faz corretamente a distinção entre texto e desenho, sabendo que o que se pode ler é aquilo que contém letras. Crianças que ainda persistam na hipótese de que tanto se podem ler as letras quanto os desenhos, provavelmente pertençam às classes sociais mais pobres que por isso acabam tendo um menor contato com material escrito. A criança tem uma longa caminhada até chegar à leitura e a escrita como adultos, percebendo que a cada som corresponde uma grafia; que há grupos de letras separadas por espaços em branco, grupos estes que correspondem a cada uma das palavras escritas. Sabemos que as dificuldades de aprendizagem, por meio do direcionamento dos estudos realizados por Ferreiro (1985), têm como primeiro momento que deixar claro sua base epistemológica assentada sobre os pressupostos piagetianos em que o conhecimento é o resultado dos esquemas de ação do indivíduo. Logo o enfoque das pesquisas dessa autora baseia-se nos processos de fonetização da escrita, dirigindo seus estudos para o momento em que a criança começa a usar letras para escrever. Descreve assim, como os sujeitos constroem a compreensão do sistema simbólico convencional, o que implica identificar as relações entre escrita e leitura. Portanto, na sua percepção, o sujeito é epistemológico e adquire um objeto de conhecimento. Cumpre-nos por fim destacar que utilizamos a intervenção psicodiagnóstica que engloba a observação geral, vínculo, provas de conservação, realismo nominal e moral, testes projetivos. Essa intervenção teve como dimensão o cognitivo, afetivo e institucional. O desenvolvimento cognitivo infantil passa por diversos estágios, descritos por estudiosos como Piaget (1896-1980) e Freud (1856-1939). Esses estágios ocorrem na infância de maneira muito rápida, fazendo com que a criança mude seu perfil radicalmente em pouco tempo. Segundo Piaget (1926), uma criança que já iniciou o processo de alfabetização e possui outros anseios, provavelmente não se interessa por assuntos ou programas que fazem sentido às crianças menores. Até os seis anos, a criança não consegue perceber o outro e seus pensamentos, portanto está centrado em si, e é na fase da alfabetização que ela abandona o seu egocentrismo e passa a imitar a mãe e a professora, separando os papéis. A imitação torna-se um recurso importante para a construção da sua realidade e reconhecimento do seu espaço na sociedade. Assim, as brincadeiras passam a simbolizar cada vez mais o mundo em que vivem, como se o faz-de-conta fosse à preparação da criança para enfrentar o mundo adulto. ! [...] no nível moral, a concepção de bem e mal serão abstrações das relações sociais efetivamente vividas. Por esta razão, uma educação moral que objetiva desenvolver a autonomia da criança não deve acreditar nos plenos poderes de belos discursos, mas sim levar a criança a viver situações onde sua autonomia será fatalmente exigida (LA TAILLE, 1994, p. 19). ! A imitação mostra-se importante nesse período, portanto os responsáveis e educadores exercem funções deveras relevantes. Durante as observações, realizadas por nós, percebemos que os profissionais adotavam condutas desregradas e longe de serem pedagógicas. Portanto, parece provável que a criança imitando condutas inadequadas dos professores, gritos, agressões e desrespeito, possa desenvolver um comportamento reprovável socialmente. O que nos intriga nessa situação é perceber que os professores recriminam os procedimentos inadequados dos alunos, culpabilizando suas famílias ditas “desestruturadas e incapazes” de educar sua prole, mas não observam seus próprios comportamentos e atitudes no ambiente escolar. Portanto o ato de repetir é o que faz com que a criança possa assimilar, ou melhor, integrar as ações sem descontinuidade com o estado precedente das estruturas prévias, e acomodar, como modificação dos esquemas de assimilação sob influência de situações exteriores do meio, que desencadeiam ajustamentos ativos, aos quais se aplicam acomodação de esquemas de assimilação. Diferentemente da criança medieval, o mundo de hoje produz infantes que se mostram conscientes do seu papel no mundo, e muitas vezes, tomam sozinhos as decisões do dia-a-dia. Porém, da mesma forma que as crianças eram vestidas como adultas há alguns séculos atrás, as crianças de hoje estão cada vez mais travestidas de adultos, fato que indica, também, que a infância vem “encolhendo”, enquanto a adolescência vem sendo “esticada”. Por outros caminhos, a figura infantil está voltando a ter a mesma caracterização medieval. ! [...], então, chamando a atenção para o fato de que as crianças praticamente desapareceram da mídia, especialmente da televisão. (Não há nenhum sinal delas no rádio ou nos discos, mas seu desaparecimento da televisão é mais revelador). Não quero dizer, claro, que pessoas de pouca idade não podem ser vistas. Quero dizer que quando são mostradas, são representadas como adultos em miniatura, à maneira das pinturas do século treze e quatorze. (POSTMAN, 1999, p 99) ! As crianças crescem cada vez mais consumistas e materialistas, produtos de uma sociedade calcada nas bases do capitalismo e da globalização, em que o TER sobrepõe-se ao SER. Outro fator importante e enfatizado na fala da diretora da escola, onde o estágio foi realizado, é a indisciplina e agressividade, tanto dos alunos como das famílias. Pensamos que seja possível a educação de forma efetiva, em que a escola esteja preparada para receber o aluno e disposta a contribuir com a formação desse indivíduo. ! [...] não adianta ficar culpando a família pelas condutas indisciplinadas dos alunos. Até onde sei isto não ajudará em nada a resolver o problema, se é que ele pode ser concebido desta forma. Ao agir assim, se está sendo ainda mais perverso com as famílias, que já sofrem todo tipo de acusação pelas mazelas sociais. Estaremos com tal atitude, alem do mais, fugindo de nossas responsabilidades: afinal, assim como os pais, também somos educadores. (SILVA, 2004 p 160) ! Sendo assim, as práticas pedagógicas devem estar voltadas ao desenvolvimento e construção do conhecimento do indivíduo, proporcionando aprendizagens significativas, ou seja, uma educação que perceba o educando como alguém que já possui uma vivência, e mesmo que essa não seja similar a educação escolar deve ser respeitada e utilizada para o desenvolvimento intelectual, afetivo e moral/ético dos alunos. Essa didática leva a uma responsabilidade educacional necessária, pois segundo Rousseau (ano), à criança não é uma “tábula rasa”. Essa responsabilidade passa por um processo democrático que se inicia com a avaliação das questões de metodologia de projetos, com a finalidade de mostrar para o aluno que o aprendizado tem significado e importância para ele, haja vista, considerar seu contexto social e sua bagagem cultural/familiar. Portanto, pais e professores devem agir com autoridade, pois são pessoas que têm conhecimentos legítimos e necessários ao desenvolvimento das novas gerações, podendo levar as crianças à autonomia. Isso fará com que as mesmas agradeçam as exigências e reflexões com gratidão. Talvez, assim, mudemos a percepção inconsciente predominante, dos educadores, de que a dificuldade de aprendizagem corresponde à indisciplina. ! 2. Histórico da escola e sua caracterização enquanto instrumento disciplinador. ! No entanto, a maioria dos profissionais não contempla a criança conforme proposto por Ferreiro (1993), estudiosa de base epistemológica. Parte dessas percepções equivocadas dos professores sobre a criança, onde indisciplina e dificuldade de aprendizagem se confundem, advém do próprio processo de constituição da escola. Logo se faz necessário percebermos o caminho percorrido pela escola, em seu surgimento, e suas implicações na vida da criança e na sociedade em si. Sabe-se que a escola é uma instituição que data do século XV (ARIÉS, 2001). A partir da instituição escolar a importância da criança começou a mudar, deixou de ser um homenzinho com os mesmos deveres dos adultos, inclusive o do trabalho para ter uma condição diferenciada, que por conta do segredo não fazia mais parte da vida adulta, e das obscenidades que essa vida oferecia. A escola dessa época não era uma instituição cujo formato e a importância na sociedade é como conhecemos hoje. Não havia separação por classes ou idades, era uma disciplina rígida, cartesiana, mas ainda assim a institucionalização do ensino marcou uma nova etapa na infância, quando as crianças deixaram de ser um “ser cômico e gentil, com o qual as pessoas se distraíam com afeição” (ARIÉS, 2001), e passaram a inspirar a responsabilidade da educação e da moral. Segundo Postman (1999), antes da prensa de Gutenberg e da instituição escola, após o desmame tardio aos sete anos, aproximadamente, as crianças interagiam com os adultos sem pudores e tinham as responsabilidades de trabalho e com ele a exigência de um amadurecimento precoce. Com a instauração da escola e a intervenção dos moralistas, à criança obteve um prolongamento da sua infância. No Brasil, os primeiros colégios foram instituídos por meio da Companhia de Jesus. Os padres jesuítas, nos termos de Del Priori (1993), por meio das missões volantes e dos colégios buscavam catequizar e educar a população da colônia. Educação instituída com base na larga utilização dos castigos físicos, que acreditavam nos termos desse autor, na necessidade de se educar o espírito através do corpo. A crença que se disseminava era a da possibilidade de se educar a criança, que era vista como anjo. Aliás, crença esta recuperada anos depois pelo movimento Escolanovista, em que além da possibilidade de se educar a criança verificavam-se a possibilidade de quais deveriam ser educadas (PATTO, 2000). O fato é que no período da instituição dos primeiros colégios, acabou se disseminando a crença de que a escola era o espaço da disciplina, do “disciplinamento” dos corpos. Os resíduos destas crenças nos dias atuais acabam mostrando-se na associação que determinados profissionais fazem da dificuldade de aprendizagem. Muitos profissionais da educação associam a dificuldade de aprendizagem ao que entendem como indisciplina. Por conta dessa percepção que possuem, sempre que surge a possibilidade de atendimento psicológico, direcionado a dificuldade de aprendizagem, os profissionais atuantes junto à educação, encaminham crianças que na verdade não apresentam dificuldade na leitura ou na escrita, mas sim que não conseguem permanecer por longos períodos sentadas nas carteiras ou que apresentam dificuldade de seguir regras, por exemplo. Frases tais como: “Se tiver mais alguém com o comportamento estranho pode pegar”, isso nos foi dito pela diretora da escola; “-Se batam aqui! - Querem uma coleira?! Vocês se comportam como animais! - Não tem mãe e pai que eduquem vocês?” essas frases foram ouvidas por nós, através de gritos que vinham da sala da direção na intenção de corrigir dois alunos “indisciplinados”. Essas frases ilustram muito bem as colocações anteriores. ! Método Informantes Participaram do estudo, a priori, dez professores, uma diretora, um vice-diretor e uma coordenadora pedagógica em reuniões pedagógicas, no intuito de esclarecer o plano pedagógico da instituição. Em um segundo momento, tivemos contato com 32 alunos de ambos os sexos, com idade aproximadamente de oito anos, que cursam a segunda série do ensino fundamental de uma escola publica do município de Tupã-SP. Dessas 32 crianças foram retiradas para atendimento psicopedagógico apenas quatro, sendo duas meninas e dois meninos. Instrumentos O primeiro instrumento utilizado foi a observação das reuniões pedagógicas, seguidas de entrevistas assistemáticas, com professoras, diretora, vice-diretor e coordenadora, para analisarmos o plano pedagógico e o entendimento desses profissionais sobre sua importância. Somente depois de levantarmos a identidade da unidade escolar iniciamos a observação em sala de aula, onde retiramos quatro crianças para atendimento psicopedagógico e, também, conversamos com os pais desses alunos, com a intenção de conhecermos um pouco a dinâmica familiar. Procedimento A escola foi analisada por meio de quase todos que participam da comunidade escolar. Entre eles: professores, diretora, vice-diretor e coordenadora pedagógica. Observamos nas reuniões pedagógicas e nas entrevistas que há um bom entrosamento dos profissionais da instituição bem como um satisfatório entendimento do plano educacional. Em seguida, realizamos observações em sala de aula, onde mantivemos contato com os alunos e a professora, e por fim a retirada dos alunos para o atendimento psicopedagógico em questão, complementada com o diálogo mantido com os familiares dos mesmos. Resultados O resultado acima descrito não indica que as crianças sejam incapazes de aprender a ler e escrever. Ao contrario, servem como advertência para que procuremos entender como as crianças apreendem a escrita adulta, por meio da assimilação e da acomodação segundo a teoria epistemológica de Piaget. O que demonstra esse estudo é que algumas crianças sentem-se incapazes de apreender nas situações de aprendizagem formal em sala de aula. O aprendizado fica comprometido quando o professor não leva em consideração as hipóteses alfabéticas da criança, sem proporcionar situações que ela possa construir seu conhecimento. Na maioria das vezes a deformação da escrita, que para nos é entendida como assimilação, e a indisciplina são consideradas dificuldades de aprendizagem. Por meio dos objetos de investigações podemos considerar que o fracasso escolar está ligado a um “grito” de algumas crianças que não concordam com a forma disciplinadora e autoritária das escolas. E que alguns professores desconhecem o desenvolvimento epistemológico da criança ou qualquer outra teoria que possa embasar a alfabetização. E como já dizia Machado (1997, p 35), esses estudos, grosso modo, questionam a concepção que culpabiliza a vítima, o aluno, pelo fracasso escolar, [e chama a atenção para má qualidade do ensino oferecido e para a presença, nas práticas escolares, de estereótipos e preconceitos existentes a respeito da criança pobre. Durante o atendimento psicopedagógico, os resultados não demonstraram que as crianças são incapazes de apreender conhecimentos. Ao contrário, ficou claro que elas têm uma cognição amplamente capaz de apreender e que os “problemas” familiares afetam, mas não a ponto de impedir o aprendizado. ! Considerações finais Até o momento foi possível verificar que não há separação entre dificuldade de aprendizagem e indisciplina. Durante as observações constatamos que alguns professores não representam uma autoridade para os seus alunos e que as atividades oferecidas não têm uma seqüência lógica para o bom desenvolvimento intelectual, afetivo e moral/ético dos alunos, mas sim são utilizadas como meios coercitivos e disciplinatórios. Segundo Kupfer (1997, p. 49), “alguns métodos escolares se apóiam em práticas ortopédicas, corretivas das ações dos professores perante as crianças”. E, ainda, para Winnicott (1982), nada é mais enganador na avaliação dos métodos educativos do que o simples êxito ou fracasso acadêmico. O êxito pode simplesmente significar que um infante encontrou na obediência o caminho mais fácil para lidar com um determinado docente, assunto, ou com a educação como um todo. Ou seja, aceitar tudo sem inspeção crítica. Observamos que a maneira com que a criança concebe o processo da escrita, não é a principal preocupação da instituição e que as teorias pedagógicas e metodológicas funcionam como receitas de ensinar a fim de evitar os erros mais freqüentes daqueles que alfabetizam. Durante a observação na escola deparamos-nos com algumas falas dos educadores calcadas na teoria “construtivista”, mas na prática de sala de aula não era possível sequer entender o que o professor solicitava como atividade. Ouvíamos sobre alguns alunos com dificuldade de aprendizagem, que suas mães eram “superprotetora”, ou suas famílias desestruturadas, e que não apreendiam nada por não terem feito préescola ou não a terem feito adequadamente. A metodologia de ensino da leitura e escrita não foi questionada em momento algum e, também, a percepção de como a criança desenvolve estas habilidades não foram consideradas como algo realmente importante para o desenvolvimento da criança pré-escolar. No entanto percebemos que como não há uma proposta pedagógica definida, fica mais fácil culpabilizar as famílias que não educam sua prole. Sendo assim, segundo Freitag (1980), Pain (1986), Silva (2004) cabe dizer que tanto a família quanto a escola, assim como as demais agências de socialização são responsáveis pelo desenvolvimento moral e ético das crianças e dos adolescentes. Com relação ao problema do fracasso escolar fica aparente, neste estudo, que a indisciplina confunde-se com a dificuldade de aprendizagem e que essas crianças não constroem suas hipóteses silábicas sem serem acusadas de não saber ler e escrever. Sabemos que fatores familiares que colocam a criança em estado de risco, podem dificultar a aprendizagem. Por fim, tomando como base o universo pesquisado, é possível, ainda, apontar o não engajamento da escola para uma educação de qualidade e perguntar se isso, também, não deve ser considerado fator de risco para a criança. ! REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ! ARIÉS, P. 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