Momento de fazer mais com menos Esta é uma iniciativa com o objetivo de sistematizar uma visão sobre os principais desafios da agenda da saúde em Portugal. Principais desafios da saúde 2012 http://www.pwc.pt/saude Introdução Inspirados na série de publicações anuais do Health Research Institute (HRI) da PwC, denominada “Top Health Industry Issues”, a PwC lança esta iniciativa com o objetivo de estimular uma discussão independente e tecnicamente sólida que permita sistematizar uma visão sobre os principais desafios da agenda da saúde em Portugal, em 2012. Esta iniciativa, que se pretende renovar numa base anual, não procura que a seleção dos principais temas seja consensual ou seja entendida como uma verdade absoluta, muito menos que a visão expressa sobre cada um dos temas seja a única, a verdade absoluta e que tenha de ser partilhada por todos. Antes pelo contrário, pretende-se que esta reflexão seja uma contribuição para uma maior pluralidade no pensamento sobre o setor, em 2012. Essa é uma das nossas principais motivações. Esta série de publicações agora iniciada, não pretende ser académica nem abordar todos os assuntos importantes do setor. O âmbito da reflexão e debate que se pretende promover não se limita ao âmbito da intervenção da administração pública no setor, aos prestadores públicos de saúde, Manuel Carrilho Dias PwC Health Diretor 2 PwC nem tão pouco limitada aos desafios do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Pretende-se que o âmbito da reflexão tenha um enfoque mais alargado, procurando refletir sobre os desafios de todas as atividades da fileira de valor da saúde e dos vários atores intervenientes, sejam eles públicos, privados ou sociais. Acreditamos que só desta forma podemos ser inovadores e concretizar a ambição de contribuirmos para uma visão integrada, sólida e independente sobre os desafios da saúde. O conhecimento de vanguarda e a intervenção da PwC no setor de saúde, a nível internacional mas particularmente em Portugal, são reconhecidos pelo mercado. Contudo, em linha com os fundamentos da iniciativa, é nosso intuito fortalecer o debate e a construção da nossa visão. Assim, alargamos o debate a um conjunto restrito de notáveis especialistas reconhecidos no setor e contámos com uma colaboração especial da Escola de Gestão do Porto (EGP) na dinamização dos painéis de peritos. Sem a sua contribuição, teria sido impossível produzir esta publicação com a qualidade aqui apresentada. Não procurámos que os especialistas participantes e a EGP tivessem uma visão comum sobre os temas em debate, nem que partilhassem a nossa visão. Esperamos que reconheça nesta publicação uma contribuição para uma maior pluralidade de ideias e pensamento sobre a saúde. Participantes O presente documento contou com as contribuições de um grupo de especialistas externos convidados. Apesar da redação final ter sido efetuada pela equipa da PwC, esta teria sido simplesmente impossível sem a colaboração dos especialistas externos e da EGP. A contribuição dos especialistas ocorreu através da sua participação em dois painéis realizados em Lisboa e no Porto, em entrevistas com membros da nossa equipa e na validação dos artigos que preparámos. A participação dos especialistas foi independente dos cargos que desempenham, bem como os mesmos não estão comprometidos com os temas selecionados como os principais para 2012 nem com o conteúdo desta publicação. A PwC agradece a contribuição da EGP e dos especialistas: o seu tempo valioso e a partilha dos seus largos conhecimentos e vasta experiência no setor. Os especialistas convidados que participaram são os seguintes: Painel de especialistas externos: • Álvaro Almeida; • Alexandre Lourenço; • António Serrano; • Carlos Coutinho; • Heitor Costa; • Henrique Martins; • José Carlos Caiado; • João Carvalho das Neves; • João Manuel Martins; • João Silveira Ribeiro; • Luís Drummond Borges; • Luís Pereira; • Luís Portela; • Luís dos Santos Pires; • Manuel Lemos; • Maria João Queiróz; • Nuno de Sousa Pereira; • Paulo Duarte; • Rui Santos Ivo; • Salvador de Mello. Os membros da equipa da PwC que contribuíram para este documento foram: • Ana Isabel Lopes; • Armando José Bernardo; • Celeste Iong; • David Esteves, • Filipe Charters Azevedo; • Marta Brito; • Manuel Carrilho Dias; • Maria Manuel Seabra da Costa; • Rita Redes; • Ricardo Sousa Valles; • Rui Manuel Gonçalves; • Sandra Ferreira; • Vera Oliveira Santos. Responsável pela publicação: Manuel Carrilho Dias Principais desafios da saúde 2012 3 4 PwC Conteúdos Página É urgente reforçar a governação do SNS 06 2012 Ano de descontinuidade na política fiscal e laboral e, potencialmente, do início da desconstrução da cadeia de valor do medicamento 14 Procurar concretizar e evitar constranger o potencial da inovação em saúde 20 É urgente agir sobre a produtividade e olhá-la como fonte de reforço do SNS 26 Prestadores e pagadores privados Há espaço para sinergias? 36 Gestão das pessoas no Setor da Saúde Uma boa relação entre os utilizadores e os profissionais 40 Capitalizar os investimentos já realizados em sistemas de informação 44 Nova dinâmica nos mercados dos MCDT e dos dispositivos médicos 48 Colocar a qualidade ao serviço da redução de custos e geração de receita 56 Setor hospitalar Racionalizar e procurar sinergias 60 Principais desafios da saúde 2012 5 É urgente reforçar a governação do SNS Mo e r nitorização e sp onsa b i l i z aç ã o ça an er elo o od tiv m niza a 6 PwC L or e id g Governação Saúde a Em Portugal e na atualidade, os desafios da governação do SNS devem ser analisados considerando algumas das principais dimensões da boa governação em saúde, refletindo a sua adoção em dois níveis: geral do sistema e em cada unidade prestadora de cuidados de saúde. Visão estratégica e ad id ão d a Efi ciênci E e q qui ua dade lid ad e c ia Sem um enquadramento de uma boa governação não há boa gestão, nem bons serviços e muito menos, gestão eficiente dos recursos do SNS e redução efetiva de custos e dívida. A governação de serviços públicos é um exercício de autoridade política, económica e administrativa para a gestão de tal serviço. Ela pode ser entendida como o modelo de distribuição dos poderes ao longo do sistema ou da organização, gerando não só uma hierarquia mas também processos e uma cadeia de responsabilidades, com o objetivo de assegurar a eficácia na prestação do serviço e a gestão eficiente dos recursos públicos. Sem um enquadramento de uma boa governação não há boa gestão, nem bons serviços e muito menos, gestão eficiente dos recursos do SNS e redução efetiva de custos e dívida. Ce no ntra cid l Hoje, o debate sobre a saúde está centrado nas tensões orçamentais, dívida e na disponibilidade de recursos. Em 2012 e nos anos seguintes, a governação do Sistema Nacional de Saúde (SNS) será condicionada pelas fortes restrições financeiras, a necessidade de controlo da redução dos custos e da dívida alarmante. Um debate mais holístico sobre a boa governação do SNS não é previsível que aconteça. No entanto, por várias razões é imperioso debater e reforçar a governação do SNS. ên par Trans As dimensões da boa governação em saúde relevantes em Portugal, em 2012, tendem a ser as seguintes: • centralidade no cidadão e no utente (direitos e obrigações, opção de escolha, participação, construir o sistema à volta do cidadão e não subordiná-lo ao sistema); • visão e orientação estratégica; • liderança e modelo organizativo; • prestação de contas, monitorização e responsabilização; • transparência; • equidade e acesso aos cuidados e qualidade da prestação; • eficiência na gestão dos recursos. Em Portugal, salvo raras exceções como foi o caso da revisão do Plano Nacional de Saúde (PNS), a participação do cidadão no setor da saúde não é promovida, resumindo-se em larga medida “à disponibilização de informação ao cidadão, não promovendo a sua participação no processo de tomada de decisão”1. Um exemplo da reduzida importância que o sistema atribui à participação ativa do cidadão está no tratamento de reclamações de utentes. Em 2010, conforme o relatório do Sistema Sim-Cidadão “a média nacional de tempo de resposta pelas unidades de saúde às reclamações de utentes é de 67 dias, existindo serviços de saúde com tempos de resposta próximos dos 180 dias”2. Ontem, hoje e no futuro próximo, a centralidade do SNS no utente será em larga medida uma dimensão de boa governação que fica por concretizar. Talvez derivado da época em que foi criado e de mentalidades ou preconceitos ainda existentes, o nosso SNS está concebido e implementado segundo um modelo contraditório: por um lado afirma-se a centralidade do sistema no utente e, em paralelo, a liderança e o seu modelo de funcionamento assume a “menoridade” ou incapacidade do utente em definir os seus interesses e ter as suas escolhas. São os dirigentes e profissionais do sistema que declaram o interesse “legítimo” e as escolhas do utente. Este facto marca de forma 67 dias é a média nacional de tempo de resposta pelas unidades de saúde às reclamações de utentes, existindo serviços de saúde com tempos de resposta próximos dos 180 dias. 1, 2 Relatório Final do Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar, 2011, Portugal Principais desafios da saúde 2012 7 É urgente reforçar a governação do SNS transversal o funcionamento do SNS. Por exemplo, o recente aumento das taxas moderadoras das urgências teve como uma das justificações o “incentivo” ao utente para que recorra aos serviços dos cuidados primários3, antes da deslocação a um serviço de urgência. O sistema não se preocupou em compreender e valorizar as razões da opção do utente pelo recurso direto a um serviço de urgência hospitalar e, consequentemente, modelizar uma solução ao nível do seu modelo de funcionamento que respondesse aos atributos implícitos na decisão do utente. Antes pelo contrário, o sistema age no sentido de “disciplinar” a opção do utente com o pretexto que o serviço de urgência exige recursos dispendiosos e, no “interesse da comunidade”, ele terá de ser penalizado se não cumprir os processos do sistema. Alguém ter-se-á preocupado em alterar o modelo de funcionamento das unidades e do sistema de saúde assegurando uma resposta adequada ao utente sem a tal utilização dispendiosa dos recursos de saúde, antes de procurar alterar ou condicionar os atributos valorizados pelo utente? O sistema e a sua rede de prestação não estão construídos para “ir” de encontro ao utente mas antes o reverso, obrigam o utente a “ir” ao sistema. Este funciona como se de um “sistema de canalização” se tratasse, fazendo o utente circular no seu interior, de instituição em instituição, subordinado à rigidez da arquitetura e dos componentes da dita “canalização”. O sistema está assente num modelo de serviço baseado em pesadas e dispendiosas infraestruturas físicas, com a agravante de existirem desajustamentos geográficos importantes entre a localização da procura e da oferta. A opção de escolha do utente é limitada e dificilmente será uma realidade abrangente em 2012. 3 Programa do XIX Governo Constitucional 8 PwC Hoje, ela está limitada ao contexto das entidades convencionadas. Por outro lado, mesmo que essa opção de escolha seja uma realidade a curto prazo, ela dificilmente será exercida de forma “informada”, considerando a escassez e qualidade de informação sobre o acesso e a qualidade da prestação dos cuidados ao nível do SNS. Adicionalmente, o que está previsto é que essa opção esteja limitada à escolha entre os operadores públicos, com prioridade para os cuidados primários e, no caso do acesso aos cuidados hospitalares essa opção seja exercida em conjunto com o médico de família. Importa também afirmar que as obrigações dos utentes do SNS também fazem parte da dimensão “centralidade do sistema no utente”. Um estudo4 do Health Research Institute da PwC indica que 46% do desperdício nos gastos de saúde são derivados do comportamento dos consumidores dos serviços de saúde (fundamentalmente obesidade e excesso de peso, fumo, não aderência à terapêutica e abuso do álcool), em paralelo com 26% do desperdício ao nível da prestação de cuidados clínicos e 26% ao nível nos processos operacionais. É importante registar a dimensão do desperdício resultante do comportamento dos consumidores e o seu peso relativo, comparando-o com as restantes fontes de desperdício na saúde. Em 2012, é pouco provável que existam alterações substanciais na responsabilização dos utentes pelos desperdícios que geram. O aumento das taxas moderadoras em geral, e das urgências em particular não pode ser confundido com responsabilização do utente. No entanto, há que sublinhar a evolução positiva neste trajeto de se potenciar a centralidade do sistema no utente. 4 The price of excess. Identifying waste in healthcare spending, PwC’ Health Research Institute, 2008 Contudo, a realidade tem provado que alguns dos pilares do sistema são também os principais entraves à concretização desta ambição. A visão e orientação estratégica para o SNS são fundamentalmente determinadas pela Constituição da República, pela Lei de Bases da Saúde, pelo Plano Nacional de Saúde (PNS) e pelo Programa do Governo. Contudo, ela é fortemente condicionada pelos orçamentos anuais. Nem sempre estes instrumentos são consistentes entre si, o que dificulta a construção 26% é a percentagem de desperdício ao nível da prestação de cuidados clínicos e ao nível nos processos operacionais. 46% do desperdício nos gastos de saúde são derivados do comportamento dos consumidores dos serviços de saúde. e orientação de uma visão estratégica sólida, exequível e partilhada. Na atualidade, poucos se atreverão a afirmar que conhecem a ambição e os objetivo s estratégicos do SNS. O PNS 2011-2016 é expectável que seja concluído em 2012. No futuro, será importante aferir o impacto efetivo da participação da sociedade na definição do plano. O PNS 2004-2010 tem sido elogiado em vários relatórios de organismos e personalidades nacionais e internacionais. Contudo, os planos nacionais de saúde encerram uma fraqueza importante decorrente da não associação dos objetivo s, metas e ações aos recursos necessários ou melhor, disponíveis para a sua prossecução. Para colmatar esta lacuna, o Memorando da Troika prevê que o Governo elabore um quadro orçamental de cuidados de saúde a médio prazo, abrangendo, pelo menos, 3 a 5 anos. Esta medida devia ter sido concluída no 4.º Trimestre de 2011. É expectável que ela se concretize em 2012. Outro aspeto importante no domínio da orientação estratégica do SNS, e hoje em forte debate na O Memorando da Troika prevê que o Governo elabore um quadro orçamental de cuidados de saúde a médio prazo, abrangendo, pelo menos, 3 a 5 anos. sociedade, é a visão do Governo sobre a elegibilidade, âmbito e nível de cobertura do SNS. Estas questões estão relacionadas com o plano de prestações garantidas5, um enigma que poderá ser concretizado de forma implícita nos próximos anos. É expectável que o esforço de mitigação dos impactos das tensões políticas e sociais decorrentes do contexto atual impeça o anúncio explícito de tal plano. Contudo, a limitação da elegibilidade poderá ocorrer através da restrição do acesso aos serviços de saúde financiados pelo Estado, por exemplo excluindo indivíduos ou famílias de elevado 5 Programa do XIX Governo Constitucional Principais desafios da saúde 2012 9 É urgente reforçar a governação do SNS rendimento ou dando oportunidade de escolha aos cidadãos entre a cobertura pública e privada. Por sua vez, a limitação do âmbito dos serviços e benefícios, suportados pelo SNS e que cada cidadão pode usufruir, poderá ser concretizada através do racionamento da quantidade e/ou qualidade dos cuidados de saúde, potenciando o aumento dos tempos e listas de espera. Finalmente, a limitação do nível da cobertura dos serviços financiados pelo Estado já está parcialmente a ser implementada através do aumento do valor e âmbito das taxas moderadoras. O setor da saúde, e em particular o SNS, tem um défice de liderança, ao nível global do sistema e em cada uma das entidades que o compõe. A missão do Estado na saúde – interpretada pelo Ministério da Saúde – e a distribuição de poderes e funções dos organismos que o compõem, nem sempre são claros para os atores internos, muito menos para o exterior. Entre outras, estamos a falar das funções de planeamento e definição de políticas nacionais, da saúde pública, regulação, financiamento (pagador), participação acionista , prestação de serviços, compra de serviços e controlo. O Programa de Governo reconhece este facto ao declarar a intenção de “Envolver as entidades do setor na necessária avaliação e clarificação da arquitetura organizativa do sistema, ou seja, na definição das funções das diferentes entidades, na avaliação da dotação e das capacidades existentes nos vários intervenientes de forma a permitir que estes assegurem uma gestão mais eficaz do sistema”. Esta necessidade de clarificação é particularmente crítica nos domínios da regulação, financiamento e na monitorização e controlo. Um exemplo das disfunções do modelo de governação atual é o planeamento, contratualização e controlo das parcerias público privadas na saúde. A inexistência de políticas, normas e processos comuns conduziram à proliferação de instrumentos, modelos de contratualização e controlo, consoante a parceria e região de saúde onde ela se insere. Tal como acontece com as medidas para um boa governação da saúde, independentemente da vontade do Governo, é expectável que o esforço de melhoria da arquitetura organizativa do SNS seja condicionado pelo contexto e objetivo s financeiros de curto prazo e pelo consequente reforço da influência e intervenção do Ministério das Finanças no setor. O bom funcionamento do SNS requer uma liderança eficaz. Neste contexto, em adição à necessidade de clarificação das funções das diversas entidades (centrais e regionais), seria necessário promover o debate sobre a virtude de existência de uma entidade independente de administração autónoma do SNS, eliminando-se por exemplo, a acumulação das funções de Presidente do SNS, por parte do Ministro da Saúde. Desta forma seria possível segregar as funções de definição de estratégias, políticas e planeamento da saúde e do sistema de saúde, das funções de administração do SNS. Em 2012, para bem da governação do sistema de saúde, também assistiremos a uma melhoria dos instrumentos e processos de prestação de contas, “Os bons resultados em saúde foram obtidos com uma despesa excessiva, que na última década superou os padrões internacionais (em % do PIB) e foi muito superior aos dos países com níveis de vida e resultados de saúde semelhantes” Álvaro Almeida 10 PwC monitorização e responsabilização a vários níveis do SNS. As medidas, metas e os prazos previstos no Memorando da Troika darão o ritmo a esta evolução. Contudo, existe o risco desta melhoria se centrar nos aspeto s financeiros, em detrimento da monitorização global do SNS. Adicionalmente, é expectável uma complexidade e esforço acrescidos na prestação de contas e monitorização, como resultado de implementação de orientações do Ministério das Finanças, fundamentalmente as relacionadas com o controlo da execução orçamental. Em termos de boa governação, a prestação de contas inclui a avaliação objetiva da eficácia e eficiência do desempenho do SNS, considerando os seus objetivo s e a necessidade de assegurar a sua sustentabilidade, não só financeira como também económica. Este debate, já em curso, permanecerá na agenda da saúde em 2012. É importante que o mesmo não seja só influenciado e centrado na conjuntura atual mas também considere aspeto s estruturais que pela sua natureza são de mais longo prazo. A questão que se coloca é se é possível ter reformas efetivas sem revisão dos pressupostos e do modelo de funcionamento do SNS, que se mantém inalteráveis desde a sua criação. tem contribuído para os resultados, assegurando a sua sustentabilidade. Se de forma objetiva podemos verificar os ganhos em saúde conquistados nos últimos anos, não é certo que se possa atestar a eficiência do SNS, fundamentalmente ao nível do seu modelo de funcionamento. A melhoria dos instrumentos e processos de prestação de contas, se não limitada aos aspeto s financeiros, poderá também contribuir para o aumento da transparência do SNS. Para bem da governação é importante que esta melhoria na prestação de contas não esteja limitada ou virada para a satisfação das necessidades do próprio sistema. Dela deveria resultar uma partilha de informação com o público e contribuintes em geral e com os utentes do SNS, em particular. A melhoria da transparência do SNS, algo em que a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) deveria ter um papel essencial, é importante para vários aspeto s da eficácia e eficiência do serviço público, como também para sustentar as escolhas e a decisão informada dos utentes do sistema. O esforço previsto para a melhoria da transparência do SNS irá enfrentar diversos obstáculos onde se destacam os de natureza jurídica, a cultura corporativista prevalecente nos principais grupos de profissionais, a inexistência de informação e sistemas de informação de qualidade, sem esquecer os preconceitos enraizados no setor. Citando Álvaro Almeida, “os bons resultados em saúde foram obtidos com uma despesa excessiva, que na última década superou os padrões internacionais (em % do PIB) e foi muito superior aos dos países com níveis de vida e resultados de saúde semelhantes”6. Importa pois refletir se as reformas em curso conduzirão a aumentos de eficácia e eficiência do sistema, pois corre-se o risco delas apenas se traduzirem em redução de custos fundamentalmente suportada pelos diversos stakeholders, principalmente os fornecedores, os profissionais e os utentes. A questão que se coloca é se é possível ter reformas efetivas sem revisão dos pressupostos e do modelo de funcionamento do SNS, que se mantém inalteráveis desde a sua criação. Como é consensual, a eficácia dos sistemas de saúde está relacionada com a equidade no acesso aos cuidados e com a qualidade da prestação, em linha com as expectativas e objetivo s do sistema e com a preocupação de assegurar a sua sustentabilidade. Em termos de governação, importa aferir a real efetividade do SNS. Por outras palavras, em que medida o modelo de funcionamento do SNS Adicionalmente, e como refere José Carlos Caiado7 “A contribuição privada para o total dos gastos com cuidados de saúde em Portugal, está bastante acima da média dos países da OCDE, ultrapassando já os 34% do total dos gastos em saúde (comparticipações e seguros privados de saúde) ”, o que prenuncia que eventualmente as funções do Estado já não estão a ser cumpridas. 6 Apresentação “Economia e políticas em saúde, Portugal 2012”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, Álvaro Almeida, 2011 7 Apresentação “Os Principais Temas da Agenda da Saúde em Portugal em 2012”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, José Carlos Caiado, 2011 Principais desafios da saúde 2012 11 É urgente reforçar a governação do SNS Conforme descreve Álvaro Almeida8, a equidade e acesso aos cuidados de saúde, em 2012, encerram os seguintes desafios: a) Cuidados primários: •assegurar um médico de família para todos os utentes; •aprofundar os modelos de Unidades de Saúde Familiar (USF); •desenvolver os CSP com uma visão primordialmente local e adaptada às situações próprias da geografia e demografia de cada região; •reorganizar o funcionamento, aproveitando melhor as competências de cada profissão. b)Cuidados continuados: •assegurar a sustentabilidade financeira da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, expandindo a rede de forma controlada; •reforçar os mecanismos de gestão da Rede; •reforçar os cuidados paliativos, com especial atenção ao reforço das unidades intra-hospitalares e aos cuidados domiciliários. Ao nível dos cuidados hospitalares os desafios da equidade e do acesso estarão principalmente relacionados com a reorganização da rede hospitalar e a procura do equilíbrio entre a redução de custos e a oferta de serviços, nomeadamente ao nível da carteira e disponibilidade. Por sua vez, os desafios no âmbito da qualidade da prestação estarão centrados na: a)Redução da variabilidade na prática clínica, aumentando a segurança dos doentes e reduzindo os desperdícios; b)Implementação nacional das boas práticas de governação clínica, em complemento da produção de normas de orientação clínica pela Direção-Geral da Saúde; 8 Apresentação “Economia e políticas em saúde, Portugal 2012”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, Álvaro Almeida, 2011 12 PwC c) Na continuidade ao Programa Nacional de Acreditação de Unidades de Saúde, reforçando a confiança dos cidadãos no sistema de saúde. Finalmente, ao nível da melhoria da eficiência na gestão dos recursos, os desafios em 2012 e anos seguintes, estão centrados na política do medicamento, monitorização da prescrição, racionalização de recursos e controlo da despesa, reorganização da rede de hospitais públicos, do modelo de financiamento e no reforço do desenvolvimento dos sistemas de informação. Também a este nível, existe a preocupação de assegurar que as medidas preconizadas não se limitem a procurar a redução de custos suportada por terceiros – mesmo assumindo que o reforço do poder negocial do Estado e os reequilíbrios nos mercados dos fatores sejam desejáveis – mas fundamentalmente resultem de melhorias efetivas do funcionamento do sistema. No contexto atual, o desafio é melhorar a produtividade do sistema e de cada uma das suas unidades, mantendo os níveis de produção. Os proveitos do sistema e de cada uma das entidades tenderão a reduzir. Por outras palavras, a melhoria de eficiência só será possível com uma redução de custos, pois o “numerador” da fração – nível de produção e proveitos hospitalares – na melhor das hipóteses só se poderá manter no nível atual, mas é previsível que até diminua. Muitos destes dilemas são depois traduzidos para a governação das unidades de saúde, particularmente os hospitais, independentemente da forma jurídica que assumam. Tal como o sistema em geral, as unidades de saúde têm um longo caminho a percorrer no desafio de colocar o utente no centro do seu funcionamento. De uma forma geral, ainda hoje os hospitais estão centrados em si próprios, construindo Deve existir a preocupação de assegurar que as reformas em curso não se limitem a procurar a redução de custos suportada por terceiros. e desenvolvendo o seu funcionamento em redor dos seus modos de produção e valências técnicas, na generalidade, como uma atitude passiva na relação com o utente. Reconhecendo este constrangimento, o Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar, em linha com o já proposto, em 2010, no relatório “Organização interna e governação dos hospitais”pelo Grupo Técnico9, recomendou a criação de Unidades de Gestão Intermédia de forma a “privilegiar o interesse do doente e a eficiência clínica, promovendo o desenvolvimento de unidades integradas multidisciplinares, em detrimento da organização tradicional em serviços monovalentes”. Neste esforço para promover e reforçar o papel do utente no funcionamento dos hospitais, destacam-se algumas propostas em cima da mesa referentes à implementação efetiva dos instrumentos de participação do cidadão na vida do Hospital e a implementação do princípio da liberdade de escolha do prestador público, por parte do utente. No primeiro caso, por exemplo, recomenda-se a alteração da composição do Conselho Consultivo dos hospitais e a promoção da intervenção ativa deste órgão na vida do hospital. Em larga medida a boa governação de muitos hospitais é afetada pela ausência de uma visão e orientação estratégica, sendo necessário 9 Grupo de Trabalho nomeado pelo Despacho n.º 10823/2010, de 25 de junho de 2010 Implicações • É necessário que o Ministério da Saúde clarifique os domínios de decisões de governação do SNS, correspondentes estruturas, funções e processos, assegurando a sua implementação efetiva. O limbo em que se vive limita a efetividade da governação geral do sistema e de cada uma das entidades de saúde. transformar os planos estratégicos em instrumentos efetivos de governação. Para tal, é importante que o Conselho de Administração do hospital tenha propriedade do plano estratégico, não seja uma imposição externa da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) ou da Administração Regional de Saúde (ARS), que ele esteja associado ao contrato de gestão e à contratualização interna, e que existam consequências pelo desempenho na concretização do mesmo. Será importante refletir sobre a virtude de introdução de contratos programa plurianuais, em linha com o plano estratégico previamente aprovado pelos acionistas. Outro dos desafios de governação refere-se à coexistência no sistema de diferentes estatutos jurídicos das unidades hospitalares dentro do SNS. Condicionada pelo contexto, não é certa a direção da evolução do modelo de autonomia dos hospitais EPE e do estatuto jurídico dos hospitais. No contexto atual, perante as crescentes restrições, a autonomia de gestão dos hospitais EPE poderá estar em causa. A recomendação10 de alteração da composição do Conselho de Administração, passando a incorporar uma Comissão Executiva e tendo o Diretor Clínico e o Enfermeiro Diretor como membros não executivos, poderá vir a ser uma realidade em 2012. O principal desafio é que esta alteração concretize uma melhor governação e não potencie o distanciamento dos membros não executivos da gestão do hospital. O envolvimento efetivo e comprometido do Diretor Clínico e da Enfermeira Diretora é decisivo para o sucesso da governação e gestão do hospital. Ainda ligado ao Conselho de Administração, destaca-se a expectativa de uma maior transparência na nomeação dos membros da Comissão Executiva. Os critérios de seleção propostos pelo Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar poderiam ter sido • A evolução da governação do SNS não deve ficar “aprisionada” aos condicionalismos de curto prazo, fundamentalmente os relacionados com as restrições financeiras. Há que desenvolver uma visão a prazo para o SNS e para a sua governação. Há que refletir com seriedade sobre a atualidade dos pressupostos e modelo de funcionamento e financiamento do SNS. • Deve ser promovida a participação do cidadão na gestão ativa do sistema e da sua própria saúde. A centralidade do SNS no cidadão, não deve ser uma retórica política, mas sim uma realidade na actuação quotidiana de todos os dirigentes, gestores e profissionais do setor. • É importante promover a transparência do SNS, divulgando informação de qualidade sobre o desempenho geral do sistema, de cada uma das suas unidades e dos seus profissionais. É necessário falar da produtividade do SNS e da qualidade da sua prestação. Há que vencer preconceitos e bloqueios corporativistas. • É crítico que existam instrumentos e processos efetivos que disponibilizem, em tempo útil, informação para apoio da monitorização e controlo do desempenho do sistema. Espera-se que os investimentos em sistemas de informação possam, ainda em 2012, contribuir de forma decisiva para este desígnio. • A prevista alteração do modelo de governação dos hospitais não deve ser entendida como uma “caixa de Pandora”. Há que assegurar que os novos modelos de Conselho de Administração, a criação das Unidades de Gestão Intermédia e as novas regras para a nomeação dos membros do CA não sejam ações de cosmética do sistema, nem introduzam uma complexidade acrescida na gestão. mais abrangentes pois, pecam por limitar o acesso à gestão dos hospitais públicos de profissionais de gestão, com experiência em outros setores. A saúde é um setor muito virado para si próprio e com dificuldades em aprender com as experiências de outros setores. Esta transversalidade setorial da gestão e a mobilidade intersectorial dos gestores são uma realidade em outros domínios da sociedade, muito mais dinâmicos que o setor de saúde e poderia contribuir para a evolução dos processos de gestão no setor. Por outro lado, considerando o contexto atual, não é expectável uma evolução positiva no incentivo e avaliação de desempenho dos Conselhos de Administração. A implementação alargada de Unidades Intermédias de Gestão (UIG) como forma de reforçar o modelo de contratualização interna, assegurando a organização da prestação dos cuidados mais centrada no utente e uma avaliação do desempenho interna mais relacionada com os resultados finais do serviço prestado pelo hospital, poderá ter o seu advento em 2012. É importante que as UIG não constituam um nível adicional de gestão, com estruturas acrescidas e tornando os processos organizacionais mais complexos. Elas só serão um sucesso se forem uma forma de aproximar a Gestão dos utentes, dos processos operacionais e dos profissionais, promovendo a responsabilização, a eficiência e a eficácia. Espera-se que, em 2012, os hospitais façam um esforço para aumentar o seu nível de transparência, fundamentalmente promovendo a divulgação dos seus resultados na área clínica e na satisfação dos utentes, contribuindo para a decisão informada do utente e para uma supervisão da sociedade sobre o serviço público de saúde. 10 Relatório Final do Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar, 2011, Portugal Principais desafios da saúde 2012 13 2012 Ano de descontinuidade na política fiscal e laboral e, potencialmente, do início da desconstrução da cadeia de valor do medicamento 2012 será um ano marcado pela elevada urgência orçamental e os mercados do medicamento não serão exceção. Será um ano de extrema exigência, difícil para o controlo das contas públicas nacionais, e em particular para o orçamento do SNS que assume à partida um défice de € 200M. Neste contexto são expectáveis fortes restrições a todos os níveis. Se, por um lado, maximizar a função-objetivo é a missão, os efeitos da restrição orçamental predominarão e far-se-ão sentir este ano de forma incontornável. O acordo de assistência financeira assinado com a EU, BCE e FMI – a Troika – impõe um conjunto de medidas de ajustamento que nos “Função-objetivo vs restrição orçamental. Os efeitos de uma gestão de tesouraria imposta pelas opções do passado.” 14 PwC levam às memórias do início da década de 80. Se no seu conjunto e no prazo de execução do programa acordado, as medidas permitirão obter ganhos de eficiência, 2012 não será o ano da implementação de medidas estruturais no setor da Saúde, mas antes, da implementação de medidas de gestão de tesouraria. A necessidade de desvalorização económica interna impõe medidas de retração da despesa e do consumo (pelo aumento da carga fiscal sobre as famílias e consequente redução do rendimento disponível), obrigando a população e as empresas a redesenharem o seu quadro de prioridades e de actuação. Se por um lado, as famílias terão menor rendimento disponível para consumir ao nível dos cuidados de saúde, por outro, as realidades oscilarão entre o saldo diferencial positivo para uns e negativo para outros, do aumento das taxas moderadoras, da redução das comparticipações e da redução dos preços dos medicamentos. “Portugal não tem dinheiro. Fechou a loja? Não, reagiu!” Ao nível das empresas, elencam-se grandes eventos – (i) o pagamento das dívidas dos Hospitais, retardada do 4º trimestre de 2011 para o 1º trimestre de 2012; (ii) a redução do mercado de medicamentos em valor (e provavelmente em volume) e (iii) o agravamento das barreiras à introdução de novos medicamentos no mercado. O pagamento das dívidas dos hospitais aos laboratórios farmacêuticos resultará, para as Multinacionais, num acerto de contas há muito esperado, sendo provável O que significa? Realidade contextual “Money is gone” UE/BCE/FMI/MOU Pagamento das dívidas dos Hopsitais SNS Redução da despesa com medicamentos Redução do mercado em valor (e também em volume) Desconstrução da Cadeira de Valor Política de “gestão de tesouraria” Restrições à introdução de inovação (sem payback imediato) Perda de potencialidade no Cluster “Patents expiring” Boas notícias para as PMEs Boas notícias para os Genéricos que grande parte desse capital retorne à casa-mãe (ou centro de distribuição) para acerto de contas a pagar. Para as PME’s e laboratórios nacionais, esta medida constituirá um fôlego da pressão financeira que desde o início de 2010 vinha crescendo nestas empresas. A redução da dimensão do mercado provocada pela alteração do modelo de fixação de preços, das margens de comercialização e do preço dos genéricos trará impactos ao nível de “Pagamento das dívidas dos Hospitais. Boas notícias para as PME’s.” Principais desafios da saúde 2012 15 2012: Ano de descontinuidade na política fiscal e laboral e, potencialmente, do início da desconstrução da cadeia de valor do medicamento •Eventual aumento do mercado paralelo. •Rateio de MNCs pode “desprivilegiar” Portugal. •O mercado de genéricos aumenta com a perda de patentes e com a “promoção” induzida pelo Governo. •Empresas licenciadas num ambiente cada vez mais estrangulado. Aumento potencial do risco de rutura de stocks Redução de custos nos Laboratórios Aumento do mercado de genéricos Retração no “conforto” induzido pela inovação terapêutica •Modelo de farmácia alterado em função de localização e cobertura geográfica. •Novos modelos de farmácia com diferentes níveis de serviço em função da rentabilidade e exigência do mercado em que se insere. Fonte: PwC toda a cadeia de abastecimento, desde a indústria à farmácia, passando pelos distribuidores e outros operadores atualmente com presença reduzida no setor mas que poderão potenciar a sua atividade neste novo enquadramento (e.g. operadores logísticos). A redução da dimensão do mercado em valor (e provavelmente em volume) tornará o mercado nacional, já em si com reduzida dimensão, com menor atratividade, em particular para os grandes operadores. A redução do preço dos medicamentos pode dar origem a uma intensificação do mercado paralelo, desviando 16 PwC •Reestruturação e Outsourcing. •Redução de DIM’s. Desconstrução da Cadeia de Valor Novas “tipologias” de farmácias Redução dos níveis de serviços da Distribuição •Redução das entregas. •Mix de serviços entre distribuição e logística alterado por relação fornecedor/cliente. Sustentabilidade do modelo de negócio de farmácia tradicional •Insolvências. •Consolidação. •Modelo de farmácia alterado em função de localização e cobertura geográfica. •Novos modelos de farmácia com diferentes níveis de serviço em função da rentabilidade e exigência do mercado em que se insere. “Redução da dimensão do mercado. Catalisador do início de um processo de desconstrução da cadeia de valor?” medicamentos para países com preços mais altos, e por outro lado levar a um menor investimento das multinacionais em Portugal, no que respeita à alocação e rateio de medicamentos, em particular naqueles em que as pressões da procura são elevadas. Estas situações, de forma isolada ou combinada, poderão dar origem a um aumento de rutura de medicamentos no mercado, o qual associado à redução da capacidade de pagamento das farmácias (e consequente redução do seu abastecimento pelos distribuidores e laboratórios), poderá apresentarse ainda mais gravoso. Em 2011, as ruturas de stock intensificaram-se no último trimestre para uma média mensal de 33 ruturas, representando quase 3 vezes mais do que a média dos trimestres anteriores que foi de 12 ruturas/mês (harmonizado das cessões de comercialização). Janeiro de 2012 prossegue com a mesma tendência, tendo sido registadas 35 ruturas (Fonte: Infarmed). (O tempo médio estimado de reposição de ruturas nos últimos 12 meses é de 4 meses. Fonte: Infarmed). Reagindo à redução do mercado e à pressão negativa sobre as suas vendas, os laboratórios continuarão a prosseguir com os esforços de redução de custos, os quais, a ocorrer ao nível do manufacturing, podem colocar em risco a continuidade da operação de algumas unidades industriais nacionais com elevada dependência de contratos de façonnage. Não obstante, tendo presente os elevados prazos que a transferência de produção impõe, exigindo 2 a 3 anos de preparação, não se antecipam impactos significativos para 2012. No entanto, ao nível das forças de vendas, é de prever que em alguns casos se venham a verificar processos de reestruturação e diminuição do número de delegados de informação médica, sendo colocadas em prática ações de promoção conjunta. Esta tendência terá tanto mais expressão com o intensificar das vendas de medicamentos para utilização em ambiente hospitalar e destinados a nichos de especialidade, que tornarão muitos DIMs redundantes. O nível de emprego no setor caiu cerca de 7% entre 2008 e 2010. Fonte: Apifarma). Ruturas 2011 4º Trimestre 99 1º Trimestre 36 33 2º Trimestre 39 3º Trimestre Fonte: Infarmed “Pagamento das dívidas dos Hospitais. Boas notícias para as PMEs.” Principais desafios da saúde 2012 17 As farmácias serão também fortemente afetadas pela alteração das margens de comercialização de medicamentos, sendo expectável uma vaga de insolvências e de encerramentos de farmácias e alguma consolidação. Entre 5% a 10% das farmácias portuguesas estão neste momento em risco de falência, motivo que levou a que a Associação Nacional de Farmácias (ANF), em conjunto com alguns bancos portugueses, criasse um programa de apoio e linhas de crédito para farmácias em dificuldades. Para o próximo ano, a ANF estima que a farmácia média venha a registar um decréscimo significativo na sua margem e que cerca de 2400 farmácias, representando cerca de 80% do universo total de farmácias, possa estar em risco de apresentar 18 PwC Cobertura por Farmácia (por distrito) PIB da população coberta por farmácia A introdução de maiores exigências ao nível de planeamento de compras junto das farmácias, ou o desenvolvimento de VMI (Vendor Managed Inventory) pelos próprios distribuidores, poderão permitir ganhos significativos de custos e uma recuperação das margens perdidas pelos distribuidores, com a alteração legislativa ao nível do cálculo das margens de comercialização (DL 112/2011 de 29 de novembro) e que, de acordo com a ANF, se aplicada ao mercado atual, representará uma retração de cerca de € 24 M. Custo Fonte: Infarmed; INE; Análise PwC A distribuição terá igualmente que empreender processos semelhantes que se traduzirão fundamentalmente na alteração dos níveis de serviço que, nalguns casos, poder-se-ão aproximar da operação logística (recuando no risco financeiro e de mercado) ou, noutros casos, na mera redução de indicadores de serviço, como o número de entregas diárias e tempos de resposta que em muitos casos, nomeadamente em Lisboa, atingiram níveis cujo custo marginal ultrapassou o valor acrescentado. Valor acrescentado 2012: Ano de descontinuidade na política fiscal e laboral e, potencialmente, do início da desconstrução da cadeia de valor do medicamento 140,000 120,000 Setúbal 100,000 Lisboa 80,000 Faro Aveiro 60,000 Viana do Castelo 40,000 Santarém Vila Real Coimbra Porto 0 10 20 Beja Bragança Portalegre Viseu 20,000 -10 Leira 30 Guarda 40 Braga Évora 50 Cobertura por Farmácia (em resultados negativos, gerando por esta via, também um aumento do risco de rutura de stocks, o qual deverá ser sentido de diferentes formas em ambientes urbanos e rurais. Neste quadro, torna-se imperativa a concentração do setor entre 15% e 30%, de forma a garantir a sua sustentabilidade económica e financeira futura. Ou seja, entre 400 e 800 farmácias terão que sair do mercado, ou ver o seu modelo de negócio significativamente reconfigurado. Em contrapartida, novas tipologias de farmácias começarão a surgir, iniciando-se no meio rural disperso, recordando um voltar às origens do farmacêutico de aldeia, com menores custos com pessoal, com uma oferta de medicamentos essenciais Castelo Branco 60 70 80 90 km2) e, eventualmente, beneficiando de intervenção da autarquia local/junta de freguesia, como forma de combater a “desertificação medicamentosa” e fazer face a potenciais problemas de acesso e cobertura; e culminando no aparecimento de modelos mais sofisticados nos centros urbanos de maior competitividade. É assim provável que a segmentação do mercado nas farmácias se venha a intensificar, cumprindo um dos desígnios da Troika de maior liberalização dos mercados. O cenário ora descrito, em nada favorece a inovação e a introdução de novos medicamentos no mercado. De facto, num quadro de gestão de tesouraria, não será expectável a introdução de novos medicamentos que permitam ganhos económicos a médio ou longo prazo. Muito pelo Conclusões • Espera-se que 2012 seja o ano da tesouraria. Da regularização dos pagamentos em dívida. Da redução de preços, margens e comparticipações. Do incremento dos genéricos. Tudo isto para contribuir para uma tentativa de equilíbrio do défice orçamental português. • A cadeia de valor alterar-se-á. • Não será o ano do DTP (Direct to Pharmacy), mas novos serviços e modelos de negócio irão surgir na distribuição e retalho/farmácia. • A internacionalização será a tábua de salvação das empresas nacionais licenciadas, cada vez mais “stuck in the middle” entre produtos de marca (com patentes com prazo à vista) e o crescimento dos genéricos. • Não se esperam grandes movimentações nas farmácias dos hospitais ou impactos na prescrição por DCI ou dispensa por unidose. • A inovação terá que esperar. E as potencialidades que a área de ensaios clínicos traduz, também. Implicações • Liquidez volta ao mercado, permitindo às empresas nacionais, em particular PMEs, um fôlego para suportar as necessidades de reestruturação dos modelos de negócio e operações que serão impostas pelas medidas em vigor em 2012. • Os laboratórios terão que reduzir custos, nomeadamente ao nível da informação médica, potenciando parcerias, privilegiando modelos de outsourcing e racionalizando os contactos a efetuar. • Os laboratórios nacionais terão que rever e simplificar os sistemas de compliance interno, no sentido da sua desburocratização e no estrito cumprimento das normas aplicáveis. • Os laboratórios nacionais não terão alternativa senão a internacionalização, sejam eles licensed ou genéricos. • Os distribuidores terão que rever e reduzir os níveis de serviços às farmácias, e equacionar a implementação de modelos de VMI nas farmácias. • As insolvências e fusões e aquisições de farmácias serão intensificadas. contrário, o custo prevalecerá sobre a inovação ou o “conforto” da terapia correndo-se o risco de prejudicar o compliance da toma, com todas as implicações inerentes ao nível de riscos de reincidências, resistência ou prolongamento da toma para além do necessário e desejável. Este efeito será tanto mais potenciado com a entrada em perda de patente de um conjunto de medicamentos com expressão, já no ano de 2012,e cujo impacto de substituição por genéricos se estima na redução do valor em cerca de € 75 M (Fonte: Apifarma – IMS Health, Infarmed). Acresce o facto que alguns deles desenvolvidos em joint ventures ou bundled e que serão provavelmente substituídos por combinações de medicamentos genéricos, cuja eficácia terapêutica conjunta requer afirmação. • Novas “tipologias” de farmácias irão surgir, em função de localização e cobertura geográfica e com diferentes níveis de serviço em função da rentabilidade e exigência do mercado em que se insere. • Inovação não terá lugar de destaque em 2012. • Aumento do mercado de genéricos com a perda de patentes e com a “promoção” induzida pelo Governo. • Empresas licenciadas num ambiente cada vez mais estrangulado. 2400 farmácias, representando cerca de 80% do seu universo total, podem estar em risco de apresentar resultados negativos. Principais desafios da saúde 2012 19 Procurar concretizar e evitar constranger o potencial da inovação em saúde, em Portugal O ambiente em que as empresas farmacêuticas têm operado tem vindo a ser cada vez mais exigente e desafiante. O imperativo global requer medicamentos mais inovadores e eficientes ao nível de custos de produção. Efetivamente, as entidades reguladoras, os prestadores e os próprios pacientes estão a exigir produtos e serviços de cada vez mais valor acrescentado, maior transparência e mais acesso à informação. Para responder a estas necessidades e expectativas, a indústria ter-se-á de reinventar sob a forma de uma comunidade colaborativa onde o conhecimento partilhado será o seu maior ativo. Portugal nos últimos anos tem tido algum destaque no ranking de inovação europeu (Innovation Union Scoreboard). Efetivamente, no último ranking, o País foi colocado como um dos mais inovadores da União Europeia e como o que mais cresceu no último ano. Contudo, de acordo com os dados do Instituto Nacional de Proteção de Propriedade Industrial, os pedidos de patentes por parte das empresas portuguesas têm diminuído desde 2009, em linha com os dados da EFPIA (European Federation of Pharmaceutical Industries and Associations) que revelam a mesma tendência a nível europeu. Verifica-se, portanto, que tem havido um forte investimento da indústria farmacêutica ao nível de Investigação e Desenvolvimento (I&D), mas a introdução de novos produtos tem diminuído. Por outro lado, o setor da saúde tem sido uma das áreas de maior aposta, especialmente no que diz respeito às externalidades obtidas aquando do investimento em I&D. Ou seja, observa-se que na larga maioria dos casos, os novos produtos e serviços que resultarão de projetos de I&D empresarial portugueses, têm na sua maioria um papel difusor de inovação tecnológica para outras empresas e setores, sendo o da saúde, um dos com maior aplicação. Poder-se-á dizer que neste caso a I&D de algumas empresas é a fonte de inovação de outras1. O setor da saúde sempre foi altamente regulado pelo imperativo da inovação. 1 De acordo com o Relatório Preliminar dos resultados do Inquérito à Valorização de Resultados da I&D Empresarial (15 de fevereiro 2011) desenvolvido pela AdI – Agência de Inovação. www.adi.pt 20 PwC Inovação como fonte de novas receitas para a industria farmacêutica P: Em que medida concorda ou discorda das seguintes afirmações acerca das expectativas em relação à inovação na sua organização nos próximos três anos? As nossas inovações conduzirão à obtenção de novas oportunidades de receitas 89 78 As nossas inovações conduzirão a eficiências operacionais que nos possibilitarão uma vantagem competitiva 77 79 Uma parte considerável da nossa estratégia de inovação está relacionada com o desenvolvimento de produtos ou serviços “amigos do ambiente” 58 64 Consideramos as Fusões e Aquisições (M&A) como uma fonte significativa de inovação 45 33 É expectável que a maioria das nossas inovações sejam desenvolvidas em mercados diferentes do país onde estamos sediados 43 29 Esperamos que exista apoio do Estado (em termos de financiamento, benefícios fiscais e/ou transferência de tecnologia) para alavancar os nossos resultados de inovação 43 26 É expectável que a maioria das nossas inovações sejam desenvolvidas com parceiros externos à nossa organização 42 39 De acordo com o 14th Annual Global CEO Survey da PwC2, os líderes das empresas farmacêuticas consideram que é no desenvolvimento de novos e melhorados produtos e serviços que existe capacidade para crescer economicamente, e muitos estão dispostos a fazer os investimentos necessários para atingir esse objetivo : 83% dos líderes estão comprometidos em garantir a inovação dentro das suas empresas e proteger a propriedade intelectual criada. Por outro lado, 43% dos líderes entrevistados afirmam que a intervenção do estado, essencialmente pelos incentivos ao nível fiscal, é fundamental para alavancar os resultados de inovação do setor. % Farmacêutica e ciências da vida Amostra total 2 14th Annual Global CEO Survey - Survey realizado a 1.201 líderes de negócio em 69 países. Principais desafios da saúde 2012 21 Procurar concretizar e evitar constranger o potencial da inovação em saúde, em Portugal A indústria farmacêutica tem enfrentado desafios ao nível da investigação clínica nunca antes observados (ver capítulo sobre a investigação e desenvolvimento). A inovação dos medicamentos deverá ser incremental (desenvolver novos medicamentos com base em melhorias de medicamentos já existentes) e o modelo de negócio terá de sofrer alterações necessárias no sentido de haver mais transferência de conhecimento e tecnologia entre as empresas, meio académico, instituições de investigação, reguladores e entidades governamentais. Cerca de 42% dos líderes globais entrevistados3 acreditam que a maioria das inovações a realizar pelas suas empresas, serão desenvolvidas em parceria com parceiros externos. Neste enquadramento, em Portugal foi criado o Health Cluster Portugal (HCP), pólo de competitividade na área da Saúde que tem apostado numa aproximação entre centros de investigação e empresas. Tem como missão “tornar Portugal num player competitivo na investigação, conceção, desenvolvimento, fabrico e comercialização de produtos e serviços associados à saúde, em nichos de mercado e de tecnologia selecionados, tendo como alvo os mais exigentes e mais relevantes mercados internacionais, num quadro de reconhecimento da excelência, do seu nível tecnológico, e das suas competências e capacidades no domínio da inovação.”4 O HCP foi criado em 2008 e conta já com 122 associados, entre instituições de I&D e Universidades, hospitais, médicos, empresas farmacêuticas e de biotecnologia e empresas de tecnologia e serviços médicos. Os “projetos âncora horizontais” (projetos que dão corpo à estratégia de curto prazo) do HCP, abrangem a generalidade dos associados 3 14th Annual Global CEO Survey – Survey realizado a 1.201 líderes de negócio em 69 países. 4 http://healthportugal.com/ 22 PwC e são coordenados pelo próprio HCP: investigação de translação, transferência de tecnologia e a promoção internacional e networking. De uma forma direta ou indireta verifica-se que a influência desta network deu origem a uma surpreendente lista de produtos e serviços inovadores (alguns em carteira e outros já em comercialização) desenvolvidos pelos associados do HCP, que vão desde o desenvolvimento de terapêuticas para doenças hepáticas, oncológicas, gástricas, entre outras, até ao desenvolvimento de peças de vestuário para monitorização de sinais vitais. Interessante ainda é verificar que, para o desenvolvimento de alguns destes produtos, foram estabelecidas parcerias com empresas fora do setor da saúde. Poder-se-á então afirmar que colaboração é a palavra de ordem. A promoção de sinergias entre os vários players do setor e a promoção da geração de ideias conduzirá à dinamização da inovação. “Atuar no desenvolvimento de laços estreitos com as várias unidades de saúde, institutos de investigação e empresas, encontrar novas fontes de financiamento para acelerar o processo de desenvolvimento de inovações e ser ativo no apoio ao desenvolvimento de novas iniciativas, deverão ser algumas das ações prioritárias a ser conduzidas para colocar o setor mais competitivo e sustentável”, de acordo com o referido por Luís Portela5. Plataformas colaborativas – a ciência de hoje desenvolve-se em rede As plataformas colaborativas online têm ganho um protagonismo muito importante como meios que apoiam o desenvolvimento desta tendência. Neste enquadramento, o conceito de open innovation (ou inovação aberta) 5 Apresentação “Os Principais Temas da Agenda da Saúde em Portugal em 2012”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, Luís Portela, 2011 Foi criada uma plataforma de informação para disponibilizar ao público, informação científica na área das ciências médicas e biomédicas. associado às ferramentas online já existentes6, tem sido fortemente utilizado no setor da saúde. As empresas começaram a perceber que defendendo as premissas de que “nós detemos os melhores talentos e portanto as nossas ideias são melhores que as dos demais” ou “se nós inventamos ninguém melhor do que nós para comercializar”, poderão estar a perder oportunidades de alto valor acrescentado. A partir do momento em que se estabelece um fluxo aberto de conhecimento, no qual os recursos (internos e externos) se movem facilmente na fronteira porosa entre empresa e mercado, a capacidade inovativa e competitiva da organização torna-se consideravelmente superior. Existem já muitas farmacêuticas que utilizam estes mecanismos para obter melhores resultados de um modo mais eficiente e eficaz. A título de exemplo, é de salientar o caso da J&J na descoberta de dois novos medicamentos no tratamento do HIV7 e a plataforma de open innovation da farmacêutica Lilly8. Contudo, também ao nível da exportação de conhecimento, deverão ser utilizados estes mecanismos. Segundo Maria João Queiroz9, “Portugal é reconhecido pela sua qualidade ao nível dos seus investigadores e institutos de 6 InnoCentive – plataforma que junta empresas (que procuram novas soluções), com 250.000 cientistas, engenheiros e empreendedores de mais de 200 países. 7 Shirley S.Wang, J&J’s Stoffels say “Open innovation is the R&D answer”, The Wall Street Journal (January 29, 2009) 8 Openinnovation.lilly.com/dd 9 Apresentação “Os Principais Temas da Agenda da Saúde em Portugal em 2012”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, Maria João Queiroz, 2011 investigação, pelo que se deveria posicionar enquanto fornecedor de I&D utilizando, por exemplo, estes meios”. De destacar neste âmbito, a base de dados SciPort10 recentemente desenvolvida pelo HCP, que lista todos os recursos e projetos de investigação científica de instituições e de empresas que atuam no campo da saúde em Portugal. Tendo como intuito primordial tornar a ciência Portuguesa na área da saúde mais conhecida pelo mundo fora, esta plataforma tem como objetivo s particulares, tornar o trabalho dos cientistas portugueses mais conhecido e potenciar parcerias a um nível global, entre outros. De forma a fortalecer a cooperação científica e tecnológica com instituições de reconhecido mérito internacional, foi criado o Programa Harvard Medical School - Portugal, parceria formalizada entre o Estado Português e a Harvard Medical School. Esta parceria, que tem como grandes objetivo s o estímulo da investigação clínica em Portugal, como também o estímulo de um maior conhecimento sobre os principais temas da saúde, teve como um dos seus eixos estratégicos, a criação de uma plataforma de informação para disponibilizar ao público informação científica na área das ciências médicas e biomédicas11. Informação aos/dos utentes Efetivamente, os pacientes estão e querem estar cada vez mais e melhor informados. O acesso globalizado à internet criou a sociedade atual de conhecimento, pelo que os pacientes, agora munidos com estudos, análises e opiniões recolhidos a partir de websites educacionais, grupos de discussão, media social (web ou tecnologia 10 Disponível em www.scienceportugal.com 11 http://www.hmsportugal.pt/portal/server.pt/ community/HMSP móvel), tornaram-se mais exigentes e requerem não só medicamentos melhores e mais seguros, como também têm melhores condições para selecionar os serviços que melhor se adequam às suas necessidades específicas. Num survey realizado pela PwC12, verificou-se que cerca de um terço dos respondentes (dos quais 50% têm idade inferior a 35 anos), utilizaram redes sociais (Facebook, Twitter, Youtube, LinkedIn ou blogs) para averiguar informação relacionada com produtos e/ou serviços de saúde. Esta nova realidade traduz enormes implicações para o setor da saúde, em todas as suas vertentes: •as empresas farmacêuticas, embora limitadas pelas entidades reguladoras no que diz respeito à comunicação pública dos seus produtos sujeitos a receita médica, necessitam de considerar a opinião dos consumidores aquando do desenvolvimento de novos medicamentos; •os prestadores de serviços, necessitam de garantir que os serviços que disponibilizam estão alinhados com as expectativas dos pacientes. A monitorização da opinião pública e partilha de informação nestes meios, garante não só uma divulgação mais dirigida das suas soluções, como também uma importante fonte de conhecimento que serve de input para a melhoria de soluções já existentes; •as seguradoras deverão tirar partido destas ferramentas no sentido da prevenção da saúde (promoção de estilos de vida mais saudáveis) e na comunicação dos seus planos de benefícios. 12 PwC Health Research Institute Consumer Survey, 2011 Principais desafios da saúde 2012 23 Procurar concretizar e evitar constranger o potencial da inovação em saúde, em Portugal Como conseguir inovação em saúde em Portugal – o papel individual e colaborativo dos vários players 24 PwC Os players As principais medidas que devem ser tomadas Empresas • Reforçar a ambição para desenvolver novos produtos e serviços que sejam efetivamente competitivos à escala global. • Apostar no diálogo e projetos conjuntos com as Universidades/Institutos I&D. • Apostar na constituição e desenvolvimento de Núcleos de Inovação. • Investir em Inovação de forma apropriada, mas “ambiciosa”. • Proteger a propriedade intelectual. • Desenvolver um adequado plano de comercialização/ internacionalização. • Negociar com parceiros estratégicos. Universidades/Institutos • Especializar alguns investigadores/Institutos em inovação. • Procurar ativamente parceiros empresariais nacionais e estrangeiros. • Profissionalizar a contratação e a defesa dos direitos intelectuais. • Facilitar o fluxo de investigadores com as empresas. Unidades de saúde • Constituir e desenvolver Gabinetes de Investigação Clínica. • Definir normas internas para investigação clínica/de translação. • Definir prazos máximos para aprovação de contratos de investigação. • Constituir Comissões de Ética Regionais (em sintonia com CEIC). • Definir normas de avaliação da CEIC e das CER com prazos máximos conjuntos. Estado • Definir políticas estáveis para o setor. • Valorizar a investigação clínica na carreira hospitalar. • Favorecer a investigação clínica/de translação nas Unidades de Saúde. • Tornar competentes Comissões de Ética Regionais (como CEIC). • Definir prazos limite para aprovação dos ensaios clínicos. • Definir regras gerais para a gestão financeira dos ensaios clínicos. • Incentivar a cooperação entre os atores da Saúde. • Fornecer informação adequada e atualizada aos utentes sobre o serviço nacional de saúde em Portugal, de um modo acessível e prático. Seguradoras • Apostar na divulgação de informação sobre estilos de vida saudáveis junto dos seus clientes, utilizando por exemplo as redes sociais. • Estabelecer parcerias com prestadores de serviços no sentido de definir uma oferta mais costumizada às necessidades de, por exemplo, grandes grupos empresariais. Implicações A inovação nos processos, no que se refere à organização, gestão e principalmente à interação entre as várias instituições, traduz-se numa forma fundamental de obter melhores resultados. • A inovação em saúde não deverá ser analisada apenas ao nível dos serviços (cuidados hospitalares, cuidados primários, cuidados continuados e mHealth), e produtos (medicamentos, dispositivos médicos e softwares). A inovação nos processos, no que se refere à organização, gestão e principalmente à interação entre as várias instituições, traduz-se numa forma fundamental de obter melhores resultados. • Proteger a inovação na saúde não deverá ser uma ação limitada à indústria farmacêutica e institutos de investigação. Efetivamente, a promoção da inovação deverá ser encarada de uma forma holística em que todos os players deverão realizar ações concretas e eficazes que garantam a sustentabilidade do setor e a sua competitividade a nível internacional • A criação de uma maior proximidade entre empresas e investigadores diminuirá o gap existente entre o investimento em I&D e a obtenção de resultados inovadores. O desenvolvimento destas parcerias estratégicas, impactará diretamente no pipeline das empresas e no aumento de novos produtos patenteados. • O crescente conhecimento e facilidade de acesso a fontes de informação por parte dos utentes/pacientes, coloca uma nova responsabilização aos restantes players. Por um lado, é fundamental procurar garantir informação correta e atualizada sobre os principais temas e serviços de saúde, evitando deste modo que exista uma incorreta utilização dos serviços de saúde disponíveis. Por outro lado, e porque conhecimento é poder, a exigência dos utentes aumenta. Os produtos e serviços disponibilizados serão mais valorizados (e terão mais valor acrescentado) se alinhados com as necessidades e expectativas dos utentes. • As empresas que apostam em inovação não se podem esquecer do poder atual das redes sociais como meios fundamentais para as vendas, marketing e desenvolvimento de produtos. O impacto da popularidade destes meios, os desafios existentes ao nível da regulação, o relacionamento e a aprendizagem obtida com pacientes e profissionais de saúde, conduz que cada vez mais empresas implementam estratégias de social media. Principais desafios da saúde 2012 25 É urgente agir sobre a produtividade e olhá-la como fonte de reforço do SNS Aumentar o Value for Money no sistema de saúde é cada vez mais um dos temas mais comuns em discussão, em particular nos países da União Europeia. Este conceito consiste muito simplesmente na resolução da seguinte equação: obter ganhos em saúde, qualidade de tratamento e acessibilidade, enquanto se contém os custos. Muitos são os desafios que se colocam a todos os stakeholders do sistema, seja o Estado, os prestadores de cuidados de saúde, os profissionais de saúde, os financiadores ou os cidadãos. O Serviço Nacional de Saúde (SNS), criado em 1979, tem por missão ser um instrumento do Estado no sentido de assegurar o direito à proteção da saúde de todos os cidadãos, nos termos da Constituição. Passados 30 anos, é possível fazer uma avaliação sobre a eficácia dos resultados que o sistema produziu considerando os objetivo s com que foi constituído, bem como avaliar a eficiência da utilização dos recursos que conduziram a tais resultados. Em Portugal, são escassos os estudos sobre a produtividade e eficiência do SNS. Talvez por doutrina ou por preconceito político, fala-se mais dos resultados em saúde e pouco na eficiência da utilização dos recursos para os obter. Só a avaliação objetiva da evolução de duas dimensões de resultado – ganhos em saúde e recursos aplicados traduzidos em despesa em saúde – ao longo destes anos, permitirá inferir sobre a trajetória da produtividade e eficiência do SNS. Sendo inquestionáveis os ganhos em saúde, alguns dados sobre a produtividade exigem uma reflexão profunda, uma vez que os recursos da sociedade não são infinitos e são hoje, bastante escassos. Debater a produtividade do SNS, identificando os seus constrangimentos e estratégias para a sua melhoria, não deve ser confundido com oportunismo político de minimizar as virtudes do SNS. Elas existem e todos nos orgulhamos. Contudo, debater a produtividade e a eficiência do SNS é sinal de lucidez. É procurar fazer mais com o mesmo e não mais do mesmo1, ao nível global do SNS, das regiões de saúde e de cada entidade prestadora, fundamentalmente os hospitais. Ganhos em saúde Ao longo destes 30 anos, diversas foram as alterações que se produziram nos fundamentos económico-sociais, 1 The King’s Fund. Improving NHS productivity. More with the same not more of the same. July 2010 26 PwC demográficos e culturais que influenciam o sistema nacional de saúde, nomeadamente: •envelhecimento da população, no qual a população com idade igual ou superior a 65 anos, que representava 10% da população portuguesa em 1980, passou para 18% em 2009; •redução da natalidade, decorrente de níveis de vida mais exigentes e associados à crescente educação e planeamento familiar da população, tendo-se passado de 16 nascimentos por mil habitantes em 1980 para 9 nascimentos por mil habitantes em 2009; •migração da população residente para zonas urbanas, que em 2009 já representa cerca de 60%, contra os 27% de 1980; •surgimento de novas doenças (ex.: HIV/SIDA); •aumento da prevalência da obesidade; •incidência crescente de patologias crónicas; •aumento do consumo de álcool. Apesar das alterações ocorridas, o sistema de saúde português foi eficaz nas respostas, podendo Portugal orgulhar-se do posicionamento relativo do seu sistema de saúde em termos internacionais. De acordo com o mais recente relatório publicado pela OCDE – Health Data, 2011 – Portugal apresentou, nos últimos anos, uma evolução muito positiva em termos de ganhos em saúde, conforme se verifica na generalidade dos indicadores apresentados: “Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes” Albert Einstein Indicadores da evolução do sistema de saúde português 1980 1995 2009 Esperança de vida à nascença (anos) 71.4 75.4 79.5 Mortalidade infantil (mortes por mil nados vivos) 24.3 7.4 3.6 9,147 6,001 3,477 3.2 4.1 Anos de vida potenciais perdidos (por 100 000 hab.) Consultas médicas (número, per capita) Doenças de declaração obrigatória (nº de casos) 12,925 3,501 Taxa de mortalidade padronizada: todas as causas 838.3 613.0 Mortalidade por doenças do aparelho circulatório (taxa padronizada) 332.8 172.1 Fonte: OCDE Health Data, 2011 e DGS Principais desafios da saúde 2012 27 É urgente agir sobre a produtividade e olhá-la como fonte de reforço do SNS A melhoria dos resultados em alguns dos indicadores críticos, aproximando-nos ou mesmo ultrapassando a média da OCDE e EU 15, é uma virtude do SNS. Contudo, se compararmos os resultados obtidos em Portugal com os resultados de outros países com níveis de vida (medidos pelo PIB per capita) idênticos2: Israel, Coreia do Sul e Republica Checa, conclui-se que o desempenho foi muito semelhante, não sendo o desempenho do sistema português de saúde algo de extraordinário. Veja-se o exemplo da evolução na esperança de vida e mortalidade infantil. Evolução da esperança de vida à nascença (anos) 83 81 79 77 75 73 71 69 67 65 1980 1983 1985 1989 1992 1995 1998 2001 2004 2007 1998 2001 2004 2007 Evolução da mortalidade infantil (por 1000 nados vivos) 25 20 15 10 5 1980 1983 1985 Coreia do Sul 2 Apresentação “Economia e políticas em saúde, Portugal 2012”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, Álvaro Almeida, 2011 28 PwC Fonte: OCDE Health Data, 2011 Israel 1989 1992 OCDE 1995 Portugal República Checa O sistema de saúde português foi bom a produzir resultados em saúde, mas terá sido eficiente na utilização dos recursos que a sociedade colocou à sua disposição? Seria possível fazer melhor? Despesa em saúde Ao analisarmos a despesa total em saúde, em percentagem do PIB, verifica-se que esta passou de 5% em 1980 para 10,1% em 2011, ultrapassando de forma crescente a média dos países da OCDE a partir de 2000, conforme gráfico abaixo: Conclui-se assim que os bons resultados em saúde obtidos neste período, tiveram despesa excessiva. Na última década, o crescimento da despesa em saúde, em Portugal, foi dramática. O peso da despesa total em saúde em percentagem do PIB foi muito superior ao dos países com níveis de vida e resultados de saúde semelhantes. Por outras palavras, consumimos mais recursos para obtermos resultados semelhantes aos obtidos por outros países que no entanto despenderam menos recursos. Evolução da despesa total em saúde (% do PIB) 12 10 8 6 4 2 - 1980 1983 Coreia do Sul 1985 Israel 1989 1992 OCDE 1995 1998 Portugal 2001 2004 2007 2010 República Checa Fonte: OCDE Health Data, 2011 Principais desafios da saúde 2012 29 É urgente agir sobre a produtividade e olhá-la como fonte de reforço do SNS modelo de funcionamento e assim os fundamentos da produtividade e eficiência. Os níveis de atividade podem ajudar a compreender a nossa produtividade. Por exemplo, podemos aferir a produtividade estimada dos médicos, considerando o número estimado de consultas por médico em 2009. Neste indicador, Portugal está praticamente na cauda dos países da OCDE. Falemos de produtividade Uma das razões que contribuiu para a tal despesa excessiva é o modelo operativo adotado pelo SNS e que afecta a sua produtividade. Com todas as limitações que merece a utilização de benchmark, podemos sempre comparar algumas características dos sistemas de saúde de forma a compreendermos o N.º estimado de consultas por médico (2009 ou ano mais recente) 777 748 Grécia 1040 Suiça 1000 Suécia 1087 Portugal Finlândia 1163 1601 1581 Estados Unidos Irlanda 1756 Chile 1421 1799 Israel 1341 1805 Islândia México 1846 Itália Dinamarca 1848 Reino Unido 1475 1873 Nova Zelândia 2051 França 1929 2051 Holanda 2000 Estónia 2146 2119 Austrália Espanha 2303 2255 2357 OCDE Luxemburgo 2616 3133 3000 2713 3148 República Checa 3732 3164 4000 Canadá 4460 5000 3973 6000 6694 7000 6129 Consultas por médico Fonte: OCDE Health Data, 2011 30 PwC Áustria Alemanha Bélgica Polónia Eslovénia Eslováquia Hungria Japão Turquia Coreia do Sul 0 Relativamente ao internamento, a taxa de ocupação dos hospitais portugueses, o último relatório da OCDE também revela uma taxa de ocupação abaixo da média, indiciando eventualmente um excesso de capacidade hospitalar ou uma ineficiente gestão de camas nos hospitais portugueses. 63,4 62,3 México Turquia 67,3 Eslováquia 65,5 67,7 70 Estónia 71,2 72,1 74,2 Luxemburgo 74,0 74,3 Hungria 74,4 75,3 75,4 Grécia 75,3 76,1 OCDE (25) 76,5 Chile 76,2 77,6 79,0 Áustria 80 Espanha 79,5 Itália 84,2 90 87,9 89,2 91,6 100 93,0 % 96,3 Taxa de ocupação das camas hospitalares (2009 ou ano mais recente) 52,7 60 Holanda Estados Unidos Eslovénia Portugal Bélgica França Japão República Checa Alemanha Reino Unido Suiça Irlanda Noruega Canadá Israel 50 Fonte: OCDE Health Data, 2011 Neste capítulo, saliente-se que o recente relatório do Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar apurou que a demora média dos hospitais portugueses verificada em 2007 era de 7,69 dias3, sendo a média da OCDE de 7,2 dias4. Já no que se refere ao rácio de enfermeiros por médico, verifica-se que Portugal é dos países em que esse rácio é menor, refletindo um sistema de saúde cujo modelo de funcionamento está fortemente dependente da intervenção de médicos, tornando-o relativamente mais caro e pesado. 3 Fonte: Relatório Final da Reforma Hospitalar, Anexo 8.6. – Quadro A.10 – Evolução da Demora média (em dias) 2007 a 2010 4 Fonte: OCDE – Health at a glance 2011 – Quadro 4.3.2. – Quadro 4.5.1. – Average Length of stay in hospital for all causes, 2000 and 2009 (or nearest year) Principais desafios da saúde 2012 31 É urgente agir sobre a produtividade e olhá-la como fonte de reforço do SNS N.º de enfermeiros por médico (2008) 5,8 6,4 7 0,6 0,9 Turquia 1,2 1,0 1 Itália 1,3 1,5 1,4 1,6 Portugal 1,9 2 Austria 2,1 2,0 Hungria 2,2 República Checa Eslováquia (2007) 2,4 2,3 Coreia do Sul 2,4 França 2,8 Holanda (2007) Polónia 3,0 2,9 OCDE 3,0 Alemanha 3,3 3 Suécia (2005) 3,4 4,0 Nova Zelândia 3,6 4,0 Islândia 3,5 4,0 Luxemburgo (2006) 3,9 4,1 4 Canadá 4,4 4,2 4,4 Japão 5 Estados Unidos Rácio enfermeiros por médicos 6 Fonte: OCDE Health Data, 2011 Mesmo considerando a diversidade da natureza de cada país e da sua população, as diferenças significativas na eficiência da utilização de recursos dizem algo sobre o nível de produtividade dos sistemas de saúde. Quanto a Portugal, fica claro que existe uma margem de progressão do modelo de funcionamento do seu sistema de saúde de forma a permitir uma melhor utilização dos recursos. 32 PwC Para aprofundarmos o debate, consideremos agora a nossa realidade interna avaliando alguns indicadores numa dimensão regional. As disparidades regionais, em Portugal, indicam que existe também uma forte margem de progressão dos nossos níveis de produtividade ao nível da saúde. Os gráficos abaixo atestam, em vários eixos de análise, que quando falámos de eficiência ela varia consoante as regiões de saúde. Demonstram igualmente que ao contrário do que muitas vezes se enfatiza, o sistema de saúde em Portugal encerra importantes iniquidades no acesso e financiamento. Grécia México Espanha Israel Estónia Eslovénia Austrália (2207) Noruega Reino Unido Suiça Dinamarca (2007) Finlândia (2007) Irlanda 0 Habitantes/Cama Habitantes/Médico 488 528 340 14 457 510 23 223 515 750 559 17 680 736 Cirurgias/Médico cirurgião 32 032 Doentes operados/Méd. cirurgião 107 Custo médio do doente padrão 54 104 4 022 90 76 4 358 74 5 306 148 111 22 715 494 428 Fonte: Relatório do Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar, 2011 Habitantes/Bloco operatório 107 111 6 458 4 464 Principais desafios da saúde 2012 33 É urgente agir sobre a produtividade e olhá-la como fonte de reforço do SNS A resposta ao desafio de melhoria da produtividade pode ser adotada do lema “Fazer as coisas adequadas de forma adequada”. O enfoque para qualquer plano de melhoria da produtividade deve incluir estratégias dirigidas a reduzir custos e melhorar os resultados cuidados aos cidadãos ou mesmo libertar recursos (tempos de pessoal, equipamento, etc.) para serem utilizados de forma mais produtiva. Como se justifica que, em média, um cirurgião na Região de Lisboa efetue 76 cirurgias por ano e um cirurgião no Algarve 111? Que exista um médico por cada 494 habitantes no Centro e 750 no Alentejo? Que o custo médio do doente padrão no Alentejo seja de 6.458 Euros e na Região Norte 4.022 Euros? Os resultados aqui expressos apontam para dois problemas essenciais: a) o desajustamento da capacidade instalada que pode significar iniquidade no acesso, excesso de oferta ou não utilização da capacidade instalada; b) a afetação inconsistente de recursos e modelo operativo que promove formas díspares de funcionamento, práticas e responsabilização com consequências ao nível da eficiência. A generalidade das estratégias propostas no esquema em baixo tem sido debatida, algumas até já anunciadas e outras em fase de implementação. A questão central está na capacidade de as implementar de forma efetiva. Outro constrangimento Estratégias críticas para a melhoria da produtividade do sistema de saúde Fazendo as coisas de forma adequada Minimização dos custos de suporte e back-office - Gestão das infraestruturas . - Serviços de suporte. - Procurement. Desenvolvimento e incentivo de profissionais - Melhoria da produtividade do pessoal. - Redução do absentismo. - Novas formas de trabalho. Mudanças na prática clínica - Maximizar a produtividade dos hospitais de agudos. - Alterações de largo impacto. Fazendo as coisas adequadas Responsabilização e redesenho de processos assistenciais - Estabelecimento de prioridades. - Redução de internamentos não programados. - Resposta às necessidades de pacientes crónicos. - Integração de cuidados. - Cuidados no final da vida. Fonte: The King’s Fund. Improving NHS produtivity. More with the same not more of the same. July 2010 34 PwC Implicações • É importante ir além dos objetivo s e planos de redução de custos. É necessário desenvolver planos que permitam reforçar a produtividade do Serviço Nacional de Saúde, mantendo a virtude dos ganhos em saúde que nos tem proporcionado. É muito importante que as medidas para promover o aumento da eficiência não se limitem à redução de custos suportada por terceiros – mesmo assumindo que o reforço do poder negocial do Estado e os reequilíbrios nos mercados de fatores sejam desejáveis – mas fundamentalmente resultem de melhorias efetivas do funcionamento do sistema. • Otimizar a rede hospitalar pública e efetuar uma análise do impacto efetivo na produtividade da reforma dos cuidados primários, da implementação da rede dos cuidados continuados e das alterações dos modelos de financiamento às regiões de saúde e aos diversos tipos de prestadores. • Ao nível da governação, avaliar o reforço das funções da ACSS e das administrações regionais de saúde no sentido de terem uma maior intervenção ao nível operacional da gestão e coordenação da oferta, não se limitando ao planeamento dos cuidados de saúde; • Aumentar a capacidade de resposta das redes de cuidados primários e continuados e agilizar os mecanismos de gestão e referenciação, assegurando uma maior integração da prestação, fundamentalmente ao nível da doença crónica. resulta do facto de muitas vezes, as soluções pensadas pecarem pelo receio de colocar em causa o paradigma ideológico em que assenta o SNS, as bases do funcionamento do serviço público e as regras da administração pública. Boa parte da melhoria da produtividade do SNS está hoje condicionada a decisões estruturais e por isso, decisões de natureza política. Existirá vontade ou condições políticas para as tomar, em 2012? É mais provável que o enfoque das decisões venha a estar ao nível de cada entidade prestadora. Em 2012, sem afetar a qualidade da prestação e a equidade no acesso, é urgente repensar e tomar decisões sobre a rede pública hospitalar, reduzir a capacidade excedentária encerrando serviços e unidades prestadoras, otimizar a capacidade • Realizar um estudo em profundidade sobre a produtividade dos recursos humanos do SNS que permita identificar os elementos necessários para a definição adequada de políticas e do planeamento dos recursos humanos. A avaliação das competências técnicas, redefinição de funções entre tipos de profissionais clínicos e a mobilidade dos mesmos são fatores críticos para a produtividade. • Impulsionar as novas tecnologias e a integração de informação que permitam desenhar novas formas de organização da prestação de cuidados. instalada, ajustar a dimensão de efetivos e as funções desempenhadas pelos vários tipos de profissionais, incentivar e responsabilizar os profissionais, promover a inovação através de novas formas de trabalho, reforçar a integração de cuidados entre os diversos níveis do sistema, particularmente no caso dos doentes crónicos, reforçar a intervenção do médico de família e das Unidades de Saúde Familiar, desmaterializar serviços e processos. Importa em 2012 avaliar o impacto efetivo da adoção dos serviços partilhados da saúde e do reforço da normalização clínica previstos para este ano. A situação financeira do SNS tem vindo a degradar-se. Em 2010, o défice do SNS ascendeu a 360 milhões de euros, que, com défice dos Hospitais Públicos (EPE) de 322 milhões de euros, gerou um défice acumulado do setor saúde em Portugal de 682 milhões de euros. A agravar esta situação, as dívidas acumuladas do setor ultrapassaram os 3.000 milhões de euros em 2011. Ora esta situação é praticamente insustentável a prazo. A melhoria da produtividade global do sistema e em cada uma das unidades prestadoras será uma contribuição crítica para se conseguirem manter os resultados em saúde. Principais desafios da saúde 2012 35 Prestadores e pagadores privados Há espaço para sinergias? Para compreender estes números é preciso olhar para os dados dos “grandes” prestadores privados: os hospitais. Numa altura de retração do mercado, os hospitais privados conseguiram aumentar de forma substancial os seus níveis de produção e de receita. Os três maiores grupos privados viram o seu nível de facturação aumentar em 14,2% em 2009. A redução da atividade global privada assentou sobretudo na diminuição do volume das clínicas e dos pequenos consultórios, por natureza menos organizados. Ou seja, caíram os prestadores menos organizados, e subsistiram os players de maior dimensão. É nossa convicção que esta tendência será para continuar. Até há pouco tempo, poderíamos considerar, de forma estilizada, que um ato médico era diagnóstico mais acompanhamento. O tratamento para uma doença poderia ser desempenhado por um medicamento, 36 PwC por um tratamento externo ou mesmo mudança de hábitos e de forma de vida por parte do paciente. Atualmente, continua a haver a mesma diferença entre o diagnóstico e a cura, mas o acompanhamento/carinho foi substituído por meios complementares de diagnóstico que conferem maior segurança ao médico e paciente. Este Despesa corrente das famílias em hospitais privados 600 500 Unidade: 10^6 € De acordo com o INE, em 2009, antes do auge da crise económico-financeira e da ajuda externa internacional, a prestação privada de cuidados de saúde caiu cerca de -0,6% em 2009. Significa que o mercado dos prestadores privados chegou a uma fase de maturação e declínio? Não! 400 300 200 100 0 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 nível de segurança, que o mercado exige, não é compatível com os pequenos consultórios e clínicas, onde o doente tem de se deslocar para um primeiro pedido de análises e um diagnóstico superficial, depois uma ida a um centro de análises, e posteriormente uma nova ida ao médico. O esforço é muito elevado. Os pacientes actuais exigem dos prestadores um diagnóstico completo quando se apresentam numa unidade de saúde. Também no setor público é evidente esta tendência: Não é apenas pela ineficiência dos cuidados primários do SNS que se prefere ir às urgências, é igualmente pela certeza de ter toda a “questão” resolvida num único dia. Os players privados mais pequenos continuarão a existir, continuará haver uma relação médico- -paciente, mas esta tenderá a esbater-se à medida que o tempo for passando. Além disso, os grandes prestadores saberão criar elos de lealdade entre os pacientes e os seus médicos. Para esta mudança de paradigma, também evidente noutros países, não é isenta da nova forma de financiamento dos cuidados de saúde privados. Até há pouco tempo, o recurso aos prestadores privados era para uma franja com maior poder de compra da população ou para os funcionários públicos com ADSE/regime de apoio público. Contudo, os seguros democratizaram o acesso. Centrados no cliente mediano, passaram a oferecer soluções de consumo hospitalar. Numa primeira fase, os seguros apostaram em coberturas de risco que ajudavam a doença, contudo, evoluíram para cartões desconto e de acesso a redes privadas. Por um valor muito acessível, os seguros garantem a possibilidade de qualquer família poder usar um prestador privado, nem que seja por via do desconto. Apesar da elevada adesão aos prestadores de maior dimensão, e uma maior adesão aos seguros, é de salientar que esta solução de prestadores e financiadores privados não é a solução óptima declarada da população portuguesa. Os portugueses responsabilizam o Governo pelos cuidados de saúde. De acordo o European Social Survey de 2008 (ESS-2008), um inquérito Europeu que avalia os valores e as atitudes de forma regular, cerca de 67% dos Principais desafios da saúde 2012 37 Prestadores e pagadores privados. Há espaço para sinergias? do serviço, burocracia e falta de qualidade, conforto das instalações, etc. portugueses são da opinião que os cuidados de saúde na doença são da responsabilidade do Governo, à semelhança de países com um sistema de saúde como o português, e com condições sócio-demográficas comparáveis. Aliás, de certa forma, todos os europeus valorizam um Estado social e consideram-no como uma marca da sua identidade. O ritmo de passagem do público para o setor privado só não é mais acelerado porque os portugueses consideram a “disponibilidade para encarar alternativas ao atual modelo do SNS” uma questão complexa, afirma o Relatório final da comissão para a sustentabilidade do SNS elaborado em 2007. A solução poderia passar por uma maior aposta na literacia e responsabilização em questões de saúde dos beneficiários. Contudo, a falta de recursos públicos de saúde, implicará uma reengenharia de praticamente todas as componentes do sistema de saúde, incluindo a redefinição do papel dos vários intervenientes e a sua visão política. Assim, se os prestadores privados conseguirem posicionar-se onde o SNS falha, o seu ritmo de captação de novos clientes será mais acelerado. Mais, sabendo que no momento de dificuldade orçamental o mais provável é o SNS posicionar-se quase exclusivamente nas coberturas de maior emergência médica, deixando um enorme espaço de manobra para os prestadores privados com ofertas consolidadas na área da saúde. O “push” do SNS O que empurra a população para o mercado privado é a consciência da maioria da população portuguesa que considera que o pessoal clínico (médicos e enfermeiros) trata os pacientes de forma diferenciada (ESS-2008) e que o sistema público funciona mal – de acordo com último relatório do OMS (Organização Mundial de Saúde), Portugal está colocado na antepenúltima posição, empatado com a Irlanda num ranking de 15 países onde foi avaliada a satisfação dos sistemas de saúde públicos. Repare-se que esta valorização do SNS nada tem a ver com a qualidade relativa do sistema público português contra os modelos existentes nos outros países – é apenas a percepção dos seus utilizadores contra as suas expectativas de rapidez Despesas em saúde em % do total do consumo das famílias (2008) 20 15 10 38 PwC Luxemburgo Reino Unido Turquia República Checa Holanda Croácia Espanha Roménia Dinamarca Malta Irlanda Noruega Estónia Itália Suécia Eurostat Eslovénia Bélgica Zona Euro Eslováquia Islândia Hungria França Letónia Alemanha Polónia Lituânia Bulgária Chipre Áustria Finlândia Portugal % Grécia 0 Suiça 5 O “pull” dos privados O que puxa os nacionais para o sistema privado é a aposta das entidades patronais num “fringe benefit”. As empresas apostam numa remuneração muito valorizada pelos trabalhadores, e que, se fosse paga em numerário, “perder-se-ia”, aos olhos dos empregados, em impostos. Com o mesmo esforço das empresas, consegue-se dar algo mais aos trabalhadores. Além disso, o papel da rede de distribuição bancária oferece uma rede capilar que facilita a colocação destes produtos de saúde no mercado de particulares. O benefício fiscal em sede de IRS era também relevante, já que servia de desconto à subscrição de seguros. O resultado final é que cerca de 20% da população nacional já tem um mecanismo de assistência privado, sendo que cerca de metade dessa percentagem é sustentada pelas entidades patronais (empresas ou Estado, no caso da ADSE ou similares). Evolução dos seguros de saúde privados A maior restrição das seguradoras deve-se ao facto de que as contas técnicas das companhias de seguro apresentam números complicados. Os sinistros estão quase ao mesmo nível dos prémios pagos pelos segurados. O rácio combinado do setor, um indicador chave nos seguros que agrega os custos de sinistralidade bem como os custos de funcionamento, estava em 2010, de acordo com o ISP, em cerca de 95% dos prémios e é uma tendência de anos. Com a retração do SNS é expectável um aumento da sinistralidade: as famílias irão utilizar mais os serviços de saúde aumentando a sinistralidade dos seguros. Unidade: 10^6 € 900 800 700 600 500 400 300 200 100 0 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 Quanto às tendências futuras, é de esperar a continuação dos números referidos: Os grandes hospitais privados apresentam uma dinâmica de substituição do setor público e de substituição das pequenas clínicas e consultórios. Contudo, parte do seu financiamento dependerá dos seguros que terão de alterar o seu modelo de negócio, “pisando” inevitavelmente o campo dos prestadores, de forma a conseguir o ideal equilíbrio técnico. Implicações • Fusões entre as diferentes companhias de forma a obter ganhos de escala nos custos, e controlo nos preços praticados. Contudo, sendo este um setor onde três seguradoras representam muito mais de metade dos subscritores, não se apresenta um cenário credível. • Controlo dos custos de sinistralidade e dos ganhos de saúde ao longo de todo o ciclo de vida de um cliente. Na prática, as seguradoras portuguesas apenas seguram o uso suplementar do SNS, e a saída desta zona de conforto implicará uma enorme imaginação e pulso no mercado de prestadores. • Melhorias na subscrição de riscos. O que se pretende é encontrar elementos diferenciadores na construção de tarifas que impliquem uma melhor seleção de risco ou mesmo expansão de mercado ou ainda uma subida nas tarifas. Esta solução obriga a visão crítica de todo o sistema, pois a nível internacional Portugal apresenta já uma elevada penetração de seguros de saúde e desde a criação deste ramo de seguros não foi possível encontrar um adequado equilíbrio técnico. • Fusão/acordo vertical de forma a minimizar o risco de financiamento por parte das seguradoras e garantir uma maior estabilidade na procura de determinados prestadores. É de notar que a lógica entre prestadores e financiadores é tão distinta que internacionalmente ainda não foi possível encontrar um bom exemplo desta estratégia. Principais desafios da saúde 2012 39 Gestão das pessoas no setor da saúde Uma boa relação entre os utilizadores e os profissionais Nos últimos anos, o envelhecimento populacional, associado ao aumento da incidência de doenças crónicas e à complexidade de estados de saúde, conduziu à intensificação dos níveis de especialização e à necessidade de aquisição de conhecimento mais profundo por parte dos profissionais de saúde. Por sua vez, esta combinação de fatores associado ao facto de os utilizadores possuírem um maior nível de conhecimento e serem parte importante no sucesso dos tratamentos, motivou necessariamente um incremento dos níveis de exigência aquando da prestação de serviços pelo setor. Ao cenário de necessidade de interação prolongada entre os diversos agentes devido à tipologia de intervenções e de doenças, alia-se a menor disponibilidade de tempo da população para visitas médicas, o maior acesso à informação, a constante evolução tecnológica e o crescente peso de custos de saúde, que têm vindo a reforçar a necessidade de redesenhar o atual modelo de saúde com impacto na forma como o capital humano é gerido no setor. 40 PwC Tem-se vindo a reforçar a necessidade de redesenhar o atual modelo de saúde com impacto na forma como o capital humano é gerido no setor. Este impacto sente-se em várias dimensões: A. A necessidade de um novo desenho organizacional que integre a dimensão de serviço implicando assim a criação de novas funções; B. A integração de maior diversidade de competências (e necessariamente conhecimentos diferentes) torna as equipas mais complexas com impacto na sua gestão e coordenação; C. O nível de exigência durante o período de desenho das funções leva a que, para manter os níveis de cumprimento associado ao longo de um dia o profissional deva diversificar a sua actuação pelo que, o conceito de policompetencias como suporte à polivalência deve estar presente no desenho das funções ao longo da estrutura. Um novo desenho para uma nova estrutura O utilizador dos serviços de saúde foi mudando mas esteve pouco presente na forma como as estruturas organizacionais no setor foram sendo desenhadas. Este desenho esteve sempre marcado pelos imperativos técnicos e por uma baixa intervenção da vontade do utilizador – esperava-se que este fosse passivo e se deixasse tratar. Hoje os níveis de exigência reflectemse não só a nível da qualidade esperada do serviço (52% de consumidores de serviços de saúde, de uma amostra de 1000 cidadãos dos Estados Unidos, selecciona os cuidados de saúde como o fator número um em termos de preocupações), mas também na abrangência de portefólio dos serviços prestados (72% da mesma amostra refere uma preferência por organizações que oferecem um maior número de atividades associadas à saúde). Tendo em consideração a enorme importância de elementos intangíveis, associados às relações pessoais, a reestruturação do setor deverá passar essencialmente por uma aposta na articulação de todos os seus intervenientes (capital humano e recursos) para garantir o desenvolvimento técnico, maior humanização e especialização do serviço. Associado a este novo perfil de utilizador e com necessidades diferentes, está também a elevada especialização dos profissionais (com grandes investimentos na sua formação e desenvolvimento) que levam à urgência de centrar a actuação de cada função no core da sua especialização rentabilizando assim o valor. Neste âmbito de novas funções poderão passar, por exemplo, pela adaptação do conceito de “gestor de cliente” às funções de prestação deste tipo de serviços que, pelo estado de urgência permanente e número de pessoas em necessidade, tem sido sucessivamente descurado. Neste sentido, é importante que exista a capacidade de identificar as necessidades do “cliente” de forma global, que responda eficientemente e eficazmente a essas mesmas necessidades, que possa gerir as intervenções das diferentes equipas e que seja aferido o nível de satisfação do utente. Tratando-se de um serviço numa área muito valorizada pelos utentes – a saúde – o nível de satisfação dependerá significativamente da gestão das expectativas pelo que a transparência e disponibilização de informação desempenha um papel importante neste contexto. Novas equipas mais diversificadas e mais complexas Quando o conhecimento aumenta, quer na profundidade quer no âmbito para construir uma solução, as equipas tendem a ser mais vastas e Principais desafios da saúde 2012 41 Gestão das pessoas no Setor da Saúde Uma boa relação entre os utilizadores e os profissionais multidisciplinares, de permanência mais focada e por isso mais curta. Surgem assim dificuldades quer na gestão inter quer intra equipas, sem descurar o nível de exigência em termos de serviços e a pressão para controlar os custos. Para evidenciar os motores de uma resposta eficiente e eficaz é preciso destacar diversos tipos de fatores: (1) relação entre diferentes profissionais e clientes; (2) gestão de capital humano; (3) gestão da utilização dos restantes recursos. É a dinâmica entre os três elementos e a respectiva ligação à etapa anteriormente descrita que irá assegurar a satisfação do consumidor. Por outras palavras, a identificação de necessidades levará à possibilidade de planeamento de recursos humanos e físicos para uma resposta exacta às exigências do momento. Inerente a todo este processo está o conceito de produtividade – efetuar os procedimentos adequados e de forma adequada. Esta noção é avaliada pela comparação entre recursos a alocar 42 PwC (inputs) e resultados obtidos (outputs), medindo a relação entre utilização de fatores como a variação do número de profissionais alocados aos serviços e a aplicação de um rácio específico para gastos. O enfoque para qualquer plano de aumento de produtividade, e consequente melhor serviço prestado, deverá incluir estratégias dirigidas à redução de custos de produção e melhoria dos cuidados de atenção aos clientes, bem como ações de optimização de recursos (tempo dispendido pelos colaboradores, equipamento, entre outros). Novo desenho de funções Um dos entraves a este aumento de produtividade encontra-se relacionado não só com a falta de flexibilidade e modelos de incentivo para a geração de motivação dos profissionais de saúde, mas também com a falta de reconhecimento do trabalho dos mesmos. Os resultados traduzem-se em maiores entraves à atenção prestada aos clientes, bem como num elevado grau de absentismo (muito elevado e injustificado); sendo que a solução passará em parte por uma dignificação do trabalho e uma melhoria das condições laborais – de acordo com o Medical School Graduation Questionnaire, publicado em 2006 pelo AAMC, o “estilo de vida” é o critério mais importante para os alunos de medicina aquando da seleção de especialidade. Por sua vez, a crescente valorização do “estilo de vida” dos colaboradores do setor de saúde associada ao mencionado desajuste entre número de recursos humanos disponíveis e utilizadores, levanta a necessidade de pensar um novo desenho de funções. Face à elevada exigência técnica, é difícil manter o mesmo nível de performance ao longo do período de trabalho. Por outro lado as necessidades técnicas especificas de uma função nem sempre se mantém estáveis no decorrer do horário laboral de determinada função. Em conclusão Criação de um novo modelo de saúde centrado na importância do Capital Humano Novo desenho organizacional Maior diversidade de competências re(Desenho) de funções • Reforço da articulação entre clientes, capital humano, recursos. • Aparecimento de equipas mais vastas. • Motivação de profissionais. • Permanência de equipas mais focada e mais curta. • Articulação de novas funções por famílias de funções. • Diversificação de equipas. • Fomento da policompetência. • Foco na produtividade. • Cultivo da polivalência permanente ou temporária ao longo do período de trabalho. • Centralização da actuação no core da especialização. • Criação de novas funções. • Criação do conceito de “gestor de cliente”. • É relevante que todos os aspeto s complementares à componente técnica do contacto do utilizador com o setor sejam salvaguardados ao longo da cadeia de valor, de outro modo poderá ocorrer uma descredibilização do ponto de vista de qualificações, pela falha de humanidade. • No que concerne a última fase do processo (a aferição do nível de satisfação do cliente), é indispensável a utilização de sistemas de reporte e feedback dentro das organizações de saúde e sua ligação direta à forma como é gerido o capital humano no setor. Surge assim a relevância de considerar um novo desenho das funções e da sua articulação por famílias, de forma a assegurar que os profissionais sendo policompetentes permitam a polivalência permanente ou temporária ou longo do período de trabalho. Mais concretamente, para que as equipas permaneçam motivadas e mais aptas a dar resposta aos problemas dos utilizadores, é essencial que haja capacidade de atuar em contextos diversos mais logicamente próximos (dentro da sua função e nas de proximidade), para suprir a ausência de alguns elementos da equipa ou ainda para evitar situações de monotonia e cansaço, aumentando a produtividade clínica. De facto, de acordo com ABIM’s Sennet, “dadas as crescentes expectativas em relação a serviços preventivos e gestão de doenças crónicas, pode não ser humanamente possível que os profissionais façam tudo o que lhes é pedido. Existem, no entanto, formas de organizar e alavancar práticas que podem aumentar a eficiência”. Implicações Um novo desenho para uma nova estrutura • Criar rankings, mediante diversos medidores de qualidade, poderá constituir um importante driver de mudança, bem como ser um importante indicador para a escolha mais informada dos utentes. • Desenvolver uma abordagem focada na elaboração de planos de desenvolvimento da produtividade. • Estipular objetivo s para as equipas e alinhá-los com os resultados que a organização pretende obter. • Desenvolver sistemas de incentivos e controlo de absentismo laboral, que requererá o apoio de tecnologias de informação para um seguimento individual dos diversos colaboradores. • Orientar os sistemas de incentivos para a prossecução de índices de qualidade. Novas equipas mais diversificadas e mais complexas • Avaliar a repartição de tarefas entre os diversos profissionais, através da instituição de diferentes métodos de alocação, ajustes de turnos e flexibilização de horários, tendo por base conceitos de policompetência como suporte à polivalência. • Incentivar o trabalho de equipa, através do reconhecimento de resultados obtidos pelas equipas, mediante critérios como a cooperação, o espírito e a consecução de objetivo s centrados na eficiência, qualidade e performance. Novo desenho de funções • Efetuar uma análise profunda sobre a produtividade dos recursos humanos, que permita identificar os elementos necessários para o planeamento adequado da alocação de profissionais, áreas de melhoria em termos de performance e necessidades de novas competências, em especial as não técnicas. • Estipular métricas de eficiência de recursos humanos, para além dos rácios financeiros geralmente utilizados, de maneira a calcular os custos associados à ineficiência de alocação dos mesmos. Principais desafios da saúde 2012 43 Capitalizar os investimentos já realizados em sistemas de informação O ano de 2012 será um ano marcado pela capitalização dos investimentos já realizados. A consolidação, racionalização e integração serão palavras-chave, tanto ao nível da administração central como nas entidades a nível local em que as existentes infraestruturas de tecnologias da informação e comunicação (TIC), no âmbito dos sistemas de saúde, nas suas diferentes dimensões e níveis de ação, produzem potenciais benefícios para os cidadãos e para os prestadores dos serviço quando devidamente utilizadas e potenciadas. essencialmente para consolidar e partilhar, nomeadamente datacenters e datawarehouses entre hospitais, havendo inclusivamente algum investimento previsto para esta área. De uma forma geral, a necessidade de dar resposta a uma organização descentralizada com diferentes modelos operativos e correspondente Pontos críticos no modelo de governo dos STI Usabilidade reduzida/Custo elevado Consolidar no topo das agendas Ao nível local espera-se uma maior pro-atividade das entidades no sentido de aumentarem os níveis de informatização, isto apesar de ser generalizada a percepção de que em 2012 a informatização na saúde não será uma prioridade. A situação financeira do país e em particular da Saúde, em conjunto com a percepção de que a informática não é imprescindível para a prestação de cuidados de saúde de qualidade, implicarão limitações aos investimentos em hardware, e constituirão um fator inibidor ao surgimento de iniciativas relevantes. Ao nível central a tendência será 44 PwC Duplicações/Dispersão/ Fragmentação/Complicação Sistema • Procurement • Desenvolvimento • Operações e manutenção Processos • No standards • Admin. Funcional RH • Falta de skills • Elevada dependência de fornecedores • Aplicações • Bases Dados • Data Interfaces • Hardware • Software • Estrutura • Competências Organização IT fragmentada serão os pontos críticos a considerar no modelo de governo de TI tendencialmente mais consolidado (ver esquema ao lado). de TI ou na gestão de projetos e fornecedores. A consolidação surge assim como uma forma de reduzir custos de infra-estrutura, constituindo ao mesmo tempo o primeiro passo no sentido de um recurso ao outsourcing no futuro. É pouco provável que este passo seja dado em 2012, mas a consolidação de infraestruturas , a integração de aplicações e o reforço das aplicações existentes permitirá iniciar o processo de reorganização da função das TI com impacto nos vários vetores que a estruturam, nomeadamente a reorganização dos grupos de competências, no catálogo de serviços A necessidade urgente de concretizar o contributo dos sistemas de informação na saúde, não poderá no curto prazo ser realizada à custa de investimentos face à atual situação financeira da saúde, no entanto 2012 será o ano de promover iniciativas ao nível dos comportamentos dos profissionais de saúde nestes temas. Racionalizar software e aplicações informáticas existentes Se é corrente afirmar-se que a tecnologia deve ser pensada para servir utentes e também os próprios profissionais de saúde, em 2012 espera-se que sejam os profissionais de saúde a desenvolver as capacidades de utilização das funcionalidades dos sistemas já existentes. Repensar o que se faz, com a tecnologia existente, será o motor de desenvolvimento dos sistemas de informação. Exemplos destes comportamentos já em curso são: • solução tecnológica de suporte ao Catálogo Nacional de Alergias, que a pedido da SPMS foi elaborado pela Sociedade Portuguesa de Alergologia e será implementado em 2012; • normalização da nota de alta de enfermagem a nível nacional, a pedido da Ordem dos Enfermeiros, etc. Principais desafios da saúde 2012 45 Capitalizar os investimentos já realizados em sistemas de informação A definição de protocolos e sua utilização permite que os atos clínicos gerem informação e conhecimento libertando mais tempo para o tratamento das exceções e de ocorrências novas e diferentes. Desta forma, e no sentido de uma maior produtividade dos hospitais, é provável que em 2012 se iniciem diversas iniciativas de informatização de regras e protocolos ao nível dos hospitais. Durante o ano esta iniciativa deverá ser lançada em diversos hospitais charneira, que constituirão a referência e benchmark para estender a iniciativa a outras unidades hospitalares. Ao nível das aplicações actuais de suporte, é expectável que em 2012 seja iniciado o processo de “repensar” o SAM (Sistema de apoio a médicos) e o SAPE (Sistema de apoio à prática de enfermagem). A implementação ocorrerá apenas em 2013. O SONHO – Sistema Integrado de Informação Hospitalar irá ser também alvo de melhoramentos e redefinições do seu âmbito de intervenção e como sistema crítico e integrador de informação hospitalar, é fundamental maximizar a fiabilidade e eficiência e eficácia das operações de continuidade, pelo que em 2012 se procederá à mudança da base de dados desta aplicação. Seja para consolidação de servidores, consolidação ou alteração de bases de dados, qualquer alteração significativa nas bases de dados é uma tarefa que consome muito tempo e recursos, e que envolve muitos riscos. Por esse motivo, em 2012 os recursos e prioridades a este nível estarão focados neste projeto. A nível local, os investimentos em 2012 deverão ser planeados tendo por base essencialmente as diversas aplicações informáticas e software existentes. Considera-se nomeadamente que há uma significativa oportunidade de melhoria na racionalização de recursos associada a uma maior eficácia na gestão e integração de aplicações 46 PwC informáticas, utilização de licenças e contratos de manutenção de software já existentes. Recursos e Organização da Função de TI no setor No sentido de acelerar a implementação dos serviços partilhados, gerando mais poupanças e sinergias, o Decreto-lei n.º 108/2011 de 17 de novembro atribuiu à SPMS – Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, E.P.E., competências no domínio dos sistemas e tecnologias de informação e comunicação e consequentemente à alteração das funções da ACSS a quem estavam acometidas estas atribuições. A SPMS passou então, ainda em 2011 a ser a entidade responsável pelo desenvolvimento, manutenção e operação dos sistemas integrados de informação na saúde, e a suceder à ACSS na posição de central de compras e de unidade ministerial de compras de bens e serviços da área das tecnologias de informação dos serviços e organismos do Ministério da Saúde e instituições do SNS e espera-se que, em 2012, se comecem a ver resultados desta mudança organizacional. Caberá à ACSS contratualizar com a SPMS EPE um contrato programa de forma a garantir a disponibilidade adequada de serviços de sistemas de informação para as diversas entidades do setor público de saúde. Foi extinta a Comissão Nacional do Registo de Saúde Electrónico e criada em Dezembro de 2011 a Comissão de Informatização Clínica (CIC) que terá como competência delinear a orientação estratégica para a informatização clínica do Serviço Nacional de Saúde. Tendo por base o princípio de partilha de informação, em 2012, de acordo com a legislação publicada, a CIC irá implementar, a Plataforma de Dados da Saúde, constituída por dois portais: o Portal do Profissional (dedicado aos profissionais de saúde) e o Portal do Utente (com âmbito funcional dedicado ao doente). Adicionalmente, a CIC tem ainda em agenda para 2012 um projeto que visa «melhorar a documentação e circulação de informação referente aos episódios de urgência, através da articulação dos serviços de urgência, serviço de atendimento telefónico (Saúde 24h), da Direção-Geral da Saúde e Sistemas de Informação do Instituto Nacional de Emergência Médica – INEM». Com estes projetos, pretende-se a partilha de informação não só entre profissionais de saúde, como também, numa fase posterior, que os utentes tenham acesso a informações sobre os seus registos de saúde próprios. O projeto da Plataforma de Dados de Saúde está a ser desenvolvido em conjunto com a Comissão Nacional de Proteção de Dados. Espera-se que a plataforma de dados da saúde permita fazer o setup para o “personal patient health record” e permita as tão almejadas poupanças ao evitar duplicação de meios complementares de diagnóstico e terapêutica. Tendo em vista a necessidade de racionalizar investimentos e capitalizar recursos existentes, o modelo de governo dos projetos da Plataforma de Dados de Saúde assenta na criação de uma equipa constituída por colaboradores da ARSLVT e ARS Norte e assim deverá continuar neste ano. A plataforma de dados, na sua ótica de partilha de informação vai de encontro à tendência internacional obtida no último survey desenvolvido pelo PwC Health Research Institute Consumer Survey, 2011, que demonstrou que os cidadãos estão interessados em compartilhar os seus dados para benefício próprio. Sessenta por cento (60%) dos consumidores entrevistados disseram que seria confortável ter os seus dados de saúde compartilhados Fins para os quais os cidadãos estariam confortáveis em ter os seus dados de saúde compartilhados entre as organizações de saúde (entrevistados puderam selecionar todas as opções que se aplicavam) 60% Para melhorar coordenação de cuidados 54% Para suportar decisões sobre os meus cuidados e tempo real 36% Para suportar análises à performance dos meus médicos 29% Para obter dados que identifiquem grupos/utentes em risco 29% Nenhum dos anteriores Fonte: PwC PwC Heath Research Institute Consumer survey, 2011 entre as organizações de saúde se isso melhorar a coordenação dos seus cuidados de saúde (ver esquema ao lado). Decorrente dos trabalhos realizados pelo Grupo de Projeto para as Tecnologias de Informação e Comunicação (GPTIC), constituído pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 46/2011, de 14 de novembro, foi elaborado um plano global estratégico de racionalização e redução de custos com as TIC na Administração Pública, de forma a cumprir um dos compromissos assumidos pelo Governo Português junto da Troika. Nesta altura, não sendo claras as atribuições das diversas entidades ao nível do planeamento setorial dos sistemas de informação, infere-se que este seja fundamentalmente o resultado da coordenação entre a ACSS e a SPMS EPE. Conclusões A maior proatividade dos profissionais de saúde na informatização, a definição e programação de regras e protocolos, uma maior integração dos actuais sistemas com a consequente partilha de informação e fazer mais com o que se tem para se gerar informação de suporte à decisão são palavras-chave deste ano ao nível dos sistemas de informação na saúde. Implicações • A consolidação dos sistemas de informação de saúde actuais, potenciará a tomada de melhores decisões tanto ao nível de cuidados de saúde como de racionalização de custos. • A maior utilização da capacidade instalada ao nível do software e hardware irá exigir um maior comprometimento por parte do peopleware. A maior utilização do que já existe estará dependente da forma de cada um dos profissionais de saúde irá transformar em as limitações actuais em fatores inibidores ou criativos. • A programação de regras e protocolos será um fator indutor da mudança de paradigma em que não há pacientes iguais para uma visão em que há grupos de pacientes semelhantes que se podem caracterizar. Esta mudança permitirá no futuro a utilização das tecnologias de informação a um nível mais abrangente (p. e. diagnóstico, prognóstico, gestão do conhecimento, etc.). • A consolidação de soluções actuais que possuem lacunas e insuficiências, poderão prolongar continuadamente essas mesmas limitações, mas é importante perceber que os investimentos futuros só poderão ser realizados coexistindo no tempo com os sistemas atualmente existentes. Uma mudança abrangente para sarar todas as feridas actuais nunca seria solução viável pelos custos incomportáveis, mas a evolução dos sistemas de informação não poderá estar cingida ao contexto atual sem uma visão de longo prazo. • As restrições orçamentais conduziram a investimentos mais limitados mas também mais pensados e integrados. • Espera-se em 2012 que a SPMS EPE assegure de forma efetiva: • o aprovisionamento de forma centralizada; • o desenvolvimento, manutenção e operação dos sistemas de informação dos serviços e organismos do Ministério da Saúde e instituições do SNS. Principais desafios da saúde 2012 47 Nova dinâmica nos mercados dos MCDT e dos dispositivos médicos Em 2012, o Estado através das suas políticas e instrumentos disponíveis irá tentar impulsionar o aumento da eficiência no mercado dos meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT) e reforçar a avaliação económica na introdução de novos dispositivos médicos. Parte significativa das entidades convencionadas tem uma forte dependência dos proveitos gerados junto do SNS e outros subsistemas públicos de saúde. O Estado está a concertar estratégias de convenção de serviços entre todos os seus sistemas e subsistemas, reforçando o seu poder negocial. A redução da procura e dos preços de alguns serviços convencionados terá um impacto económico significativo junto das entidades convencionadas, fundamentalmente nas de menor dimensão e situados num espaço geográfico mais competitivo. Se a redução dos preços pode gerar opiniões não unânimes, não deixa também de ser verdade e preocupante que o modelo de negócio e de funcionamento de muitas dessas entidades se tenha mantido inalterável durante anos a fio, sem acréscimos de produtividade, resultado da inércia gerada, em parte, pelas regras de contratualização de serviços pelo SNS. Adicionalmente, talvez o único fator 48 PwC que promovesse a eficiência fosse a opção de escolha do utente do SNS. À exceção da diálise, os convencionados de hoje são praticamente os mesmos dos anos 80. Desde os anos 90 que as alterações aos preços foram sendo residuais. Para sobreviverem muitas dessas empresas terão de transformar os seus modelos de negócio e de funcionamento, procurando novos mercados, adoptando novas tecnologias, novas formas de trabalho e articulando parcerias. Em boa verdade, estas medidas poderão contribuir para a eliminação das empresas pouco eficientes. Além do desafio da eventual redução do volume de procura e do preço – fique claro que também há uma revisão em alta de preços para alguns serviços – as entidades convencionadas terão de efetuar o esforço de acompanhar o desenvolvimento tecnológico que será exigido pelo Estado. Falamos da desmaterialização do processo de prescrição de MCDT, incluindo a adoção da imagem digital e o serviço electrónico de conferência de facturas, bem como a alteração do processo de licenciamento para facilitar a atividade dos convencionados e a entrada de novos concorrentes. Do ponto de vista da diálise, será interessante acompanhar a estratégia do Estado para reforçar o seu poder negocial considerando que atualmente duas Se a redução dos preços pode gerar opiniões não unânimes, não deixa também de ser verdade e preocupante que o modelo de negócio e de funcionamento de muitas dessas entidades se tenha mantido inalterável durante anos a fio. empresas detêm cerca de 80% do mercado convencionado respectivo. Ao nível do setor convencionado da medicina física e de reabilitação, o Estado vai procurar definir uma estratégia até ao final de 2012. Na atualidade é um setor com larga margem de melhoria de eficiência e talvez onde um preço das convenções necessite de revisão em alta. Ao nível dos dispositivos médicos o propósito do Estado é reduzir a despesa com os dispositivos, ao nível dos cuidados hospitalares. A redução do custo de aquisição – administrativa ou por concorrência – e a monitorização mais apertada na introdução de novos dispositivos poderão ser os instrumentos a serem utilizados pela administração do SNS. Se estes instrumentos podem resultar numa perspectiva financeira e de curto prazo, será que do ponto de vista económico serão os mais adequados? Ou melhor, estará a administração do SNS em época e com condições para avaliar o impacto económico das medidas? O funcionamento efetivo dos serviços partilhados do SNS, em 2012, poderá vir a ter impacto no mercado dos dispositivos médicos não só via preço mas também pela natureza do serviço associado à venda do dispositivo médico. Esta preocupação será mais real se, ao nível da contratualização centralizada, os critérios de seleção de fornecedores e dispositivos médicos não considerarem a distinção do serviço associado. Interessante também será o posicionamento dos fornecedores de dispositivos médicos na relação entre os pagadores e prestadores privados. Os pagadores privados de serviços de saúde, seguradoras de saúde e empresas de serviços, fruto do seu poder negocial crescente, há muito que têm vindo a normalizar os custos inerentes à prestação de serviços aos seus utentes, por parte dos prestadores privados. Atualmente, o preço que hoje pagam por um serviço tem subjacente uma negociação de pelo menos uma parte da estrutura de custos. Por exemplo, na atualidade, por tipo de cirurgia, existe já uma padronização dos custos elegíveis ao nível de horas de pessoal clínico envolvido, horas de utilização do bloco operatório, entre outros. Claramente que agora a disputa negocial avançará para os consumíveis clínicos, incluindo os dispositivos médicos. Será que os pagadores privados irão negociar o preço dos dispositivos médicos diretamente com a indústria, reduzindo o espaço de manobra Principais desafios da saúde 2012 49 Nova dinâmica nos mercados dos MCDT e dos dispositivos médicos e assim a margem do prestador privado? Voltemos ao SNS e aos MCDT. A despesa corrente na saúde relacionada com os meios complementares de diagnóstico e terapêutica (MCDT) é maioritariamente efetuada junto de prestadores privados e sociais1. Através de convenções e acordos, o Serviço Nacional de Saúde e outros subsistemas públicos de saúde contratualizam com instituições sociais e privadas serviços de análises clínicas, medicina física e reabilitação (MFR), radiologia, diálise, entre outros. Os serviços convencionados têm uma natureza complementar aos prestados pelas entidades prestadoras da rede pública de saúde, mas representam uma parcela com impacto significativo no total de despesas em saúde no nosso país. Neste contexto, é importante salientar que o setor convencionado de MCDT, representa, atualmente, 1 ACSS – “Relatório da Atividade do Setor: MCDT 2008/2009” 50 PwC uma grande maioria da produção total do SNS em ambulatório, assumindo um papel importante na formação da rede assistencial do País2. O valor facturado ao SNS pelas entidades convencionadas (excluindo hemodiálise) ascendeu, em 2010, ao montante total de € 490.539.618, representando um acréscimo de 0,6% face ao ano anterior. Em termos do n.º de atos e requisições, observa-se um ligeiro aumento de 0,1% e 1,2%, respectivamente, face a 2009. Em sentido inverso, o n.º de exames apresenta um decréscimo na ordem dos 2,4%. 2 ACSS – “Relatório da Atividade do Setor: MCDT 2009/2010” 2,4% foi o decréscimo sentido no número de exames. Em termos do n.º de atos e requisições, observa-se um ligeiro aumento de 0,1% e 1,2%, respectivamente, face a 2009. Encargos do SNS com Exames Complementares 2009 Encargo SNS Nº Atos 487.744.457 114.724.003 Nº Exames Nº Requisições 75.429.080 22.090.564 73.628.527 22.353.396 2010 490.539.618 114.890.659 % 2009 - 2010 0,6% 0,1% O Programa do Governo para 2012 e as medidas previstas no Memorando de Entendimento com a Troika terão um impacto significativo no mercado de MCDT. À redução da procura de serviços junto dos convencionados, como resultado da opção de optimização da utilização da capacidade instalada dentro do setor prestador público, acresce o conjunto de medidas que visa reduzir administrativamente o preço e aumentar a competitividade no setor e, por esta via obter reduções adicionais do custo para o Estado. Nestas medidas destacam-se: i) adoção de medidas para o aumento da concorrência entre prestadores privados; ii) revisão e alteração do atual sistema de preços de referência com base nos preços praticados internacionalmente, adequando-os à realidade atual; iii) instituição da prática de revisão periódica dos preços dos serviços -2,4% 1,2% pagos aos prestadores privados; iv) avaliação do cumprimento das regras de concorrência europeias na prestação de serviços de saúde; v) promoção da convergência da política de contratualização de convenções; vi) redução em cerca de 1/3 dos custos com o transporte de doentes; e vii) promoção do reforço e agilização da Governação no setor. Em Portugal, o tratamento da insuficiência renal crónica (IRC) em ambulatório é, primordialmente, realizado no seio do setor privado, sendo o acesso dos cidadãos do SNS assegurado através do estabelecimento de convenções3. Na prática, se nos limitarmos a analisar de forma limitada este serviço, não poderíamos falar de complementaridade do setor convencionado. Os prestadores públicos são poucos e com reduzida expressão ao nível da prestação. Distribuição de doentes por tipo de prestador e por região de saúde3 100 90 80 60 50 40 30 20 10 0 % 461 497 2.025 1.025 836 420 240 867 RSN Misericórdias 454 367 1.511 355 RSC RSLVT Diaverum RSA Outras entidades RSALG Nephrocare 3 ACSS – “Relatório de acompanhamento de atividade – Hemodiálise 2010” Principais desafios da saúde 2012 51 Nova dinâmica nos mercados dos MCDT e dos dispositivos médicos Os prestadores de menor dimensão terão maior dificuldade em obter economias e eficiências, pelo que se perspectiva um aumento da concentração (direta e indireta) dos prestadores neste mercado. O setor convencionado da diálise registou nos últimos anos alterações substanciais, nomeadamente no modelo de aquisição de serviços através da adoção do pagamento pelo preço compreensivo e na implementação da plataforma de Gestão Integrada da Doença. A redução do preço convencionado pelo serviço prestado, em cerca de 12,5%, tem impacto direto na margem e resultados do prestador que assim terá de melhor racionalizar os recursos disponíveis. Tendo presente que o mercado se encontra muito concentrado, os grandes prestadores terão capacidade para o fazer em função da sua escala e dos meios para otimizar os recursos disponíveis. Salientamos ainda que em Portugal o número de utentes em diálise excede em muito a média da OCDE, (fonte: estudo da OCDE Health data 2011) sendo apenas suplantado pelos Estados Unidos e Japão, com um elevado crescimento nos últimos 20 anos. Verifica-se também uma elevada relação de utentes com transplante de rim estando Portugal no topo dos países da OCDE. Doentes em tratamento de diálise e prevalência com rim implantado Prevalência de doentes submetidos à diálise, 1990 e 2009 (ou ano mais recente) Japão (2003) Prevalência de doentes vivendo com rim transplantado, 1990 e 2009 (ou ano mais recente) 186.3 E.U.A. Portugal Portugal 96.1 Grécia 78.6 46.3 46.0 76.5 Finlândia Turquia 74.7 França Israel Espanha 44.4 70.4 Bélgica 44.2 66.9 OCDE 65.2 Hungria 64.0 Irlanda 61.0 Nova Zelândia 52.4 França 52.1 Eslováquia 52.8 Áustria OCDE 36.4 Reino Unido 36.3 Austrália 36.1 Républica Checa 35.9 49.6 Austrália 47.1 Estónia México 47.1 Hungria 41.7 37.2 Holanda 36.8 Finlândia 25.2 23.3 Grécia 21.5 Eslováquia 15.0 Japão (2003) 19.1 0 30.6 29.5 Coreia 32.1 Islândia 32.5 Alemanha 48.0 Irlanda 34.8 Nova Zelândia Dinamarca Reino Unido 36.6 Islândia 49.9 Espanha 40.0 Dinamarca 61.1 Luxemburgo 41.4 Israel 63.0 Républica Checa 45.3 71.9 Canadá Bélgica 47.6 Canadá Itália Polónia 47.9 Áustria 80.7 Coreia 54.5 Holanda 85.0 Alemanha 54.5 E.U.A. 125.7 50 100 150 200 0 15 30 Nº de pacientes numa população de 100 000 Nº de pacientes numa população de 100 000 1990 4.1 45 60 2009 Fonte: OCDE Health Data 2011 52 PwC Estes factos realçam a relevância deste mercado. Contudo, tal não tem reflexo direto na qualidade de vida dos utentes, em particular dos idosos, pois os dados da OCDE mostram que Portugal se encontra muito abaixo da média neste indicador, pois apenas 13,8% da população com mais de 65 anos se encontra de boa saúde, enquanto a média dos países da OCDE é de cerca de 45%. Este divórcio entre o esforço do país no dispêndio de recursos e os resultados será uma demonstração de alguma ineficiência? População com 65 ou mais anos que afirmam estar de boa saúde População com 65 ou mais anos indicando ser saudáveis, 2009 ou ano mais recente 83.5 75.8 75.5 74.8 71.8 68.4 68.0 75.9 75.1 71.9 Canadá 75.9 Dinamarca 78.4 Suiça 75.2 Autrália 66.6 Noruega 72.0 63.0 Suécia 64.9 Holanda 67.1 Bélgica 61.4 Islândia 58.2 Áustria 55.2 OCDE 49.0 Luxemburgo 46.1 43.2 França 45.4 42.7 México 44.2 47.4 45.2 44.7 41.8 40.5 37.9 64.0 63.4 60.1 54.3 52.8 51.4 44.1 42.2 43.7 41.5 41.3 Israel 48.8 36.4 48.6 34.4 Chile 37.1 Grécia 43.0 36.8 Alemanha 38.5 38.4 32.6 35.5 29.2 Républica Checa 45.6 32.7 Coreia 26.2 Eslovénia 22.8 20.2 Turquia 27.6 20.0 Japão 22.1 Hungria 21.6 14.0 Estónia 17.6 13.8 Portugal 18.2 30 Polónia 0 19.3 37 27.8 10.3 28.0 39.6 Itália 18.1 60 69.2 69.9 Espanha 37.3 35.4 90 75.8 62.3 54.6 83.2 83.2 E.U.A. Irlanda 56.5 Mulheres Nova Zelândia 63.2 60.0 Homens 13.4 0 19.0 14.6 18.4 15.5 12.3 10.6 8.4 30 60 90 % da população com 65 ou mais anos Fonte: OCDE Health Data 2011 Principais desafios da saúde 2012 53 Nova dinâmica nos mercados dos MCDT e dos dispositivos médicos O mercado dos laboratórios é considerado como estratégico para resposta aos cuidados primários. Contudo, os convencionados que existem são os mesmos dos anos 80, mesmo considerando as alterações tecnológicas, demográficas, reformas na rede do SNS, entre outros. Recentemente a ACSS efetuou a revisão dos preços e tabelas de atos, que se manteve praticamente inalterada durante vários anos. Com esta revisão assiste-se a um aumento de algumas taxas moderadoras pagas pelos utentes, bem como foram tipificadas as análises em cada patologia de modo a monitorizar as requisições e evitar situações de abuso. Considerando os dados relativos à despesa do ano de 2010, verifica-se que 44,4% dos encargos do SNS com a aquisição de MCDT convencionados, reportam-se às análises clínicas. Em 2012, deverá existir uma redução da despesa cumulativa com análises laboratoriais junto do setor convencionado na ordem dos 20%, procurando potenciar a capacidade instalada nos prestadores públicos, principalmente ao nível dos serviços hospitalares. Este mercado encontra-se bastante pulverizado em vários prestadores privados, existindo muitos laboratórios de pequena dimensão apesar da concentração que se tem vindo a operar no setor. A redução da procura do setor público junto do setor convencionado terá impacto na dimensão e natureza dos resultados económicos das entidades convencionadas, potenciando uma dinâmica que poderá levar a uma concentração acrescida ou a novas formas de modelo de funcionamento dos laboratórios privados. As Diretivas aplicáveis aos dispositivos médicos (Diretivas: 90/385/CEE, 93/42/CEE e 98/79/CE) estabelecem requisitos mínimos que os dispositivos 54 PwC médicos deverão cumprir para poderem entrar no mercado. Esses requisitos visam a proteção da segurança e da saúde dos doentes e dos utilizadores, considerando os riscos inerentes à utilização de dispositivos muitas vezes complexos que são sujeitos a condições de utilização extremas, como por exemplo a implantação no corpo humano. A marcação CE é um pré-requisito para a colocação de dispositivos médicos no mercado e uma garantia para a livre circulação dos mesmos, certificando-se desta forma que os produtos estão conformes com os requisitos essenciais que lhes são aplicáveis, exceto para os dispositivos médicos feitos por medida ou destinados a investigação clínica, que são sujeitos a um mecanismo de avaliação próprio. A demonstração da conformidade inclui necessariamente uma avaliação clínica dos dispositivos médicos, independentemente do risco associado. dos doentes, dos utilizadores e de terceiros, controlando os problemas técnicos e também os de potencial concorrência desleal. A EUCOMED5, associação que representa a Indústria da Tecnologia Médica na Europa, defende que o atual Sistema Legislativo Europeu aplicado aos dispositivos médicos tem demonstrado garantir um elevado nível de segurança e qualidade dos dispositivos médicos, ao mesmo tempo que tem permitido o acesso atempado a tecnologias de saúde inovadoras. Para os dispositivos médicos, de baixo risco, a avaliação é realizada pelo próprio fabricante, sendo obrigatório o respectivo registo junto da Autoridade Competente onde o mesmo se encontra sedeado. Por outro lado, os dispositivos médicos de médio e elevado risco são sujeitos a procedimentos de avaliação da conformidade realizados por um Organismo Notificado (Entidade Independente). O INFARMED é um Organismo Notificado em Portugal4. A EUCOMED continua a apoiar os principais elementos do modelo legislativo atual, que provaram até ao momento ser muito eficazes, reconhecendo, no entanto, a necessidade de modernizar e fortalecer a atual legislação dos dispositivos médicos na Europa. Acredita que esta deve ser feita pelo envolvimento dos Estados-Membros e através de uma melhor coordenação e gestão do sistema de regulação a nível Europeu. Defende ainda que as alterações propostas devem levar a um quadro legislativo inteligente e eficiente, aplicado de forma coerente em toda a UE e que garanta saúde de qualidade, segurança dos doentes e o acesso rápido a tecnologias médicas recentes com valor demonstrado. A associação alerta ainda para a necessidade de se garantir a existência de um sistema de vigilância no pós-mercado eficiente e efetivo. As Autoridades Nacionais Competentes para a área dos Dispositivos Médicos (INFARMED, em Portugal), intervêm sobretudo na fase de póscomercialização, desempenhando um papel importantíssimo na vigilância do desempenho dos dispositivos médicos e na supervisão de todo o mercado, garantindo que os dispositivos colocados no mercado nacional não comprometem a saúde e a segurança O mercado de dispositivos em Portugal representa uma pequena parcela da despesa em saúde. De acordo com um Estudo realizado pela EUCOMED, as despesas com dispositivos médicos na Europa, em 2005, totalizavam € 63,62 mil milhões, cerca de 6,3% das despesas em saúde dos estados-membros, representando uma despesa per capita de € 128. Em Portugal, as despesas com dispositivos 4 http://www.infarmed.pt/portal/page/portal/INFARMED/DISPOSITIVOS_MEDICOS 5 http://www.eucomed.org/about-us Implicações Gastos em tecnologias médicas, per capita 62% • As medidas implementadas ao nível da convenção de serviços do SNS vão implicar a contração do mercado de meios complementares de diagnóstico. Esta contração resulta da forte dependência que o setor tem dos serviços que presta ao SNS, da redução estimada da procura resultante de uma melhoria da utilização da capacidade pública instalada, fundamentalmente ao nível dos cuidados hospitalares, bem como de uma redução efetiva dos preços dos atos; • A queda da procura pública tenderá a imprimir outra dinâmica neste setor e talvez, permitir a passagem a um novo patamar de eficiência setorial. Para responder a este desafio, as empresas terão de alterar o seu modelo de negócio e de funcionamento, procurando sinergias para alavancar os benefícios de escala, reduzir os custos de forma sustentada, potenciar a inovação nos processos de funcionamento e distinção tecnológica. Será que as medidas implementadas pelo SNS serão suficientes para alterar a dinâmica do setor? • A desmaterialização do processo de prescrição de MCDT’s, a adoção da imagem digital e sua transferência para os centros prescritores permitirá um aumento significativo da eficiência, fundamentalmente ao nível dos cuidados primários onde a relação com o setor convencionado é mais relevante. Este facto poderá contribuir para a evolução tecnológica das entidades convencionadas como também poderá será um fator que contribua para a eliminação das empresas menos eficientes; 128% Portugal União Europeia médicos totalizavam € 650 milhões, cerca de 4,8% das despesas em saúde, representando uma despesa per capita de € 62 ou seja, menos de metade da União Europeia6,7. Conforme indica Luís Pereira8, estima-se que a despesa com tecnologias médicas corresponda a menos de 5% do total de despesa em saúde, o que demonstra a pequena dimensão do mercado de dispositivos médicos. A dívida dos hospitais públicos a fornecedores afecta de forma muito significativa a indústria dos dispositivos médicos, uma vez que a sua atividade é fortemente centrada ao nível hospitalar. Ao contrário da indústria farmacêutica que, excetuando alguns casos, tem uma componente de mercado ambulatório significativa que ajudará ao maior equilíbrio financeiro das empresas, no setor dos dispositivos médicos esta componente é muitíssimo reduzida. • Alteração do processo de compra dos dispositivos médicos, nomeadamente através de compras centralizadas pela SPMS. Existe o risco deste processo de centralização das compras conduzir a sobrevalorização do atributo preço do dispositivo em detrimento da oferta agregada do dispositivo e serviço associado e as mais-valias técnicas dos produtos apresentados pelos concorrentes. • Na procura de uma melhoria na eficácia da introdução e utilização de dispositivos médicos é expectável que 2012 traga o debate da necessidade do desenvolvimento de um programa específico para os dispositivos médicos, com introdução de um sistema de avaliação prévia dos principais dispositivos pelo INFARMED, em articulação com a ACSS – Administração Central do Sistema de Saúde, de acordo com critérios clínicos e económicos, e a adoção de normas de orientação para a sua utilização, possibilitando uma racionalização do seu uso. • 2012 pode também acender o debate sobre a necessidade de implementação de um programa de reutilização de dispositivos médicos. Este programa deverá considerar as características próprias de cada dispositivo médico, nomeadamente se o dispositivo é passível de ser reprocessado e reutilizado (dispositivos médicos reutilizáveis ou de uso único) mantendo o seu desempenho funcional e também apurar quais as implicações éticas e de segurança para o doente. A adoção de um programa desta natureza implica estudos aprofundados sobre quais os custos diretos e indiretos envolvidos nesta atividade e sobre a relação custo-benefício da reutilização dos dispositivos. De acordo com posições públicas recentes, nomeadamente o Relatório do Grupo Técnico para a Reforma Hospitalar, são sugeridas algumas medidas para o setor dos dispositivos médicos que a serem implementadas, terão impacto muito significativo no mercado. 6 Competitiveness and Innovativeness of the European Medical Technology Industry – Evaluation of the Survey Results. Relatório. EUCOMED. Maio 2007. Disponível em: http://www.eucomed.be/ press/~/media/92ED48D8135D40E49EAB7592DF0 3F331.ashx 7 Alto Comissariado da Saúde – Plano Nacional de Saúde 2011-2016: Política do Medicamento, Dispositivos Médicos e Avaliação de Tecnologias da Saúde, novembro 2010 8 Apresentação “Os Principais Temas da Agenda da Saúde em Portugal em 2012”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, Luís Pereira, 2011 Principais desafios da saúde 2012 55 Colocar a qualidade ao serviço da redução de custos e geração de receita A qualidade é um tema que tem suscitado um interesse crescente em Portugal. Na área da saúde, em particular, tem sido apontada como um dos requisitos determinantes para o desenvolvimento de um sistema de saúde moderno, de forma indissociável dos conceitos de acesso, equidade e sustentabilidade. a garantia de acessibilidade, afabilidade e melhoria do estado de saúde, se estivermos a analisar na ótica do utente; a obtenção de resultados clínicos, na ótica do prestador; a eficiência ou a rentabilização de investimentos, considerando os requisitos imediatos do financiador. Qualidade: uma questão de expectativa Em 2012, assistir-se-ão a duas tendências contrárias em termos de expectativas: se por um lado, é provável que o sentimento generalizado de contenção e austeridade poderá levar a uma redução das expectativas dos utentes para com os serviços de saúde e, em particular, para com o SNS, por outro, os serviços de saúde sentirão uma pressão crescente pela obtenção de resultados com eficácia e eficiência, a custos mínimos. A ISO 9000:2005 define qualidade como o grau de satisfação dos requisitos de um serviço ou produto. Estes requisitos traduzem-se nas necessidades e expectativas de um cliente, traduzidas de forma implícita ou obrigatória. A Organização Mundial de Saúde (OMS), por sua vez, refere como componentes-chave de cuidados de saúde de qualidade: o elevado grau de excelência profissional, a eficiência na utilização de recursos, a obtenção de resultados de saúde, a minimização de riscos para os doentes e a satisfação dos utilizadores. Para se obter efetivamente qualidade em saúde é necessário endereçar, simultaneamente, as expectativas dos diferentes stakeholders, como 56 PwC Em 2012, haverá um desinvestimento na qualidade organizacional… Em Portugal, os esforços na procura de qualidade têm valorizado principalmente as dimensões estrutural e processual, ao contrário do que se verifica nos EUA, em que se dá primazia aos critérios de processos e resultados. Este posicionamento baseia-se no pressuposto de que, se a estrutura for adequada e os processos devidamente definidos e executados, então obter-se-ão resultados de qualidade. Assim, as experiências de qualidade em Portugal têm-se focado a um nível organizacional, de que são exemplo a formalização e padronização de procedimentos internos, a adoção de boas práticas de gestão, a criação de estruturas orgânicas de qualidade (gabinetes de qualidade, comissões de controlo de infeção hospitalar, provedores do utente, etc.), e a implementação de programas de qualidade para áreas específicas, como é o caso dos laboratórios. Contudo, as organizações têm adotado estas iniciativas impelidas, em parte, pela obrigatoriedade de adoção das mesmas. Outras, têm realizado este tipo de investimento de forma integrada em esforços de acreditação ou certificação. Os reais benefícios que decorrem da qualidade organizacional dificilmente são apreendidos, sobretudo quando defrontados com os custos que estão associados à concretização destas iniciativas. É expectável que em 2012, perante as fortes restrições orçamentais e pressão para redução de custos associados à contratação de serviços externos, o ímpeto para a melhoria da qualidade organizacional seja significativamente menor do que nos anos anteriores. Assim se manterá enquanto as organizações de saúde não apreenderem os verdadeiros benefícios que decorrem da melhoria da qualidade organizacional. Esta não só traz vantagens ao nível daquilo que é a gestão e organização internas, com a criação de mecanismos de controlo interno, reforço da governação, maior transparência e responsabilização, mas igualmente ao nível da eficiência na utilização de recursos, através da padronização e da eliminação de processos ou procedimentos redundantes. Significa isto que a qualidade organizacional, apesar de estar associada a custos iniciais mais ou menos avultados, acaba geralmente por trazer benefícios a médio/longo prazo, que ultrapassam largamente o investimento inicial. É expectável que em 2012, perante as fortes restrições orçamentais e pressão para redução de custos associados à contratação de serviços externos, o ímpeto para a melhoria da qualidade organizacional seja significativamente menor do que nos anos anteriores. Principais desafios da saúde 2012 57 Colocar a qualidade ao serviço da redução de custos e geração de receita …e uma redefinição do conceito de qualidade clínica A questão dos custos será incontornável em 2012. No entanto, ao contrário do que sucede com a qualidade organizacional (associada a consumo de recursos), a qualidade clínica será utilizada como uma ferramenta de redução de custos/ obtenção de receitas, através das seguintes dimensões: Normalização clínica Introdução do conceito custo-efetividade Benchmarking: indicadores de qualidade Redução de custos/obtenção de receitas Normalização clínica Em linha com uma filosofia defensora da decisão baseada na evidência científica como potenciadora do aumento da qualidade clínica, 2012 será um ano de reforço da normalização da prática clínica em Portugal. A adoção e generalização da utilização de normas de orientação clínica, baseadas na evidência, permitirão não só reduzir a probabilidade e a consequência da ocorrência de erros clínicos, cirúrgicos e na administração de medicamentos, mas também, reduzir e conter o aumento de custos em saúde. A normalização clínica será reforçada com a entrada em operação de um sistema de deteção de incidentes ou quase-incidentes, que permita monitorizar a ocorrência do risco, e implementar medidas corretivas e preventivas que previnam reincidências. Neste domínio, está previsto para 2012 a entrada em operação do Sistema Nacional de Notificação de Incidentes e Eventos 58 PwC Adversos (SNNIEA), sistema nacional, aplicado ao setor público e privado, de notificação, tendo por fim aumentar o nível de compromisso dos profissionais para com a segurança do doente, criar uma cultura de segurança, e partilhar experiências e práticas de tratamento de riscos entre organizações de saúde. Qualidade e custo-efetividade Crescentemente, qualidade é também sinónimo de eficiência e custo-efetividade. Por exemplo, no Reino Unido, a National Institute for Health and Clinical Excellence (NICE) publica a lista de tratamentos que podem ser financiados, com base em indicadores que relacionam o custo-efetividade dos tratamentos com os chamado QALYs (Quality Adjusted-Life Years), indicador que mede os anos de vida com qualidade. Nos Países Baixos, os QALYs são igualmente utilizados para limitar determinadas coberturas. No fundo, trata-se de estabelecer limites sobre a utilização dos recursos, assumindo que estes são escassos e que a sua utilização tem que ter em conta critérios de custo-efetividade (no pressuposto de que, caso um tratamento ultrapasse esses critérios, traduzir-se-á somente em consumo acrescido de recursos, sem ganhos de qualidade). Em Portugal, este tem sido um assunto tabu, que opõe critérios economicistas a princípios morais e éticos. Não obstante, no contexto de um eventual “Plano de Prestações Garantidas”, este tipo de métricas poderão vir a ser aplicadas no nosso país, já em 2012. Será que existe coragem para se avançar por este caminho ou também, será que Implicações • A pressão para a contenção de custos irá levar a um desinvestimento na melhoria da qualidade organizacional. Uma aposta mais forte na qualidade clínica, poderia constituir uma forma de reduzir custos e obter mais receita. • A qualidade é um conceito multidimensional, sendo que é necessária a criação de condições ao nível das infraestruturas , recursos humanos, materiais e organização (qualidade organizacional), para que a prestação de cuidados possa ter qualidade (qualidade clínica). • Incentivar para a qualidade implica reconhecer e premiar as iniciativas e as ações que permitam melhorias de qualidade, a nível individual e institucional. O desenvolvimento de um sistema de avaliação do desempenho profissional que permita uma diferenciação qualitativa é um primeiro passo, com a aplicação de incentivos acordados entre o avaliador e avaliado de acordo com a estratégia de qualidade (p. e. dias de férias, participação em seminários e ações de formação, acessos a recursos de investigação). • A nível institucional, os actuais contratos-programa já preveem incrementos remuneratórios se cumpridos determinados objetivos de qualidade (p. e. taxas de reinternamento aos cinco dias, número de profissionais formados em controlo de infeção, etc.), no entanto, é questionável se o cumprimento daqueles objetivos se traduz, efetivamente, numa melhoria de qualidade, ou constituem apenas uma forma de os hospitais alavancarem o financiamento. • A intenção do Governo implementar, já a partir de 2012, um sistema de comparação (benchmarking das instituições de Saúde por via da publicação de indicadores de desempenho, poderá contribuir para a melhoria da qualidade na prestação de cuidados de saúde. O Programa do Governo estabelece igualmente a “necessidade de garantir estruturas e mecanismos de acreditação em saúde com vista à certificação e reconhecimento público do nível de qualidade (…)”. • Não obstante a importância destes estímulos à qualidade, esta só se obtém se houver uma interiorização da sua importância pelos profissionais (procura pela melhoria contínua e pela excelência) e pelo utente (só com o envolvimento do utente nos seus cuidados se obtêm resultados de qualidade). a sociedade está suficientemente madura para aceitar este caminho? Indicadores de qualidade A intenção do Governo implementar, já a partir de 2012, um sistema de comparação (benchmarking) das instituições de Saúde por via da publicação de indicadores de desempenho (Programa do XIX Governo Constitucional), fomentando a transparência e a competição entre instituições, poderá contribuir para a melhoria da qualidade na prestação de cuidados de saúde. Na eventualidade daqueles indicadores ficarem indexados ao financiamento, tornar-se-iam então potentes instrumentos de incentivo. As instituições de saúde não só competiriam entre si para “atrair” mais utilizadores, como, por força do reconhecimento público da sua qualidade (para o qual poderiam contribuir largamente os sistemas de certificação e acreditação), poderiam tornar-se em agentes ativos do chamado Turismo de Saúde, à escala internacional. Tratar-se-á de utilizar a qualidade em prol da geração de receitas adicionais. Em 2012, os conceitos de qualidade e custo/rentabilidade assistirão a um esbater de fronteiras, e deixará de ser possível falar num sem mencionar o outro. Principais desafios da saúde 2012 59 Setor hospitalar Racionalizar e procurar sinergias Mais de metade da despesa corrente em saúde do SNS e outros subsistemas de saúde, são efetuadas nos hospitais públicos. Nestes, mais de 50% dos gastos são com pessoal seguido pelos medicamentos com cerca de 1/5. Despesa corrente do SNS por prestador 18% 1% 1% Hospitais públicos Hospitais privados Ambulatório público Ambulatório privado 11% 15% 52% Farmácias Cuidados residenciais privados Outros 2% Fonte: INE (2009) Estrutura de custos dos Hospitais públicos 18% Pessoal Medicamentos Materiais de consumo clínico 7% Outros 54% 21% 60 PwC Fonte: ACSS (2010) O corte no subsídio de férias e de Natal previsto para 2012 permitirá uma poupança isolada mas outras medidas serão tomadas. De acordo com o Programa de Ajuda Financeira, terão de ser obtidas poupanças adicionais. Espera-se uma estabilização da procura ou decréscimo no ambulatório programado via efeito do aumento das taxas moderadoras, redução das segundas consultas e um acréscimo nas urgências e internamento pela procura de cuidados por cidadãos descompensados pela restrição na manutenção de terapêuticas ambulatórias, procura de resposta por cidadãos isentos e limitada capacidade de resposta da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados. 4 vetores de actuação dos hospitais públicos Reorganização do trabalho Rentabilização da infra-estrutura instalada • A nível externo, através da complementaridade de serviços com os cuidados primários e continuados. • A nível interno, da estrutura operativa: - reestruturar e flexibilizar equipas; - reavaliar os padrões de consumos (produtos de menor custo, reavaliação dos consumíveis); - aumentar as ações de controlo de infeção. • Gestão adequada das altas clínicas (redução de um dia na demora média de internamento equivaleria a 300 milhões de euros de poupança). • Cirurgia de ambulatório em alternativa à convencional. • Reavaliação de laboratórios de patologia clínica. • Reavaliação das necessidades em diagnóstico e intervenção por imagem. Monitorização da performance Articulação vertical e horizontal • Adequar os sistemas de informação instalados: - monitorizar a performance; - melhorar os métodos de codificação e previsão. • Mensurar as variáveis críticas para controlar a eficácia das medidas de redução de custos: demora média, turnover no internamento e blocos operatórios, tempo de resposta de MCDT, etc. • Compatibilizar as atuações a nível regional, organizacional e das redes de referenciação/diferenciação. • Encaminhar atempadamente doentes agudos para a rede de cuidados continuados. • Externalizar quando possível e concretizável. • Cooperar com o setor privado, social e outros agentes. Principais desafios da saúde 2012 61 Setor hospitalar Racionalizar e procurar sinergias Camas em enfermarias por ARS e setor público e privado (milhares de camas) 2.7 7.0 Novos hospitais, reorganização e racionalização da rede hospitalar 1.2 5.8 0.4 3.0 0.9 7.8 0.3 0.8 SNS Privados Fonte: DGS 2009 62 PwC Será importante verificar o impacto do aumento das taxas moderadoras e de outras medidas de contenção de custos, via redução de oferta de serviços (transporte de doentes não urgentes, reestruturação da rede de urgências hospitalares, etc.), na procura de serviços públicos de saúde, incluindo urgências. O novo Hospital de Loures, Parceira Público Privada que será gerida pela Espírito Santo Saúde (ES Saúde), aumentará a oferta de camas do SNS em 5,4% na área de Lisboa e Vale do Tejo. Na realidade, a área de influência do novo Hospital de Loures coincide em parte com a atual área de influência do Centro Hospitalar Lisboa Norte (CHLN) – constituído pelos Hospitais de Santa Maria e Pulido Valente. Questiona-se a necessidade de manter a atual oferta e adicionar-lhe 424 camas sem efetuar uma correção da oferta. A procura do CHLN irá reduzir-se por transferência para Loures, sem impacto correspondente na estrutura de custos, o que deteriorará a sua performance financeira, ou, a procura de serviços hospitalares por esta área de influência aumentará, mantendo-se a procura no atual CHLN e “gerando-se” uma nova procura para o novo Hospital que em nada ajudará a contenção da produção necessária por questões de financiamento dos hospitais públicos. Provavelmente o que acontecerá é o CHLN enfrentar uma redução da procura sem a devida compensação na redução dos seus custos. O Hospital Oriental de Lisboa, com 790 camas, previsto para servir a zona oriental de Lisboa para substituir os hospitais de S. José, Capuchos, Santa Marta, Desterro e D. Estefânia, e com financiamento assegurado, deverá ser ponderado, uma vez que o mesmo poderá conduzir a ganhos financeiros, de eficiência e de qualidade assistencial, considerando a dispersão e arquitetura da infra-estrutura atual. A disponibilidade financeira do país e também a robustez financeira dos concorrentes poderão conduzir a um eventual adiamento deste projeto importante de requalificação da oferta hospitalar na região. Setor privado: privatização da HPP Uma das exigências do Programa de Ajuda Financeira é a venda da Hospitais Privados de Portugal (HPP), atualmente detida pela Caixa Geral de Depósitos. A HPP detém 6 hospitais, tendo uma quota de mercado estimada (em termos de número de camas) de 8% do mercado privado em 2011, emprega mais de dois mil Quota de mercado dos maiores grupos privados em 2011 (medido em nº de camas considerando as PPP’s) 9% ES Saúde Quota de mercado dos maiores grupos privados estimada para 2012 (medido em nº de camas considerando as PPP’s) 13% 8% 8% HPP José de Mello Saúde Trofa Saúde Outros 65% ? 15% 3% Para quem ficará a quota? 15% 61% 3% Nota: Consideração da abertura do Hospital de Loures e do Hospital Privado de Alfena Fonte: DGS 2009 e análise PwC trabalhadores e faturou 162 milhões de euros em 2010. O processo de privatização da HPP poderá gerar alterações estruturais no mercado hospitalar privado em Portugal, dependendo do modelo de privatização a seguir e da(s) entidade(s) adquirente(s). Os principais grupos privados de saúde já manifestaram vontade de acompanhar o processo, o mesmo ocorrendo com potenciais compradores estrangeiros. A dificuldade de acesso ao mercado de crédito e a própria robustez financeira da entidade poderá condicionar a estratégia de alguns atores interessados. A evolução do desempenho financeiro das unidades Hospital dos Lusíadas e HPP Cascais poderá determinar a atratividade da transação. Aprofundar parcerias Já existem atualmente parcerias entre o setor social e o setor público e privado. Das primeiras, são exemplo a participação na rede de hospitais convencionados pelo SIGIC e das segundas, o Hospital da Misericórdia de Évora, gerido pela ES Saúde, e Hospital da Misericórdia de Sangalhos, gerido pela HPP. Principais desafios da saúde 2012 63 Setor hospitalar Racionalizar e procurar sinergias A União das Misericórdias Portuguesas está disponível1 para cooperar com o setor público, o que pode passar, pela anunciada devolução de 15 dos 27 hospitais que ainda são geridos pelo Estado. As Misericórdias podem ser uma mais-valia pela sua característica de proximidade às populações, na prestação de cuidados continuados, na potenciação de recursos e partilha de risco e algumas potenciais deficiências em termos de gestão poderão ser colmatadas recorrendo ao setor privado. Ainda pouco exploradas são as parcerias entre prestadores privados e entre estes e os prestadores sociais. As dificuldades esperadas em 2012 e anos seguintes podem potenciar condições para que os prestadores privados possam procurar sinergias através da colaboração entre si. Isto é particularmente relevante para os players de menor dimensão. A colaboração entre privados e entre estes e os prestadores sociais pode envolver a criação de plataformas comuns ou de serviços partilhados, por exemplo ao nível gestão global da carteira de serviços, redes de referenciação, negociação com pagadores privados, centralização de laboratórios, farmácias, esterilização, centros de contacto, entre outros. Tal como hoje existe e é uma realidade crescente na relação entre o setor público e social, os prestadores privados de cuidados hospitalares poderão beneficiar da parceria do setor prestador social ao nível dos cuidados continuados, assegurando assim não só a continuidade na assistência mas também preservando a relação com o seu utente, fazendo valer as vantagens da proximidade e custo que os prestadores sociais podem aportar à sua oferta. 1 http://www.ump.pt/ump/index.php?option=conte nt&task=view&id=1076 64 PwC Será interessante verificar o impacto efetivo dos serviços partilhados da saúde, bom exemplo que o Estado dá aos setores privado e social. Por sua vez o setor social através das parcerias com o setor privado de saúde pode beneficiar das competências de gestão que podem ser por estes aportado ao seu funcionamento. A procura de sinergias nos modelos colaborativos entre hospitais não persegue unicamente o objetivo de melhorar a conta de resultados dos hospitais que partilham o serviço; existem outras vantagens inquestionáveis, como a melhoria do serviço aos utentes, a possibilidade de tirar partido dos benefícios da especialização, alcançar um posicionamento mais competitivo e reforçar o poder negocial com as entidades pagadoras. Importa saber se as entidades privadas e sociais conseguem por si só vislumbrar os benefícios das parcerias ou se esse impulso só existe quando o Estado toma a iniciativa de estabelecê-las. Ao nível do SNS, em 2012, será interessante verificar o impacto efetivo dos serviços partilhados da saúde, bom exemplo que o Estado dá aos setores privado e social. Implicações • As restrições impostas pelo Programa de Ajuda Financeira ao setor público no sentido de poupar, racionalizar, melhorar eficiência e eficácia, deverá passar pela reorganização do funcionamento dos hospitais públicos, rentabilização da infra-estrutura instalada, monitorização da performance para assegurar as poupanças necessárias e articulação vertical dos hospitais públicos ao nível da prestação de cuidados e horizontal na exploração de sinergias com setor privado e social. Em 2012 poderemos vir a assistir a uma reconfiguração da rede hospitalar pública como resultado de eventuais fusões e encerramento de serviços. Neste cenário, na grande maioria das regiões e principalmente ao nível dos grandes centros urbanos, não será expectável o reforço da colaboração com o setor hospitalar privado e social. Ele será mais provável ao nível da articulação entre os níveis hospitalar e os cuidados continuados. • O setor hospitalar público estará centrado na contenção da despesa corrente dentro do valor da receita corrente, sem sobrecarregar o passivo e mantendo o nível operacional2. • A abertura do novo Hospital de Loures, numa região já por si com excesso de capacidade ao nível das camas disponíveis, levará a uma revisão das áreas de influência de algumas unidades hospitalares, por exemplo a do CHLN. Mesmo com estas alterações é expectável que se mantenha o excesso de oferta na região e que o CHLN venha a sofrer uma redução da procura sem a devida redução dos encargos de estrutura. Existe uma grande incógnita sobre a estrutura futura do mercado hospitalar privado na sequência da alienação da rede dos hospitais HPP. Esta transação poderá resultar no reforço da posição de algum dos players privados já hoje no mercado ou a entrada de novos players. A atratividade do negócio dependerá do modelo de privatização a adotar e das tendências do desempenho das unidades HPP Cascais e HPP Lusíadas. • Reposicionamento dos hospitais privados para compensar a perda de poder de compra dos portugueses e tirar partido do aumento das taxas moderadoras. • Aparecimento de novas parcerias entre prestadores privados e entre estes e os prestadores do setor social, como forma de fidelizar clientes e responder ao momento recessivo do setor. • Devolução de hospitais às Misericórdias, reforçando o papel do setor social na prestação de cuidados de saúde. 2 Apresentação “2012 – Desafios aos prestadores públicos na Saúde”, Painel de especialistas Saúde 2012 PwC-EGP, João Silveira Ribeiro, 2011 Principais desafios da saúde 2012 65 http://www.pwc.pt/saude Este documento foi impresso em papel composto de 100% fibras recicladas post-consumo e homologado com diferentes certificados ambientais. 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